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nicipal Senhora directa dos terrenos de aluvião já formados, e que sómente confinam, do lado do rio com o mesmo rio, vem a ter sempre, como proprietaria confinante com o rio, o direito de aluvião, esperança esta, que o contracto, no artigo 23.°, plenamente destroe.

É este mesmo artigo no § unico, que demonstra em que tem consistido o dominio e posse da Camara municipal de Lisboa, quer se considere a praia do Tejo, como objecto principal da sua propriedade, quer se considere hoje como accessorio da sua propriedade adquirida.

E note-se, antes de passar adiante, nesta demonstração, que não se podendo negar á Camara municipal o dominio dos terrenos de alluvião já formados, e que possue corporalmente; e sendo expresso no direito geral do reino, que, sempre que se procede á demarcação de terrenos, são ouvidos, e para esse fim previamente intimados, todos os proprietarios dos predios confinantes; na delimitação, que aqui se ordena, a Camara municipal para nada é chamada! O Governo, que nada possue, e a empreza, que nada possuia, nas marinhas do Tejo, eis os proprietarios que intervém, o Governo pelos seus engenheiros, a empreza com o seu accôrdo! Em todo este negocio a Camara não existe para cousa nenhuma!

Peço attenção sobre as palavras do § unico do artigo 23.°, que vou ler:

Para assegurar bem á empreza, e lhe pôr a salvo de qualquer questão futura os direitos que lhe são concedidos por este artigo, fará o Governo proceder immediatamente pelos seus engenheiros, de accórdo com a empreza. ao levantamento da planta e demarcação dos terrenos de alluvião, que se tem successivamente formado até hoje pela acção natural das agoas, a ponto de a lhes estarem superiores nas marés cheias regulares, de modo que separe bem distinctamente «estes terrenos, que podem já estar apropriados, daquelles outros que hão de ser conquistados ao Tejo, e creados pelas obras que a empreza executar, os quaes, por este contracto, lhe são cedidos e garantidos.»

Terrenos de alluvião successivamente formados até hoje, que podem já estar apropriados?...

E por quem, senão pela Camara municipal de Lisboa? Podiam ser apropriados, diz o paragrapho, logo a apropriação não foi uma usurpação, foi o exercicio de um direito legitimamente constituido.

E quem o póde negar, ou sofismar? Pois esta apropriação não é um facto publico e notorio, que todos presenceamos? Esses bens de alluvião não estão tombados no livro dos proprios da mesma Camara, ou Senado de Lisboa? Não são estes os terrenos que se foram descobrindo das agoas, e que successivamente foram dando objecto, sobre que recaísse o direito de alluvião?

Não é novo, nem singular, este direito da Camara municipal de Lisboa, pois já existia o mesmo direito nos antigos almoxarifados de Aveiro, havendo sempre os respectivos donatarios, como a Camara municipal de Lisboa, tido a cautela de aforar designada porção de terreno, sobre si, para sempre conservarem os mesmos donativos, e nunca transferirem, nos seus emphyteutas, o direito de alluvião, de sorte que podessem augmentar-lhes o furo, na proporção do augmento de terrenos, que de novo lhes accrescessem.

Assim se conservava o dominio geral e directo, como illimitado, ou sem outros limites mais que o rio, que é o que dava aos predios a qualificação de illimitados (riu-se um digno Par do lado esquerdo da Camara). V. Ex.ª ri-se? (O Sr. J. M. Eugénio — Eu não me ri)! Bem sei que não foi V. Ex.ª, nem sobre isto ha de que rir, porque é o direito geralmente recebido em toda a Europa: na França, Hespanha, na Hollanda, na Allemanha, etc. É ensinado por Heinccio, Grocios, Puffendorfio. É auctorisado na Lei de 18 de Agosto k 1769, por ser o direito romano, conforme á loa razão; é, finalmente, o direito estabelecido, o direito corrente sobre terrenos illimitados, ou que não tem outros limites senão um rio, de que resulta o jus accrescendi, que é bem conhecido ma jurisprudencia, para quem a tem estudado.

Disse o digno Par, que eu devia querer então a igualdade na Lei, pois se fosse contemplada a Camara municipal do Lisboa, que tambem o deviam ser as Camaras de Belem, e a dos Olivaes, desmembradas do antigo termo de Lisboa!

Quer isto dizer, porque se não attendem as Camaras de Belem, o dos Olivaes, que se não queixam, que não reclamam, não se deve attender a Camara municipal de Lisboa, que se queixa, e que representa!!

