O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 349

DOS PARES. 349

O Sr. Presidente deu para Ordem do dia da seguinte Sessão (no dia immediato), a discussão do Parecer (N.° 70) sobre o Projecto de Lei da Camara dos Srs. Deputados (N.° 40), concedendo uma pensão a Luiz Villa Milla, o que constituiria a l.ª parte da mesma Ordem do dia, e 2.ª o proseguimento da materia, de que se tractára hoje. - E fechou esta Sessão.

Eram quatro horas e meia.

N.º 64. Sessão de 26 de Abril. 1843.

{PRESIDIU o SR DUQUE DB PALMELLA, DEPOIS o SR. CONDE DE VlLLA REAL, E ULTIMAMENTE O MESMO SR. DUQUE.)

FOI aberta a Sessão pela uma hora e um quarto: estiveram presentes 32 Dignos Pares - os. Srs. Duques de Palmella, e da Terceira; Marquezes de Fronteira, de Niza, de Ponte de Lima, e de Santa Iria; Condes do Bomfim, do Farrobo, de Lavradio, de Linhares, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, de Semodães, e de Villa Real; Viscondes de Fronte Arcada, de Laborim, de Oliveira, de Sá da Bandeira, e da Serra do Pilar; Barão de Ferreira; Barreto Ferraz, Miranda, Ribafria, Gambôa e Liz, Ornellas, Serpa Saraiva, Margiochi, Lavares de Almeida, Geraldes, Silva Carvalho, Serpa Machado, e Polycarpo José Machado.

Lida a Acta da Sessão antecedente, ficou approvada.

Mencionou-se um Officio da Presidencia da Camara dos Srs. Deputados, acompanhando uma Mensagem da mesma Camara, que incluia um Projecto de Lei sobre ficarem isemptos de direi tos os objectos importados de fóra do Reino, ou que de futuro o forem, para a edificação e decoração do Theatro Nacional de D. Maria II, e. outras providencias a respeito do mesmo Theatro. - Passou á Secção de Negocios internos.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Mando para a Mesa a representação de um Professor, João Linneu Jordão, o qual achando-se comprehendido no Decreto de 19 de Dezembro de 1842 para receber com as Classes activas, tem feito todas as diligencias para que assim se considere, porem tem encontrado a mesma injustiça em toda a parte? e por consequencia julgou dever dirigir-se a esta Camara, para ver se encontra nella mais justiça, do que encontrou nas outras Repartições Publicas: por isso peço, que este requerimento se mande á Commissão de Petições, com urgencia.

Assim se decidiu.

Entrando-se na 1.ª parte da Ordem do dia, foi lido o Parecer (N.° 70) sobre o Projecto de Lei da Camara dos Srs. Deputados (N. 40), concedendo uma pensão a. Luiz villa Milla (V. pag. 329 col. 1.ª)

O SR..CONDE DO BOMFIM: - Sr. Presidente, a Commissão de Guerra, de que tenho a honra de ser Relator, julgou desnecessario juntar quaesquer razões para convencer, de que esta pensão deve ser concedida, fundando-se no Parecer da Commissão de Guerra da Camara dos Srs. Deputados. Eu, para não cançar a attenção da Camara, prescendi de ler esse Parecer; mas pediria a V. Exa. que o mandasse ler na Mesa, pois o que delle consta é mais, do que eu posso dizer. ( Leu-se.)

O SH. CONDE DE VILLA REAL: - Sr. Presidente, eu assisti á Commissão, em que se apresentou este Parecer, e assignei vencido. Não desejo prejudicar o Requerente, não desejo que das minhas palavras se intenda, que elle não prestou grandes serviços; mas assignei vencido, por que já em outra occasião votei contra, por que sendo Estrangeiro, vem a ficar em melhor condição do que os Portuguezes, que estão nas mesmas circumstancias: agora não posso deixar de dar um voto similhante, ao que dei na outra occasião.

O SR. CONDE DO BOMFIM: - Sem impugnar as intenções do Digno Par, que acaba de falla r, direi, que S. Exa., por um melindre excessivo, conforme ao seu caracter, intende que se queria conceder pensão maior a um Estrangeiro, do que se daria a um Nacional; e eu, para motivar que não é assim, e que pedi a palavra. Escuso de dizer nada sobre os serviços deste Italiano, depois do relatorio que acaba de ler-se: elle tinha um estabelecimento no Porto, que perdeu, serviu com armas na mão. Para os Nacionaes a Lei garante as recompensas, mas hão para os Estrangeiros: .º Governo não tinha uma Lei por onde elle podesse ser beneficiado; a pensão que se lhe dá, muito pouco excede ao pret; por consequencia parece-me, que se lhe não póde negar, o que seria uma grave injustiça, visto que já nas Côrtes passadas foi decidido, que se mandasse ao Governo para propor. Agora, pela Carta, pertence ao Governo apresentar as Propostas; e parece-me que não póde deixar de ser deferida a pensão de duzentos e quarenta réis diarios.

O SR. TAVARES DE ALMEIDA: - Este negocio já tem vindo aqui por mais de uma vez. Eu não sei se pelo regimen da Carta a Proposta pertence ao Governo: eu desejava saber se este Projecto tinha sido elaborado sobre Proposta do Governo. Peço ao Sr. Secretario da Commissão me queira sobre isso informar.

O SR. CONDE no BOMFIM: - Esta pertenção nasceu primeiro de um requerimento perante as Camaras; mas no regimen da Constituição de 38, e antes della estar jurada, remetteu-se ao Governo para fazer a sua Proposta, e o Governo só veio a faze-la depois da Constituição jurada: por consequencia, posso dizer affoutamente, que foi uma Proposta do Governo; ao actual pediram-se explicações, deu-as, e então não se póde duvidar, que a Proposta é do Governo.... (O Sr. Tavares de Almeida - Peço que se leia a Proposta do Governo.) O Governo propoz, e eu era então Ministro. (O Sr. Tavares de Almeida - Mas essa Proposta morreu, foi aqui rejeitada, e V. Exa. não ha de querer, que vigorem as Propostas da Constituição transacta.)

Sendo lida na Mesa a Proposta, proseguiu

1843 - ABRIL. 88

Página 350

350 DIARIO DA CAMARA

O SR. TAVARES DE ALMEIDA: - Eu digo que essa Proposta cahiu, por que já foi rejeitada; e parece-me que devia haver uma nova Proposta do Governo. No Art.º 75.º § 1.º de Carta Constitucional diz-se (leu,) Por tanto, daqui collijo eu, que as pensões devem ser propostas pelo Governo, e que ás Côrtes pertence approva-las. O Governo é quem está habilitado para avaliar1 os Serviços, cujo conhecimento as Côrtes não tem: e por tanto da natureza do abjecto, que seja proposta pelo Governo. Ora essa Proposta não vejo eu ahi. Álem disso, supposto que tal pensão seja uma cousa insignificante, nós termos uma Lei, a qual diz que - no Governo; quando propõem uma pensão, proponha quaes os meios de preencher o deficit que ella deixa: tambem não vejo isso; e assim, não possa votar.

O SR. PRESIDENTE: - A Carta concede ao Governe á faculdade de fazer estas Propostas; mas não tolhe ás Côrtes poder faze-las: isso seria limitar o Direito ás Côrtes. Eu concordo em que é conveniente, que a iniciativa seja do Governo; mas negar ás Côrtes o Direito dessa iniciativa, não ha Constituição que o diga.

O SR. TAVARES DE ALMEIDA: - Permitia-me V. Exa. o observar, que a Constituição de 1838, muito explicitamente consignava, que ao Governo competiria a Proposta das mercês pecuniarias, que não estivessem marcadas por Lei.

O Sr. CONDE DE BOMFIM: - Eu não quiz negar, que na Camara dos Srs. Deputados cada um tinha a iniciativa de propôr qualquer cousa; nem tambem quiz inculcar, que era necessario vir a Proposta dó Governo: o que eu quiz dizer foi, que no tempo em que não regia a Carta, houve este requerimento ás Côrtes Constituintes, as quaes o mandaram ao Governo e este fez a Proposta; e então digo eu, quer de um modo quer de outro, este requerimento está com todos os sacramentos. As Propostas caducam; mas o que não caduca, é a opinião do Governo: as Commissões da outra Camara, que são as competentes para conhecer da qualidade das pensões, depois de descerem, a minuciosos exames, viram que se não pedia demais, e redigiram esse Projecto, e qual me parece, que senão póde atacar, até por que o actual Presidente do Conselho concorreu para elle. Por tanto, concedendo-se isto ao Pertendente, elle não vem a ficar em melhor situação, do que qualquer Nacional, a quem as Leis tem estabelecido recompensas de serviços.

Não havendo quem mais pedisse a palavra, foi approvado na sua generalidade, e especialidade contida no seu Art.° unico.

Passou-se á 2.ª parte da Ordem do dia, proseguindo a discussão sobre o Projecto de Regulamento interno da Camara, constituida em Tribunal de Justiça, começando-se pelo Art.º 8.º e emenda do Sr. Barreto Ferraz, tudo o que ficara pendente da anterior Sessão, (Vid. pag. 34.8 col. 2.ª)

É o seguinte

Art.º 8.° Quando algum processo fòr remettido á Camara dos Pares, em o qual se ache pronunciado algum Individuo, dos que pertencem, á sua exclusiva jurisdicção; o Presidente, dando conhecimento disso á Camara, o enviará á Commissão de Legislação, para que com o seu parecer a camara possa resolver se o processo deverá, ou não seguir os seus termos ulteriores, e se o Réo, sendo Par, deverá ou não ser suspenso das suas funcções, nos termos, da Carta Constitucional, Art.º 27.°

§ unica. Esta resolução1 da Camara será tornada, em Sessão secreta.

O SR. VISCONDE DE LABORIM: - Sr. Presidente, principio rogando aos meus Collegas, que trabalharam na Commissão, que se convençam, de que alguma pequena opposição, que tenho feito 21 alguns dos Artos. deste Projecto, nasce do desejo, de que esta obra sáia com a perfeição possivel; e em abono da verdade não faço outra couza mais, do que aquillo, que SS. Exas. reconhecem no seu mesmo Relatorio; por que, ahi reconhecem a dificuldade da materia, e as circumstancias, em que collocados, de não quererem se não seguir Legislação já sanccionam, e alguns dos fundamentos estabelecidos na Carta Constitucional.

