O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 935

N.º 70

SESSÃO DE 12 DE AGOSTO DE 1887

Presidencia do exmo sr. Antonio José de Barros e Sá

Secretarios - os dignos pares, Frederico Ressano Garcia, Conde de Paraty

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. - Correspondencia. - Ordem do dia: discussão dos pareceres n.ºs 137, 129, 128,135,142 e 114. - Lê-se na mesa o primeiro, acerca da eleição do digno par o sr. Silvestre Bernardo de Lima, e é approvado sem discussão. - Em seguida procede-se á discussão do segundo. Usam da palavra os dignos pares visconde de Carnide, Franzina e marquez de Vallada. Responde o sr. presidente do conselho. Approva se tambem esse parecer.- Os dignos pares os srs. Pinheiro Borges, Franzini e Margiochi mandam para a mesa vários pareceres de commissões.- Approva-se depois sem discussão o parecer sob n.° 129. - Continua a discussão do que tem n.° 114, acerca do Mil de indemnida de - O digno par o sr. Dignei Osorio fundamenta e manda para a mesa uma proposta. É admittida á discussão. - Impugna este projecto o digno par Barjona de Freitas. Defende o o sr. presi dente do conselho. Condemna o por seu turno o sr. Hintze Ribeiro. Replica-lhe o digno par Pereira Dias. Secunda o sr. Thomás Ribeiro a opinião dos oradores precedentes, adversos ao projecto. Rebate-lhe o sr. presidente do conselho as suas doutrinas. - O digno par o sr. conde de Castro propõe e a camara approva que se prorogue a sessão. - Approva-se a generalidade do projecto.- Segue-se a discussão da sua especialidade. Usa da palavra o digno par conde de Margaride. Redargue-lhe o sr. presidente do conselho. - Os dignos pares Bandeira Coelho e Pinheiro Borges indicam a conveniencia de se modificar a ultima reforma de engenheria. - Por ultimo é o projecto approvado na sua especialidade, salva a redacção dos artigos a que respeitam a substituição e o additamento dos srs. dr. Senna e Francisco de Albuquerque, e apresentados na sessão anterior, e os quaes tambem são approvados. - Os dignos pares os srs. D. Luiz da Camara Leme e Telles de Vasconcellos pedem para retirar a sua proposta. A camara annue. - Estes mesmos dignos pares e os srs. Hintze Ribeiro e Bocage igualmente pedem se consigne na acta haverem votado contra o referido projecto. - Considera-se prejudicada a proposta do digno par Miguel Osorio e é rejeitada a do sr. Margiochi, apresentada na véspera. - O digno par o sr. Serra, e Moura manda para a mesa um parecer da commissão do ultramar.- Levanta-se a sessão e designa-se a immediata, bem como a respectiva ordem do dia.

As duas horas e meia da tarde estando presentes 35 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão precedente julgou-se approvada na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Mencionou-se a seguinte:

Correspondencia,

Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição de lei que equipara o ordenado do guarda mór de saude do Porto aos dos guardas mores do Funchal e de Ponta Delgada.

A commissão de fazenda.

Outro do director da penitenciaria, remettendo 145 exemplares do seu relatorio, com respeito ao anno de 1886, para serem distribuidos pelos dignos pares.

Mandaram-se distribuir.

(Estavam presentes os srs. ministros da fazenda e da justiça.)

O sr, Presidente: - Está dada para primeira parte da ordem do dia a discussão do parecer n.° 137, sobre a eleição para par do reino do sr. conselheiro Silvestre Bernardo Lima.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

PARECER N.° 137

Senhores. - Foi presente á vossa commissão de verificação de poderes o diploma da eleição pelo collegio districtal de Faro, de. Silvestre Bernardo Lima, para o desempenho das funcções de par do reino.

O processo eleitoral está correcto e não offerece protesto algum; os documentos juntos garantem ao eleito o direito de ser approvado o seu diploma em vista das leis de 3 de maio de 1878, regulamento de 3 de janeiro de 1880 e organisação de 24 de julho de 1885, e por estar comprehendido na categoria 18.ª do diploma publicado em 1878.

Sala da commissão, 10 de agosto de l887.= Mexia Salema= José Joaquim de Castro = Hintze Ribeiro = Sequeira Pinto = Conde de Castro.

Acta da eleição de um par do reino a que o collegio districtal de Faro procedeu em conformidade da carta de lei de 24 de julho de Í885 e decreto de 2 de junho de 1887.

Aos 10 dias do mez de julho do anno de 1887, pelas dez horas da manhã, nesta cidade de Faro, e na sala das sessões da junta geral do districto, reunidos os cidadãos Sebastião Fernandes Estacio, Antonio José Ayres de Mendonça, Francisco de Sousa Archanjo, José Francisco de Azevedo e Silva, José Francisco do Valle Galvão, Damião de Sousa Medeiros, Francisco Correia de Almeida, dr. Francisco Lázaro Côrtes, Bento José da Silva, Manuel José da Fonseca, João Rodrigues Gomes Centeno, José Bernardo Vizetto, dr. José Vaz Guerreiro Judice de Aboim, José Sebastião, Pedro Alves da Silva Nogueira, José Antonio Vasco Mascarenhas, José Fernandes de Almeida, Joaquim da Conceição Franco, Pedro José Martins do O, Antonio José Ramos Faria Caimotto, José Antonio Garcia Blanco, commendador Antonio Guerreiro Lourenço, eleitores effectivos do collegio districtal, que, em virtude da organisação eleitoral da parte electiva da camara dos pares, approvada pela carta de lei de 24 de julho de 1885, tinha de eleger um par do reino pelo districto administrativo de Faro, faltando os cidadãos: José Bento Ferreira de Almeida, visconde de Silves, Matheus Teixeira de Azevedo, Marçal de Azevedo Pacheco, Eliseu Xavier de Serpa, Marianno Presado e José Gregorio Figueiredo Mascarenhas, deputados da nação, tambem eleitores do dito collegio, o presidente deste, Sebastião Fernandes Estacio, convidou os escrutinadores Bento José da Silva e Pedro Alves da Silva Nogueira, e os secretarios José Antonio Vasco Mascarenhas e José Fernandes de Almeida a occuparem os seus respectivos logares na mesa, e annunciou que, para o cumprimento do disposto no artigo 2.° do decreto de 2 de junho do corrente anno, ia proceder-se ao escrutinio secreto para a referida eleição, observando que, segundo o preceito legal, não seriam admittidas listas em papel de cores ou transparente, ou que tivessem qualquer signal, marca ou numeração ex-

71

Página 936

936 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

terna e bem assim que das listas contendo mais de um nome, só se contaria o primeiro.

Apresentada a lista organisada, segundo o preceito do artigo 36.° da citada organisação, e effectuando-se a chamada exigida no artigo 39.° da mesma, o presidente lançou a sua lista na urna, recebendo e lançando nesta, successivamente, as listas dos outros vogaes da mesa, e aã dos restantes eleitores presentes, ao passo que o escrutinador Pedro Alves da Silva Nogueira fazia na lista dos inscriptos as respectivas descargas.

E, sendo onze horas da manhã, declarou o presidente que deste momento começava a contar-se a meia hora de espera, prescripta no ultimo dos ditos artigos da citada organisação.

Findo este praso sem que nenhum dos sete deputados da nação acima nomeados se apresentasse a votar, o presidente fez contar as listas que se achavam na urna, verificando-se serem vinte e duas, numero igual ao das descargas postas na lista por onde se fizera a chamada dos eleitores inscriptos.

Concluida a contagem e confrontação das listas recebidas, lavrou-se edital que foi immediatamente affixado na porta do edificio do governo civil, no qual se achava installada a sala das sessões da junta geral, declarando o numero das mesmas listas.

Procedendo-se ao apuramento, dos votos, desdobrando o presidente successivamente cada uma das listas, entregando-as alternadamente a cada um dos escrutinadores, o qual a ha em voz alta e a restituia ao presidente, e escrevendo os secretarios ao mesmo tempo o nome dos votados, e numerando por algarismos, que repetiam em voz alta os votos obtidos, verificou-se ter sido votado em um unico escrutinio o conselheiro Silvestre Bernardo Lima, lente jubilado, com 22 votos, contendo cada uma das listas sómente o nome do par a eleger com as designações acima indicadas.

Os eleitores que formam este collegio districtal outorgam ao par eleito os poderes necessarios para que, reunido com os outros pares do reino, faça, dentro dos limites da carta constitucional e dos seus actos addicionaes, tudo quanto for conducente ao bem geral da nação.

Reconhecido que o conselheiro Silvestre. Bernardo Lima obteve a maioria absoluta de votos, o presidente o proclamou em voz alta eleito par do reino pelo districto administrativo de Faro, mandando publicar o seu nome por edital affixado na porta do edificio do governo civil, onde se achava installada a sala das sessões da junta geral.

E, dando se cumprimento ao disposto nos artigos 44.° e 45.° da supramencionada organisação, se houve por dissolvida a assembléa.

Do que, para constar, se lavrou a presente acta, que eu, José Antonio Vasco Mascarenhas, secretario, escrevi e as signo com os restantes vogaes da mesa. - O presidente, Sebastião Fernandes Estacio - Bento José da Silva - Pedro Alves da Silva - Nogueira - José Fernandes de Almeida - José Antonio Vasco Mascarenhas.

Está conforme Sebastião Fernandes Estacio = Pedro Alves da Silva Nogueira = Bento José da Silva = José Antonio Vasco Mascarenhas.

Exmo. sr. - Silvestre Bernardo Lima, antigo lente da escola veterinaria militar e do instituto agricola e instituto geral de agricultura, actualmente director aposentado, precisando de um attestado que certifique o tempo que teve de serviço activo rio magisterio - P. a v. exa., como, director do instituto de agronomia e veterinaria, lhe seja passado o dito attestado.

Lisboa, 17 de julho de 1887.= Silvestre Bernardo Lima.

Passe por certidão o que constar. - Instituto, 19 de julho de 1887.= 0 director, Ferreira Lapa.

Augusto José Henriques Gonzaga, habilitado com os cursos d'este instituto de agronomia e medicina veterinaria, secretario do instituto de agronomia e veterinaria.

Certifico, em virtude do despacho retro, que o supplicante Silvestre Bernardo Lima, antigo lente da antiga escola veterinaria militar, foi, por decreto de 5 de dezembro de 1855, encorporado no magisterio deste instituto, que então se denominava instituto agricola, onde esteve em serviço activo e sem interrupção até ao dia 23 de março de 1881. Consta dos livros de folhas de vencimentos. A presente, por mim sómente assignada, vae firmada com o sello deste instituto.

Secretaria do instituto de agronomia e veterinaria, 19 de julho de 1887. = O secretario, Augusto José Henriques Gonzaga.

