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podia abrir o caminho á circulação e não podia funccionar, e elle funcciona, faz carreiras diárias e regulares á hora costumada, sem nunca ter faltado desde que se abriu. O que sim não terá é o material circulante conveniente para se prolongar a linha.

Emquanto ao comboyo especial para o correio, a companhia não se obrigou a isso, no contrato não ha estipulação a tal respeito.

O sr. JS. J. de Carvalho: — Mas não ó mesmo o comboyo ordinário necessário?

O Orador:—Ha o comboyo ordinário para as malas do correio, mas não se obrigou a companhia a ter comboyo especial.

O sr. S. J. de Carvalho: -r-Mas esse mesmo. O Orador:—O segundo quisito apresentado pelo digno par é em que base assentou o governo a sua opinião para não julgar exagerado o preço por que comprou o caminho de ferro.

Eu direi ao digno par porque não pôde ser taxado de muito exagerado o preço de 13:500^000 réis por cada kilo-metro. Está avaliado que um kilometro de caminho de ferro custa approximadamente 10:000$000 réis, no que diz respeito ao material fixo e circulante. Se a esta somma juntarmos o custo dos terrenos expropriados, das obras de arte, movimentos de terra, passagens de nivel, estações- armazéns etc, concluiremos que o preço de 13:500^000 réis não é exagerado.

Mas- alem d'isso este preço era o dado por alguém que queria ficar com o caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas com ramal para Setúbal, e o governo entendendo necessária a compra, por certas considerações que logo apresentarei com o correr da discussão, não a podia fazer por outro preço. 1

O outro quesito é a importância da reconstrucção da linha. Creio que o digno par se refere ao custo do alargamento da via. (O sr. Carvalho: — Apoiado.) O alargamento de uma linha férrea é uma obra que não custa pouco dinheiro; mas de certo custaria muito mais se o governo passasse a exploração do caminho de que se trata a uma companhia ou a um individuo a quem teria de indemnisar. A companhia concessionaria do caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas não o faria por menos de 500:000#000 réis. Sendo feito esse alargamento debaixo da inspecção do governo, ou em virtude de um contrato com o governo, de certo ha de sair muito mais barato, porque se iriam substituindo a pouco e pouco as travessas, nas condições requeridas, para passar da via lm,44 para o de lm,G7: collocan-do-se ao mesmo tempo uma terceira ordem de rails, para converter por fim aquella linha recta. Ao mesmo tempo também se iria adoptando o material da via estreita á via larga. Se o governo porém exigisse que a companhia fizesse o alargamento, esta diria que para não interromper a circulação precisava estabelecer uma outra linha, para o que teria de alargar os aterros; que o material da via estreita não podia aproveitar-se, etc, etc, e todas estas indemnisa-ções custariam ao estado uma somma superior a 500:000^000 réis. Adqnirindo o governo o caminho para si, nào só tem a economia uma grande parte d'aquella somma, mas também tirou a vantagem de o libertar das onerosas condições, que segundo o contrato, sobre elle pesavam. E isto que posso dizer ao digno par por emquanto; pelo correr da discussão darei mais algumas explicações.

O sr. Aguiar: — Pedi a palavra sobre o projecto em discussão, não para esclarecer o paiz e a camará sobre um acto inconstitucional e deplorável que o governo acaba de praticar; o paiz e a camará estão suílicientemente esclarecidos, mas para que fique consignado o meu voto. Sinto ter de combater o sr. ministro das obras publicas, cujo caracter e probidade respeito.

O primeiro dos deveres do governo ó respeitar e acatar as leis, e a primeira das leis é a lei fundamental do estado, contra a qual elle acaba de commetter um attentado injustificável, usurpando as attribuições do corpo legislativo. Não ha nada que possa justificar este procedimento; não ha uma única circumstancia que possa attenua-lo, algumas ha que o aggravam, e entre ellas avulta a de se acharem reunidas as camarás.