O argumento, pois, não procede, mas, além disso, direi, que a concessão das marinhas do Tejo foi feita nominalmente á cidade de Lisboa, e é, pelo menos, muito duvidoso se a desmembração dos territorios de Belem e Olivaes, importou em seus effeitos a transmissão do direito respectivo ás ditas marinhas.

Diz-se mais que o artigo 23.° manda religiosamente respeitar os direitos de propriedade; mas ião se adverte que esse artigo falla unicamente dos particulares, que, tendo os seus predios limitados, entram na regra geral das expropriações por utilidade publica, segundo as Leis em vigor, o que nada tem com a propriedade da Camara municipal, sobre as futuras alluviões do Tejo.

Mas supponhamos que esse artigo comprehendia a Camara municipal de Lisboa, e que portanto se é offendida, se tiver algum direito, lá será attendida pelos meios competentes, perante o Poder judicial, usando do mesmo processo que a lei auctorisa para os particulares.

Pois quereria o digno Par, relator da commissão, que a Camara municipal, corpo de administração protegido pelo Governo, collocado debaixo ia sua suprema inspecção, tivesse luctas e demandas judiciaes com o mesmo Governo? É possivel, Sr. Presidente, sair por esta tangente, para se dizer, que não é offendida a Camara municipal, por isso que ella depois pode usar do seu direito?! Eu já mostrei a incompetencia do Poder judicial em presença da Lei e do caso julgado; mas passando o projecto de lei como está, torna muito duvidoso o direito da Camara municipal, para o fazer valer nos Tribunaes de Justiça. Como se ha de a Camara municipal fundar no direito que tem ás marinhas do Tejo, quando o Estado dá esses terrenos como seus?! Como ha de a Camara invocar um direito que os Poderes politicos lhe desconhecem?! Como poderá neste caso fazer sobresair a sua prova de direito, se se nega o reconhecer-lho na Lei?!

Não basta pois dizer-se, que fica salvo o recurso, porque em taes circumstancias de nada elle servirá! O Parlamento deve sempre fazer justiça inteira, e por isso não devemos consentir, que saia daqui uma Lei com falso supposto, e que fica obrepticia e subrepticia. Não podemos deixar passar a proposição de que cedemos á empreza, como do Estado, uma cousa que evidentemente não pertence ao Estado.

Eu não quero que se façam pagamentos previos á Camara municipal, como parece suppôr o digno Par o Sr. Conde da Taipa! Que digo eu na minha emenda? Que se tome em conta na liquidação, que se fizer, as vantagens que ao municipio hão de resultar, do caminho de ferro de Lisboa a Cintra; vantagens que eu considero muito superiores ao prejuizo resultante da expropriação. O que eu quero é, que se guardem os principios que garantem o respeito devido á propriedade, e que se salve a dignidade desta Camara, não saindo assim approvada uma proposição falsa, segundo a demonstração, que fiz, e que ninguem póde destruir.

Eu teria muito mais a dizer sobre este objecto, e o que disse foi porque não podia deixar de tomar a palavra, como a illustre commissão sabe, por isso que teve presente a resposta, que dei á Camara municipal de Lisboa, que me fez a honra de me consultar sobre o assumpto. Os dignos Pares ahi haviam de vêr, que eu aconselhei á Camara municipal, que não demonstrasse a menor opposição, a uma obra, que era realmente de grande utilidade publica; que se dirigisse porém ao Corpo legislativo representando-lhe respeitosamente o seu direito, que só pode ser arrebatado por uma força maior, qual a das mesmas agoas do Tejo, ou a da voragem de um novo terremoto! Não se negue, pois, um direito tão manifesto; solicite-se ao menos a acquiescencia, o accórdo da Camara ao contracto celebrado; saiba o municipio, saiba a cidade de Lisboa que a sua Camara, sendo convidada a esse accórdo, a esse consentimento, para uma obra de interesse publico, a mesma Camara conveio, attendendo primeiro que tudo a esse bem publico; mas desconsiderar a Camara municipal de Lisboa até ao ponto de não ser ouvida em cousa alguma, nem é necessario, nem é decoroso. Não se examinar aqui o seu direito, nem pesar as razões que allega, é uma denegação de justiça. Não dar á municipalidade o quinhão de gloria que lhe devia pertencer, é uma offensa moral e politica, maior que a material ao direito de propriedade.

Pois é preciso reconhecer, que para as individualidades moraes e publicas, tambem ha uma honra como para as individualidades particulares, e por isso a Camara municipal não só como administradora de bens do concelho, mas por sua propria honra e dignidade, não podia ficar silenciosa auctorisando com o seu abandono e silencio o que parece feito em menospreso dos direitos, que durante seculos o municipio havia possuido e fruído.