Exmo. sr, - Silvestre Bernardo Lima, proprietario, natural do logar de Alpiarça, freguesia do concelho de Almeirim, comarca de Santarem, e actualmente residente em Lisboa, precisa que, pelo cartono respectivo, se lhe certifique o que a seu respeito constar do boletim do registo criminal, para o que - P. a v. exa. se digne mandar passar o certificado na forma requerida. - E. R. M. cê.

Pelo supplicante, o advogado, José Joaquim Dias.

Passe o certificado requerido., - Santarem, 8 de agosto de 1887.= Azevedo.

Comarca de Santarem. - Attesto que dos boletins archivados no registo criminal da comarca de Santarem pada consta contra Silveste Bernardo Lima, natural de Alpiarça. Não se declara a filiação.

Registo criminal da comarca de Santarem, 8 de agosto de 1887. = O escrivão do registo, Henrique Julio Dias.

José Augusto César e Silva, parocho de Santo Eustachio de Alpiarça, concelho de Almeirim, patriarchado de Lisboa.

Certifico que, vendo o livro de baptismos desta freguezia, n.° 16 a fl. 33 v., encontrei um termo do teor seguinte:

"Aos 7 dias do mez de abril de 1824 baptisei e puz os santos óleos solemnemente a Silvestre, que nasceu ao primeiro dia deste mesmo mez, filho legitimo de Bernardo Joaquim da Ascenção, baptisado na freguezia das Olha-lhas, termo de Thomar, e de Marianna Clara, baptisada nesta freguezia de Alpiarça, e a esta tambem se receberam; neto paterno de Joaquim Duarte e de Anna Maria, baptisados na dita freguezia das Olhalhas, neto materno de Justino da Costa Lima e de Francisca Theresa, baptisados nesta freguezia de Alpiarça, foi padrinho Silvestre Rodrigues, e tocou com prenda de Nossa Senhora do Rosario por madrinha, Januario Filippe Rodrigues: em fé do que fiz este assento, que assignei dia, mez, era, ut supra. O vigario - Clemente Xavier Matheus."

Está conforme com o original.

Alpiarça, 6 de agosto de 1 887. = O parocho, José Augusto César e Silva.

Illmo. e exmo sr. - Silvestre Bernardo Lima, desejando provar que o seu nome se acha incluido no recenseamento politico da freguezia de S. Mamede, do terceiro bairro de Lisboa. - P. a v. exa. assim lho mande certificar. - E. R. M.cê.

Passe, não havendo inconveniente. - Lisboa, 10 de agosto de 1887.= O governador civil substituto, Tenreiro.

Na secretaria deste governo civil existe a copia authentica do recenseamento dos cidadãos eleitores e elegíveis do

Página 937

SESSÃO DE 12 DE AGOSTO DE 1887 937

terceiro bairro de Lisboa, do corrente anno, e nella, na parte respectiva á freguezia de S. Mamede, se encontra a verba seguinte a que o supplicante se refere: "Silvestre Bernardo Lima, contribuição, 18$194; emprego, lente; estado, casado; morada, rua do Monte Oliveira, 65; idade, 63; é elegivel para deputado, é elegivel para os cargos districtaes, municipaes e parochiaes."

E para constar se passou a presente certidão, em virtude do despacho retro.

Secretaria do governo civil de Lisboa, 10 de agosto o e 1887. = Servindo de secretario geral, o chefe da segunda repartição, Alexandre J. da Costa.

Poz-se em discussão e, não havendo quem pedisse a palavra, fez-se a chamada.

O sr. Presidente: - Convido para escrutinadores os dignos pares os srs. Margiochi e visconde de Carnide.

Corrido o escrutinio, verificou-se terem entrado na uma da approvação 33 espheras brancas, correspondendo a este numero as que estavam na uma da contraprova.

O sr. Presidente: - Está, pois, approvado o parecer por unanimidade.

Agora vae ler-se o parecer n.° 129, que envolve materia dependente do ministerio da fazenda.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

PARECEU N.° 129

Senhores. - A vossa commissão de, fazenda foi presente o projecto de lei n.° 90, vindo da camara dos senhores deputados, o qual tem por fim auctorisar o governo a auxiliar a camara municipal de Lisboa nas dificuldades da sua situação financeira durante o anno de 1888; e considerando que essas dificuldades provem da lei de 18 de julho de 1885, que alargando, com a area, as despezas do municipio de Lisboa, previu, para lhes fazer face, um augmento de receita que ainda não póde tornar-se effectivo pelas rasões expostas no relatorio que precede a pró posta do governo;

Considerando que na capital já as contribuições são muito pesadas, avultando principalmente entre ellas o imposto do consumo, que na sua maior parte é applicado, não ás despezas da cidade, mas ás urgencias do estado;

Considerando que a regularisação definitiva das finanças da capitai é assumpto que demanda serio estudo e não póde ser resolvido agora, visto o estado de adiantamento da sessão legislativa;

Considerando, porem, que é de justiça acudir com uma medida provisoria ao desequilibrio financeiro da camara municipal, devido a causas estranhas á sua administração;

Considerando, finalmente, que é de conveniencia para o estado, pelo reflexo que póde ter sobre os seus titulos, manter o credito do primeiro municipio do reino, que se ha pouco tempo era bem fraco, está agora solidamente estabelecido:

É a vossa commissão de parecer que o projecto de lei de que se trata merece ser approvado para subir á sancção regia.

Sala da commissão de fazenda, aos 9 de agosto de 1887.= A. de Serpa = A. de Aguiar = Francisco de Albuquerque = Conde de Castro = Augusto José da Cunha = Frederico Ressano Garcia, Pereira de Miranda = Manuel Antonio de Seixas.

Projecto de lei n.° 90

Artigo 1.° É auctorisado o governo a emprestar á camara municipal de Lisboa a somma de titulos de divida publica, na posse da fazenda, necessarios para a mesma camara caucionar emprestimos até á quantia de 600:000$000 réis effectivos, a fim de prover ao déficit do orçamento municipal, no anno de 1888.

§ 1.° Com a garantia desses titulos poderá a camara levantar as quantias necessarias até ao limite fixado neste artigo, pelos mesmos meios que o thesouro publico tem empregado, depois de maio de 1886, para effectuar os supprimentos da divida fluctuante.

§ 2.° Os titulos emprestados pelo governo, computados pelo preço do mercado, na occasião em que a camara municipal effectuar os supprimentos, não podem representar somma superior a 85 por cento da importancia real dos mesmos supprimentos.

§ 3.° Os juros dos titulos emprestados continuam a ser receita do thesouro publico.

§ 4.° São despeza obrigatoria da camara municipal de Lisboa os juros é demais encargos das operações auctorisadas por esta lei, até completa liquidação dessas operações, liquidação que se effectuara logo que esteja promulgada providencia legislativa que regularise definitivamente a situação financeira do referido municipio de Lisboa.

Art. 2.° Fica revogada a legislação contraria a esta.

Palacio das côrtes, em 8 de agosto de 1887.= José Maria Rodrigues de Carvalho, presidente = José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, deputado secretario = Francisco José Machado, deputado vice-secretario.

Poz-se em discussão.

O sr. Visconde de Carnide:- Sr. presidente, só brevissimas palavras direi sobre este projecto, o qual eu approvo e voto, porque o considero, como o governo tambem o considera, simplesmente um expediente provisorio.

Porem, não me posso eximir de fazer algumas observações, para não parecer em contradicção com o que disse em outra occasião sobre esta materia.

Sr. presidente, referindo-me ás considerações que eu tive a honra de apresentar nesta camara, na sessão de 11 de junho, sómente recordarei que a lei de 18 de julho de 1885 creou uma situação em extremo difficil, não sómente para a camara de Lisboa, como tambem e principalmente para as aldeias e povoações completamente isoladas e a uma distancia de 9 kilometros da cidade, as quaes se encontram atreladas ao municipio de Lisboa, não para gosar de quaesquer beneficios que não disfructam nem podem disfructar, mas unicamente para pagar as contribuições e posturas.

Para sair desta difficil e injusta situação ha só um meio, mas esse é radical, simples e facil, é desfazer o que se fez, é proceder á desannexação da parte rural, encorporada recentemente no municipio de Lisboa. E note-se que digo a parte rural, porque quanto á parte urbana que se estende pela margem do Tejo, essa póde sem inconveniente ser encorporada na cidade.

Quanto á futura organisação administrativa da região desannexada, é essa uma questão secundaria. Quer se constitua com ella um concelho administrativo independente, quer se reorganise como estava dantes, é indifferente. O importante é que a região agricola fique fora da acção da camara municipal de Lisboa.

É fora de duvida que se este ou qualquer outro governo quizesse fazer o ensaio da percepção dos imposto do consumo, pondo as barreiras fiscaes na estrada militar, daria logar a tantos conflictos e complicações que não seria possivel leva-lo a effeito. Alem de que a percepção e fiscalisação causaria uma despeza maior do que a receita.

O proprio governo assim o considera porque, no bem elaborado relatorio que precede este projecto, diz que a questão offerece dificuldades insuperaveis para a fiscalisação dos impostos do consumo.

O proprio governo já assim o tinha considerado, quando, reconhecendo a justiça das reclamações feitas, tomou a salutar providencia de suspender, pela portaria de janeiro do corrente anno, as funestas consequencias da lei de 18 de julho de 1885. Com aquella portaria evitou o governo graves conflictos e complicações e prestou um verdadeiro serviço ao paiz.

Sr. presidente, esta questão não é de pequena importancia. A região agricola que foi annexada a Lisboa, para pá-

Página 938

DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 938

gar os embellesamentos desta, é muito vasta e fertil. Produz muitos milhares de moios de cereaes, e muitos milharem de pipas de vinho, uma grande riqueza que infallivelmente se perderá, se for por diante a annexação, visto que cessarão todas essas culturas, que nessas condições seriam a ruina dos cultivadores. No momento actual é talvez a unica região do paiz que está inteiramente livre da phylloxera, mas esses florescentes vinhedos não tardariam em perecer pela acção de outro agente, ainda mais terrivel para elles do que a phylloxera, e que se chama a alfandega do consumo.

Posso contar á camara um facto, que prova quanto aquellas povoações consideram necessaria, a desannexação. Quando se tratou da eleição do deputado pelo circulo de Belem, alguns eleitores daquelle circulo mandaram um memorial ao candidato, dizendo que, se elle se promptificava a sustentar no parlamento, o principio da desannexação, elles gostosamente lhe dariam os seus votos, mas de contrario não. Ora, note-se que todos esses eleitores eram progressistas, amigos do governo, e desejavam o triumpho do candidato ministerial. Mas tal era a sua convicção da necessidade da desannexação, tal era o empenho que tinham nessa medida, que fizeram depender os seus votos dessa circumstancia, e só votaram no candidato depois de terem recebido a segurança de que elle abundava naquellas mesmas idéas.

