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gravidade, mas que provavelmente não exigiria votação, requereu que se passasse a ella, não obstante não haver na Sala numero sufficiente de Dignos Pares.
O Sr. Presidente, annuindo a este pedido, annunciou que se passava á
Ordem do dia.
Interpellação do Sr. Conde de Lavradio.
Esta interpellação consta da seguinte nota:
Requeiro que se participe ao Ex.mo Ministro dos Negocios do Reino que eü desejo perguntar a S. Ex.ª se é verdade que a Junta do Deposito Publico manda pagar os depositos anteriores a 23 de Maio de 1846, em notas do Ronco de Lisboa, não obstante as disposições da Lei de 13 de Julho de 1848. Sala da Camara dos Pares, 21 de Maio de 1849.
O Sr. Conde de Lavradio expondo o modo por que lhe consta que a Junta do Deposito paga os depositos que alli se tinham feito antes de 23 de Maio de 1846, que não obstante terem sido feitos em moeda metal, que era a unica em circulação, se lhe restituem n'outra especie de moeda que aquella em que foram feitos; obrigando-se assim os infelizes depositarios a perderem 40 por cento, isto intendeu o Digno Par que não tinha nome, que se lhe podesse dar nesta Casa.
Citou um facto, que lhe constou por ter visto o documento, praticado ultimamente com um individuo a quem se queria pagar em notas do Ranço de Lisboa um deposito feito em 1794, isto e, quando ainda nem o papel-moeda tinha sido creado; e fazendo por esta occasião muitas considerações, chamou a attenção da Camara sobre a circumstancia aggravante de que os depositarios não vão ao deposito voluntariamente levar os depositos, são constrangidos a isso, e obrigados ao pagamento do premio de 1 por cento; o qual se funda na obrigação que a Junta tem de os entregar tão fielmente, como os recebeu: qual seja essa fidelidade, a Camara o está vendo, pois que contra a disposição da Lei de 13 de Julho de 1848, se entrega uma moeda depreciada em pagamento de prata, que alli se depositou anteriormente a 23 de Maio de 1846.
Tambem desejou ser informado se é ou não verdade o que se diz que o Deposito Publico já não tem no Banco de Portugal notas algumas anteriores ao Decreto de 23 de Maio de 1846; porque se é verdade o escandalo sobe então de ponto.
Fazendo muitas outras e importantes considerações, pretendeu ser informado se os factos que acabou de expor procedem de determinações da Junta do Deposito Publico, ou se procedem de ordens do Governo.
O Sr. Ministro do Reino expondo a pratica que se usa para a realisação dos depositos, assim como para a restituição delles, disse, que a Junta não paga, mas unicamente dá uma ordem pela qual no Banco se deve restituir ao portador della a importancia do deposito, que elle está habilitado a receber — assim a Junta não tem responsabilidade alguma na fórma do pagamento, pois que esta acaba no momento em que dá a ordem.
Não está habilitado para responder á pergunta: se o Deposito já não tem no Banco notas anteriores ao Decreto de 23 de Maio á e 1846: mas póde asseverar em resposta á outra, que o Governo nenhumas ordens deu para que tivessem logar os factos que se exposeram, e em cuja apreciação não se atreve a entrar agora por motivos de alta deferencia para com o Poder Judiciario, qualquer que seja a sua opinião pessoal a respeito desses factos, por isso que a apreciação delles e da exclusiva competencia dos Tribunaes.
O Sr. Conde de Lavradio esperou que o Sr. Ministro brevemente se habilitasse a responder á parte não menos importante da sua interpellação quanto ás notas anteriores a 23 de Maio de 1846; e requereu que se lhe explicasse qual era o motivo porque se põe na ordem de pagamento dos depositos com tinta diversa = Conta antiga = e porque é que, quando vai essa nota, o pagamento do deposito se faz em notas do Banco de Lis"Loa. Exigiu ser esclarecido sobre isto; não accusa ninguem, mas quer saber quem é o culpado neste facto, pelo qual se causa um grave prejuizo a terceiro, um prejuizo de 40 por cento, que o Deposito é obrigado a indemnisar aos prejudicados, por isso que elle é por as Leis obrigado a todos os encargos dos fieis depositarios. Se os lesados se tem callado, não é isto razão para que se presuma que tem perdido o direito de indemnisação.
O Sr. Conde de Porto Covo mostrou que não recebendo o Deposito Publico antes de 23 de Maio de 1846 depositos pecuniarios senão em prata, pois que as notas não eram dinheiro nesse tempo, e como não eram dinheiro não era ninguem obrigado a recebel-as; assim como não se podendo fazer na escripturação differença alguma entre moeda metalica e moeda papel, pelo que o Deposito não póde allegar que tinha recebido notas, é claro que o mesmo deve pagar os depositos anteriores ao Decreto de 23 de Maio de 1846 em prata como os recebeu; e indemnisar aquelles depositarios, que por qualquer motivo não se atreveram a recuar o pagamento dos seus depositos n'uma especie de moeda diversa daquella em que o tinham feito.
Não póde convir com a opinião de que o Deposito Publico não tinha responsabilidade senão até á entrega da ordem; expondo as rasões em que se fundava, sendo entre outras, a de que elle designa a especie do dinheiro, em que se ha de fazer o pagamento do deposito, e é em virtude "dessa designação que se elle faz; e por isso a responsabilidade permanece inteira contra o Deposito Publico.
O Sr. Ministro do Reino deu as razões porque não estava habilitado para responder hoje inteiramente á interpellação do Sr. Conde de Lavradio, e eram que o officio que recebêra não designava expressamente o ponto essencial da questão: mostrou por tanto desejos de que esta materia ficasse adiada para outra occasião em que viesse habilitado com os esclarecimentos que não deixaria de exigir, attenta a gravidade do assumpto, que tocava em interesses por certo respeitaveis.
