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SESSÃO DE 6 DE AGOSTO DE 1887 845

chegam a quinze e dezeseis, e, segundo me dizem, algumas ha que chegam a produzir de vinte a trinta.

Não precisam tambem estas terras de protecção, porque, se os lavradores têem o bom senso de escolherem as qualidades mais procuradas, as mais rijas, como os lobeiros, toda a producção é empregada na fabricação de massas no paiz, não chegando mesmo para o consumo todo o trigo que produzem, e sendo necessario todos os annos importar de Marrocos e da India saldos importantes.

Ainda não ha duas horas que um dos principaes fabricantes de Lisboa me informou que os seus agentes lhe diziam que este anno, sendo grande a producção, talvez chegue.

N'estes ultimos annos o preço d'estes trigos tem sido sempre superior ao preço dos molles, chegando a vender-se a 540 e 650 réis, quando estes só obtêem 480 e 520 réis. Quasi todas as terras do Alemtejo são susceptiveis de produzirem trigos d'esta natureza, e se a producção não é maior, se chegamos a importar, é porque os lavradores fogem d'elle com o pretexto futil de ser muito trabalhosa á debulha, preferindo ficar com o outro nos celeiros.

Restam as terras que eu classifiquei em terceiro logar, aquellas que não produzem mais de seis sementes, e isto é, por assim dizer, a excepção, pois que a maior parte d'ellas não dá mais de tres, quatro e cinco sementes de trigo rijo tambem.

Comtudo, estas terras não dão prejuizo. Parece paradoxo, mas não o é. Cultivar trigo com similhante resultado seria um acto de loucura, se este cultivo não fosse motivado por causas estranhas, se não fosse como é, uma cultura accessoria destinada tão sómente a beneficiar montados, olivaes ou pastagens.

Eu, por exemplo, se não tivesse oliveiras e montados, não semearia um bago de trigo; mas tendo que lavrar os arvoredos, tendo de fazer uma despeza necessaria, tudo quanto vier d'ali é ganho, e o que eu penso, pensam tambem os que, como eu, têem terras em taes condições, e que, por mais que se faça, não produzem mais de duas ou tres sementes. Considerando só em relação á producção cerealifera, nem sei calcular qual a protecção que precisariam para pagarem ao cultor.

E não se diga que muita região ha onde não existem arvoredos, e onde, por consequencia, esta theoria falha.

Ainda assim não é exacto. A freguezia de S. Braz do Regedor, uma das mais ricas do districto de Evora, pouco arvoredo tem, mas em compensação é uma das regiões de pastagens mais privilegiadas que conheço; produz pessimamente em cereaes, e comtudo cultivam-se, porque a pastagem no Alemtejo precisa ser renovada com a lavoura. As terras de mato que só produzem com roças, amanho baratissimo, dão pouquissimo em trigo; mas, se de tempos a tempos se se não roçarem e lavrarem, nem uma febra de herva produzirão.

Conclusão: a protecção é desnecessaria aos terrenos que produzem trigos ribeiros e aos proprios para o cultivo dos rijos, porque, salvos os desastres causados pela intemperie, e que a protecção não póde remediar, a cultura paga largamente; é desnecessaria aos terrenos menos productivos, porque a cultura n'elles é o accessorio e não o principal, é meio, não é fim.

Eu fallo, sr. presidente, do que conheço. É possivel que na parte do norte do paiz, que eu conheço pouco, estas circumstancias não sejam verdadeiras; mas na parte que eu conheço, que é o Alemtejo e a Extremadura, affirmo que o são; são-n'o até mesmo para a região de Lisboa, que tanto se chora, onde ha terras que posso apontar, como por exemplo tudo quanto vae desde de Belem até á ponte de Algés, onde as producções de quinze e dezeseis sementes não são raras.

Agora passo a demonstrar que é inutil o novo imposto.

Em primeiro logar, Portugal não produz, nunca produziu e nunca ha de produzir trigo sufficiente para se alimentar; e isto não é cousa nova; quando aqui entrou Filippe II, e que reuniu côrtes em Thomar, o primeiro capitulo d'essas côrtes é a resposta ao pedido dos povos que supplicavam ao conquistador, não que fechasse a raia aos trigos de Castella, como hoje se lhe pediria, mas pelo contrario que permittisse que entrassem livremente em Portugal, visto não haver trigo sufficiente para se alimentar.

O que acontecia então, e que se podia julgar excepcional pela falta de braços que as emprezas gloriosas nos tinham roubado, aconteceu sempre.

Ora se não podemos produzir a quantidade necessaria, o que succede?

Succede que é preciso importar, e o importador, seja qual for a protecção ha de preferir sempre o trigo estrangeiro ao trigo nacional, porque é superior, sempre uniforme e mais barato.

Se como na Hungria a producção fosse sufficiente para o consumo do paiz ainda se podia esperar que, não se tendo o gosto acostumado ao pão fabricado exclusivamente com trigos moles, podesse manter-se o fabrico com a mistura dos nossos trigos, mas como a contraria é que é verdade, como não se anda para traz, e digam os sabios o que quizerem a respeito da melhor alimentação dada pela farinha de trigo rijo, o facto é que quem uma vez se acostumou ao pão branco, fofo, leve e facilmente dirigivel, feito com trigo molle, não quer outro, se os fabricantes moerem trigo rijo não teriam a quem vender a farinha. O proprio padeiro recusa-se a empregal-a e é tal a pratica que já tem, que basta o fabricante misturar 10 por cento de trigo rijo para a marca lhe ser rejeitada; e a rasão é simples: panifica-se com trigo molle em menos de metade do tempo do que com trigo rijo, e o tempo é dinheiro.

A uniformidade da qualidade que os nossos trigos não têem e que se encontra nos americanos é outra rasão, e forte, de preferencia. Nada mais apreciavel para uma industria do que poder contar sempre com a mesma materia prima, e na quantidade que precisa; é afastar uma contingencia, e dispensar combinações sempre falliveis; é poder calcular com exactidão a producção a obter. Entre nós as qualidades são quasi tantas como os conselhos. Finalmente comprando trigos americanos, embora mais caros, faz o fabricante uma economia, porque lhe é necessario muito menos capital circulante.

Todos sabem que o nosso lavrador quando vende o seu trigo, precisa que lh'o paguem immediatamente, pois muitas vezes já deve o que recebe da colheita, emquanto que os americanos com os seus habitos de confiança commercial mandam os seus carregamentos com saques, nunca inferiores a tres mezes; por consequencia, o industrial quando tem de pagar o preço do trigo, já tem recebido a sua importancia, com a venda da farinha.

Conclusão: a medida é inutil, porque só conseguirá subir de 16 réis em alqueire o preço de trigos ribeiros, que o não precisam, e deixará os rijos na mesma situação; facilmente vendaveis quando proprios para massas, com difficil venda para pão.

Falta-me finalmente demonstrar que o imposto é perigoso, e creio que não é difficil fazel o.

Ha sempre perigo em tocar na alimentação do pobre.

Bem sei que o governo pede auctorisação para logo que suba o preço do pão, poder baixar o direito das farinhas; mas eu pergunto a s. exa. o sr. ministro da fazenda se tem absoluta confiança em que baixando o direito baixará tambem o preço do pão; e pergunto-lhe mais, se quer ír até ao ponto de o taxar, unico remedio que se me antolha efficaz. Dispenso-o da resposta que sei de antemão, pois não creio que haja quem nos queira fazer voltar aos tempos dos mesteres.

É preciso não esquecer que, elevado uma vez o preço de um genero, buscam-se mil pretextos para manter a elevação.