As commissões de fazenda e obras publicas não o entenderam assim. «Provado que seja, dizem ellas em um dos paragraphos do seu relatório, que a compra ão caminho ãe ferro era conveniente para o serviço publico, e ãe vantagem para o estaão, como parece ás vossas commissões, claro está que o governo ãeve ser relevaão, e approvado o projecto ãe lei d ! Se assim é, de que servem as camarás legislativas ? O governo pôde decretar todas as medidas legislativas que forem convenientes para o serviço e de vantagem para o estado; e ás cortes compete approva-las! Porém todas as medidas legislativas devem ter por base a utilidade publica, a conveniência do serviço e a vantagem para o estado, e a consequência derivada da doutrina das commissões é que as camarás quasi que não são mais do que uma instituição de luxo. Esta doutrina, sr. presidente, está em opposição manifesta com a carta constitucional da monarchia, é incompatível com ella, e com a divisão e attribuições dos poderes politicos que ella estabelece.

«Mas, dizem ainda as commissões, as provisões ão projecto são as consequências da auctorisação para compras já effectuadas.d Confesso que não entendo, não sei o que isto quer dizer. Que auctorisação é esta? Que compras effectua-das são aquellas a que as commissões se referem ? Como é que a approvação da compra do caminho de ferro ás Vendas Novas, e a concessão do indulto ao governo, que o comprou, e consummou sem auctorisação a compra, pôde ser consequência da auctorisação concedida para outras compras ? Peço ao digno par, relator do parecer, que dê a explicação, se pôde, mas parece-me que ha de ver-se no mesmo embaraço em que eu me vejo.

Que motivo podia haver para o governo praticar aquelle acto com flagrante violação da primeira lei do estado, usurpando attribuições de um dos poderes politicos, despresan-do a auctoridade d'elle, e procedendo tão precipitadamente, que nem ao menos ouviu o conselho d'estado sobre um negocio grave e de grande importância, nem se quer se lembrou de consultar as suas maiorias nas camarás, convidan-do-as para uma reunião, como o tem feito muitas vezes? O governo convocou os pares e deputados para em reunião extra-parla"mentar lhe dar conta do contrato que havia feito. Não seria melhor que os convocasse antes ? Não era. Podia assim obstarse á comprado caminho de ferro; e o governo estava decidido a compra-lo por qualquer preço, e embora tivesse de commetter um attentado.

Seria o governo movido pelas rasões expendidas no relatório que precedeu a sua proposta? Por outra — seria o governo obrigado pela necessidade para evitar que a venda do caminho de ferro se fizesse com as condições que elle julgava" desvantajosas, e que o queira modificar harmoni-sando-as com as do caminho das Vendas Novas a Évora e Beja?! Não me parece.

Tem-se agitado a questão — se as companhias que têem a natureza d aquella, que tomou, por contrato celebrado com o governo, a empreza da construcção e exploração do caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas, podem sub-stituir-se e transferir para outras companhias ou individuos o direito que têem adquirido; e applicando a questão ao nosso caso — se á companhia d'este caminho de ferro era permittido transferir o usofructo e exploração d'elle, sem necessidade de auctorisação do governo,- ou'se o governo podia impedir a transferencia.

Os que seguem a opinião de que a transmissão ou transferencia não depende de auctorisação, fundam-se na natureza d'essas companhias; porém nas companhias ou em-! prezas (e por emprezas se tomam os originários concessionários) dos nossos caminhos de ferro é geralmente declarado que ellas não possam substituir-se, sem que essa substituição seja auctorisada pelo governo. É verdade que esta declaração falta no contrato celebrado com a companhia do caminho de ferro do Barreiro; mas eu inclinó-me á opinião daquelles que entendem ser da natureza de similhantes emprezas, que ellas não possam livremente ser trespassadas pelos concessionários, com quem originariamente se contratou. A exploração de um caminho de ferro é negocio importante, que não pôde deixar de estar sujeito á intervenção do governo, em relação ás pessoas que tem de dirigi-la.

Mas, sr. presidente, o que importa para mostrar que não havia nenhuma pressa, nenhuma urgência, é mostrar que esta era a opinião do governo. Na portaria dirigida pelo ministério das obras publicas á companhia em 2 do corrente, diz-se que—constando a Sua Magestade que a companhia pretendia fazer trespasso do seu contrato, se lhe declarava que o mesmo augusto senhor o não auctorisava. A portaria é muito explicita: segundo ella a companhia não podia effectuar o trespasse sem ser para isso auctorisada. Não o sendo, a consequência era que a companhia devia continuar a exploração; mas o governo declarou que comprava o direito que ella tinha pelo mesmo preço, e com as mesmas vantagens que lhe foram offerecidas.