O Sr. Conde de Thomar intendeu que havia abuso, e abuso muito grande, não só contra a fé publica, mas ainda em prejuizo de terceiro, no procedimento da Junta do Deposito Publico, e na maneira porque ella cumpre os seus deveres; sendo por isso de toda a necessidade que se saiba quem é o auctor desse abuso tão revoltante.
Tambem conveio em que era a Junta do Deposito quem tinha a responsabilidade do pagamento dos depositos, porque era ella quem designava a especie de moeda em que se havia de fazer esse pagamento, lançando n'umas ordens a rubrica = conta antiga =, e n'outras = moeda metal =, e porque era em virtude dessas rubricas que o Banco pagava essas ordens em notas, ou em moeda metal,
O Sr. Ministro do Reino tornou a observar que não estava completamente habilitado para tractar desta questão; e explicou de novo o fundamento com que disse que a responsabilidade da Junta cessava com a entrega da ordem; e era, dada a hypothese, de que a ordem fosse remettida para o Banco, em conformidade com o precatorio.
O Sr. Conde de Lavradio está resolvido a mandar uns quesitos para a Mesa, a fim de que o Sr. Ministro do Reino possa em vista delles exigir officialmente as informações que lhe parecerem necessarias para chegar ao cabal conhecimento do assumpto.
Na sua opinião e inquestionavel a responsabilidade da Junta, porque assim como o negociante é responsavel pela fórma por que o seu caixeiro paga as letras que se sacam contra elle, tambem a Junta é responsavel pela fórma porque o Banco paga as suas ordens, pois que este não é neste caso mais que o caixeiro da Junta do Deposito Publico, que alli tem os fundos depositados.
O Sr. Visconde de Fonte Arcada, abundando nas idéas emittidas por todos os oradores que o precederam, quanto á gravidade da questão, e ao escandalo que resulta do procedimento da Junta, pediu que se nomeasse uma Commissão de inquerito para conhecer a fundo este negocio; e mandou para a Mesa uma proposta neste sentido.
A proposta não foi admittida á discussão.
O Sr. Tavares Proença admirou-se de que os interessados não dessem uma querella contra a Junta do Deposito Publico, por não lhes não restituir integralmente os depositos, querella a que lhes dava direito a Ordenação do Reino, que impõe penas aos depositarios infieis, e exige que os depositos se satisfaçam na mesma especie em que foram feitos, com a comminação de penas no caso contrario. Fez diversas considerações tiradas da Legislação, e dos principios de moralidade, para estigmatisar um procedimento tão escandaloso; e pediu que nos quesitos que o Sr. Conde de Lavradio ia fazer inserisse um outro, para se averiguar quem tirou interesse do agio que resulta da differença da moeda em que se satisfizeram os depositos, que tendo sido feitos em moeda de prata, se pagaram em Notas do Banco de Lisboa; porque muito convinha que isto se averiguasse a fundo,
Suspendendo-se a Sessão em quanto o Sr. Conde de Lavradio redigia os seus quesitos,
O Sr. Presidente propoz á approvação da Camara um requerimento do Sr. Macario de Castro, para que fosse impresso no Diario do Governo o seu Projecto de Lei offerecido na Sessão de hontem, para beneficio do Douro.
A Camara assim o resolveu.
O Sr. Conde de Lavradio leu os seus quesitos, que são os seguintes:
Se é verdade que a Junta do Deposito Publico manda pagar os depositos anteriores a 23 de Maio de 1846, em Notas do Banco de Lisboa, não obstante as disposições da Lei de 13 de Julho de 1848?
Se é verdade que as ordens que a sobredita Junta passa sobre o Banco para as entregas dos sobreditos depositos levam uma nota de tinta diversa, que diz — Conta antiga— e por ordem de quem, e para que fim é lançada?
Se o Banco de Portugal ainda tem Notas do Banco de Lisboa pertencentes ao Deposito Publico, anteriores a 23 de Maio de 1846, e qual é a sua importancia?
Quem tem recebido a differença do agio no pagamento dos fundos, que tendo sido depositados em metal, se diz terem sido pagos em Notas do Banco de Lisboa?
Fita na Mesa segunda leitura, a Camara approvou que fossem remettidos ao Governo.
Passou-se á segunda parte da Ordem do dia, que é o Parecer da Commissão de Fazenda (com o n.º 137) sobre o requerimento de Lino da Silveira e C.ª, e Manoel Joaquim Pimenta e C.ª, sublocatários do Contracto do Tabaco de 1837 a 1840, que pedem a restituição de 67:679$248 réis, resto do deposito do seu contracto.
O Sr. Conde de Thomar lendo o despacho que o actual Sr. Ministro da Fazenda lançou no requerimento destes pretendentes, em que lhes diz que pertence ás Côrtes o conhecimento della para lhes reconhecer a divida, ou para lhes votar os meios indispensaveis; não foi de opinião que se approvasse o Parecer tal como está lançado, parecendo-lhe melhor que em logar delle se dissesse, que não pertence á esta Camara tomar conhecimento deste negocio no estado em que elle se acha.
O Sr. Silva Carvalho adoptou a emenda do Sr. Conde de Thomar, porque fóra nesse sentido que a Commissão lançou este Parecer.
Não havendo mais ninguem inscripto, foi approvada a emenda do Sr. Conde de Thomar.
O Sr. Presidente deu para Ordem do dia de sexta feira Pareceres de Commissões, e levantou a Sessão eram quasi quatro horas da tarde.