800 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
já pagou 56:000$000 réis ao thesouro. Calculando em réis 750:000$000 as quantias destinadas á provincia, uma parte em 1876, e a outra em 1878 ou 1879, é claro que as garantias pagas por Moçambique apresentam metade dos; encargos.
Estas contas não são rigorosas, são apenas approximadas; mas dão ellas clara idéa do que tem de falsas as apreciações dos terroristas dos deficits, ou dos que especulam com esses terrores.
Quanto a Cabo Verde: vemos que pagou ao thesouro publico por conta dos encargos dos emprestimos para obras publicas a quantia de 14:000$000 réis.
Reconhece-se, pois, que Cabo Verde, que recebeu para obras publicas approximadamente 200:000$000 réis, já tem pago parte dos encargos que deve; devendo acrescentar-se que ali o imposto para obras publicas montava em 1875 a 30:000$000 réis, e no anno seguinte 40:000$000 réis. Ainda no presente orçamento o vemos nós calculado em 30:000$000 réis, apesar da prudencia artificiosa com que os calculos estão feitos. Ora se Cabo Verde pagou um anno os seus encargos, é claro que póde continuar a pagar; vê-se que ali não ha repugnancia em pagar os encargos resultantes dos melhoramentos executados na provincia; o que póde ter havido até agora é má administração. Ali não se emprehendia energicamente e com regularidade nenhuma obra importante. O plano mudava quasi sempre com cada governador. Nas costas e nos portos não ha illuminação. Os cães estão por construir em quasi todas as ilhas. Edificios publicos faltam. As aguas andam desaproveitadas, onde o clima tanto recommenda o seu emprego, e onde ellas são tão poucas. Construcção de estradas ha apenas alguma; as communicações são difficeis, e o custo dos transportes carrega extraordinariamente o preço das mercadorias.
Só algum governador muito zeloso, forçando, por assim dizer, a mão aos inimigos locaes dos melhoramentos publicos — porque em toda a parte os ha — fazia alguma cousa em beneficio da provincia, mas sem systema geral, e acabando o impulso que elle dava quando acabava o seu tempo de governar.
Isto que succedia em Cabo Verde, succedia com maiores inconvenientes em outras colonias.
Sr. presidente, as colonias têem, para obras publicas, um rendimento annual de 163:000$000 réis, e pagaram já 140:000$000 réis ao thesouro por conta dos encargos dos emprestimos para obras publicas.
Supponho eu que, melhorando este imposto, poderia desde já elevar-se sem grande difficuldade a 200:000$000 réis.
Ora, nós temos gasto em obras publicas nas colonias, comprehendendo o emprestimo, de que trata este projecto, 2.500:000$000 réis, quantia que alguem reputa enorme, sem ter lido os relatorios dos engenheiros; aliás saberiam que tudo estava a caír, que foi preciso reparar todas as casas de administração, todas as casas de correio, todos os quarteis, todas as escolas, todas as igrejas. Alguns edificios foi indispensavel reedifical-os. Tudo estava caído, era uma completa ruina; e foi preciso levantar do solo todas essas ruinas.
Na minha opinião, sr. presidente, as colonias podem pagar sem difficuldade alguma os seus melhoramentos; comtanto que se melhoram e acrescentem os impostos destinados a obras publicas, o que não é difficil. Tem-se gasto com as obras 2.500:000$000 réis; comprehendendo, como já disse, o emprestimo de que se trata no projecto em discussão. Os encargos resultantes da quantia dispendida, a 7 por cento, não excedem a 170:000$000 réis. Assim, cumpre-se o que dispõe a lei de 1876 — que não tinha outro fim senão dar ás colonias a vantagem de terem obras publicas dirigidas systematicamente, e com o fim de melhorar as suas condições agricolas, commerciaes, e administrativas, dando-lhes ao mesmo tempo a responsabilidade dos encargos que para proveito d’ellas se houvessem de tomar; cumpra-se a lei de 1876, e nenhum encargo pecará sobre o thesouro da metropole
Disse eu que as colonias, segundo as informações que me foram communicadas, não só podem pagar os seus encargos, mas já pagaram os encargos de um anno; e acrescento que o rendimento dos impostos destinados para obras publicas póde ser augmentado.
Todavia, se ellas entenderem, em vista das disposições do projecto que o sr. ministro da marinha trouxe á camara, e de maus precedentes que se estabeleceram em Moçambique, que podem lançar sobre a metropole todos os encargos, e converter em proveito proprio o rendimento do imposto para obras publicas; como aconteceu, repito, em Moçambique, aonde foi parte d’esse imposto distribuido pelas municipalidades, que não fizeram obras nenhumas, farão todas as colonias o mesmo, e todos os encargos pesarão sobre o thesouro da metropole; em opposição ao que dispõe a lei de 1876, que eu propuz ao parlamento como ministro da marinha. De modo que o inconveniente, o defeito por que se condemna a lei de 1876, é justamente o defeito que ella não tem, mas que tem esta lei que discutimos.
Se não se consentir este abuso ás provincias ultramarinas, e se este projecto de lei que se discute não fosse approvado, não se poderá dizer com rasão que a metropole paga os encargos dos emprestimos para obras publica nas colonias.
Se ha culpa, não é da lei, e sim da sua falta de execução. Se d’aqui em diante o thesouro da metropole vier a pagar os encargos dos emprestimos feitos, a culpa é deste projecto de lei que o actual sr. ministro da marinha trouxe ao, parlamento.
E singular! Accusa-se um erro de administração que não existe, e para o corrigir estabelece-se o erro como disposição legal!
Mas, emfim, receia-se o deficit; e as colonias portuguezas já teem deficit.
Teme-se a divida nas colonias; e a lei de 1876 divida creou, mas para proveito das colonias, que podem com os encargos d’ella. Creou divida amortisavel, para se empregarem os capitães indispensaveis em lucrativas obras publicas. A divida publica não é um phantasma de que se deva ter medo supersticioso. Se é phantasma todas as nações o têem em casa e vivem com elle.
Sendo o orçamento do ultramar, apresentado este anno ás camarás, elaborado sob a inspecção do sr. marquez de Sabugosa, não tenho duvida alguma de que está feito conscienciosamente; mas n’esse documento temos a notar o seguinte, comparando-o com o orçamento de 1875—1876.
São as receitas comparadas as seguintes:
1875-1876 1880-1881
Cabo Verde e Guiné .... 220:377$000 219:098$000 S. Thomé e Principe.... 109:610$000 125:620$000
Angola................. 565:974$000 433:202$000
Moçambique............. 247:713$000 221:520$000
India.................. 528:648$000 478:762$000
Macau e Timor.......... 354:831$000 455:475$000
Somma............ 2.027:153$000 1.933:677$000
A differença, pois, entre o rendimento calculado nos dois orçamentos é de 83:000$000 réis.
Se compararmos a despeza nos mesmos dois orçamentos, encontraremos o seguinte:
1875-1876 1880-1881
Cabo Verde e Guiné....... 218:876$000 255:309$000
S. Thomé e Principe ..... 105:552$000 126:570$000
Angola....................556:110$000 586:658$00
Moçambique................249:953$000 362:913$000
India.................... 496:968$000 497:765$000
Macau e Timor............ 322:702$000 347:071$000
Somma.......... 1.950:161$000 2.176:286$000