Se é exacto o que se acha escripto no relatório, que precedeu a proposta apresentada á camará dos senhores deputados, convertida depois no projecto de que se trata, já o j governo havia muito antes manifestado á companhia, que julgava necessário intervir em qualquer negociação, para que só se fizesse nos termos em que o mesmo governo julgava conveniente consentir n'aquelle trespasso.

Eu poderia deduzir de outros documentos a prova incontestável de que, segundo o direito que o governo julgava ter, e as declarações por elle feitas, não havia necessidade, não havia urgência que obrigasse a commetter um attentado contra as instituições do paiz; porém o governo tem-se recusado a dar os esclarecimentos que se lhe têem pedido, e a apresentar ao parlamento a correspondência que houve entre elle e a companhia, e o cavalheiro com quem elle tinha contratado ultimamente. Pedi um officio do governo dirigido a este cavalheiro: esperei, e esperei inutilmente que fosse publicado no Diário de Lisboa para esclarecimento da camará; mas aqui tenho uma copia delle: o ministério dirá se é exacta. N'esje documento, que é um officio aquelle cavalheiro, diz o ministro das obras publicas ser incontestável o direito do governo a não consentir que o usofructo, e exploração das linhas férreas, que fazem parte do dominio publico, seja trespassado pelos concessionários sem auctorisação e adherencia do mesmo governo; que este direito não se deriva nem do contrato, nem da lei que o approvou; que é preexistente e superior ao mesmo contrato; que o estado não pôde prescindir d'elle; e que o governo ha de mante-lo sempre a respeito de todos os concessionários de trabalhos públicos.

Não tenho o officio, mas sei que existe (O sr. Ministro das Obras Publicas:—Apoiado).

Pois, sr. presidente, se o governo estava tão seguro de que a venda não podia verificar-se sem ser por elle auctorisada, que pressa havia, que urgência o obrigou a proceder tão illegal e inconstitucionalmente? Que receio podia o governo ter de que a companhia fizesse o trespasso sem a sua auctorisação? Se aquelle é o direito incontestável (como entendia o governo), que validade podia ter esse trespasso sem ser auctorisado?

Foi necessário ao governo contratar com a companhia, e fazer a compra da exploração pelo mesmo preço e pelas mesmas vantagens que aquelle cavalheiro lhe offerecia (segundo os termos da portaria), ou lhe offerecesse, segundo os termos do contrato entre a companhia e o governo! Eu ouvi que a companhia exigira isto do governo, e que lhe

não admittira dilação: não o creio, mas esta exigência em vez de attenuar o attentado, aggrava-o mais. Pois se o governo tinha o direito incontestável, preexistente ao contrato com a companhia, superior a elle, de não consentir absolutamente que os concessionários transferissem o usofructo e exploração da linha férrea, como podia a companhia limitar este direito, sustentado pelo governo sem limitação, obrigando-o a usar do direito de opção, e indicando-lhe que não optando, e logo, ultimaria veada que tinha contratado sem dependência da sua auctorisação? Em que ó fundada esta pretensão da companhia! Qual é a lei, qual é o principio, qual é a condição do contrato em que ella pôde apoiar-sé ?

Porém, sr. presidente, aonde estão os documentos que provam que a companhia fez estas e outras exigências que o governo lhe attribue?

O medo, sr. presidente, é mau conselheiro, e o medo foi também a causa do procedimento do governo, e da precipitação com que elle andou n'este negocio. Receiaria o governo, que se o cavalheiro com quem a companhia tinha contratado fizesse a compra de poucas léguas de uma via férrea, podesse correr risco a nossa nacionalidade! Algum receio houve; mas não foi esse, devo dize-lo por honra do meu paiz. Pouco poderia a influencia adquirida pela acqui-sição de alguns kilometros de uma via ferrea pôr em perigo a nossa nacionalidade.