Concluo, portanto, que a representação da Camara municipal de Lisboa deve aqui ter deferimento, para que, reconhecido o seu direito, s já delle expropriada, como o indiquei no meu additamento.

O Sr. Ministro das Obras Publicas — Se não fosse a sua posição official nesta questão, decerto que não tomava a palavra sobre o assumpto importante de que se tracta, e que se acha commettido ao exame e á opinião de pessoas tão competentes e respeitaveis como são as que formam a illustre commissão de administração publica desta casa; além disso, pouco teria que accrescentar ás observações apresentadas pelos dignos Pares que tomaram a defeza do projecto, e principalmente pelo nobre relator da commissão o Sr. José Maria Eugenio de Almeida; porém, que tendo o digno Par o Sr. Ferrão feito algumas perguntas ao Ministro da Fazenda, ou ao Ministro das Obras Publicas, neste caso, desejando que elle emittisse a sua opinião sobre este objecto, e principalmente a respeito da substituição que mandou para a Mesa, julga-se elle Sr. Ministro, obrigado a dizer algumas palavras, por parte do Governo, para justificar as condições deste contracto, da imputação de attentatorias dos direitos da Camara municipal de Lisboa.

O orador ouviu dizer ao digno Par, que a emenda que tinha mandado para a Mesa, era uma emenda innocente, e que não esperava que por parte da commissão de administração publica desta casa se objectasse a sua approvação; elle orador não sabe o que S. Ex.ª intende por uma emenda innocente; se a innocencia consiste em não fazer mal nem bem, então, nesse caso intende que o digno Par a considera como inutil; — mas se ella deve ter algum resultado definido para o projecto que se discuto, está convencido de que mesmo adoptando as opiniões do digno Par a respeito della, póde considera-la como um embaraço para os trabalhos, porque S. Ex.ª continuou dizendo — que não era da sua intenção que a Camara municipal de Lisboa recebesse do Thesouro qualquer quantia de indemnisação pela expoliação que se lhe fazia, mas pelo direito da dignidade moral dos corpos collectivos. —Portanto, se se não tracta de uma indemnisação á Camara municipal de Lisboa, representada por uma somma que corresponde ao valor das propriedades que tem, neste caso não sabe a que proposito vem a emenda do digno Par, para que seja indemnisada a mesma Camara municipal pelos terrenos que até agora, na opinião de S. Ex.ª lhe pertenciam como donatária, e se lhe firam por este contracto. Se o digno Par intende que se deve fazer uma indemnisação, como é que na sua emenda não intende que se faça?

Essa indemnisação deve ser previa na conformidade da carta constitucional, ou seja na conformidade da Carla de lei de 22 de Junho, ou por uma legislação especial, e sem haver a indemnisação previa ninguem póde tomar conta da propriedade expropriada. Por consequencia, já se vê que tem de se proceder á avaliação destes terrenos, e apreciação de valores sobre a qual se ha-de julgar a indemnisação. E comtudo, o digno Par não acautelou na sua emenda esta circumstancia inevitavel, que traz embaraços para a empreza; e sendo certo que a Lei de 92 de Junho não se refere senão a incendio, e a defeza de territorio; é evidente que não estando

0 caso de que se tracta comprehendido em nenhuma destas hypotheses, ha-de applicar-se a disposição de direito, sendo o Governo obrigado a fazer a indemnisação previa antes de tomar posse do terreno. Esta indemnisação não está na emenda, e exigia um trabalho e processo muito demorado para o seu resultado chegar a tempo; e nesse caso perguntarei se valerá a pena do perturbar a continuação das obras importantes, como S. Ex.ª as considera na sua emenda, para attender aos direitos da Camara municipal, como donataria daquelles terrenos?

O Sr. Ferrão — Peço a palavra.

O orador que não foi estranho á redacção deste contracto, que póde dizer que o fez nas suas principaes prescripções, e sabia a correlação de certas idéas que havia incumbir a pessoas competentes, nunca julgou que tinha redigido uma espoliação, como S. Ex.ª intende das disposições do contracto; e parece-lhe mesmo que pelo artigo 23 e seus parágrafos se vê que o Governo, não quiz espoliar ninguem, o se quizesse mais provas, e bem evidentes, para se justificar desta arguição, bastava o artigo addicional em que o Ministerio concordou, e que foi proposto na Camara dos Srs. Deputados (apoiados). Diz o artigo 23 (leu).