Sr. presidente, esta opinião sobre a desannexação não é só a dos proprietarios interessados na questão, é a opinião de ioda a gente imparcial, é a opinião de homens illustrados, distinctos no inundo politico, membros do parlamento, que o eram quando foi feita a lei de julho de 1885, que eram tambem do partido que estava no poder naquella occasião; e a maior parte delles reprovam e condemnam aquella medida.

Sr. presidente, nada mais direi sobre este assumpto, porque já tratei delle mais extensamente, e porque não quero tomar mais tempo á camara, pois todos estão anciosos de ver terminar esta sessão parlamentar. Foi por este motivo que não tomei parte no debate que ultimamente teve logar sobre os interesses agricolas, interesses que foram brilhantemente defendidos pelos dignos pares conde de Valenças, Margiochi e Pinheiro Borges. Mas estas discussões não nos levarão a resultado algum, em quanto se não adoptar, como muito bem observou o digno par sr. Aguiar, um systema permanente, não interrompido por uma serie de annos, de medidas de diversa natureza, seguido por todos os governos, com um pensamento constante de proteger a agricultura. Só assim é que se protege a agricultura, disse o sr. Aguiar, e tem muita rasão.

Termino, pois, pedindo ao nobre ministro do reino que na proxima abertura do parlamento traga ás côrtes um projecto de lei para modificar a lei de 18 de julho de 1885, sendo certo que, se assim fizer, prestará um bom serviço ao paiz.

O sr. Franzini: - Sr. presidente, quando ha dias tratei de um assumpto que dizia respeito á administração municipal, disse se nesta casa que o parlamento não era competente para, a apreciação desse assumpto.

Não me conformo com esta doutrina. Entendo que o parlamento tem competencia para discutir todos os assumptos de interesse, geral, e as questões municipaes não podem por forma alguma ser consideradas de interesse particular.

Eu desde já declaro que voto o projecto, e mesmo não podia deixar de o votar, porque se trata de um negocio urgente, qual é o de conceder, meios que habilitem a camara municipal - de Lisboa, a sair da situação embaraçosa em que se encontra; - mas o parlamento está perfeitamente no uso das attribuições que lhe competem, apreciando e discutindo os negocios que dizem respeito á camara municipal de Lisboa, principalmente recorrendo o municipio frequentes vezes e agora aos cofres da nação, e se não fosse a estreiteza do tempo, e a conveniencia de restringir quanto possivel os debates, eu havia de discutir largamente o orçamento municipal, verba a verba, e provar que uma grande parte das difficuldades com que lucta é devida a erros de administração, e outra a ser vastissima a area do municipio e relativamente diminuta a população, é que torna dispendiosos todos os serviços, principalmente os da viação e limpeza.

No relatorio sobre o estado financeiro da camara, organisado pela commissão executiva, notarei de passagem algumas verbas de despeza que vem muito augmentadas no orçamento de 1887.

Por exemplo, nos vencimentos e gratificações nota-se o augmento de despeza, e por outro lado é eliminada a verba desempregados addidos, na importancia de 4:008$000 réis, o que não é facil de explicar.

A verba das despezas com a instrucção publica eleva-se a 180:534$000 contra 163:948$398 réis no anno anterior.

Todos os que se interessam pela educação popular, e sou eu um delles, de certo applaudem este acrescimo de despeza; mas, em verdade, a verba para cada alunno é um pouco elevada e superior ai correspondente em outras escolas.

(Aparte do sr. Fernando Palha que não se percebeu,)

Mas, sem proceder agora á, analyse de cada uma das verbas que vem aqui descriptas, o que levaria um tempo infinito, notarei que as despezas com annuidades dos emprestimos passam de 263:000$000 réis approximadamente em 1886 a 480:000$000 réis em 1887; devendo ainda attender-se a que os encargos municipaes mais serão aggravados com o novo emprestimo que se vae contrahir na importancia de 600:000$000 réis.

O resultado é que as despezas propriamente com o serviço municipal, excluindo mesmo as annuidades dos emprestimos, augmentam por um modo assustador.

Apezar do alargamento da area do municipio, donde a camara esperava grande augmento de receita, vê-se que o acrescimo de despeza com os diversos serviços municipaes, excluido o dos emprestimos, é de mais de 120:000$000 réis com relação ao orçamento de 1886.

Este orçamento calcula que o déficit proveniente de despeza ordinaria e extraordinaria será de 300:000$000 réis; mas de certo ha de ser muito mais porque a receita resultante da parte novamente annexada, fica muito aquém do que se esperava, como a experiencia já tem sobejamente mostrado, e no anno de 1888 acrescerá mais o déficit com os juros do emprestimo de 600:000$000 réis.

Esta situação é muito seria, muito embaraçosa. Urge remedia-la por qualquer modo, sem estes paliativos.

Levantar todos os annos um emprestimo para occorrer ao déficit é apenas um paliativo, que agrava cada mais o estado pouco lisongeiro das finanças municipaes.

Seja-me permittido acrescentar ainda algumas palavras.

Sendo a situação da fazenda municipal tão embaraçosa e tão digna de inspirar receios a todos os municipaes, parece-me não procedeu bem a vereação rejeitando as propostas feitas em tempo pela companhia lisbonense de illuminação a gaz. Por essas propostas, desde que se assignasse o contrato, entrava immediatamente nos cofres municipaes uma receita nova de 39:000$000 réis, quer dizer o sufficiente para pagar o juro e amortisação do emprestimo que se vae levantar.

Sr. presidente, eu sinto que os interesses do municipio, dos consumidores particulares, e tambem os do capital e trabalho nacional, fossem postos de parte com a rejeição das propostas referidas.

Eu não quero levantar agora de novo essa questão, porque é extremamente desagradavel; mas em pouco tempo os factos hão de provar, hão de demonstrar, que eu tinha rasão quando vim aqui sustentar a ultima proposta que se tinha feito por. parte da companhia lisbonense de illumina-

Página 939

SESSÃO DE 12 DE AGOSTO DE 1887 939

ção a gaz, e que era a mais vantajosa de todas as que se tinham apresentado.

Eu concluo, sr. presidente, porque não é meu costume prolongar os debates desta casa, e como a camara sabe, até hoje nunca o tenho feito.

O sr. Marquez de Vallada:- Protesta que póde fallar de cabeça erguida em todas as questões, por jamais haver seguido o systema de fazer accusações infundadas ou allusões pessoaes a ninguem.

Não é, pois, do numero daquelles que, penitenciados, se ajoelham e retractam, beijando, a mão de quem pouco antes insultaram.

Esse nunca foi o seu procedimento e tão pouco alguma vez poderá ser o de homens que se prezam de patriotas e amigos do seu paiz.

Repugna a ser membro de uns chamados partidos, que realmente nada mais são que aggremiações heterogeneas, com o unico intuito de especular, e que, na mira desse ideal, perfilham hoje um principio que amanhã desnaturadamente engeitam.

O orador passa depois a referir-se-ao ministro que em 1878 recalcitrou contra o alargamento das proverbiaes garantias e liberdades populares, entendendo que assim apenas proporcionam ellas innuraeros ensejos para outras tantas dictaduras.

Estranha que o sr. presidente do conselho, fallando acerca de dictaduras, emmudecesse quanto ás municipaes, e verbera que não querendo nós um Rei absoluto e despotico, consintamos a tyrannia nas corporações administrativas.

Deseja que ellas se possam gerir convenientemente, mas sem a regalia do abuso e o apanagio do luxo, e antes sob a fiscalisação do governo.

Conceitua o sr. presidente do conselho e ministro do reino de intrépido reformador, mas adverte-lhe que certos privilegios, por obsoletos, de ha muito caducaram, e que, não obstante, as immunidades prevalecem ainda para com alguns e bem notorios contrabandistas, aos quaes a actual impunidade muito bem póde instigar a futuras reincidencias.

O sr. Presidente: - Observa-lhe que se circumscreva ao projecto em discussão.

O Orador: - Redargue-lhe que ambos aprenderam rhetorica e que as divagações são permittidas, segundo a arte que ensina a deleitar e persuadir.

Que, todavia, se o governo tem pressa e as divagações o incommodam, nesse caso, trouxesse ha mais tempo este projecto á discussão, e não queira agora tolher a palavra aquelle que se tem abstido de, lhe pedir conta dos seus actos.

Allude em seguida a um artigo .transcripto no jornal O seculo, artigo no qual se pede uma syndicancia á camara municipal do Porto, e pergunta ao sr. presidente do conselho se tenciona mandar proceder a ella.

Confessa que neste debate se tem expandido a sabor do seu temperamento ardente, porem felizmente sem offender ninguem.

E com esta mesma intenção nota que jamais pertencera á nenhuma associação ou syndicato, por sempre e sómente se haver contentado com o patrimonio que herdara, o qual, se porventura não lhe fosse bastante a supprir as necessidades, manter-se-ia á custa do suor do seu rosto e com os fructos do seu1 contanto e indefesso estudo.

Alvitra por melhor que a politica deixa de ser entre nós uma pura exploração e se converta a uma idéa elevada, para que o povo cesse de clamar que tão bons são uns como outros.

Crê que não ha muitos republicanos em Portugal, senão innumeraveis descontentes, provindos de grandes injustiças e não menores aggravos.

Certifica que, por não fazer parte das actuaes camarilhas, é por isso mesmo continuamente aggredido por varias folhas politicas.

O sr. Presidente: - Observa-lhe de novo que sé circumscreva ao projecto em discussão.

O Orador: - Protesta ser reverente ás ordens de s. exa.; mas, proseguindo, intervem novamente o sr. presidente com as mesmas advertencias, as quaes- se cruzam com as replicas do digno par, que por ultimo finda por dizer que para si é um direito e um dever fallar e não está disposto a abdicar de uma nem de outra cousa.

Liga depois a sequencia das suas idéas e invoca o testemunho do sr. Barjona de Freitas para confirmar quanto se insurgira sempre contra o despotismo das camaras municipaes, porquanto era liberal e esperava morrer dando vivas á liberdade!

Faz ainda outras considerações e põe-lhes remate insistindo na syndicancia á camara municipal do Porto, e assegurando que ha de pugnar constantemente por dois principies que devem estar entre todos acima de tudo, a liberdade, sem a anarchia, e a justiça, sem o despotismo!

(O discurso do digno par será publicado na integra, quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Agradece ao digno par antecedente as amaveis expressões que s. exa. lhe dirigiu, só filhas da sua benevolencia, a que ha muito tempo estava habituado, e pondera-lhe que a syndicancia á camara municipal do Porto é assumpto que o respectivo governador civil não descura.