Sr. Presidente, é uma verdade que o Parecer da Commissão, relativamente ao processo do Digno Par Marquez de Niza foi addiado, e tomou-se neste intermedio a resolução, de que os Dignos Pares o vissem; alguns o viram, outros deixaram de o vêr; depois de passado Certo tempo veio o Parecer á discussão, elle não continha nada mais, nem nada menos, que o seguinte. - "que a Com missão era de Parecer, de que o negocio do Digno Par Marquez de Niza, "e o processo a este respeito estavam nas circumstancias de seguir os termos legaes, todas as vezes que a "Camara se constituisse em Tribunal de Justiça:" foi este Parecer approvado unanimemente pela Camara. - Depois de estabelecer este principio, não posso deixar de dizer (pedindo licença ao Digno Relator da Commissão), que me surprendeu o principio, que S. Exa. estabeleceu, quando disse que - " o " Art.° 8.° tinha sido exarado em contemplação áquillo, "que se havia vencido em Camara, e em contemplação á Carta Constitucional no Art.° 27.°" Mas, Sr. Presidente, seja-me, licito dizer, que eu neste Art.° 8.° nem vejo observar, o que se decidiu: na Camara, nem o Art.º 27.° da Carta, na conformidade era que eu o intendo. Sr. Presidente este modo de pensar da digna Commissão, levou ao meu conceito alguma tal, ou qual irregularidade; por que, quando estabeleceu este principio, vio-se forçada a estabelecê-lo de duas maneiras, e em ambas ao mesmo tempo executado, de confirmar a pronuncia: uma no Art.° 8.°, e outra no .Art.° 12.°. No Art.° 8.°, Sr, Presidente, estabelece-se o principio de confirmação da pronuncia; e o que se diz ahi? .. Diz-se que o Réo pronunciado deve effectivamente ser suspenso do seu emprego. É este, Sr. Presidente, o effeito da pronuncia; e ainda digo mais: tractando do Empregado publico, ainda vai álem da mesma pronuncia; por que, não é só o eifeito da pronuncia, e o effeito da declaração da accusação, por que o Empregado publico só póde ser suspenso do seu emprego, depois de se declarar a sem accusação; quer dizer, foi-se ainda álem da pronuncia, chegou-se ao ponto da accusação. Sr. Presidente, por estes motivos, para não cançar a Camara, não tornarei outra vez a tractar desta questão: não e possivel, no meu conceito, passar o Art.º tal qual esta; e peço a V. Exa. queira dignar-se mandar ler a emenda do meu digno amigo, o Sr. Barreio Ferraz, por que,
parece-me, que tem a exposição da minha convicção. (Satisfeito, proseguiu) Neste Art.º deve por força inserir-se essas palavras: logo que chegue o processo, e que venha

Página 351

DOS PARES 351

O parecer da Commissão, o primeiro passo que se segue, é a Camara formar-se em Tribunal da Justiça; e tudo fôr fóra d'aqui é fóra da Carta e dos principios de Jurisprudencia.

O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA: - Sr. Presidente, eu, pedi a palavra, por que o Digno Par, que acabou de faltar, disse, que todo o Parecer tinha, sido approvado unanimemente: votei contra, e por consequencia não foi approvado unanimemente e o Parecer approvou-se quando houve uma Proposta, para que senão entendesse, que approvando-se o Parecer da Commissão, nem se ractificava nem deixava de ractificar a prenuncia: se estou hera lembrado, parece-me que foi neste sentido. Eu combati o Parecer, por que me pareceu, que, se havia uma decisão da Camara Legislativa, que podia tomar conhecimento do processo sem a Camara estar ainda constituida em Tribunal de Justiça; ella podia tomar conhecimento do processo, par que parece que se tirava uma attribuição a esta Casa. Eu não me recordo se houve votação sobre este ponto; mas eu faltei contra; e se votei pelo Parecer, foi depois da declaração que se fez, de que não importava a ractificação da declaração de pronuncia.

Eu hontem offereci aquella Emenda, não por que estivesse persuadido, de que effectivamente a Camara se devia constituir em Tribunal de Justiça para decidir daquillo, que eu suppunha ser ractificação de pronuncia, mas uma cousa e querer, que se entrasse n'um objecto para depois se julgar, visto que havia divergencia na Camara, e outra é ter feito opposição áquillo, que depois pareceu ter approvado. Eu não sou sabio, e por consequencia o mudar de conselho não póde ter relação a mim, por que não estou nessas circumstancias; mas naquella epocha votei contra, por que não estava feita Lei alguma, nem Regulamento, que deixasse a Camara de constituir-se em Tribunal de Justiça. Hontem apresentei aquella Emenda, que depois retirei, por que tendo havido aquella questão, quando a nos parecia que devia haver Tribunal de Justiça, e a outros que não; era necessario para aquella discussão (e os Dignos Pares que tinham feito o Parecer sobre o processo ao Sr. Marquez de Niza serão, da mesma opinião), tirar toda a duvida, que depois se podesse suscitar a este respeito, e por que me pareceu, que o Parecer não as tirava: para que se podessem tirar, é houvesse uma regra fixa, e que fiz aquella Emenda. - Parece-me, que dando esta explicação mostro, que effectivamente não estive em contradição.

Q Sr. VISCONDE DE LABORIM. - Sr. Presidente, eu em abono da verdade, não sei a illação que hei de tirar do discurso do Digno Par: entretanto parece-me, que S. Exa. quer dizer, que a approvação não foi unanime. Eu não sei se e11a foi unanime, ou não, mas parece-me que sim: todavia, isso não vem nada para o caso, como quer que seja, foi uma approvação da Camara; mas se entrasse em mais escrupulos, pedindo a V. Exa. que mandasse ler a Acta, mostraria que não me enganava.

Agora, em quanto a S. Exa. dizer, que se exigiu uma declaração dos Membros da Commissão, é verdade que se exigiu; mas o Parecer e tão unanime, que ninguem se lembrou de que a Commissão se quereria intrometter no processo; por que, o que diz o Parecer da Commissão! (leu) Ora, quem dirá presença destas palavras, que a
Nem o podia fazer.

O SR. CONDE DE LINHARES: - Não posso dar a minha approvaçao á redacção desta Emenda, sem se explicar nella claramente, que não tem referencia com os Deputados; por que nas palavras nas "algum individuo, dos que pertencem á sua exclusiva jurisdicção" (da Camara dos Pares), isto é claro, e então, offender-se-hia a prerogativa constitucional da Camara dos Srs. Deputados. - Tambem hontem creio, que provei, que a suspensão era uma consequencia necessaria da pronuncia, e que esta nem sempre era consequencia de uma sentença condemnatoria: citei para este fim o Art.° 9.°, e Art.° 191.° da Carta Constitucional: portanto, no caso presente, para que insistir em considerar estes actos como essencialmente judiciarios, e não como uma garantia politica, em cujo caso, reconhecida a necessidade da pronuncia pelas provas, que tornam provavel, que um Individuo commettesse um crime, e igualmente reconhecida a necessidade da sua suspensão, até que se purifique da accusação, ou do crime? Ora, tractar d'estas cousas em Sessão secreta, e comprometter a garantia politica; motivo parque não approvo tambem o § 1.º deste Art.º 8.º (O Sr. Presidente - Este § não está era discussão.) Reconheço que não esta em discussão; mas occorreu-me tocar nelle como materia ligada intimamente com a Emenda ao Art.°, cuja redacção, pelos motivos expostos, não approvo. A Commissão o que fez, foi dizer " a Camara lê o processo, constitue-se em Tribunal de Justiça, e Veremos se a pronuncia tem " logar, ou não" logo, não emittiu opinião alguma sobre a validade; e debaixo destes principios, o que a camara votou, e votou muito bem. - Parece-me que o Digno Par estará satisfeito....

O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA: - Estou satisfeitissimo.

O SR. ORNELLAS: - Offereceu a seguinte;

Emenda (ao Art.° 8.°)

Quando algum processo, que não seja relativo a Deputados, for remettido á Camara dos Pares, em o qual se ache pronunciado algum dos outros Individuos, que pertencem á sua exclusiva jurisdicção, o Presidente designará o dia, em que o Tribunal se ha de reunir.

Admittido á discussão.

O SR. VISCONDS DE FONTE ARCADA: - Como a Emenda do Sr. Ornellas está em discussão, e substitue o §, e o que eu portando e que elle se elimino; desejarei a palavra para sustentar essa Emenda.

O SR. ORNELLAS........

O SR. VJSCONDE DE FONTE ARCADA: - Eu proporei uma substituição a este Art.° desta maneira:

Proposta (de substituição ao Art. 8.°)

Proponho o Art. 27 da Carta, como substituição ao Art. 8.° do Regulamento.

E proseguir. E desde já peço a palavra para pedir uma votação nominal - sobre se a Camara ha de tornar conhecimento da rectificação de pronuncia em Sessão secreta.

Admittiu-se esta substituição.

Q SR. CONDE DE LINHARES: - Para não tomar

Página 352

352 DIARIO DA CAMARA.

tempo á Camara, mando a minha Emenda para a Mesa

Proposta (de substituição ao Art. 8.°)

Proponho como Emenda o Art. 27.° da Carta Constitucional, ou qualquer outra redacção analoga, redigida de novo pela Commissão.

O SR. PRESIDENTE: - Já cá está uma igual, que é do Sr. Visconde de Fonte Arcada.

Admittiu-se a Proposta.

Tendo- se proposto á votação a Emenda do Sr. Barreto Ferraz ( V. pag. 347 col. 2.ª), foi approvada, e com ella o Art.º, pelo que ficarão prejudicadas todos as mais alterações propostas.

O SR. VISCONDE DR LABORIM: - No § do vetado Art.° vejo um reforço para a nossa opinião: parece-me que na aqui uma nova razão para a Camara decidir como costuma. É necessario notar-se, que pelas Leis actuaes, e mesmo pelos vigentes, a pronuncia, e ractificação, tem diversos effeitos: quando o Réo interpõe recursos para o Tribunal Superior, e o Juiz reconhece, que o Réo não tinha sido bem, ou mal pronunciado, já não é necessario segredo; por que já pelo primeiro acto da pronuncia ficava praticado tudo quanto se deve praticar, debaixo do principio do segredo: não sei se me tenho feito explicar, e tornarei a repetir. - Quando em um Tribunal Superior se dizia, que procedia a pronuncia, já não havia necessidade do segredo, por que este só e necessario até á pronuncia; por que, de duas uma, ou o Réo estava prezo, ou afiançado: em uma palavra, todas as vezes que o recurso subia, o Réo devia estar prezo.

A Carta Constitucional no art. 126 diz "todos os " actos serão publicos até á pronuncia" isto não tem duvida nenhuma: assim vamos atacar a Carta Constitucional, e depois do que está vencido, não póde deixar de se eliminar este §

O SR. CONDE DE LINHARES: - Impugno a doutrina do § do Art.°, como contraria ao espirito da Carta Constitucional, e proponho a sua eliminação. Segundo o Art.° Q7.° da Carta e para mim evidente, que as pronuncias em que se possão achar compromettidos Membros desta Camara, raras vezes, ou quasi nunca, serão feitas pela intervenção da mesma Camara: de que se tractará, pois? me dirão: de nada mais que confirmar as pronuncias já feitas: então para que em segredo, quando os que se presumem de culpados são conhecidos, e talvez já postos em custodia? Eu presisto em não poder ver na confirmação da pronuncia pela Camara, um auto judicial, mas sim o cumprimento de uma garantia politica; e esta para ser efficaz deve ser publica. - Nos outros casos, em que a Camara é chamada a julgar a confirmação da pronuncia, o a suspensão dos cargos, que exercem, não pertencem á Camará: ella os julga, mas não os pronuncia, tal e o caso com os Deputados, e os Ministros, e Conselheiros d'Estado, a quem a Camara dos Deputados forma o acto de accusação. A pronuncia e um acto preparatorio do processo, com o fim de indagar, e indigitar os suspeitos do crime, que se ha de julgar; mas não e um acto, que se deva considerar como pretencente ao processo. Por estas razões, pois, proponho que se omitia o § do Art.º

O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA: - Eu opponho-me a este §, que estabelece a ractificação da pronuncia seja em Sessão secreta. Todos os actos que se fazem no processo, antes delle vir a esta Camara, são sobre a pronuncia; mas aqui não se faz mais do que rectifica-la: ora, esta effectivamente deve, ser publica, a fim de que se conheçam os motivos, que levaram os Membros desta Camara a votarem desta, ou d'aquella maneira; por quanto, todas as Pessoas que forem aqui julgadas (embora os seus crimes não sejam politicos), estão todas ligadas mais, ou menos com a politica; e qualquer que fosse o julgamento ás portas fechadas, não teria aquella veracidade, que todos os actos devem aqui ter: por consequencia proponho, que este § se elimine, ou que então se proponha, que a rectificação de pronuncia feita nesta Camara, seja em Sessão publica, e não secreta; porque me parece, que por qualquer dos modos será o mesmo.