O Sr. Ministro pergunta, se nesta disposição generica do artigo 23, das cessões que o Governo faz á empreza, se não se comprehendem tambem as indemnisações da Camara municipal, se tiver esse direito? Accrescentando que foi muito de proposito que não se quiz mencionar esta Camara ou estes principios. Parece-lhe, pois, que por esta disposição generica fica a Camara habilitada como está, porque os Tribunaes competentes é que devem decidir sobre a questão de direito; e quando lá forem, ninguem póde tolher os proprietarios, quer se chamem Camara municipal de Lisboa, ou dos Olivaes, ou de Belem, a que reclamem pelas regalias dos seus fóros e direitos; e se o Poder judicial intender que ellas tem effectivamente esse direito contra a empreza, ou o Estado, neste caso é-lhe applicada a disposição do artigo 2.º do projecto que se discute, em virtude do qual não se teve em vista prejudicar nem privar ninguem deste direito, com tanto que as obras não cessassem, nem lhe parece que os Corpos legislativos é que devam decidir se estas corporações tem direito ou não; pois para isto é que existe o Poder judicial, e perante elle Poder é que cada um deve deduzir o seu direito e fundamentos.

Diz o digno Par que este negocio não póde ser levado ao Poder judicial, visto que o Alvará de 18 de Agosto de 1779 tem o caracter de sentença, não é uma disposição legislativa, é um caso julgado. Como estranho á sciencia da jurisprudencia acha-se em grande embaraço tendo que oppôr duvidas á opinião de pessoa tão auctorisada, mas quanto póde conhecer das disposições de direito, o Alvará de que se tracta póde ser considerado como contendo materia legislativa, mas nunca como uma sentença, porque os antigos Monarchas não exerciam este direito senão por via dos Tribunaes, e aqui não vê o Tribunal para expressar, a fórma de sentença. Mas suppondo que o Alvará de que se tracta corresponde effectivamente a uma sentença, pergunta, porque ha um caso julgado, ficam privados os individuos que se julgam lesados de reclamar os seus direitos? Pode ser que os Tribunaes julguem que o caso está julgado pela lei ou sentença, que tenha direitos que se devam resalvar; mas nunca individuo ou corporação fica privado de recorrer perante os Tribunaes competentes, o sempre esse Tribunal competente é que ha-de decidir esta questão, e não os Corpos legislativos que fazem leis, e não applicam a lei ao facto.

Neste caso parece-lhe que o mais prudente, e mais avisado que o Governo podia fazer era declinar esta decisão para os Tribunaes competentes, segurando ao mesmo tempo o direito da empreza; e tomando o Estado a responsabilidade de qualquer indemnisação que houvesse de se dar em virtude da concessão feita á companhia, e sem embaraçar os trabalhos, pois deste modo sem quebra de nenhuns direitos o Governo assegurava de uma maneira permanente e verdadeira o proseguimento daquelles trabalhos.

Mas tambem ouviu ao digno Par responder ao nobre relator da commissão — que nós não tinhamos nada com a representação que fizera a Camara municipal de Lisboa a esta Camara, e a respeito desta, e não das Camaras dos Olivaes, e de Belem, em quanto aos direitos que suppoem ter esta corporação; mas que este argumento não procede, porque ha Legislação em contrario, pois se não se engana o anno passado se promulgou uma Lei em que se davam ás Camaras municipaes de Belem e dos Olivaes todos os fóros e direitos, principalmente na marinha do Tejo sobre que versa a emenda do digno Par. Por tanto, havendo esta legislação ficaram aquellas Camaras com o mesmo direito que tinha a antiga Camara de Lisboa, porque passou para ellas esse direito; e parece-lhe por isso fundada a observação do digno Par, relator da commissão, sem avançar nenhuma consideração sobre o direito que tenham a alguma parte destes terrenos as Camaras dos Olivaes e de Belem, e não a Camara municipal de Lisboa, embora lhe fosse primitivamente feita a doação desses terrenos.

Disso que lhe custava a entrar nesta materia, que é inteiramente estranha aos seus estudos; mas que o digno Par permittiria que lhe dissesse a impressão que trouxe dos documentos que viu, quando se tractava de um assumpto tão importante, apesar de S. Ex.ª dizer que elle orador era estranho a este contracto que mandava ao Parlamento; estudou por muitos dias, e talvez por mezes, as disposições deste contracto, porque não havia de ter a ousadia de o apresentar ao Parlamento sendo inteiramente hospede nas suas condições (pois só é hospede na materia de direito); tractou de se instruir sobre todas as diversas relações deste contracto, que tinha obrigação de estudar; e como se fortificou com a auctoridade de distinctos jurisconsultos e especialmente com a dos Conselheiros da Corôa, não póde concordar com a opinião do digno Par, que se persuade ter a Camara municipal de Lisboa um direito inquestionavel aos acrescidos pelas aguas ás praias deste cidade, e aos terrenos que são cobertos pelas marés, em virtude da doação a que S. Ex.ª se referiu. Não quer agora trazer a questão a este terreno, mesmo talvez porque se não sente para isso habilitado; no entanto essas opiniões contrarias á do digno Par, e de jurisconsultos tão distinctos, provam sem duvida (na sua opinião) que osso direito que S. Ex.ª attribue á Camara municipal não o é tão corrente como á primeira vista lhe parece; e parecia-lhe por isso prudente e mais conveniente deixar esta questão entregue ao Poder judicial, salvando-se assim os direitos a quem os tiver, e assegurando-se ao mesmo tempo o pro-seguimento dos trabalhos sem lesão de direitos adquiridos.