A precipitação, filha do medo, qualquer que ella fosse, observa-se a cada passo. PoÍ3 não se fez uma escriptura em que se disse que o governo garantia á companhia as vantagens e o preço que por qualquer outro lhe fosse oífe-recidos?!

Sabia o governo o estado do caminho? O sr. ministra das obras publicas, sendo perguntado sobre isto, disse — que se tinha procedido ao exame do estado do caminho de, ferro quando foi aberta a exploração: quer'dizer, ha seis ou sete mezes; e não sei mesmo se ha mais tempo. E valerá o caminho tanto como valia seis meze3 antes?! Não sei se o governo sabia, mas devia saber, que depois que a empreza começou a tratar da venda do caminho, não fez, como era natural e não lhe pôde ser estranhado, senão o que se chama tapar os buracos.

Sabia o governo se as vedações em toda a linha estavam feitas?

Sabia quanto valia a renuncia que fez de aualquer reclamação que podesse fazer á companhia por qualquer motivo em relação á execução das condições do contrato? Esta renuncia alguma cousa devia valer: sem isso não estipularia a companhia a condição d'ella, que pelo menos põe em duvida se elles cumpriram o que contrataram.

Sabia o estado das differentes estações, o estado do material fixo e rolante?

Não sabia nada d'isto; concedeu tudo á companhia. Talvez mais ainda do que ella exigia.

O governo fez a compra, e cm acto continuo entregou o preço á companhia. Quo segurança tem o governo dos encargos que pesam sobre o caminho? Ahi tem já apparecido-differente.s reclamações de credores, cuja garantia, dizem elles, ó a exploração do caminho, e o governo comprou-o livre de quaesquer encargos, sem saber sc elles existiam, e sem sufficiente garantia.

Que garantia tem o governo para no caso de não ser approvado o projecto em discussão, tornar a haver aquelle preço ? O mesmo caminho! Porém vale o caminho esse preço, não valerá muito menos?!

Por qualquer lado pelo qual se considere a compra feita pelo governo, é insustentável. O governo commetteu uma violação flagrante da carta em muitos dos seus artigos, c fez um contrato ruinoso para o paiz.

A companhia não gastou talvez mais do que a subvenção em dinheiro c em madeiras para a construcção do caminho, c estas duas verbas andam por novecentos e tantos contos de réis. Agora recebeu -outro tanto! E um dos grandes negócios que se têem feito n'este paiz, e n'isto não vejo eu senão a consequência do empenho do governo em comprar o caminho por qualquer preço e por qualquer modo, sem attenção á constituição, ás leis e aos interesses do paiz! Bem haja a companhia. Se o governo não attendeu a estes interesses, a companhia attendeu aos seus.

Custa o caminho ao estado perto de 1.900:000)51000 réis! E vale-os!

E quanto ha de custar mais! Quanto ha de custar a obra das estações e das vedações, por acabar? Quanto hão de custar as obras necessárias e indispensáveis para melhorar o embarque e o desembarque, que se faz hoje (quando o estado das marés não permitta que os vapores se approxi-mem da ponte) em pequenos barcos e canoas, com grande incommodo dos passageiros e tal demora muitas vezes, que é mais o tempo que se gasta no embarque e desembarque, do que se consome em toda a linha até ás Vendas Novas!

E poderá conseguir-se, ainda á custa de uma grande despeza, aquelle melhoramento? Duvido: os homens entendidos e práticos da localidade dizem que não; e que o local do embarque e desembarque tem de ser mudado. A companhia também assim o entendeu; mas contra a sua, prevaleceu infelizmente a opinião do seu engenheiro em chefe e a do engenheiro do governo.

E ainda, sr. presidente, tem de despender-se uma grande somma com o alargamento do caminho, para ficar todo o do Barreiro a Évora e Beja com a mesma largura. Já o sr. ministro das obras publicas nos deu a satisfação de sabermos que não custará mais de 500:000$000 réis, e poderá mesmo custar menos. Mas esta despeza, para que a companhia teria ao menos de concorrer no seu próprio interesse, carregará toda sobre o paiz.

Em troco de tanto desprezo pela constituição e pelo corpo legislativo, e de tantas despezas, tantos sacrifícios que