(Serão publicados na integra as breves palavras que s. ex* proferiu, quando haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Não ha mais ninguem inscripto. Vae votar-se.

Posto á votação o projecto foi approvado.

ORDEM DO DIA

Entraram em discussão e foram successivamente approvados os pareceres n.ºs 135 e 128, que são do teor seguinte:

PARECER N.° 135

Senhores.- Foi presente á vossa commissão de fazenda o projecto de lei n.° 91, vindo da camara dos senhores deputados.

Teve este projecto origem na proposta de lei de 11 de julho proximo preterito, apresentada pelo sr. presidente do conselho e ministro do reino e pelo sr. ministro da fazenda, com o fim de isentar de quaesquer impostos as merces honorificas que forem ou tiverem sido concedidas a operarios pela sua applicação ao trabalho e por merito relativo.

É tão justo e sympathico este pensamento, tão conveniente a medida proposta para o desenvolvimento do trabalho nacional, que a vossa commissão se julga dispensada de encarecer as vantagens do referido projecto de lei, limitando-se a expressar o seu parecer de que merece ser approvado, para subir á sancção regia.

Sala da commissão de fazenda, aos 10 de agosto de 1887.= A. de Serpa = Hintze Ribeiro = Visconde de Bivar = A. de Aguiar = Conde de Castro = Francisco de Albuquerque = Barros e Sá = Pereira de Miranda = Manuel Antonio de Seixas = Frederico Ressano Garcia, relator.

Projecto de lei n.° 91

Artigo 1.° É auctorisado o governo a dispensar do pagamento de direitos de mercê, de emolumentos de secretarias d'estado e do imposto do sello os operarios que, pela sua applicação ao trabalho e por merito artistico relevante, forem agraciados com mercês honorificas, bem como os que já o tenham sido e ainda não satisfizessem os impostos devidos pelas respectivas mercês.

§ 1.° Nos decretos pelos quaes forem de futuro agraciados com mercês honorificas operarios que mereçam a isenção de que trata esta lei, mencionar-se-hão as circumstancias que determinarem a mercê e a isenção dos direitos,

Página 940

940 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

publicando-se, na integra, na folha official esses decretos, bem como as informações officiaes em que elles se fundarem,

§ 2.° Em relação ás mercês anteriores o governo, usando da auctorisação concedida por esta lei, declarará, em decreto publicado na folha official, quaes são os operarios a quem a isenção tem de aproveitar.

Art. 2.° Fica revogada a legislação contraria a esta.

Palacio das côrtes, em 8 de agosto de 1887. = José Maria Rodrigues de Carvalho, presidente = Francisco José Machado, deputado vice-secretario = F. de Almeida e Brito, deputado servindo de secretario.

PARECER N.° 128

Senhores.- As vossas commissões de guerra e de fazenda reunidas apreciaram o projecto de lei n.° 88, vindo da camara dos senhores deputados, e considerando dignos de consideração os argumentos apresentados pela commissão de guerra da mesma camara em favor do quadro dos sargentos guardas-portas do cominando geral de artilheria, são as duas commissões de parecer que este projecto merece a vossa approvação. = José Paulino de Sá Carneiro = Conde de Castro = Sarros e Sá = Frederico Ressano Garcia = Manuel Antonio de Seixas = Marino João Franzini = José Maria Lobo d'Avila == Pereira de Miranda = Candido de Moraes = D. Luiz da Camara Leme = J. Bandeira Coelho = F. de Albuquerque = A. de Aguiar = José Joaquim de Castro = Hintze Ribeiro = Domingos Pinheiro Borges, relator.

Projecto de lei n.° 88

Artigo 1.° As vantagens estabelecidas para os officiaes inferiores do exercito, no artigo 6.° da carta de lei de 23 de junho de 1880, são extensivas aos sargentos guardas-portas do commando geral de artilheria.

Art. 2.° Fica revogada a legislação contraria a esta., Palacio das côrtes, em 6 de agosto de 1887. = José Maria Rodrigues de Carvalho, presidente = José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, deputado secretario = Francisco José Machado, deputado vice-secretario.

O sr. Presidente: - Continua em discussão o parecer que diz respeito ao bill de indemnidade, e tem a palavrão sr. presidente do conselho de ministros.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Cedo por agora da palavra.

O sr. Presidente: - Tem então à palavra sobre a ordem o sr. Miguel Osorio.

O sr. Miguel Osorio (sobre a ordem): - Em conformidade do regimento, começo por ler a minha moção, que é á seguinte:

"Proponho que na discussão do bill de indemnidade se não comprehenda á questão suscitada pelo digno par o sr. Barjona, por ser inadmissivel.= Miguel Osorio."

Não discuto o bill de indemnidade, sr. presidente, já porque não combato este projecto, já porque para o defender me escasseia o tempo é os srs. ministros e o illustre relator têem dito em justificação das medidas tomadas em dictadura o bastante para sua defeza.

Se não quero, porem discutir o bill de indemnidade, quero comtudo repellir o extraordinario fundamento da questão previa apresentada na sessão de hontem pelo digno par o sr. Barjona de Freitas.

Pois se 6 governo hão tivesse reformado em dictadura o codigo administrativo, conseguiria obter maioria na camara dos deputados e na parte electiva desta camara?

Como poderia isso acontecer, principalmente a respeito desta camara, se não fossem renovadas as corporações administrativas, que tinham de intervir na eleição?

Quando o digno par o sr. Barjona disse não achar provado que as anteriores corporações deixassem de concorrer para que o governo podesse governar, pareceu-me que s. exa. attendia mais ás conveniencias parlamentares e á rhetorica, do que ao dictame da propria consciencia; mas em todo o caso o sr. presidente do conselho já declarou, e é verdade, que não alterou a forma da eleição.

Com effeito, deve notar-se que entre os decretos dictatoriaes nenhum se publicou para alterar o direito eleitoral vigente, nem para alargar o imposto, que são os assumptos mais vitaes da politica de um povo, o primeiro por ser o meio de exercer a sua soberania, e o segundo por constituir o sacrificio para occorrer ás despezas publicas.

Declarou aqui tambem o sr. presidente do conselho que pela urgencia das circumstancias se vira na necessidade de tomar em dictadura outras medidas extraordinarias e eu, sentindo que essa necessidade inadiavel se tivesse dado, reconheço comtudo que é o governo o unico competente para apreciar a urgencia de taes medidas e que desde que elle as julgou inadiaveis é porque realmente o eram.

Por estas rasões, pois, e porque confio no governo, é que eu não hesito em dar ao governo o meu voto, approvando este projecto.

Algumas observações teria que fazer sobre o decreto de 29 de1 julho do anno passado, que reformou os serviços judiciaes; mas como o sr. ministro da justiça apresentou uma proposta mais ampla e complexa para esse fim na outra casa do parlamento, reservo-me para quando vier a esta camara, e, ou na discussão publica, ou na particular da commissão de legislação, a que tenho à honra de pertencer, terei occasião de expor as minhas opiniões.

Pedi a palavra especialmente para tratar da questão previa apresentada pelo sr. Barjona de Freitas.

Affirmou o digno par que, devendo os pares electivos a sua eleição ao acto de dictadura, que deu logar á renovação das corporações administrativas, que nella intervieram, teem interesse proprio na renovação do bill na parte respectiva, e são suspeitos segundo os principios geraes, que regem o foro, porque ninguem póde ser juiz em causa propria.

Ora eu combato esta interpellação, de que o par electivo não póde votar o bill de indemnidade.

Ou seja simples questão previa, ou suspeição formalmente opposta aos pares eleitos, quem ha de decidi-la?

O digno par certamente que não, porque, apesar da grande importancia de s. exa., já como eminente homem de estado, já como orador distincto, já como professor notavel, carece de competencia, dão obstante ter enunciado sem hesitação a sua opinião affirmativa.

Será o sr. presidente do conselho, visto que o digno par lhe dirigiu a pergunta, esperando a resposta de s. exa?

Mas quem é aqui o sr. presidente do conselho? É o primeiro representante do poder executivo, e nada mais. E ha de o poder executivo ingerir-se no exercicio exclusivo das funcções legislativas de qualquer das camaras para estremar votos, é escolher de entre os seus membros quem tenha direito de intervir em alguma deliberação, e muito mais tratando-se de absolver ou de condemnar o proprio governo por um peccado, que elle vem confessar?

A presidencia tambem nada póde decidir, porque não tem auctoridade nem attribuições para tanto. Poderá ser a camará? Mas a qual camará? Onde fica ella? E evidente que, se os pares eleitos são suspeitos para votar a proposta, do bill na parte que respeita, á sua eleição, muito mais suspeitos vem a ser ainda para conhecer da propria suspeição, porque ninguem se pode julgar a si proprio. Mas, segundo a lei fundamental na sua ultima reforma, a camara dos pares compõe-se de vitalicios e de electivos; ora excluidos de quaesquer funcções os pares eleitos, a parte restante, que são os vitalicios, é apenas uma fracção, que não póde constituir camara, nem assembléa politica deliberativa para tomar nenhuma resolução valida, assim como os pares eleitos só por si nada poderiam deliberar tambem.

Mas, não podendo a questão ser resolvida por nenhum

Página 941

SESSÃO DE 12 DE AGOSTO DE 1887 491

destes meios, haveria possibilidade de se nomearem arbitros, que é a forma legal nos tribunaes ordinarios para julgar suspeições? E quem havia de nomea-los, ou qual é a lei que auctorisa e regula os termos desse incidente? Deixar tambem á consciencia dos pares recusados confessarem a suspeição, ou nega-la, teria a mesma illegalidade, porque nem haveria quem recebesse a confissão, nem quem os julgasse e compellisse, se negassem, alem de não ser licito a nenhum membro do parlamento eximir-se ao dever de votar em qualquer questão.

Segue-se, portanto, que, ainda que o digno par o sr. Barjona, se quizesse agora arvorar em dictador, visto que se discute a dictadura, seria inefficaz para qualquer resultado pratico o poder discricionario de s. exa.

Em todo o caso admira que hoje se levante uma suspeição politica, e mais admira ainda ser levantada e opposta aos seus collegas por um estadista tão liberal como o digno par o sr. Barjona. Se as suspeições politicas fossem admissiveis, não se poderia dar um passo no governo pelo systema constitucional, que é o dos partidos, que governam pelas suas maiorias.

Tão suspeitos seriam os conselheiros d'estado nas questões de politica partidaria, como o governo em qualquer dos seus actos, ainda mesmo na nomeação de um simples administrador de concelho.

Suspeições politicas onde todos teem igual direito!

Sr. presidente, concluo das ponderações que acabo de fazer, que a questão suscitada pelo sr. Barjona, mas que s. exa. não propoz nos termos do regimento, nem foi admittida pela camara, não póde aqui ser decidida por ninguem. Se não póde ser decidida, tambem não póde discuti-la uma assembléa deliberativa, que nisso não exerce a faculdade de deliberar.