Que o digno Par tambem extranhára que o Governo tivesse consignado no contracto a disposição de que mandaria proceder immediatamente pelos seus engenheiros, de accôrdo com a empreza, ao levantamento da planta e demarcação dos terrenos de alluvião, que se tem até hoje successivamente formado pela acção natural das agoas, a ponto de lhes estarem superiores nas marés cheias e regulares, sem que fosse ouvida a Camara municipal nem os proprietarios confinantes, porque segundo o direito commum, quando se tracta de demarcar um terreno qualquer, são sempre citados para assistirem á demarcação desse terreno os proprietarios confinantes: ao que elle Sr. Ministro objectava que o Governo tractára de uma demarcação que tinha um caracter especial, para o qual por isso não era necessaria a audiencia dos proprietarios confinantes; que assim o intendeu o Governo, não para lezar os direitos de ninguem, mas por que se tractava de uma demarcação que era determinada pela natureza da cousa, e pelas circumstancias que a revestiam, a ser feita pelo modo porque o Governo intendeu que devia ser feita. Esta demarcação havia de necessariamente ser regulada pela baixa e alta das marés (que é a expressão até de que se serviu o Governo no contracto), e segundo os preceitos geodesicos applicados ao fluxo e refluxo das agoas, é que se havia de estabelecer a linha de altura — a linha a que devia subir a maré, regulando-se assim a maré baixa e alta, e segundo os quaes já havia sido feita a Carta de Lisboa com as margens do Tejo onde se acham marcadas as linhas de preamar e de baixamar; carta que havia sido construida independente do contracto de que se tracta, e segundo os principios geraes da sciencia; e por isso ao Governo parecer! que era inutil a audiencia da Camara municipal de Lisboa, o dos proprietarios confinantes a esses terrenos, visto que não podia essa audiencia dar um resultado diverso do que aquelle que tinham tirado os engenheiros, procedendo aos necessarios estudos com uma exactidão e escrupulo que realmente tem feito inveja aos estrangeiros.

Parece-lhe ter explicado succintamente quanto haste para que se tracte a guestão nos termos em que intende que deve ser tractada, e apresentando estas considerações á Camara, que as tomará na sua alta sabedoria, deve comtudo declarar que se conforma com a emenda apresentada pela illustre commissão, porque está persuadido que por ella se não prejudica o que está contractado entre o Governo e a Companhia, antes simplifica melhor o que é propriamente legislativo do que o que não é, e deixa o Governo habilitado a, de accôrdo com a Empreza, fazer quaesquer alterações que o proseguimento da obra» tornar necessarias.

O Sr. Visconde de Algés — A hora está a dar; alguns dignos Pares terão de fallar, e eu, que assignei o parecer com declaração, tambem terei que dizer alguma cousa, de maneira que a discussão só poderá terminar hoje prorogando a Camara a sessão, e não ha-de ser pequena a prorogação.

O Sr. Presidente — A hora ainda não deu...

O Sr. Visconde de Algés — Não deu; mas faltam sómente dois minutos.

O Sr. Aguiar — Tenho a apresentar, por parte da commissão de legislação, o seguinte parecer (leu):

Este projecto é simples; tracta-se de revogar aquella disposição da Ordenação do Reino, que prohibia que o clerigo pudesse testar a favor de outro clerigo, e todos sabem que a razão que então se dava não existe hoje, tornando-se por conseguinte uma disposição absoluta. Peço portanto a V. Ex.ª que consulte a Camara se dispensa a impressão.

(Despensada.)

O Sr. Presidente — Ámanhã continua a mesma ordem do dia, entrando depois em discussão os pareceres que hoje foram apresentados. — Está fechada a sessão. —Eram 5 horas da tarde.

Relação dos dignos Pares presentes na sessão de 9 do corrente.

Os Srs. Cardeal Patriarcha; Silva Carvalho