O SR. VISCONDE DE LABORIM: - Sr. Presidente, eu queria lembrar que, a materia em discussão é - se deve, ou não ser eliminado o §, e nada mais: parece-me que o pensamento dos Dignos Pares e votarem a sua eliminação, e por consequencia, para que à a vemos de estar a perder tempo, tendo-se até definido a maneira da pronuncia muito esquipaticamente?- Sr. Presidente, a pronuncia não é outra cousa mais, do que aquella sentença, pela qual o Réo se julga iniciado, neste, ou aquelle crime, e por ella e levado ao rol dos culpados: esta definição e a de todos o> Jurisconsultos ( Apoiados,), e a de Pereira e Sousa. Mas da maneira pela qual o § estava apresentado no Projecto, era uma consequencia necessaria, que isto fosse em Sessão secreta; e ainda digo mais, que, se este acto não fosse em segredo, estabeleceu-se aqui um principio contrario á Carta; porque ella diz, que "todos os actos posteriores á pronuncia sejam publicos e manifestos" nisto quer dizer, que, os outros todos, antes da pronuncia, sejam em segredo: por tanto, repito, estabelecida aqui uma doutrina contraria, é oppôr-se á Carta. - Ora, depois da Camara se constituir em Tribunal de Justiça, e que tem cabimento, quando se tractar da prisão, que vem em consequencia da accusação, o saber-se se isso ha de ser, ou não publico, e para então me reservo. Peço a V. Exa. em conclusão, que consultar a Camara sobre se effectivamente o § deve ser eliminado.

O SR. PRESIDENTE: - Não posso consultar a Camara, sem que fallem os Srs. que teem pedido a palavra.

O SR. VISCONDE DU LABORIM: - Pois então peço a palavra sobre a Ordem, e proponho, que se consulte a Camara sobre - se o § se deve eliminar, ou não.

O SR CONDE DE LINHARES: - Eu acho bastante forte, que lendo fallado um Digno Par, e querendo os outros responder-lhe, isto se lhe véde.

O SR. SERPA MACHADO: -......

O SR. VISCONDE DE OLIVEIRA: - Peço a V. Exa. que tenha a bondade de mandar ler a Emenda do Sr. Barreto Ferraz. (O Sr. Barreto Ferra,* explica a S. Exa. em voz baixa o sentido da sua Emenda.)

Avista do que acabo de ou vir, estou conforme era que se supprima o §.

(Entrou o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.)

O SR. CONDE DE LINHARES: - O Art.° 27.° da Carta Constitucional diz assim " Se algum Par ou

Página 353

DOS PARES. 353

Deputado for pronunciado" logo é claro, que um Par, ou Deputado póde ser compromettido tem uma devassa de tal maneira, que haja de ser pronunciado, isto é, reconhecido como compromettido em um crime: ora, não vejo muito fundamento, para que um Par, ou Deputado não possa deixar de ser retido em custodia, se ocaso for de tal gravidade, ou que para bem do exame, esta precaução seja necessaria. Estando a Camara reunida, ocaso poderá desde logo ser referido a ella; mas não estando, tal caso haverá, que exija a custodia até á proxima reunião da Camara; e a não ser assim, gosariam os Pares, e Deputados, de uma impunidade, que nenhumas Leis podem admittir. A Camara ajuizando subsequentemente da pronuncia, decide se ha motivo de se continuar o processo, e em consequencia, da suspensão do Par, ou Deputado.

O § do Art.º 8.° foi eliminado.

O SR.CONDE DE LAVRADIO: - Acha-se nesta Camara o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, e provavel que S. Exa. tenha muito que fazer, e creio que não veio aqui para assistir a esta discussão do Projecto, mas para responder ás interpellações, que eu tinha annunciado desejava fazer-lhe: por consequencia peço a V. Exa., que consulte a Camara, se quer que se interrompa esta discussão,- a fim de eu fazer a minha interpellação a S. Exa. ou se quer que nos guardemos para o fim da Sessão.

Resolveu-se pela suspensão da discussão.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Sr. Presidente, ha uns poucos de dias appareceu um annuncio no Diario do Governo, que eu reputo parte official; feito por authorisação do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, em que se publicava, que as negociações commerciaes, que haviam entre Portugal, e a Gram-Bretanha, se tinham interrompido: por consequencia, não pude deixar de pedir a S. Exa. que communicasse a esta Camara qual fôra o motivo, que causara essa interrupção das negociações. Pediria mais a S. Exa., que quisesse declarar a maneira, e o modo, por que essas negociações foram conduzidas; e álem das explicações que houvesse de dar a esta Camara, eu mais exigiria, se lhe remettesse todos os documentos, e correspondencia relativa a estas negociações, para que a Camara podes>e julgar se esta interrupção era devida a causa nossa, ou á da outra Alta Parte contractante.

O segundo objecto sobre o qual desejaria algumas explicações, era sobre o trafico de escravos branco", que cada vez se augmenta mais; e alêm de varias noticias, ha uma caria publicada no Diario de Governo, que veio confirmar isto. - Nas Ilhas, principalmente nas dos Açôres, esta-se fazendo um verdadeiro trafico de escravos brancos: eu desejo saber quaes eram as medidas, que se tinham adoptado para impedir a sua continuação, querendo ouvir do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, se com effeito já exigira do Governo do Brazil a restituição dos Portugueses, que lá estão considerados como escravos, dando-nos uma indemnisação, alem da satisfação pela injuria feita áquelles Individuos, e ao Paiz: por quanto, querendo-se acabar com o trafico da escravatura na Costa de Africa, estão indo para lá os Portuguezes como escravos, e não faltará muito, que os nossos filhos, e as nossas mulheres, não vão para os Estrangeiros, a fim de satisfazerem a sua voluptuosidade. Peço, por consequencia, que se me diga quaes são as medidas tomadas, ou as que se tencionam tomar a este respeito.

O SR MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - O Sr. Conde de Lavradio desejava saber os motivos, por que se interromperam as negociações com a Inglaterra; e eu declaro ao Digno Par, que nós não nos podemos combinar em condições, que obstaram a que podesse a negociação vir áquelle termo, que se desejava; mas não posso dar os motivos senão com a correspondencia, que ha de aqui vir, e por ella se saberá donde veio a causa de senão concluir esta negociação. Na camara dos Deputados já se apresentou uma Proposta, para que esta correspondencia lhe fosse enviada, e por consequencia tractou-se de a mandar copiar, a fim de ser remettida ás Camaras, a qual espero que venha de uma maneira, que de um cabal conhecimento de toda a negociação: parece-me que não será necessario omittir cousa alguma.; roas se isso se tornasse preciso por se entender, que podia prejudicar o Serviço publico, creio que os Dignos Pares senão opporiam: entretanto repito, que não será necessario, e virá de um modo satisfactorio.

Km quanto a esse negocio da emigração de Portugal para o Brazil, não entendo muito bem a expressão de escravos brancos- mas persuado-me, que se fallou sobre a emigração dos Portuguezes. - Sr. Presidente, isto é um negocio, que, sem duvida nenhuma, demanda algumas medidas: com tudo, eu devo prevenir esta Camara, de que nessas relações ha alguma exaggeração. Acarta, a que o Digno Par se referio, apparecida no Diario do Governo, não póde deixar de ser exaggerada; e acredito isto, porque no fim daquella carta se diz, que o Cônsul Portuguez e o culpado da maior parte daquelle engajamento; mas o facto é, que áquelle Consul tem dado muitissimas providencias, e tomado medidas, que teem sido communicadas ao Governo, o qual já tem adoptado parte; e não st descuida neste ponto. Teem-se tomado algumas medidas preventivas de policia para as Ilhas dos Açôres; e aqui mesmo na Capital, quando esteve ahi a fragata Brazileira, houve uma denuncia de estar engajada certa porção de gente: entretanto, considerando-se que aquelles Individuos iam illudidos, não quiz o Governo indispor-se com uma Nação estrangeira; mas mandou o Governo logo ordens positivas para o Rio de Janeiro, a fim de que o nosso Cônsul, apenas chegasse aquella embarcação, empregasse todos os meios de saber quantas Pessoas foram; que tractamento lhes deram, e todas as suas particularidades; porém até agora não ha tempo de vir a resposta: entretanto, o Governo faz todos os possiveis para evitar esta emigração. Em quanto á da Provincia do Minho, declaro, que esta e uma emigração natural, porque quasi todos teem alli os seus parentes, e isto provem de que os pães empregam uns filhos na lavoura, e os outros vão para o Brazil, de maneira que isto está n'um estado normal, e por consequencra, tudo quanto se fizesse para se impedir a emigração desta Provincia, seria fazer-lhe um grande prejuizo, e os Dignos Pares, que de lá forem, hão de se convencer do que eu acabo de dizer. (Apoiados.) Em conclusão digo, que o Governo ha de tomar todas as medidas indirectas, que cão as que hão de produzir melhores effeitos, e das quaes espero se poderá vir a um bom exilo.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Sr. Presidente,

1843 - ABRIL. 89

Página 354

354 DIARIO DA CAMARA

eu estou satisfeito quanto á promessa, que o Sr. Ministro fax de remetter a esta Camara a correspondencia. Tomaria a liberdade de pedir a S. Exa., que a remettesse desde logo impressa; mas isso fica ao cuidado de S. Exa.: agradeço a promessa; mas se se demorar muito, eu hei de insistir. Agora pediria a S. Exa. que me dissesse o estado como deve ser considerado ainda hoje o Art.° 7.° do Tratado de 3 de Julho de 42 - se as disposições daquelle Art.° se devem considerar como tendo caducado, em consequencia da rotura das negociações - desejava saber a opinião de S. Exa. se o não julga inconveniente.

S. Exa. disse, que não sabia bem do que eu queria fallar, mas que julgava que era da emigração: não era da emigração, porque convenho, em que e quasi impossivel, e até em que não ha direito de impedir aos Individuos a liberdade de mudarem de Paiz: eu quero fallar de um verdadeiro trafico que existe nas nossas Ilhas, ainda que seja exaggerado o que se acha no Diario do Governo, ha alguma cousa de similhante. Creio que ha de ser Pessoa mui respeitavel o nosso Cônsul em Pernambuco; mas desejaria que o Governo incumbisse alguma Pessoa da sua confiança," que não fosse este Consul; não porque eu o suspeite; mas como elle se reconhece accusado de fazer este commercio, ainda que eu sou amigo das economias, seria de opinião que o Governo fosse authorisado a mandar lá um Commissario. Recommendo muito ao Governo, que não abandone este negocio, e pediria mesmo medidas extraordinarias a bem da Humanidade.

O SR. VISCONDE DE SÁ DA BANDEIRA: - A esta Camara foi presente um Projecto para, por meios indirectos, diminuir a emigração: este Projecto foi á Commissão respectiva, está-se trabalhando sobre elle, e será presente á Camara: entre tanto, lembrarei algumas cousas, que me parecem convenientes. Primeiramente, deve-se determinar quaes são os Portos, nos quaes os navios possão embarcar Emigrados, e nestes deve haver Capitães do Porto, sendo os Capitães dos navios obrigados a assignar termo de tractar bem os Passageiros, e sendo estes consignados aos Consules Portuguezes, e não se levantando a responsabilidade aos Capitães, senão depois de terem satisfeito os ajustes contractados com os Passageiros. Deste modo virá o Governo Portuguez a ter acção directa para podêr exigir, que as condições sejam executadas.

Quando os Colonos chegam ao Brazil, em geral, não tem pago a passagem, nem tem dinheiro para a pagar; são então expostos á venda pelo Capitão, ou Consignatario do navio, o que se executa, ajustando elles os seus serviços futuros, com quem os pretende; o Colono engajado é mandado para o trabalho, supponhamos d'uma Roça; ahi precisa elle de cousas, que só por dinheiro póde ler; o Proprietario, ou o seu Feitor, fornece-lhas por oito preço, pelo qual responde o futuro serviço do Colono; e aqui temos este engajado por tempo indifinido, talvez por toda a vida, aqui o ternos escravo de facto. - Para escapar a tal estado, muitas vezes os Colo-los fogem; mas se são capturados, entregues de novo a seus Senhores, são castigados. O Governo, ou os seus Agentes, poderião ter posto obstaculo, ao que aconteceo ha pouco tempo na Madeira com os Camponezes, a que alli chamam vilões. A Assembléa Legislativa da Goyana ingleza, votou uma quantia
muito consideravel de dinheiro, para ser empregada no transporte de Emigrados da Serra Leôa, e na Madeira; e alguns Portuguezes, já lá estabelecidos, foram mandados a esta ilha com a promessa de cinco libras sterlinas por cada Emigrado, que fizessem partir: como Missionarios se espalharam pela Ilha, pintando as fortunas, que na Goyana esperavam os Emigrados. - Seguiu-se uma especie de fanatismo entre os Camponezes, e diz-se, que mais de cinco mil se foram para aquelle Paiz insalubre. Se o Governador Civil, se o Juiz de Policia Correcional, fizessem o seu dever, isso teria sido bastante para impedir uma tal emigração.

Concordo com o que diz o Sr. Ministro, quanto á emigração da Provincia do Minho para o Brazil; esta é util: vão para lá rapazes dirigidos a Pessoas conhecidas; muitos empregam-se logo como caixeiros das casas de Commercio; bastantes prosperam pela industria; e alguns destes voltam á Patria.

Já por duas, ou tres vezes dirigi ao Sr. Ministro, e agora repito, as seguintes perguntas: Primeira, se o Governo Britanico tinha admittido o principio, de que as prezas illegaes de navios portuguezes, feitas por Cruzadores britanicos, ao sul do Equador, antes da publicação do acto do Parlamento, que as auctorisou, fossem pagas, e como, segunda pergunta - quaes são os motivos, por que senão tem posto em pratica o Artigo do Tratado, pelo qual se supprimem as Conservatorias; terceira - se estão nomeados os Commissarios para as Commissões mixtas, e se o Governo não tem duvida de mandar á Camara uma relação desses Com missa rios, e qual o ordenado, que lhes foi arbitrado: quarta - se tem dado alguns passos a negociação relativa ao navio Gloria.

O SR. CONDE DE LINHARES: - Desejava aproveitar esta occasião para lembrar ao Sr. Ministro, que um dos meios mais efficazes para evitar a emigração, seria mandar uma parte dessa gente para as nossas Provincias, que estão quasi desertas: isto seria de muita vantagem. Portanto, eu creio, que o Governo poderia olhar para isto com attenção, ainda que a emigração, em essencia, não é um grande mal; mas como Portugal percisa dessa emigração, era de desejar que o Governo a encaminhasse para o Paiz.

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Confesso, que me admirei quando vi no Diario, que se tinham interrompido as negociações, que segundo é voz constante, estavam proximas a um termo favoravel. Não faço perguntas ao Sr. Ministro a este respeito, só lhe indicarei, que havendo tão poucos dias, que se romperam as negociações, não quereria que o Sr. Ministro se apressasse a responder, para não tornar mais difficil qualquer negociação futura.

Quanto ao Art.° 7.° do Tratado, o Digno Par póde responder a si mesmo, e por isso é que eu sobre este ponto desejaria, que o Sr. Ministro não désse resposta, quando dessa resposta resultasse algum mal, que talvez depois se não possa remediar.

Quanto á escravatura branca, o facto consiste em que muitos desses homens, que teem ido das Ilhas, são elles que fazem um contracto livre, e expontaneo com os Mestres dos navios. Tive conhecimento destes factos, quando estive no Ministerio, e não achei que fosse facil evitar estes males, apezar do desejo que disso tinha. Tanto o Consul da Bahia, como o

Página 355

DOS PARES. 355

de Pernambuco, representaram varias vezes sobre questões, que occorreram entre estes Passageiros, e os Commandantes dos navios em que iam: muitos delles tinham contractos escriptos, nos quaes se obrigavam a pagar com o. seu trabalho a despeza da sua passagem; e realmente é difficil tomar medidas a este respeito, bem longe está de ser tão facil como diz o Sr. Visconde de Sá. Quanto ao Homem, que veio á Ilha da Madeira, é um caso differente.

Levantei-me, pois, principalmente para dizer, que se devem apresentar os factos taes quaes elles são, e não transforma-los, illudindo assim o Publico.

O SR. ORNELLAS: - Tenho a dar uma explicação a respeito dos chamados vilões, que teem emigrado da Ilha da Madeira. Posso asseverar á Camara, que essa emigração foi muito voluntaria, e que nella lucraram, porque essa gente não linha alli de que viver: aquella Ilha conta cento e vinte mil Habitantes, muitos dos quaes não podem tirar a subsistencia do pequeno espaço de terra, em que viviam, pela falta de trabalho, resultante da estagnação do commercio: por tanto, ou haviam de tornar-se salteadores, ou emigrar: não se tornando odioso, nem prejudicial ao Paiz, este segundo expediente, permitia algum beneficio aos que se não expatriaram, porque mais facilmente, assim desaffrontados daquella super abundancia, podem encontrar emprego aos seus trabalhos. Consequentemente, seria até uma tyrannia obstar, a que essa gente, não tendo no seu Paiz modo de vida, o vão procurar fóra, quando na sua permanencia alli, ou soffriam muito, ou se proporiam a meios de subsistencia fataes a si, e á Sociedade.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Eu confesso a verdade, que tendo feito a minha interpellação com a melhor moderação possivel, não, esperava ouvir o que se apresentou: appello até para o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, de quem tenho sido adversario politico.... mas em fim, não fui bem entendido. Eu pedi a comunicação da correspondencia, que tinha havido entre o nosso Governo, e o da Gram-Bretanha a respeito das negociações terminadas: nem mesmo a Camara me podia negar este direito, em quanto ellas estivessem pendentes, no caso de não haver nisso inconveniente, reconhecendo comtudo no Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros o direito de dizer, que não convinha communicar essa correspondencia; mas como foi publico, que as relações estavam interrompidas, u

O SR. VISCONDE DE SÁ DA BANDEIRA: - O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros já disse, fazendo-lhe eu uma pergunta em outra occasião, relativamente aos documentos sobre o Tratado com a Gram-Bretanha, que - a convenção sobre a reducção de direitos estava tão ligada com o mesmo Tratado, que seria melhor, quando esta convenção estivesse concluida, se apresentassem então todos os papeis a esta Camara: por tanto, como S Exa. está de accordo sobre isto, não fallarei por ora mais em tal.

O Digno Par, o Sr. Ornellas, concordou comigo, no que disse relativamente á emigração da Ilha da Madeira, mas não em quanto ao modo, porque ella se fizera. - Eu disse, por informação recebida daquella Ilha, que lanham- sido alli enviados alguns Agentes portuguezes, afim de induzirem os Habitantes dos campos a irem para a Goyana ingleza; e que destes Camponezes, fanatisados pelas palavras de taes Agentes, tinham deixado a Ilha em numero de mais de cinco mil, e embarcado para a Goyana, Paiz que tem um péssimo clima, onde os Europeos, que trabalham nos campos, vivem mui pouco tempo. Desses illudidos Emigrados, um ou outro escapará, u virá talvez a fazer fortuna, depois de ter já morrido a maior parte de seus companheiros. Isto é um objecto de grande importancia; porquanto, tendo nós Colonias, e que precisam de população, o Governo fará o seu dever se dirigir esta emigração dos Açôres e Madeira para a Africa, estabelecendo Colonias em logares sadios, porque ninguem o póde fazer melhor, do que o Governo..

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Diversas são as interpellações, que se me teem feito, e eu principiarei por responder á pergunta, que teve a bondade de fazer o Sr. Visconde de Sá da Bandeira, e vem a ser - se o Governo inglez se dispunha a indemnisar as perdas daquellas prezas, que se fizeram antes do bill chamado de Lord Palmerston. - Sr. Presidente, não me consta que tenha havido reclamação alguma desse tempo; e pelo outro lado ha um documento official, no qual o Governo inglez se presta a indemnisar toda, e qualquer, reclamação, que fosse fundada em direito: entretanto, ha uma reclamação do navio fé nus de Londres, que foi condemnado pela Commissão da Serra Leôa e o Governo inglez entende, que as sentenças das Commissões da Serra Leôa são como a de um Tribunal, da qual por conseguinte deve haver recurso legal, e não extraordinario. Ora, esta Commissão da Serra Leôa está hoje composta de uma maneira exquisita, e só se póde remediar, quando se tiverem estabelecido as Commissões, como marca o Decreto de 3 de Julho de 42. Nesta Commissão não ha hoje senão Commissarios inglezes; mas este inconveniente é puramente nosso, porque (segundo sou informado), os nossos Commissarios teem-se retirado, e o Governo

Página 356

356 DIARIO DA CAMARA

inglez tem-se visto na difficuldade de nomear outros e por consequencia aqui estão os Inglezes a pronunciar os julgamentos, sem com tudo nos devermos queixar, por ser culpa nossa.

Em quanto á outra pergunta do Sr. Visconde de Sá, sobre - se existe ainda o privilegio das Conservatorias - digo, que a sua abolição está dependente de estabelecer-se uma medida igual para todas as Nações, e até que isto se faça, as Conservatorias subsistem, nem era possivel imaginar, que os Inglezes quizessem ficar sem aquelle privilegio, em quanto que as outras Nações gosavam delle, como a França: esperar isto, seria, um absurdo; mas o certo é, que o Governo já apresentou um Projecto de Lei na outra Camara, que pela affluencia dos negocios não tem podido vir á discussão, a fim de que se acabem todos os privilegios para todas as Nações: já lá existe, e espero que em breve se tractará delle.

As Commissões mixtas estão nomeadas, são duas nas nossas Possessões Africanas, que vem a ser - Loanda, e Boa-vista - e nas Possessões inglezas e - no Cabo da Boa. Esperança, e Jamaica - Para estas Commissões nomiei eu Pessoas as mais capazes com os conhecimentos necessarios, para dignidade da Nação, e assim como o permitte este negocio; tambem procurei combinar as cousas de modo, que a despeza do Thesouro fosse moderada, empregando, emquanto pude, algumas Pessoas que já tinham vencimento do Estado; mas estes vencimentos estão sujeitos á approvação das Côrtes, porque em todos os Decretos tinha posto esta clausula, e qualquer dia, e sem muita demora, vou apresentar na Camara dos Srs. Deputados o competente Projecto de Lei para se approvarem estes ordenados: elles são segundo as suas differentes localidades.

Não me resta senão uma pergunta do Sr, Visconde de Sá, e vem a ser - se se tem continuado a tractar sobre o navio Gloria - respondo affirmativamente; e como o Digno Par não quer saber qual o seu andamento, não tenho mais nada a dizer a este respeito.

Sr. Presidente, o Sr. Conde de Linhares fez uma recommendação ao Governo, para que chamasse aquelles Colonos, que iam para o Brazil, a irem para outras Provincias, onde por falta de população, podem ter que fazer: estas reflexões são muito sensatas; mas isso depende dos Colonos quererem, e depende tambem de dinheiro para os trazer para alli: entretanto, as suas reflexões não deixarão de ser tomadas no devida consideração.

Ora, outra pergunta me fez o Sr, Conde de Lavradio, e vem a ser - se a disposição do Art.º 17.° do Tractado com a Inglaterra é subsistente para todas as Nações. - Se acaso o Brazil quizer contractar comnosco no pé de reciproca vantagem, ou outra qualquer Nação, eu não sei se o Governo se ha de recusar a entrar num contracto de conveniencia commum; porque no Art.º diz-se = com o fim de se augmentar a esphera do commercio = e diz-se, que isto fará um objecto de negociações especiaes; mas isto e fundado em Direito Publico, e admittido por todas as Nações, pelo que o Digno Par concordará, em que nada ha mais justo.

O SR. VISCONDE DE SÁ DA BANDEIRA: - Pela interpretação dada pelo Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros ao Art.° do Tratado (leu), não me parece que se possa deprehender delle a estipulação, de que a Conservatoria britannica será abolida, e não exige que as mais Conservatorias o sejam tambem, para que ella se execute: não, intendo, por isso, como vem agora o Sr. Ministro dar uma interpretação opposta á letra do Tratado! de mais, S. Exa. apresentou na outra Camara uma medida para a abolição das Conservatorias de todas as Nações, e esta medida estimaria eu muito, que fosse levada a effeito, por isso abstive-me de fallar nesta Camara sobre esse objecto; mas visto o Sr. Ministro fallar nella, perguntarei se S. Exa. tem permissão dos Governos de França, de Hollanda, e de Hespanha, para, por uma Lei alterar, o que se acha convencionado por Tratados com aquellas Nações? Se S. Exa. a tem, eu estimaria muito, que informasse a Camara, e mostrasse, que apresentando a sua Proposta de Lei, obrara de accôrdo com aquelles Governos.

O SR. PRESIDENTE: - Ma ainda alguns Dignos Pares, que tem a palavra: se a camara quer que fallem, vou-lhes dar a palavra..

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - (Sobre a Ordem)- Sr. Presidente, a ordem dos trabalhos pediria, que os Dignos Pares fizessem sobre isto um objecto de Commissão, a qual venha apresentar a Camara um parecer, e então se discuta; por que estarmos agora aqui a discutir sobre Tractados, desse modo serão as discussões indeterminadas.

O SR. PRESIDENTE: - Eu peço licença para dizer ao Digno Par, e á Camara, que a sua moção de ordem, aliás muito rasoavel (e para a qual pediu a palavra), depois do que acaba de dizer o Digno Par o Sr. Visconde de Sá, teria essa moção o effeito de deixar na Camara uma injuria.

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Sr. Presidente, eu com a minha moção não queria de nenhum modo chamar a attenção dos Dignos Pares, e deste modo julgo fundada a minha moção.

O SR. CONDE DE BOMFIM: - Sr. Presidente, u minha moção, pelo contrario, dirige-se a pedir, que quando esteja acabado este incidente, visto que a V. Exa. toca regular os trabalhos da Camara quando isso tem lugar, me fosse dada a palavra como Relator da Commissão de Guerra sobre um objecto, que foi presente á mesma Commissão, o qual eu considero muito importante; mas quando esteja acabado o incidente, então tomarei a palavra.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Sr. Presidente, eu hei de dizer muito pouco sobre esta materia, por que ella é summamente delicada, e espero que quando eu disser: u este é o direito e que se me não faça uma pergunta, que já se me fez em outra occasião, dizendo-se "e o Governo tem força para manter esse direito?" Espero que esta pergunta senão faça, até por que ella não parece muito parlamentar.

Quando o Governo apresentou um Projecto para abolir as Conservatorias de todas as Nações, estava convencido de que não está ligado com Nação alguma para as sustentar: eis-aqui está a crença, e firme persuasão, em que está o Governo, aliás não se comprometteria a fazer lo, e não comprometteria a dignidade da Coroa, apresentando um Projecto, que não podesse sustentar. Não posso entrar longamente nesta materia; mas posso dizer, que o Governo meditou muito sobre isto. - Quando o nobre Visconde de Sá apresenta asserções desta natureza obre Tractados feitos, parece-me que não lêu, se-

Página 357

DOS PARES. 357

não os papeis dos nossos adversarios! Decerto; por que, tendo sido o Digno Par Ministro dos Negocios Estrangeiros eu estou muito certo, de que se tomasse as suas informações no archivo da Secretaria encontraria, que o Governo estava plenamente do seu direito de apresentar o Projecto, que apresentou. - Sr. Presidente, se o Governo infringir; se o Governo sahir da orbita das suas attribuições; seja accusado: eu estou prompto a responder a qualquer accusação; mas até esse ponto, não acho conveniente que se esteja aqui a estabelecer direitos a Nações Estrangeiras (Apoiados), a que ellas não estão obrigadas.

(O Sr. Presidente cedeu a Presidencia no Sr. Conde de Villa Real.)

O SR. VISCONDE DE SÁ DA BANDEIRA: - O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros accusou-me, de eu ler estabelecido direitos a Nações Estrangeiras; mas eu não estabeleci direitos alguns, pedi ao Sr. Ministro, que me désse uma explicação sobre a extincção da Conservatoria Ingira, visto que no Art.º 17.° do Tractado com Inglaterra não se estipulou, que a abolição da Conservatoria de Inglaterra, ficasse dependente da abolição das Conservatorias de todas as outras Nações. Se está abolição dependesse da abolição das outras Conservatorias, não se achando isto convencionado no Tractado publicado, segue-se que existe alguma convenção secreta; e se não ha tal, como combina o Sr. Ministro o Tractado, e a Proposta de S. Exa. - No Tractado não ha uma palavra, que determine a abolição das Conservatorias Inglezas, sómente depois de abolidas as das outras Nações. Acabei de ler o Art.°, e vejo, que não existe o que o Sr. Ministro disse ser preciso: logo, o que se póde tirar daqui, e que ha algum Art.º de convenção secreta, que estipule o que o Sr. Ministro propoz na outra Camara. É muito singular, que o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros procure lançar uma censura sobre o que disse um Par, attribuindo-lhe que se defende os interesses dos Estrangeiros, e mais notavel é, que seja apoiado por fazer essa cenoura, por alguns Dignos Pares! ao mesmo tempo que a Proposta e a doutrina de S. Exa. é que estabeleceu, que não tinham tal direito pelo Tractado!

Que um Par, ou Deputado exprima uma opinião sobre terem os Estrangeiros em Portugal mais, ou menos direitos pelos Tractados, não passa isso de opinião: não e assim quando um Ministro da Corôa emitte uma opinião, ou fórma Proposta sobre o mesmo objecto, por que por esta póde fazer-se obra desvantajosa á Nação, em quanto que pela outra, nenhuma obra se póde fazer, e este e o caso da questão, em que estamos.

Eu perguntei a S. Exa. se - quando fez a sua Proposta tinha para isso concordado com os Governos, que tem aqui Conservatorias, afim de que estas fossem supprimidas... Neste momento não tenho presente os Tractados; mas é preciso notar, que as Conservatorias Inglezas não foram as primeiras, que existiram em Portugal. Era uso então conceder o Governo Juizes particulares, ou Conservadores para algumas classes de causas, ou de instituições. As Conservatorias foram concedidas á Inglaterra, como tambem se concederam á Hespanha.

O Sr. Ministro quiz de algum modo dizer, que não tinha examinado essa questão, quando fui eu Ministro dos Negocios Estrangeiros, e veio attribuir me cousas, que eu não tinha emittido. Eu perguntei - se o Sr. Ministro, quando fez aquella Proposta, tinha a certeza de que estava no seu direito para a fazer. - Se estava fez muito bem, e sou o primeiro a desejar, que se leve a effeito a Proposta. Ninguem, porêm, como o Sr. Ministro quiz suppôr - que se perguntasse nesta Camara " se o Governo eslava decidido, e tinha força para levar a effeito uma tal medida - " não se tractou disso, e por tanto não havia precisão de S. Exa. se dar ao trabalho de responder áquillo, que se não havia perguntado.

O Sn. DUQUE DE PALMELLA: - Os Membros desta Camara, que movem a opposição ao Governo, fazem muito bem, e usam do seu direito, em aproveitar todas as occasiões para atacar os Ministros, e fazê-los passar debaixo de um ponto de vista menos favoravel; porem, ha uma excepção a esta regra, que é quando se tracta de negocios entre a Nação Portugueza, e as Nações estrangeiras: nesse caso, todos os Membros das Camaras, todos os Portuguezes, devem unir-se, e identificar-se com o Governo. Nisto não recuso o direito de censurar o Governo, e mesmo de o accusar quando se julgue, que elle de algum modo prejudica os interesses do Paiz, e deroga da sua nacionalidade; mas no curso de negociações pendentes, e na interpretação de convenções existentes, não deve haver se não um só voto entre os Portuguezes, que e sempre aquelle, que se póde considerar como favoravel ao Paiz, e opposto ás pretenções, ainda que apparentemente justas, das outras Nações.

Agora peço licença para applicar esta doutrina ao Digno Par (o Sr. Visconde de Sá) que, naturalmente contra a sua intenção, usou de expressões, que me obrigaram a descer da cadeira da Presidencia. S. Exa. disse - "que desejava saber se o Governo linha permissão da França, da Hespanha e da Hollanda, para a abolição das Conservatorias:" eu "Creio que o Digno Par queria dizer - " se o Governo se julgava com direito de proceder a essa abolição" O Governo reputa-se com esse direito; e ainda que o Governo não tivesse sufficientes fundamentos para abolir as Conservatorias, não era de certo nesta Camara, que se lhe deveria contestar.

Entretanto, existe em tudo isto uma confusão notavel: posso dizer, que me tenho occupado de negocios analogos a este, no decurso da minha vida publica, e peço licença para dizer, que, não conheço Tractado algum, em que se estipulasse sobre Conservatorias, a não ser o de Inglaterra. As concessões ácerca de Conservatorias, foram feitas a outras Nações por Alvarás; outras por Cartas Regias; e outras por se lhes permittir, em certas occasiões, o exercicio de direitos especiaes em o nosso Paiz; mas essas concessões não foram contractadas, não podem fundar um direito. O Governo, na minha opinião, apresentando uma Proposta de Lei na outra Quinara, para abolir todas as Conservatorias (uma vez que se intende desembaraçado das dificuldades resultantes de estipulações de Tractados), usou de um direito, que tinha; fez o que devia; e por este acto merece a approvação de todos os Portuguezes, especialmente dos Representantes da Nação.

Quanto á pergunta do Digno Par sobre os motivos, por que não se acha já abolida a Conservatoria Ingleza - em primeiro logar poderia responder, que

1843 - ABRIL. 90

Página 358

358 DIARIO DA CAMARA

não obstante o Art.º 17.º do Tractado, é evidente que todo o favor, que gose em Portugal uma Nação estrangeira, esse não pode, em virtude do mesmo Tractado, negar-se á Gram-Bretanha. Portanto, ainda que não houvesse clausula especial no Tractado, o senso commum indica, que a permanencia das outras Conservatorias, abolindo-se previamente a Ingleza, seria contra a letra do Tractado, podendo o Governo Inglez, ainda que o não favorecesse o Art.° 17.º, invocar o 2.°, que diz - " será o mesmo favor concedido ás outras Nações, e extensivo reciprocamente aos seus respectivos Subditos. " Além disto, por occasião da troca das ractificações, houve mais Notas reversaes (communicadas subsequentemente ao Corpo Legislativo), e n'uma dellas se declara, que a abolição da Conservatoria Ingleza terá logar, quando se abolirem as outras. Appello para o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, e estou Certo de que o seu testemunho será conforme. Depois disto, não podia o Governo deixar de proceder como procedeu. Ora, tendo e1le em seguida feito a Proposta para a abolição de todas as Conservatorias, parece-me, que satisfez ao que os mais escrupulosos lhe podiam exigir a este respeito. Portanto, não ha aqui logar para censuras, ou increpações, é até certo ponto só se poderia lamentar, que o Governo não tivesse sido mais prompto no andamento deste negocio na outra Camará: não quero com esta observação argui-lo, nem o poderia fazer; mas seria para desejar, que o Projecto para a abolição das Conservatorias não ficasse demorado por mais tempo.

Ainda farei uma observação sobre o assumpto, referindo-me ao direito que, as Nações que gosam Conservatorias, terão á continuação dellas. Fallarei da França, (e poderia citar outras Nações, mas prefiro esta por ser uma das grandes Potencias da Europa, e a que está, depois da Inglaterra, em relações mais proximas comnosco), e direi, que os Francezes estão tão longe de se julgarem com direito a ter Magistrados especiaes em Portugal, que existe um documento official, pelo qual esse direito lhes foi negado em 1814. Nessa epocha assignei eu uma Convenção com o Principe de Talleyrand, então Ministro dos Negocios Estrangeiros em França, composta de quatro artigos, estabelecendo relações geraes de commercio, e num deites se declarava, que sé não restabeleceriam Feitorias francesas em Portugal" Depois de feita a Convenção, dirigiu-me o Principe de Talleyrand uma Nota, na qual dizia, que fazia uma reserva para a Conservatoria Franceza, ao que repliquei, que não acceitava essa reserva. Effectivamente ficou a Nação Franceza sem Conservatoria até 1838, quando por medida não sei de que Administração, e sem mais negociação com a França, novamente em Portugal se estabeleceu a Conservatoria Franceza.

Levantei-me unicamente para fallar neste sentido: entretanto, poderia dizer mais alguma cousa sobre outras increpações, que se fizeram ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros; mas limitar-me-hei, porem, a declarar, que como o Sr. Ministro prometteu apresentar com brevidade a correspondencia official, que houve durante as negociações interrompidas com Inglaterra; nessa occasião serei mais extenso.

Q SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Sr. Presidente, um Digno Par, e illustre Presidente desta Camara, preveniu-me em tudo aquillo, que eu poderia dizer e sómente accrescentarei, que eu não tive o menor desejo de fazer censura ao Sr. Visconde de Sá da Bandeira.

O SR. VISCONDE DE SÁ DA BANDEIRA: - Pedi a palavra unicamente para uma explicação, a respeito do que disse o Sr. Duque de Palmella, - S. Exa. tem razão quando explicou a minha pergunta ao- Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros; porêm, tocou em que se tinha feito alguma Convenção com França. Em quanto ao que o nobre Duque disse ácerca do restabelecimento das Conservatorias Francezas, não me consta que tivesse locar no tempo do Ministerio, de que fiz parte. - Agora ácerca das Notas passadas entre S. Exa., e o Principe de Talleyrand, parece-me que essa Convenção de 1814, foi para se estabelecer em Portugal os antigos privilegios francezes, taes como estavam antes da Revolução; por quanto, tendo eu visto ha annos uns papeis a este respeito, tenho uma idéa, de que aquelle era o objecto da mencionada Convenção: peço por isso ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, que veja bem esta Convenção de 1814.

O SR. DUQUE DE PALMELLA: - Peço licença para invocar o testemunho do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, e do Digno Par, o Sr. Conde de Lavradio.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Eu não posso deixar de deplorar, que nesta questão nós sahissemos fora da ordem; por que, esta era o tractar-se da interpellação, que eu tinha ennunciado havia muitos dias, queria fazer ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, e sinto que o meu illustre amigo, que não está longe de mim, o fizesse, até mesmo por estar mais fraco, do que eu, que estando mais fórte, callei-me.

Mas como o Sr. Duque de Palmella invocou o meu testemunho, devo dizer, que n'aquella Convenção não se estabeleceram os antigos privilegios: o Convenio reduzia-se a poucas cousas, e não tractava de Conservatorias (O Sr. Duque de Palmella - Mas eu recebi uma Nota para esse fim.) Não tractarei dos Juizes Conservadores; mas já que estou em pé fallarei das Conservatorias, e digo, que para mim é muito duvidoso, que alguma Nação, excepto a Ingleza, tenha direito a gosar esse favor, é apenas é um direito Costumeiro; haviam alguns Alvarás para isso; mas esses mesmos caducaram, depois que houve a guerra, e por consequencia acabaram estas concessões. - Ora, parecia-me que o Governo ha mais tempo podia ter regulado este negocio, para evitar todas as duvidas, e podia-o fazer, dizendo - "ficam revogados taes, e taes Decretos, que tenham concedido a essas Nações o direito de ter Juizes Conservadores " e pôr em pratica o Art. 17.°, por que nelle cedia-se desse direito por outras condições. Portanto, a unica censura, que faço ao Governo, é de negligencia: verdade é ter elle dito, que está fazendo, ou apresentou já um Projecto na outra Camara relativamente ás Conservatorias; mas já o podia ter feito ha muito tempo.

O SR. MINISTRO DOS NRGOCIOS ESTRANGEIROS: - Sr. Presidente, eu acceitaria de muito bom grado a censura, que me acaba de fazer o Digno Par, se tivesse incorrido nella; mas se o Digno Par tiver a bondade de lêr esse Projecto de Lei, no Art.°; 17.° achará algumas provisões, que senão podem pôr em vigor, sem que passe uma Lei nas Camaras Legislati-

Página 359

DOS PARES. 359

Vas entretanto, eu comprometto-me coma Camara, e que heide fazer tudo quanto depender das minhas forças para coadjuvar este negocio,

(O Sr. Precedente1 torna a occupar a Presidência.)

O SR. CONDE DE BOMFIM: - Principiarei por fazer uma communicação á Camara, que, tendo ido á Commissão de Guerra, um Projecto vindo da outra. Camara, e lendo-se logo reunido a mesma Commissão, como a materia era grave, foi preciso considerála, e daqui resultou alguns Membros da Commissão não se poderem concordar inteiramente com a materia, e por conseguinte, ainda que eu tive a honra de ser Relator, por delicadeza pedi, que fosse nomeado outro, para apresentar o Parecer, porquanto mal poderia eu redigir idéas contrarias aquillo, de que eslava persuadido: portanto peço, que seja convidado o Sr. Conde de Villa Real, a que lêa o Parecer da maioria da Commissão, por isso que o meu e da minoria como logo se verá; elle não póde ser assignado por alguns Membros: um, porque declarou não o assignava; outro, porque lendo declarado a sua opinião, depois occorreram-lhe algumas duvidas, donde resultou assignar eu sómente o Parecer, que vai ser presente á Camara.

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Passarei a ler o Parecer da maioria da Commissão (leu.)

Parecer ( N.° 71.)

A maioria da Commissão de Guerra, tendo examinado com madura reflexão o Projecto de Lei, que veio da Camara dos Srs. Deputados, e que tem por fim indemnisar os Officiaes, que foram preteridos em consequencia da mudança politica, que occorreu em Setembro de 1836, e dos acontecimentos subsequentes; tem a honra de apresentar á Camara as razões em que fundou o seu Parecer.

Uma das maiores desgraças, que póde sobrevir a um Paiz, é sem duvida uma revolução que, derrubando a sua Lei fundamental, ataca todos os principios e direitos existentes. Raras são as vezes, em que se possa justificar similhante revolução, e em que as suas consequencias compensem o abalo, que produz em toda a Nação, no seu credito, e na confiança interna e externa, tão necessaria para a sua prosperidade.

Pouco tempo havia decorrido depois de se achar inteiramente terminada a guerra civil, e restaurada a Carta Constitucional com o Throno da Rainha, em toda a Monarchia Portugueza, quando, inesperadamente, os acontecimentos de 9 e 10 de Setembro de 1836 vieram derrubar a mesma Carta e pôr em perigo o Throno da Rainha. Não ser podia apontar acto algum do Governo, até então existente, do qual se inferisse, que elle pertendeu atacar os principios de liberdade consignados naquelle sagrado Codigo, que até alli linha sida venerado como estandarte das victorias do Exercito fiel emblema, tanto de gloria nacional, como da sabedoria do Rei, que o tinha outorgado.

Era muito natural, que um grande numero1 de Portuguezes, lamentando um tal acontecimento, não quizesse trahir os seus juramentos nem concorrer para a consolidação de uma nova Ordem de cousas.

Muitos Officiaes do Exercito, e Empregados de todas as classes, deram espontaneamente as suas dimissões; outros foram, contra Lei e contra os
principios de Justiça,, removidos dos seus empregos, para serem substituidos por Individuos affectos ao partido, que se achava á testa dos negocios.

As occorrencias do mez de Agosto de 1837, em que estava proximo a completar um anno depois daquella mudança politica, sem que ainda estivesse promulgada, nem concluida a nova Constituição que devia substituir a Carta Constitucional; deram um novo motivo a exclusões, e preferencias.

O desejo de remunerar os vencedores, produziu a promoção de 5 de Setembro de 1887, pela qual se preencheram os postos dos Officiaes que, em virtude daquellas occorrencias, tinham sido separados delles, e collocados na condição daquelles que constantemente tinham luctado contra a Rainha, e a Carta Constitucional, e alguns mesmo em peior condição. Ainda posteriormente, contra Direito e Justiça, foram reformados alguns Officiaes, que não tinham hostilisado o Governo, e que não tinham requerido as suas reformas, e pelo contrario foram chamados outra vez ao quadro effectivo do Exercito, em contravenção ás Leis existentes, alguns que estavam reformados sem ser por opiniões politicas. Deste modo, ficou gravemente prejudicada a carreira de muitos Officiaes distinctos, que tinham prestado serviços relevantes á causa da Liberdade, da Carta Constitucional, e do Throno da Rainha. Parecia que a promulgação da Constituição de 1838, e d Decreto de amnistia de 4 de Abril do mesmo anno, proclamando inteiro esquecimento das anteriores dissensões, deveria ter restituido os Officiaes, de que se tracta, áquella posição que competia asna nunca desmentida fidelidade, e nos seus já ponderosos serviços á Patria, e á Liberdade. E não succedeo assim! Posto que alguns fossem readmittidos ao quadre* effectivo do Exercito, muitos continuaram em uma situação, que não lhes dava direito a accesso, e toda em uma inferior á de muitos, que até entenderam muito mais modernos do que elles. Duas Leis especiaes restituiram ao quadro do Exercito os Officiaes, que se achavam dimittidos, ou injustamente reformador, mas com a clausula expressa de não prejudicar os outros nas graduações, que tinham obtido. Estas Leis são documentos da injustiça, que tinham soffrido os referidos Officiaes, e corroboraram a maioria da Commissão na opinião, de que tendo sido feita a precitada promoção antes da promulgação da Constituição de 1838, foi um abuso de Poder, que não podia ser sanccionado, nem por Leis anteriores, ou posteriores áquelle acto, nem pelos principios que antes, ou depois se proclamavam.

A maioria da Commissão, reconhecendo, portanto, que é unanime em todos os Portuguezes o desejo, e a convicção da necessidade de sanar, por meio de indemnisação devidas a Officiaes benemeritos, as feridas causadas por passadas, e lamentaveis dissensões politicas, e de reunir a todos os Portuguezes em torno da Carta Constitucional, que foi na emigração por tantos annos, e que ainda hoje e, a unica e verdadeira Arca de alliança para todos os Portuguezes; e de parecer, que seja approvado este Projecto tal qual veio da Camara dos Srs. Deputados. Posto que, alguns dos Membros da maioria julguem, que poderia ter este Projecto uma melhor redacção; como todos concordam nos principios, que estabelece, tambem pensa a mesma maioria, que e inutil propor uma nova redacção.

Sala da Commissão, em 26 do Abril de 1842.-

Página 360

560 DIARIO AA CAMARA

Duque da Terceira. - Marquez de Santa Iria. = Visconde da Serra do Pilar. = Conde de Villa Real.

O SR. CONDE DE BOMFIM: - Eu hei de juntar as listas dos Officiaes a que me referi, para comprovar os allegações, que faço no Relatorio do meu Parecer, que é o seguinte:

Parecer N.º 71 A.)

Tendo examinado com a devida attenção o Projecto de Lei N.º 44, vindo da Camara dos Srs.- Deputados, e não podendo concordar com a opinião da maioria da Commissão, cumpre-me expor as razões, que Me determinaram a não adoptar o seu Parecer. Se a adopção deste Projecto houvesse de influir sómente sobre meus interesses pessoaes, não hesitaria eu) sacrifica-los; mas intendo que a minha honra, os direitos de um grande numero de Officiaes benemeritos, e o bem do Estado, se oppõe á medida, que a maioria da Commissão julga deve converter-se em Lei. Motivos tão poderosos reclamam toda a minha franqueza, e cooperação para mostrar, que não só a Justiça, mas a Politica, igualmente aconselham a sua rejeição, lisongeando-me que a pureza de meus sentimentos será julgada justa.

As Leis, não sendo ordinariamente mais que a expressão, e consagração dos factos sociaes, são por isso o titulo sagrado, que estabelece, e conserva os direitos individuaes, direitos que uma vez adquiridos, não é licito destruir, sem causar um abalo geral no Estado, pelo receio, que a todos, e a cada um dos Cidadãos imprime, por seus proprios direitos, a quebra dos alheios.

Achando-se, portanto, fundados em diversas Leis, e actos politicos, os direitos de mais de 500 Officiaes do Exercito, que vão ser altamente prejudicados, quando se adopte o Projecto de Lei, é claro que o Legislador não póde, sem transtorno da Ordem publica, anniquilar estes direitos, e attentar contra interesses, que as Leis já consagraram.

Para mais clara demonstração do que levo dito, cumpre observar, que o Art.º 1.° do Projecto de Lei toma por base um facto, a meu vêr inexacto: ordena-se neste Art.° uma completa reparação "aos Generaes e mais Officiaes do Exercito, que estando na "escala dos accessos, foram della riscados pela sua "adhesão á Carta Constitucional, desde 10 de Setembro de 1836 até á publicação da presente Lei, "e por esse unico motivo preteridos, seja qual for "a situação em que actualmente se achem. " Mas nas circumstancias marcadas neste Art.º, e pelo unico motivo apontado nelle, nenhuns Generaes, ou outros Officiaes do Exercito foram riscados da competente escala, logo nenhum logar, nem applicação póde ter similhante disposição; e neste caso e inutil a Lei.

Os factos que deram logar ás suppostas preterições, a que neste Art.º se allude, tão de outra natureza mui diversa da pura affeição á Carta Constitucional, por mais acrisolada que podesse ser. É triste, e doloroso recordar algumas das épocas da nossa Historia contemporanea; mas ninguem deixará de conhecer, que e indispensavel recorrer a ellas, quando o Projecto vem traze-las á discussão.

Os Generaes, e mais Officiaes do Exercito, para quem se pede uma reparação, tomaram armas contra o Governo estabelecido, que haviam jurado sustentar, de que houve limitadas excepções, e depois

de o terem servido por mais de nove mezes? e quando Côrtes Extraordinarias e Constituintes se occupavam de discutir uma Constituição, cujas bases não deveriam ser estranhas á Curta Constitucional. Pelejaram-se batalhas, e a sorte das armas decidiu contra elles; então teve logar a Convenção em Chaves, aos SÓ de Setembro de 1837, pela qual os Officiaes do Exercito, que não foram Chefes da revolta (a respeito dos quaes outra foi a disposição), deixaram de continuar a pertencer ao quadro do Exercito, como se acha expressamente estipulado no Art.° 2.° da mesma Convenção.

Jurada a Constituição em 4 de Abril de 1838, uma amnistia foi concedida a todos os Portugueses implicados nos successos anteriores; e por uma disposição especialmente favoravel aos Militares, foram elles restabelecidos no quadro do Exercito, porém com a condição, e clausula expressa de não se considerarem com direito ás promoções, que até áquella época haviam sido feitas.

Daqui resulta que, não pertencendo estes Officiaes ao quadro do Exercito, não podiam, nem deviam ser incluidos em qualquer promoção, que se fizesse, por que não eram Officiaes do Exercito; e que os direitos legitimamente adquiridos pelos Officiaes, que compunham o quadro do mesmo Exercito, não podem agora ser destruidos por aquelles, que nessa data estavam fóra do quadro.

Esta Jurisprudencia recebeu a sua completa sancção pela Carta de Lei de 7 de Julho do 1840, publicada na Ordem do Exercito N.º 30 de 10 de Julho do mesmo anno. E que outro motivo, alem dos ponderados, podia determinar o Legislador, quando tractava de reintegrar em seus postos os Officiaes, que pediram, e obtiveram a dimissão do Serviço, em consequencia dos acontecimentos politicos de 9 de Setembro de 1836, a declarar que não deviam considerar-se restituidos ás Commissões, em que se achavam, ou com direito ás promoções que desde áquella época tivessem sido feitas no Exercito senão o rigoroso dever de conservar os direitos legitimamente adquiridos pelos Officiaes, que, pertencendo ao quadro do Exercito, foram então promovidos?

A Carta de Lei de 27 de Janeiro de 1841, publicada na Ordem do Exercito N.º 11 de 5de Fevereiro do mesmo anno, veio ainda corroborar estes principios, e ultimamente a Proclamação da Junta Provisoria do Porto, em data de 27 de Janeiro de 1842, reconheceu a sua santidade, por que a não ser assim, não se teria publica e solemnemente comprometi ido a respeitar os interesses creados depois da Revolução de Setembro de 1836, e a empregar todos os esforços para acabar denominações odiosas, origem fecunda de malquerenças, e desordens.

Uma Lei pois, que tende a destruir factos convertidos em direitos, e santificados pelas Leis, creio que póde em boa consciencia ser chamada injusta; nem Legisladores illustrados, e que tem por timbre sustentar a moral, e a Ordem publica, hão de por certo prestar o seu consentimento, e apoio a um acto, que apenas se funda no arbitrio.

As consequencias immediatas do Projecto, se for convertido em Lei, hão de convencer que, alem de injusta, não será ella menos impolitica. O primeiro mal que resultará, e o arbitrario prejuizo causado a mais de 500 Officiaes, para beneficiar cento e sessenta e tantos, dentre os quaes muitos não se acham

Página 361

DOS PARES. 361

em estado de retribuir á Patria, com o seu serviço, este beneficio, tanto mais injusto, quanto menos direito a elle tem os agraciados, e quanto mais flagrante e a expoliação, que se faz aos que effectivamente obedeceram ao Governo.

O segundo mal, e por certo o mais transcendente, será aquelle que Bentham no seu Tractado de Legislação chama mal d'alarme, o qual consiste no medo, e epprehensôes em que fica uma Sociedade inteira, quando vê prostergar violentamente os direitos d'um Cidadão, receando, como deve, que a violencia e oppressão, caminhando a largos passos, á similhança da morte, calque e anniquile indistinctamente todos os direitos, e garantias.

O resultado deste terror, ou é a perda completa de confiança, e o abandono de si proprio, symptoma infallivel da dissolução social, ou a desesperação, capaz de produzir males não menos fataes em seus resultados.

Outro mal de largas consequencias não póde deixar de ser a relaxação da disciplina militar, isto é, a perda da confiança, que o Soldado, e o Inferior deve ter no seu legitimo Superior; e como o resultado da Lei ha de collocar no cominando Officiaes, que até agora eram commandados, passando os commundantes para o logar destes; a perda da confiança, e consequentemente a relaxação da disciplina será inevitavel. Que prestigio, que influencia, ou acção póde ter n'um Corpo, ou no Exercito um Official, o qual se declara ao mesmo Exercito como intruso como homem que adquiriu mal o seu adiantamento, como criminoso em fim? E será este o meio de acabar com denominações odiosas, e de estancar a fonte das revoluções? Não, Senhores; não e a violencia, não e a injustiça, que póde consolidar uma Sociedade, ou dar-lhe estabilidade.

Se a politica inflexivel escolhe, em regra ordinaria, como maxima invariavel o maior bem do maior numero, será a medida, de que tracta, politica, quando se apresenta com o ominoso côrtejo da violação dos principios da Justiça, e das Leis?

Srs., eu faço justiça aos sentimentos dos meus benemeritos Camaradas prejudicados pelo Projecto; creio firmemente que são superiores aos estimules do interesse pessoal; aias a honra! mas a reputação militar!! Serão elles acaso menos zelosos desta inapreciavel propriedade, do que eu? Se mataes o nobre orgulho da lealdade, e da honra, onde quereis achar o pundonor?!

O Poder não morre: os Ministerios succedem-se, e com elles a transmissão deste deposito sagrado, que as Sociedades instituiram para protector da Ordem publica, e dos direitos individuaes; a força da disciplina militar reside no principio da obediencia passiva; o Chefe do Estado não mudou em 1836; e obedecer ao Ministerio, symbolo do Governo, que esse Chefe do Estado escolheu, era um rigoroso dever.

Quem cumpre com o seu dever não póde ser castigado.

Mas o Projecto parece antes destinado a punir aquelles 500 Officiaes, do que a preencher um acto de justiça distributiva: logo o Projecto e, alem de injusto, impolitico.

Se não temesse fatigar a attenção da Camara, continuaria a percorrer a longa serie dos factos que abonam, e justificam as minhas observações; limitar-me-hei portanto a referir apenas dous, que deixam ficar fóra de toda a duvida, que não foi a affeição á Carta Constitucional, a causa de não serem contemplados nas promoções, de que se tracta, os Officiaes que agora se pertende gratificar; assim como quanto foi generosa, e conciliadora a politica seguida pelas Administrações, que então governavam o Paiz.

Muitos Officiaes e Generaes, que haviam feito relevantes serviços para a conservação da Carta Constitucional, que nunca deixaram de ter a este Codigo amais profunda adhesão; não só não foram riscados, ou preteridos, mas, pelo contrario, foram promovidos. Estes Officiaes, porém, estes Generaes, não tomaram as armas contra o Governo, e Instituições então vigentes; ou se conservaram em suas respectivas situações, ou combateram debaixo das ordens do Governo; ora, se a supposta preterição fosse determinada pela affeição á Carta Constitucional, por que titulo seriam poupados estes Officiaes que, na lucta entre o dever e suas affeições pessoaes, preferindo o desempenho de seus deveres, combatendo, eram pungidos pelos movimentos do seu coração, que a custo via consumar-se o sacrificio? Muitos dos Officiaes readmittidos ao quadro do .Exercito, depois reintegrados em suas patentes, foram promovidos, entrando grande numero no com mando de Corpos, com manifesto prejuizo, dos que haviam continuado a servir.

Estes, e outros factos, que omitto, provam sobejamente, que é fundamento que se tomou para formular este Projecto, é inexacto.

Destruida a base deve cahir o edificio, e com elle os §§, que, em seguida ao Art." 1.° do Projecto, contem o desenvolvimento, e applicação de sua doutrina, assim como os outros Artos. seguintes. Cumpre, todavia, não deixar de observar, que alguns desses desenvolvimentos exaggeram tanto a doutrina do principio, que chegam a tocar a iniquidade.

Tal é, por exemplo, a disposição que se contem na segunda parte do § l.°, a qual, alem de eivada dos vicios, nos quaes acabei de demonstrar, que labora o Art.°, offende essencialmente as salutares disposições dos Alvarás de 28 d'Abril de 1791, 27 de Fevereiro de 1801, e 21 de Fevereiro de 1816, e Carta de Lei de 15 d'Abril de 1835, circumscrevendo as faculdades, que as Leis outorgam ao Podêr Executivo, impossibilitando-o de realisar as promoções, pela maneira que ellas as regulam, por serviços distirictos, ou no campo da batalha, e contravindo assim uma das disposições fundamentaes da Carta Constitucional, que garante os premios, e recompensas por serviços feitos ao Estado; ao mesmo tempo que limita, e destroe a liberdade da escolha, que ao mesmo Poder Executivo constitucionalmente compete, na designação dos Officiaes de sua confiança para os commandos, e outras com missões.

Tal é tambem a disposição, que se encontra no § 4.° do mesmo Art.° 1.°, cujo resultado é o de conferir dous postos a alguns Officiaes ao mesmo tempo, em contravenção manifesta das Leis, que mandam seguir os postos.

Por estas, e outras muitas considerações, que não podem escapar ao vosso atilado engenho e rectidão, sou de parecer:

Que o Projecto de Lei N.° 44, vindo da Camara dos Srs. Deputados, deve ser in limine rejeitado.

Sala da Com missão de Guerra, em 24 d* Abril de 1843.- Conde de Bomfim.

1843 - ABRIL. 91

Página 362

302 DIARIO DA CAMARA

Projecto de Lei (N.° 44.°)

Artigo 1.º Os Generaes e mais Officiaes do Exercito de Portugal, que estando na escala dos accessos foram della riscados pela sua reconhecida adhesão á Carta Constitucional, desde 10 de Setembro de 1836 até á publicação da presente Lei, e por esse unico motivo preteridos, seja qual fôr à situação em que actualmente se achem, serão indemnisados das preterições que estão soffrendo, pela fórma designada nos §§ seguintes.

§ 1.° Os que foram preteridos, 3 depois obtiveram a effectividade dos postos a que tinham direito, contam desde já a antiguidade que lhes competia.

§ 2.º Os que foram preteridos, é já estão graduados, contam a antiguidade da graduação desde quando foram preteridos; e as futuras promoções serão reguladas de maneira, que jamais os que os preteriram possam ser promovidos ao posto immediato com o prejuizo dos graduados.

§ 3.° Os que ainda estiverem no mesmo posto serão graduados, sendo-lhes em tudo applicaveis as disposições dos §§ antecedentes.

§ 4.° Os que já se acharem collocados ha forma do § 1.°, e ainda assim estiverem preteridos em virtude de promoções posteriores á de 5 de Setembro de lS37i serão graduados no posto que lhes competir, applicando-se-lhes as disposições do § 2.°

Art. 3.° São exceptuados das disposições desta Lei, aquelles a quem não tiver aproveitado o beneficio de Lei de 27 de Janeiro de 1841, Art.° 1.º

Art. 3.° Os Officiaes, assim indemnisados, ficam sem direito aos vencimentos em que tiverem sido lesados.

Art. 4.° Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 8 de Abril de 1843. - Bernardo Gorjão Henriques, Presidente. - Antonio Vicente Peixoto, Deputado Secretario. - Diogo Antonio Palmeira Pinto, Deputado Vice-Secretario.

O SR. PRESIDENTE:- Eu creio, que a Cornara não quererá ouvir segunda vez a leitura destes Pareceres. (Vozes - Nada, Nada) e então mandam-se imprimir (Apoiados).

Assim se fez.

O Sr. Presidente deu para Ordem do Dia da seguinte Sessão (no immediato dia), o proseguimento da discussão, que na Sessão de hoje fora suspensa, a qual declarou fechada.

Eram quatro horas e meia,

N.° 65. Sessão de 27 de 1843.

(PRESIDIU o SÁ VISCOHDE DE SOBRAI. - E ULTIMAMENTE o SR. DUQUE DE PALMELLA.)

Aberta a Sessão pela uma hora e meia da tarde, verificou-se a presença de 31 Dignos Pares - os Srs. Duque de Palmella; Marquezes de Abrantes, de Fronteira, de Niza, de Ponte de Lima, e de Santa Iria; Condes da Cunha, do Farrobo, de Lavradio, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, de Semodães, e de Villa Real; Viscondes de Fonte Arcada, de Laborim, de Oliveira) da Serra do Pilar, de Sobral, e de Villarinho de S. Romão; Barões de Ferreira, e de Villa Pouca; Barreto Ferraz, Miranda, Ribafria, Gambôa e Liz, Ornellas, Serpa Saraiva, Geraldes, Silva Carvalho, Serpa Machado, e Polycarpo José Machado.

Foi lida a Acta da Sessão precedente, e ficou approvada

Mencionou-se a correspondencia:

1.° Um Officio do Digno Par Costa Falcão, participando que o estado de Sua saude o tinha privado de comparecer na Camara, e continuando os seus padecimentos não poderia por mais alguns dias concorrer ás Sessões. - .Ficou inteirada.

2.° Um dito da Presidencia da Camara dos Srs. Deputados, acompanhando uma Mensagem da mesma Camara, que incluia um Projecto de Lei sobre ser o Governo authorisado a dispender annualmente com o Asylo militar de Invalidos de Runa até á quantia de 2:400$OOÓ réis. - Passou á Secção de Guerra.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Eu peço, que seja mandado á Com missão de Guerra disse Projecto

como V. Exa. acaba de indicar, má á com urgencia, por que aquelle Estabelecimento acho-se destruido, talvez já não existisse, se não fosse o zêlo dos seus Empregados: por tanto, peço que vá á Com missão de Guerra com urgencia, para que ella quanto antes apresente o seu Parecer.

Foi assim resolvido.

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMÃO: O proprietario de uma mina de chumbo de Aveiro, mandou-me uma Representação para apresentar a esta Camara: em summa o que pede e, que se augmente o direito de importação da barra de chumbo, por que não póde Continuar a elaboração daquella mina com tão pequenos direitos, que são de dous por cento: eu digo isto, como pertenci á Commissão das Pautas, quando estabeleceu este direito, por que era uma materia prima, e agora que se conhece que ha uma mina de chumbo muito importante, acho conveniente, que seja reformado aquelle direito. - Portanto, como me remetteram esta Representação, ou apresento-a, e em substancia é o que digo. (O Sr. Secretario Machado - Se V. Exa. quer que vá á Commissão de Pautas, não a ha, póde ir á de Fazenda, que é a competente.) Póde ir á de Fazenda, mas isto é para quando vier o Projecto da outra Camara. (O Sr. Vice-Presidente - O Digno Par quer que se leia...) Não Senhor: esta Representação é só para considerar-se, quando vier este objecto da Camara dos Srs. Deputados.

Foi enviada á Secção de Fazenda.

Passou-se á Ordem do dia, o proseguimento da discussão do Projecto de Regimento interno da Camara, constituida em Tribunal de Justiça, discussão suspensa na antecedente. (V. pag. 353 col. l.º)

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×