E emfim, se não é resoluvel, nem discutivel, nunca deveria ser suscitada, nem se póde considerar comprehendida cumulativamente na discussão geral do bill de indemnidade.

É esta a justificação, creio que plena, da proposta que mando para a mesa.

O sr. Barjona de Freitas: - Declara usar novamente da palavra sobre este assumpto, pois que a tanto o reptara o sr. presidente do conselho, ao alludir s. exa. na véspera ao partido regenerador de um modo menos consentaneo com a verdade.

Nunca imaginou que o governo ou os seus partidarios se lembrassem de argumentar e defender-se com precedentes, pondo-os em parallelo com a actualidade.

Em vantagem do passado e descredito do presente, resulta, evidentemente um tão descabido confronto.

Em abono desta asserção delimita o praso de vinte e dois annos, isto é, desde 1865 até agora, juntando que durante esse periodo jamais os governos regeneradores exerceram, dictadura alguma, senão que sómente praticaram alguns actos dictatoriaes, ponderado ser bem facil distinguir entre o levar dictatorialmente a effeito um ou outro acto singular, e o realisar uma dictadura larga, na accepção ampla da palavra.

Comtudo, ouvira citar ao sr. presidente do conselho, no intuito de contrariar esta verdade e justificar o procedimento do actual governo, as dictaduras de 1881 e 1885.

Comprova a rasão desta ultima, allegando que ella tivera unicamente por fim a reforma do exercito, e que, alem disso, o projecto de lei attinente a essa reforma fora, não sómente discutido e approvado na camara dos senhores deputados, como ainda sobre elle havia já emittido parecer a respectiva commissão da camara dos dignos pares do reino.

Quanto á de 1881, bem poderá rogar ao sr. presidente do conselho que se dignasse de confrontar o proceder da maioria regeneradora, quando s. exa. subiu ao poder, com o da progressista, quando anteriormente os collegas delle, orador, tinham sido chamados aos conselhos da coroa.

Porem, como sabe que o sr. Hintze Ribeiro tem a palavra e fez parte do governo daquella epocha, deixa, por uma justa deferencia, a defeza dessa dictadura a s. exa.

Da sua argumentação deduz e accentua depois que naquelle espaço de vinte e dois annos quem mais propuzera a dissolução do parlamento não fora o partido regenerador.

Que nesse lapso de tempo houvera oito dissoluções das quaes apenas duas pertenciam ao sobredito partido, acrescendo que uma dellas derivara naturalmente de se ter votado uma lei eleitoral e ser necessario consultar de novo o suffragio popular.

No entretanto, não pretende attribuir a responsabilidade de todas as restantes ao partido progressista, mas com rasão a da sua maior parte.

Do exame de obras vae agora transferir-se ao de promessas.

E assim, lembra que em 1871, discutindo-se uma dictadura, se levantara na camara dos senhores deputados o sr. presidente do conselho e promettera que o partido progressista havia de fazer reformas politicas, ao que elle orador correspondera, erguendo-se por seu turno, e garantindo que o partido regenerador as faria tambem.

Qual mais sincera das promessas evidenciara posteriormente o tempo, porquanto em 1872, entrando os regeneradores na administração do estado, desde logo apresentaram ás côrtes uma proposta de reforma constitucional, que, se porventura não se convertera em lei, fora, como é sabido, por circumstancias independentes de quem a propunha.

Por virtualmente contraposto a isto, reputa o que fez o partido progressista, quando, em 1879, estando no poder, e exigindo-se-lhe o cumprimento das suas promessas, respondia sempre que o programma da Granja não o era exclusivamente do ministerio, senão de execução extensiva a todos os partidos.

Donde resultara a necessidade imprescriptivel de sobrevir o partido regenerador, para que se realisasse a reforma da carta constitucional.

Ajuiza que, se em politica, a despeito dos melhores desejos, muitas vezes não é permittido fazer-se tudo quanto se promette, entretanto é muito para admirar que o sr. presidente do conselho indique nas suas palavras uma orientação que sempre mais tarde redunda justamente no inverso das suas obras. Busca roborar esta, a seu ver, contradicção com o seguinte:

Que o sr. presidente do conselho, quando opposição, bradava que, para melhorar a administração do estado nos seus diversos ramos, urgia levar a termo a reforma politica, e depois fizera exactamente o contrario.

Que tambem affirmara que a reforma administrativa se realisaria em plena vigencia das leis, e mais tarde escrevera no seu relatorio e sanccionara com os seus actos integralmente o opposto.

Que, finalmente, desta ultima e demonstrada proposição resulta ainda um corollario, a saber: que se os dignos pares electivos absolverem os ministros de haverem decretado em dictadura a reforma administrativa, equivalerá a reconhecerem que devem a sua eleição ás influencias do governo.

Com isto não deseja ser desagradavel aos seus collegas, mas unicamente advogar os principios do que é lógico e justo.

Passa depois a referir-se a algumas disposições da reforma judicial e administrativa.

Estranha que o sr. ministro da justiça extinguisse os juizes ordinarios, substituindo-os por juizes municipaes, mas que, em vez de extinctos, aquelles se achem ainda funccionando.

Particularisa os inconvenientes dos julgados municipaes, asseverando que a sua creação traz comsigo despezas extraordinarias, sem o minimo proveito para o paiz. Censura que, pretendendo o sr. ministro da justiça manter independente o poder judicial, legisle ao ré vez da sua intenção e

Página 942

942 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

ao ponto de se não saber ao certo se um juiz que vai a uma praça de touros ou qualquer outro divertimento desce ou não da sua dignidade, e se por tal deve ou não ser punido.

Acerca deste assumpto faz ainda outras ponderações, e em seguida leva-as a incidir sobre a reforma administrativa.

Recorre então ao programma do partido progressista e maravilha-se de que a descentralisação nelle apregoada desapparecesse totalmente do seu codigo ultimamente publicado.

Em confirmação deste asserto, cita o facto de, pelo codigo de 1878? terem as juntas geraes 39 tutelas, e pelo de 1886 nada menos que 117.

Admira-se tambem de que, dizendo se urgentissima aquella reforma, no proposito de cercear as faculdades tributarias das camaras municipaes, a este fim não viesse ha muito o relativo projecto á discussão. Memora ainda outros exemplos, que capitula de contradictorios, e condenma que o referido codigo eliminasse a renovação dos corpos administrativos e confira á camara municipal de Lisboa faculdades que nega aos outros municipios.

Julga desvantajosamente dos concelhos autónomos, e estranha a solução apparente que o sr. presidente do conselho dera ao conflicto de Braga e Guimarães, a cujo proposito, embora s. exa. lhe replique estar actualmente Braga calada e contente, a todos é incontestavelmente notorio que Braga em tempo se queixava, por estarem os regeneradores no poder, e Braga não se queixa agora por nelle estarem os progressistas.

Reputa não se achar de vez resolvida esta questão com a reforma administrativa.

O orador, alem das substanciadas aqui, faz ainda outras; arguições á reforma administrativa, concluindo por, reiterar que o programma do partido progressista era a todo o momento por elle proprio falseado.

(O discurso dó digno par será publicado na integra, quando s. exa.- haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Pinheiro Borges (Sobre a ordem): - Mando para a mesa um parecer da commissão de guerra.

Foi a imprimir.

O sr. Franzini (sobre a ordem): - Mando para a mesa um parecer da commissão de guerra, pedindo a v. exa. que o mande imprimir com urgencia.

Foi a imprimir.

O sr. Margiochi (sobre a ordem): - Mando para a mesa uma proposta em substituição á que hontem apresentei.

Importa isto simplesmente uma questão de redacção, e peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte a substituição.

(Consultada a camara, concedeu a licença pedida pelo digno par.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Allega que, se não fosse o adiantado da sessão, responderia largamente ás accusações que lhe acabam de ser feitas e ao seu partido pelo sr. Barjona de Freitas.

Que, de contrario, provaria com factos, com documentos, com diplomas legislativos, que o partido progressista tem correspondido no governo ás suas promessas na opposição, e mesmo tem ido alem dellas.

Que no entanto lhe parece que no ministerio actual apenas ha dois ministros, dois réus de lesa-constituição, com os quaes o digno par o sr. Barjona anda inimisado ou que incorreram no seu desagrado.

Como taes, individua-se a si proprio e ao sr. ministro da justiça.

E não se lastima da preferencia, antes se rejubila pela distincção que merecem os outros seus collegas, porque, ficando elles a coberto das coleras e censuras de s. exa., bem revelam ter nobremente servido o paiz.

Quanto á si, poderá contrabalançar as acrimonias do seu contendor com uma compensação, qual a de haver dito o sr. Antonio de Serpa que a sua permanencia no governo era uma garantia.

Que não deseja, porem, soccorrer-se a essa expressão meramente gratuita e lisonjeira, senão sómente accentuar bem que tanto os ministros ausentes, como os presentes, teem trabalhado tão conscientemente em prol do paiz, quanto as suas forças e saber lho comportam.

Rebate depois a argumentação do seu adversario, com referencia aos julgados municipaes, objectando que as respectivas camaras não são obrigadas a crea-los, e as que os têem é pelos haverem reclamado em "nome da sua propria conveniencia.

Relativamente aos encargos resultantes do pagamento por conta do governo a esses empregados judiciaes, dá por já existente uma proposta na camara dos senhores deputados, destinada a allivia-lo dessa obrigação.

Quanto a ser incriminado o sr. ministro da justiça, por tambem atacar a independencia do poder judicial, responde que, se assim fosse, já se teria pedido a revogação de tão odiosa lei.

A este proposito justifica e interpreta as penas disciplinares comminadas aos juizes.

Sobre este assumpto deduz ainda varios argumentos, após os quaes se traslada para a defeza da reforma administrativa.

Acha, pois, naturalissimo o empenho e aferro com que o sr. Barjona de Freitas procurou disputar a melhoria do codigo de 1878 sobre o de 1886, por isso necessariamente lhe promanar do amor proprio e entranhado affecto com que s. exa. creara aquelle seu filho mental.

Não obstante, entende haver1 entre o codigo de 1886 e o programma do partido regenerador a mais perfeita harmonia, porque, dizendo esse programma que não devem prevalecer tutelas do governo em nada que seja de interesse local, o codigo de 1886 concilia isto perfeitamente.

Pondera mais que esse codigo distingue entre interesses locaes e geraes, deixando aquelles á livre acção das localidades, e submettendo estes á fiscalisação do governo, de onde provem a conveniencia da descentralisação para os primeiros, mas nunca para os segundos.

Com o de 1886 põe em confronto o codigo de 1878 e infere dahi que o gravissimo erro deste ultimo foi precisamente confiar a administração geral do estado ás corporações locaes, sem nenhuma interferencia do governo.

Dahi tambem a grande anarchia, á qual insuspeitamente se referira o sr. marquez de Vallada.

Comprova a rasão com que eliminara a renovação dos corpos administrativos, visto os eleitores poderem reeleger os mesmos individuos que tenham estado á testa dos negocios municipaes, e porque o maior defeito dessa medida estava em promover continuas eleições.

Contesta que a camara municipal de Lisboa logre de faculdades que não possam vir a ser extensivas aos outros municipios.

Quanto ao maximo dos addicionaes, em relação ás corporações administrativas, traz á memoria que pedira informações aos governadores civis, mas que tão confusas tinham ellas vindo, que lhe fora impossivel fixar essa percentagem.

Que, todavia, desde logo inhibira essas corporações de lançarem novos addicionaes.

Alludindo á dictadura, affirma que effectivamente a fizera por varias e ponderosas rasões, não pesando entre ellas menos a necessidade de conseguir maioria na camara dos dignos pares, o que sem um acto dictactorial se lhe tornara impossivel, attento que as estações por onde corria essa eleição estavam quasi todas constituidas pôr instancias e á imagem do partido regenerador.

Reputa acertada a solução que dera á questão de Braga e Guimarães, como unica a sanar aquelle pertinaz conflicto.

Delonga-se ainda noutras reflexões, e por ultimo condemna a questão previa apresentada pelo sr. Barjona, por

Página 943

SESSÃO DE 12 DE AGOSTO DE 1887 943

importar uma suspeição politica, e pretender sem fundamento estabelecer distincções entre pares electivos e vitalicios, quando a lei não as permitte.

(Publicar-se-ha este discurso na integra, quando o orador haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Hintze Ribeiro (S. exa. não reviu):- Sr. presidente, hontem era o sr. ministro da justiça que, respondendo ao digno par o sr. Serpa Pimentel, se queixava das distincções estabelecidas neste debate pela opposição, doendo-se de que ella não averbasse de maus todos os decretos publicados dictatorialmente pelo governo, e só alguns em especial, e tanto isso lhe custava, que na tristeza e amargura do seu sentir... apodava de casuistico o sr. Serpa! Porque o sr. ministro da justiça não queria que a opposição atacasse sómente dois ministros!

Pois não eram todos membros do governo?

Não eram todos solidarios?

Que todos partilhassem então o duro castigo dos erros commettidos! Elle -acceitava resignado o seu quinhão, mas uma vez que era mau... que todos fossem por igual contemplados! Até nisso... elle era ministro da justiça!

E tão longe ia neste seu afan, tão largo e munificente era nesta sua piedosa intenção... que para a opposição poder cumprir o seu dever merecidamente punidor, era elle quem advertia que, se para isso fosse necessario, bem podia a sessão legislativa prorogar-se por mais alguns dias! comtanto... que a todos chegasse a correcção! o que elle não queria.. . era ver-se só na hora da expiação.

Pois não era costume nesta casa do parlamento discutirem-se os assumptos com a maxima largueza, e só se votarem quando esgotada a inscripção, que discutissemos então, e muito, que protelássemos o debate... e que não poupássemos os collegas!

Isto hontem, foi o thema, foi a primeira lamentação do governo, no dolorimento do seu peccado!

Hoje, é o sr. presidente do conselho, que, encarregado da variação, igualmente se levanta para nos dizer que a dictadura foi muito larga, que todos os ministros a fizeram; que não ha, pois rasão para atacarmos sómente s. exa. e o sr. ministro da justiça, deixando em paz os outros ministros que são menos responsaveis pelos erros do gabinete.

Pois se o governo é um só, como póde dividir-se a censura, que sobre todos recaia, visto que todos delimquiram.

E no seu maguado carpir o sr. presidente do conselho quasi chegava a pedir.. . que se lembrassem ao menos do sr. ministro da fazenda! Esse!... Mas elle, elle de quem o sr. Serpa ainda não ha muitos dias dissera que neste rumorejar de boatos e suspeitas era como que uma garantia no poder?!

Pois se a garantia era elle. .. para que o flagellavamos nós?

Ora eu, que sou realmente amigo do sr. José Luciano de Castro, vou ver se o posso consolar. Tenho por s. exa. uma grande admiração, não só pelo seu talento, que é muito, mas tambem pela boa fé das suas intenções, que é grande, e pela integridade do seu caracter, que ainda é maior. Deixe-me portanto lembrar-lhe o que acontecia ainda ha pouco no meu partido, e com o meu chorado chefe o sr. Fontes.

Quando presidente de em gabinete, todos os ataques, todas as investidas, as phrases mais vivas, as mais duras arguições, convergiam para elle.

E aquelle eximio estadista lisonjeava-se com isso. Porque? Porque isso mostrava quanto elle era grande! Firme e intrépido no seu posto, ouvia estrondear sobre a sua cabeça trovoadas bem mais roucas, via perpassarem no ar faiscas bem mais coruscantes, do que as que tanto inquietam e sobresaltam agora o sr. presidente do conselho.

E quando o roncar do trovão era findo, e os arremessos de fogo haviam cessado, calmo e sereno se retirava para sua casa, muito seguro e tranquillo de haver cumprido o seu dever.

Consinta, pois, s. exa. que, em homenagem aos nobres predicados que o exornam e para sua resignação e allivio, eu lhe offereça o exemplo do seu memoravel antecessor.

S. exa., bom ou mau grado seu, está hoje na mesma perigosa imminencia. Retempere, pois, o seu animo na boa lição dos que o precederam, não deixe conspurcar por ninguem a dignidade do poder que lhe confiaram, e de resto... que silvem as balas ou que estalem os foguetes, nem a aggressão nem a lisonja podem deter ou desviar do seu caminho a quem sente sobre os seus hombros as responsabilidades de um homem de estado.

E passemos adiante.

Sr. presidente, serei muito breve, tão breve que não descerei ao minucioso exame dos actos de dictadura, tão breve que me absterei de apreciar as multiplices disposições que com caracter legislativo se promulgaram quando fechado o parlamento.

É pouco o tempo, disse o sr. presidente do conselho; é pouco o que nos resta até o fim da sessão.

E são estas palavras do sr. presidente do conselho que respondem ao generoso convite do sr. ministro da justiça.

Porque hontem, dizia nos o sr. ministro da justiça, como se largo fôlego tivesse: discutam tudo e todos largamente!

Hoje diz-nos o contrario o sr. presidente do conselho, diz-nos que a camara está cansada, e é verdade, diz-nos que a sessão já vae mais de que longa, o que tambem verdade é, e diz-nos que por isso se abstum até... de mostrar que o seu partido tem cumprido fielmente o seu programma e que são infundadas as accusações que em contrario lhe teem feito. E é nesta parte que eu ainda mais rasão acho ao sr. presidente do conselho. Que s. exa. desista de demonstrar que o seu partido cumpriu o programma que traçou, acho tanto mais para applaudir... quanto fora impossivel proceder de outro modo!- Ninguem póde provar que fez... o que nunca se lembrou de fazer!

O programma, esse celebre programma que do alto da Granja havia de dictar a lei ao mundo.. . coitado! ... depois de longos caminhos .. . sumiu-se de vez rio ministerio de agricultura!

Por isso o sr. presidente do conselho o deixou hoje em paz. Hoje, porque hontem ainda s. exa., cheio de calor, e possuido de grande enthusiasmo, se esforçou por demonstrar quanto é calumniosa a fama que lhe attribuem de ser inconstante no seu modo de dizer e de proceder.

Uma perfeita injustiça, na verdade!

E eu sou o primeiro a dar testemunho disso.

Porque effectivamente, quando se trata de dictaduras, nunca ouvi s. exa. responder senão com o mesmo argumento. E verdade que é um só, mas de grande effeito parlamentar.

Todos nós o conhecemos. Tem duas partes. Na primeira com ar contricto, porte resignado, e gesto humilde, s. exa. começa assim:

"É verdade, sr. presidente, nós delinquimos; commettemos um peccado, é grande a nossa culpa; infringimos a constituição, faltámos á lei fundamental do paiz, somos réus, aqui estamos perante o tribunal, que elle nos julgue, e nos condemne".

E de repente, a segunda parte, com ar nobre, porte, altivo e gesto largo, exclama: "Mas onde estão as vestaes, impollutas, de branco vestidas, que puras nas suas consciencias se erguem contra nós? Sois vós?! Com que direito e com que auctoridade? Quem vos deu foros de juiz a vós? que fizestes ás dictaduras de 1872, de 1881 e 1884?" E dahi uma diatribe contra as dictaduras do partido regenerador, como salvo conducto para as ilegalidades deste governo, e excepção de incompetencia- opposta ao julgamento das arbitrariedades commettidas.

E este argumento, que lhe tenho ouvido tantas vezes,

Página 944

944 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

mostra bem quanto o sr. presidente do conselho é coherente em assumptos de dictadura.

Simplesmente, se nós, que somos representantes do paiz investidos no seu mandato, não temos competencia nem attribuições para julgar dos delictos do governo, naturalmente accode a perguntar de qual é o tribunal que os póde julgar?

Então s. exa. confessa o peccado, que é grande, e nem ao menos espera pela nossa absolvição?

A constituição foi violada e ninguem ha que passe uma esponja sobre esse nefando caso de querella?

Não póde ser.

Desde que não ha outros representantes do paiz, que não sejamos nós, claro é que a nós compete o tomar contas estrictas ao governo pelos desmandos que pratica.

Se aqui ha candidos vestaes, que nunca na taça do peccado(deixaram cair a sua aza branca, não sei; nem, francamente, é meu mister, indaga-lo; o que sei é que, vestaes á, parte, e nem sempre a historia disse bem dellas,, como pares ou deputados, todos temos o direito de inquirir dos delictos politicos, porque a todos nos cumpre manter á integridade da. constituição.

Julgar é a nossa attribuição, desde que um delicto existe.

O sr. presidente do conselho confessa o delicto; logo, ha de submetter-se ao nosso julgamento, sem que as vestaes lhe valham.

E só como questão previa, para assim classificar a excepção que o sr. presidente do conselho contra nós formula, é porque prompto estou sempre a defender as responsabilidades dó meu partido, começarei por me referir aos feios actos de dictadura, que s. exa. lançou á nossa conta, como se os nossos peccados podessem lavar os seus!

Brevissimas palavras pois, apenas para liquidação de responsabilidades.

Quaes são essas paginas negras da nossa historia politica, que s. exa. nós lança em rosto?

A dictadura de 1852?

Mas essa foi uma dictadura salvadora; póde ser combatida como infracção constitucional; mas é innegavel que levantou o nosso credito, que solveu os nossos compromissos, que regularisou os vencimentos dos servidores do estado pondo em dia o seu pagamento, e que numa palavra fez surgir do marasmo o nosso Portugal, dando-lhe uma vida que não tinha.

É então está dictadura, assumida em circumstancias bem difficeis, tão grande no seu arrojo, como benéfica nos seus commettimentos, que se pretende comparar com a dictadura que este governo assumiu ha pouco, quasi que no exclusivo intento de derribar a opposição nas eleições parlamentares?

A dictadura de 1852, tendo por unico alvo o interesse publico a todos serviu, e para todos se fez. A dó anno passado só serviu os amigos do governo, e só se fez para trazer ás camaras maiorias que cobrissem os protestos erguidos contra os injustificaveis desatinos do governo.

Defendam-se pois, é esse o seu dever; mas não tragam á memoria dictaduras como a de 1852, porque creiam que o confronto os esmaga.

Se eu quizesse tecer a apologia dessa grande dictadura não precisava de palavras minhas, tinha as de um ministro da coroa, de que ninguem póde dizer affecto ás ideaes do meu partido.

Em 1880 dizia um testemunho insuspeito:

"Devo dizer a v. exa. e á camara que, folheando esse volume da legislação de 1852, a que alludiu o sr. Hintze Ribeiro, não posso, deixar de experimentar, um sentimento de veneração e respeito pelos homens eminentes que firmaram com o, seu nome aquelles trabalhos, e quando considero as provas, de intelligencia, o talento pratico, as grandes e elevadas qualidades do governo, reveladas pelo sr. Fontes Pereira de Mello na ocasião em que geriu a fazenda publica, nas circumstancias mais angustiosas e afflictas, conseguindo obter resultados tão notaveis, que póde datar-se dessa epocha o melhoramento do nosso credito, não posso deixar de prestar o testemunho da minha profunda admiração e respeito pelo seu trabalho."

Era a apotheose do sr. Fontes, feita pelo sr. Barros Gomes, então ministro da fazenda.

A dictadura do actual sr. presidente do conselho é que de certo não encontrará tão preclaro cantor.

Pelo que toca á dictadura de 1881, tambem rasões, que para a de 1886 se não podem allegar, a tornaram inevitavel.

Caira o ministerio progressista, em consequencia de uma votação da camara dos pares e organisara-se uma situação regeneradora presidida pelo sr. Sampaio..

Estava então pendente uma questão diplomatica, que tornava perfeitamente justificavel o adiamento das côrtes, não tendo de mais a mais o novo governo a confiança politica da camara dos senhores, deputados.

Resolveu-se essa questão, e findo o adiamento apresentou-se o ministerio ao parlamento, e pediu-lhe os meios necessarios para governar; a camara dos senhores deputados negou-lhos.

Aberto o conflicto, o poder moderador decidiu.

A opinião do paiz estava com o governo; o governo, desajudado das camarás, teve de decretar a lei de meios. Cobraram-se as receitas e applicaram-se ás despezas pela lei do anno anterior. Nenhuma perturbação, de ordem publica surgiu. E a isto se limitou a dictadura.

É esta a dictadura que se pretende comparar com a do anno passado?

Pois façamos então o confronto.

Em 1879 succedia a um governo regenerador uma situação progressista; o novo gabinete encontrava o orçamento quasi votado, tinha largo tempo para o fazer passar; apesar disso pedia a lei de meios, e as maiorias de então, já depois de aberto o conflicto, votaram-lha sem restricções, e só pediam que, cumprido esse dever constitucional, o conflicto se resolvesse pela dissolução, pois que o governo tinha a confiança da coroa. Era nobre o seu proceder.

Em 1881 succedia a um governo progressista uma situação regeneradora; o novo gabinete era recebido na ponta das bayonetas; e quando unicamente pedia a lei de meios, de que indispensavelmente precisava para governar, a maioria da camara dos deputados respondia-lhe intransigente que fizesse passar o orçamento, se para isso tinha força! Isto em junho, quando o anno economico estava prestes a findar!

Ou a opposição de 1879, ou a de 1881!

E queixam-se da dictadura os proprios que obrigaram é governo á assumida!

Mas ainda o confronto não para aqui.

Em 1886 volta de novo ao poder o partido progressista, e pedindo o esquecimento de passados aggravos, pede, em março, quando tanto tempo havia para a discussão do orçamento, a lei de meios, precisamente o mesmo que nos haviam negado em 1881!

E ainda uma vez a opposição lha votou, dando ao governo que entrava amplos meios para governar.

Pois, apesar disso, pouco depois de encerradas as côrtes, este governo, zombando das tréguas que pedira, e das declarações que fizera sem necessidade que o, justifique, sem sequer uma rasão de estado que possa apontar, entrou na mais estravagante e na mais desordenada das dictaduras que temos visto. E governa assim, no mais puro arbitrio, durante um anno, porque quando em janeiro abriu as côrtes ... foi para as fechar!

E ainda fallam da dictadura de 1881!

Compelliram-nos a assumi-la... e revoltaram-se depois contra a sua propria obra!

Agora a dictadura de 1884.

Em 1884 os dois partidos militantes, o regenerador e o progressista, pactuaram entre si um accordo politico. Tro-

Página 945

SESSÃO DE 12 DE AGOSTO DE 1887 945

caram-se as declarações respectivas nas duas casas do parlamento.,

Por um lado foi a declaração feita pelo sr. presidente do conselho que era então o sr. Fontes, por outro lado veiu a declaração do sr. José Luciano de Castro.

Esse accordo tinha por fim as reformas politicas; mas, com essas reformas vinha uma nova lei eleitoral, e era ahi que a opposição progressista verdadeiramente concentrava todas as suas esperanças.

Uma lei que lhe desse deputados; um accordo que lhe desse benevolencias, ahi todo o seu empenho.

Para isso é que transigia nas reformas politicas o governo de então, inspirando-se mais nos elevados interesses da politica geral, do que no mesquinho desejo de pôr em debandada os seus contrarios, propoz e fez votar uma lei eleitoral que, no dizer da propria opposição, tantas garantias assegurava nos seus preceitos, e tão ampla era no favor dispensado ás minorias, que bem o podia considerar a mais liberal da Europa.

Fez-se a lei eleitoral e trocaram-se as bases de uma reforma na organisação da camara dos pares, a fim de que a rotação dos partidos se conseguisse por modo mais consentâneo com os principios politicos.

E porque, votadas estas medidas de tão longo alcance, medidas que, affectavam a funcção parlamentar, consequente era fecharem se as côrtes; e porque as reformas do exercito e da armada haviam ficado pendentes na camara dos pares, já com o voto affirmativo das respectivas commissões, e depois de votadas na outra camara, decretou-as o governo dictatorialmente, isto muito antes das eleições. E a mais não passou a sua dictadura.

O que pensa v. exa. que succedeu. Julga talvez, pela sanha de agora, que a opposição progressista de 1884 rompeu para logo o accordo politico que fizera, e contando exclusivamente com as suas proprias forças para a lucta eleitoral, abriu fogo em toda a linha contra a nefanda dictadura que aquelle governo nefasto se lembrará de emprehehder?

Não, muito pelo contrario. A opposição, que concordara nas reformas politicas para conseguir a lei eleitoral, quasi silenciosamente deixou passar a dictadura, mantendo perante ella a attitude mais benévola, e acceitando, porque esta é a verdade, acceitando do governo, não só imparcialidade, mas largo favor nos actos eleitoraes... até que estes findaram, e que ás côrtes se reabriram com quarenta deputados de opposição... não raros dos quaes, á sombra do accordo, haviam alcançado os seus mandatos.

E só então... é que a dictadura se tornou alvo das mais virulentas invectivas; e só então... é que as reformas politicas deixaram de ter rasão de ser, e se quebrou o accordo!

Na mutua fé desse accordo se fortificou a opposição ao sabor dos seus particularissimos interesses; depois... faltou e rompeu-o.

Para que nos faliam agora na dictadura de 1884? Era obnoxia? Era attentatoria da constituição do estado? Porque a não combateram então? Então ella era toleravel, quando as eleições batiam á porta, e a opposição queria deputados; e só depois é que se tornou tão condemnavel que tudo por ella se rompeu? Ora, francamente, é bem melhor que nos não venham fallar da dictadura de 1884!

Não têem auctoridade para a arguir os que primeiro a consentiram pelo silencio, e só depois de haverem faltado a um pacto solemne, que primeiro deu alento e esperança, recobraram voz para se erguer em paladinos da legalidade e do decoro parlamentar.

Liquidadas ás nossas dictaduras, apreciemos agora a do governo.

E a este respeito começarei pela extraordinaria declaração que hontem nos fez o sr. presidente.

Affirmou s. exa., que, ao tomar sobre os hombros a árdua tarefa de compor o ministerio, dissera ao chefe do estado que sem dictadura lhe não era possivel governar.

Esta declaração ouvira eu já ao sr. Barros Gomes, e mal a quizera acreditar!

Agora, repete-a o sr. presidente do conselho como prova da sua franqueza para com o parlamento!

Extraordinario!

Pois o sr. presidente do conselho logo ao constituir o gabinete, e como questão previa, expoz ao augusto chefe do estado a necessidade de uma dictadura, e ao apresentar esse gabinete ás camaras legislativas, perguntado sobre se era sua intenção entrar em dictadura, responde por esta forma:

"Quem julga possivel que no parlamento portuguez se levante um ministro para declarar, que ha de fazer dictadura?!

"As dictaduras nascem de imperiosas e indeclinaveis necessidades publicas, que se impõem aos poderes publicos. (Apoiados.)

"Não se explicam pela legalidade; justificam-se pelos seus resultados.

"Quer o illustre deputado saber; se o governo tem intenção, de usar desta faculdade, ou de proceder em conformidade com a constituição?

"O governo não póde adivinhar, não póde prevenir as circumstancias que podem occorrer; não pôde, portanto, prometter se ha de fazer 6u não fazer á dictadura; isso excede a sua previsão. O governo o que póde dizer, é que õ seu pensamento é fazer manterias leis."

Mas, insistia alguem na camara dos senhores deputados, a questão de Braga e Guimarães? Quando se resolve? Promulga-se em acto de dictadura? Ou espera-se pela convocação das côrtes?

E o sr. presidente do conselho, expondo a sua idéa que era de uma medida geral, repetia a pergunta para responder assim:

"Mas quando realisará o ministerio esta idéa, pergunta s. exa? Quando eu apresentar e submetter ás estações competentes a proposta da reforma administrativa."

E acrescentava:

"Diga o illustre deputado a Guimarães que espere por que seja a approvada a reforma administrativa, em que vem a idéa que ha de satisfazer, não só aquella, cidade, mas todos os concelhos do reino que estiverem em certas circumstancias.

"Este é o meu pensamento."

E fechado o parlamento, sem circumstancias que de novo occorressem, ou que podessem exceder a previsão do governo quando elle estava aberto, entra em dictadura, promulga, sem submetter ás estações competentes, que em materia legislativa só podiam ser as côrtes, a reforma do codigo administrativo, e tendo assim occultado o seu proposito, e ido de encontro ás suas declarações, vem agora fazer alarde... da sua franqueza para com o parlamento?!

Verdadeiramente extraordinario!

E outra declaração curiosa! Sabe v. exa. para que este governo fez dictadura? É o sr. presidente do conselho que o diz: foi porque o ministerio regenerador a havia já feito, e elle então.. . quiz igualar o seu partido!

Nós haviamos peccado... por isso elle quiz peccar tambem!

Era um attentado contra a constituição, e, em tempo bem o tinha elle verberado com os fulgores da sua eloquencia tribunicia, e com os dardos flamejantes da sua palavra exaltada; era um attentado; era mesmo um crime. .. mas como nós o haviamos commettido...!

Se o governo regenerador houvesse tido a pujança de praticar actos dictatoriaes, s. exa. por certo se não lembrava de fazer dictadura?!

Mas tendo nós sido dictadores... o que diria o seu partido... se elle não fosse dictador tambem?

Que importava que em 1874, s. exa., com o seu verbo inspirado e a sua convicção aquecida no sacro fogo de uma

Página 946

946 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

indignação sublime, houvesse combatido as dictaduras, bradando assim:

"Dizemo-nos um paiz livre, apregoamos todos os dias o nosso liberalismo, encarecemos os direitos e franquias de que gosamos, e todavia somos o paiz mais autoritário, mais dominado pelas influencias do poder, mais sobranceira e arbitrariamente governado de quantos praticam o systema representativo. Não ha aqui o despotismo brutal da força, mas a liberdade não passa de uma formula mais ou menos, transparente, ou de uma ficção mais ou menos vã, que mal dissimula e encobre as demasias e abusos dos governos. Pela eleição, profundamente viciada, apesar dos aperfeiçoamentos da nova lei eleitoral, estes assenhoreiam-se das maiorias parlamentarei. Pela dictadura dispensam o concurso dessas maiorias, põem de lado a constituição, e confiscam em seu proveito as mais preciosas prerogativas da, soberania nacional.

"E isto systema representativo? Poderá e deverá continuar este desprezo dos principios constitucionaes, esta relaxação politica?... "

Relaxação politica!... Mando estas palavras com vista ao sr. ministro da justiça, para que, como hontem, as repudie em nome da consideração que o governo reclama, e do respeito que é devido ao justo pudor desta casa do parlamento.

E dizia mais o sr. presidente do conselho; dizia assim:

"Não haverá remedio para tão profundos males? Não haverá meio de acabar as dictaduras?

"Já disse, que quando tratámos da reforma da constituição no anno passado, desejava que fosse nella inserida uma disposição attinente a este fim. Não passou essa proposta, na qual se prevenia a repetição destes actos violentissimos chamados dictaduras.

"Pois bem. Lavremos ao menos um protesto vigoroso contra essas indesculpáveis infracções de constituição, e manifestemos o desejo de que se inaugure uma nova epocha de fiel observancia das leis fundamentaes do reino.

"A minha proposta póde ser votada por todos quantos prezam o systema representativo; é menos a condemnação do passado, do que uma generosa aspiração em relação ao futuro; é mais uma affirmação de boa, doutrina constitucional, do que a censura vehemente e apaixonada dos erros e irregularidades, que todos deplorámos.)

Mas isto era em 1874, quando s. exa. estava na opposição.

Em 1886,- o sr. José Luciano de Castro, investido nas mais altas funcções do governo, só tinha em desejo, um credo, uma aspiração suprema; e essa era... a de fazer dictadura!

Protestos antigos, affirmações passadas, as grandes phrases - da fiel observancia das leis fundamentaes do reino -, da affirmação das boas doutrinas constitucionaes e da- censura vehemente e apaixonada dos erros de outros tempos... tudo o prazer do mando expulsara para bem longe.

As preciosas prerogativas da soberania nacional podiam lá prevalecer, sobre o prurido... de igualar o seu partido, mostrando que tambem com elle é este paiz o mais sobranceira e arbitrariamente governado de quantos praticam o systema representativo?!

Tambem, já é infelicidade de s. exa., sempre que se tem erguido na opposição para levantar e defender os grandes principios do constitucionalismo e das garantias"parlamentares. .. se tem depois, encarregado de os contradizer no governo.

A proposito da lei de meios, proposta e votada em 1885, dizia s. exa.:

"Votar pela simples disposição de um paragrapho um orçamento inteiro para o anno futuro, é uma irrisão; (Apoiados.) é um escarneo; (Apoiados.) é desconhecer; é ludibriar; é desvirtuar o nosso sacratissimo direito de fiscalisar a applicação dos dinheiros publicos, direito que não cedemos, que não podemos ceder a ninguem." (Apoiados.)

E todavia... foi precisamente isto o que s. exa., como chefe do governo, propoz e fez no anno passado e neste anno!

E isto... já bem esquecido deste impetuoso rasgo oratorio:

"Sei que o sr. ministro da fazenda, tendo por si a rasão das maiorias, ha de vencer.

"Ha de vencer hoje.

"Não sabemos porem quem vencerá amanhã. (Apoiados.)

"Mas este precedente não póde ficar nos registos parlamentares.

"Estou convencido que o governo, depois de triumphar o seu capricho, que não é outra cousa, será o primeiro a reconhecer o mal que praticou, Q nunca mais virá ao parlamento apresentar uma proposta desta ordem.

"Espero que ninguem mais seguirá este precedente, porque quero ainda crer que o systema representativo não está de tal modo decadente e abatido entre nós, que haja governo que se prevaleça de tal precedente para o imitar e reproduzir. (Apoiados.)"

Como s. exa. então se preparava para o futuro!

Mas emfim, qual foi o intuito da dictadura exercida por este governo?

Foi, segundo a propria confissão de s. exa. a realisação da reforma administrativa, de modo a poder trazer á camara dos pares elementos mais favoraveis ao partido progressista.

Está escripto no relatorio dessa reforma!

E, na defeza desta peregrina, confissão, diz o sr. presidente do conselho:

"Pois eu não podia ter ido bem mais longe? pois não podia ter feito desde logo uma reforma eleitoral? Podia, não o fiz, pelo muito respeito que tenho pelos corpos co-legisladores!"

Como se o desrespeito pelos corpos legisladores não fosse precisamente o mesmo publicando em dictadura uma lei eleitoral, ou fazendo em dictadura um codigo administrativo que, reconstituindo a seu arbitrio os corpos eleitoraes, obrigou o fiel da balança a pender para o partido progressista.

E depois disso, depois de uma larguissima dictadura, em que o governo reformou os serviços a seu talante, introduzindo descricionariamente elementos novos na administração publica, vem o sr. presidente do conselho propor um pacto para não haver mais dictaduras!

Ora, sr. presidente, ao ouvir enunciar esta proposta, cabe-me primeiro o direito de perguntar quaes são as garantias que nós podemos esperar de s. exa. para o cumprimento desse pacto?

Porque todos temos de certo bem presente na memoria o que em 1885 se passou quanto ao celebre accordo para as reformas politicas.

Desde que o partido progressista rompeu esse. accordo sem as reformas politicas estarem votadas, desde que esse precedente se abriu, sem que cousa alguma o houvesse, até ao presente, justificado, como poderemos nós ter confiança num pacto como aquelle de que nos falla o sr. presidente do conselho?

Eu não duvido da palavra honrada de s., exa. mas tenho rasão para duvidar das promessas politicas de um partido que já uma vez deixou de cumprir um pacto, em que lealmente se assentara.

Sr. presidente, em materia de dictadura, que todos em principio condemnam, porque um a recordação dos tempos absolutos, em que na concentração dos poderes, se julgava encontrar a força dos governos, o que sobretudo convem é que cada partido se inspire na mais justa e verdadeira comprehensão dos seus deveres politicos, a fim de que a constituição não seja violada a todo o momento por mero capricho do que está no poder.

Um governo deve ter por si a opinião publica; se a não

Página 947

SESSÃO DE 12 DE AGOSTO DE 1887 947

tem, não é aos meios de pressão e violência, que se póde soccorrer para a conquistar.

Eu comprehendo que se derrube uma maioria parlamentar, o que não comprehendo é que se não possa organisar um ministerio, sem se impor por uma dictadura.

E por isso eu lamento, não a franqueza com que hontem nos fallou o sr. presidente do conselho, mas a triste impressão que nos fica de que um ministerio houve em Portugal, que, chamado pela confiança. da coroa, lhe impoz como questão de vida.. . uma dictadura!

Como se a confiança da corôa podesse andar alheada á opinião do paiz, e como se appellando para a opinião do paiz, se não encontrasse sempre ahi um seguro arbitro para a resolução dos grandes problemas governativos.

Terminando, pedirei, pois, ao sr. presidente dó conselho, que, firmando-se no voto do parlamento, bem mais do que na pressão das dictaduras, tome claramente sobre si as responsabilidades de governo que lhe cabem, não procurando declina-las para ninguem.

Como chefe do gabinete, e como garantia desta situação politica, consoante o disse o sr. Serpa, tem s. exa. altos deveres a cumprir, cumpra-os sem receio das responsabilidades, que dahi lhe advenham.

Como chefe do gabinete, cabe-lhe mais do que a ninguem a direcção politica desta situação.

Que s. exa., firme no seu posto, procure por todos os meios ao seu alcance, impedir que a constituição seja violada, como á cada passo o tem sido até hoje, e fazer com que na administração do estado se mantenham sempre os sãos principios da moralidade e do zelo pelas conveniencias publicas, com preterição de tudo o mais.

Tenho dito.

(O orador não reviu.}

O sr. Pereira Dias: - Eu pedi a palavra unicamente para declarar que me dispenso de responder aos dignos pares que teem discutido este assumpto, e procedo assim pelo desejo de ainda hoje podermos votar este projecto.

O digno par o sr. Hintze Ribeiro tambem quasi se limitou a defender os actos da sua responsabilidade e eu sobre este ponto nada tenho a esclarecer.

Preciso, comtudo, fazer uma declaração e esta declaração é propriamente minha.

O sr. presidente do conselho declarou nesta casa que, se em verdade os seus adversarios se comprometterem a nunca mais fazer dictaduras, elle não tinha duvida de se comprometter a outro tanto.

Eu declaro que fico fora deste compromisso. Eis o meu primeiro acto de rebeldia partidaria, mas estou intimamente convencido de que continuará a vigorar o celebre proloquio de frei Thomás. