752 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
de ser discutido, quando as nossas finanças não apresentam um aspecto inteiramente lisongeiro, não sei de que serve então apresentar-se o orçamento, nem de que servem as funcções do parlamento, se não procedermos ao seu exame e não discutirmos o parecer que se apresenta a este respeito. Se quando a fazenda publica está em circumstancias regulares se entende que a discussão do orçamento não deve ter importancia, não se dá o mesmo quando as circumstancias das financeiras não chegaram ao estado em que todos as desejâmos ver.
O orçamento do ministerio das obras publicas não é só das obras publicas; mas os melhoramentos materiaes substituiram-se de tal fórma a todos os outros melhoramentos, que já se não falla das outras denominações d'aquelle ministerio, que é tambem do commercio e industria.
Eu devo dizer ao actual sr. ministro das obras publicas, que entre nós ha uma circumstancia que revela que a producção tem difficuldades maiores a vencer do que as dificuldades da localidade, e que essas apenas estão nas difficuldades do capital.
Eu entendo que o ministerio, que se chama tambem do commercio, não póde desconsiderar a circumstancia de que o desenvolvimento do commercio faz com que o juro seja, menos elevado. Mas emquanto o governo se vir na necessidade de seguir o impulso de tantas exigencias que lhe são feitas, ha de ver-se em grandes difficuldades. Emquanto o governo se vir na necessidade de ser o maior concorrente ao mercado de capitães, estes hão de ter sempre uma certa preferencia pelas exigencias do governo.
Já se tem dito que com o credito de governo fica a todos muito satisfeitos. Eu sinto bastante que ao governo do meu paiz lhe aconteça o que já se disse, isto é, que só o governo tem credito. Isto é muito inconveniente. Eu quero que todos tenham credito, e que em vez de termos um juro de 6 por cento, tivessemos um juro menos elevado.
Entre os nossos vizinhos hespanhoes tem o desconto tido muito mais elevado do que entre nós, mas já hoje está reduzido a 4 por cento, emquanto que o nosso está a 6 por cento. Ainda assim temos a circumstancia de ler o capital mais caro do que em nenhuma outra parte.
Eu, sr. presidente, já por varias vezes tenho ultimamente ouvido dizer (creio que se diz isto para nos reconciliar com o deficit) que em quasi todas as nações da Europa na deficit.
Ora, isto não é exacto; a Inglaterra não tem deficit; a Russia, depois de uma guerra em que despendeu mil milhões de rublos, tambem o não tem; a Italia não tem deficit; na França, não fallemos, pois é bem conhecido o estado prospero das suas finanças; a Hollanda, a Belgica, a Dinamarca e a Suecia tambem já não accusam deficit nos seus orçamentos.
Por consequencia, para que se ha de estar a dizer que quasi todas as nações têem deficit!
O que é verdade é que a Allemanha votou na passada sessão legislativa 130 milhões de marcos de impostos, para fazer face á sua situação financeira, o que prova que não bastam victorias para conjurar deficits; mas que ali, apesar da gloria militar, não se julga conveniente adiar a solução de quaesquer difficuldades financeiras.
Eu, sr. presidente, não cansarei agora a camara com uma prelecção sobre este assumpto; mas é facto que a nossa situação financeira não é excellente nem mesmo é boa; comtudo, não é desesperada. O que ella exige é grandes cuidados.
Ora, se nós continuarmos a fazer todos os esforços junto dos ministros das obras publicas para elles acudiram a todas as necessidades e realisarem todos os melhoramentos materiaes dentro do menor tempo possivel, mesmo aquelles que não são urgentes e que só o amor da localidade tornar meramente plausiveis; em logar de habilitarmos o estado com os meios necessarios, ainda que por meio de medidas pouco sympathicas, então parece-me que devemos perder toda a esperança de equilibrar o nosso orçamento.
O que eu tenho visto é que os impostos, pondo de parte todos os enthusiasmos a favor e todos os enthusiasmos contra, são depois justificados e reconhecidos mais tarde que elles não matam o commercio, nem a industria, nem a propriedade. Já a cortiça nos está demonstrando isso. Já v. exa. vê que os nossos bons desejos nem sempre levam á realisação das nossas esperanças.
No ministerio das obras publicas existem elementos de rendimento que fazem parte de algumas das despezas do mesmo ministerio. É assim, por exemplo, que a despeza do correio tem a seu favor o rendimento do mesmo correio.
N'esta occasião seja-me licito dizer que, ás vezes, a modicidade da quota do imposto não contraria a importancia da sua totalidade; pelo contrario, augmentada, e d'isto é prova o que se deu com os portes do correio, cujo rendimento cresceu com a modicidade da quota. Foi uma das melhores reformas esta que se fez no correio em 1852, reduzindo-se consideravelmente a quota.
N'este momento referir-me-hei tambem á preoccupação muito vulgar entre nós. Quando se trata do correio, ouve-se dizer que o correio não é feito para render, e só para gastar.
Estimo que o governo tivesse apresentado a reforma do correio, fazendo juncção dos correios e telegraphos, d'onde ha de resultar alguma economia. Ha nações porém, que não se envergonham de que entre ellas o correio tenha rendimento, como na Allemanha, onde elle rende liquido 13 milhões de francos; a Inglaterra não se vexa de que o correio lhe ronda, liquides, 2 milhões e meio de libras esterlinas; a Suissa, que é uma nação muito mais modesta nas suas dimensões, apresenta um resultado no anno de 1879, com relação ao rendimento do correio, de 2 milhões de francos livres.
Creio que nós deveriamos estimar que elle tambem rendesse no nosso paiz, fazendo-se o serviço bem, e que o sr. ministro das obras publicas não seria contrario a isso.
Fallemos agora das matas. A venda das matas que o governo propunha, na importancia de 240:000$000 réis, era, no meu entender, uma operação boa, de muita vantagem para o estado, porque dizia respeito a alguns grupos do arvores, com os quaes não póde haver fiscalisação, e que depois de vendidos era quando principiariam a render para o thesouro, porque pagariam contribuição predial alem da contribuição de registro por titulo oneroso. Não é vexame nenhum vender as matas que não tenham as condições necessarias para satisfazer ao que d'ellas se deve esperar.
A França, que possuo a melhor administração financeira, a da restauração, quando subiu ao throno Luiz XVIII, 150:000 hectares de florestas na importancia de 80 milhões de francos, e ninguem ali disse que esta operação, foi prejudicial ao estado, ou lhe trouxe vexame.
É preciso reagir contra certas preoccupações da opinião, as quaes, ás vezes, tendem tanto a diminuir a receita como a augmentar a despeza.
Já disse que o que me assusta não é o orçamento ordinario, mas sim a rectificação d'este orçamento, por causa dos taes creditos supplementares eu extraordinarios.
Mas eu, a dizer a verdade, sr. presidente, comquanto entenda que se tem abusado, o se não deve continuar a abusar dos creditos supplementares, reconheço ao mesmo tempo que será necessario ao governo recorrer mais ou menos a elles, porque quem julgar que o estado está suficientemente dotado para occorrer cabalmente ás necessidades da nossa situação actual, está enganado.
Não prolongarei mais a discussão.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Saraiva de Carvalho): - Sr. presidente, pedi a palavra depois de ouvir o digno par, e meu amigo, o sr. Carlos Bento, porque me pareceu conveniente declarar que estou inteiramente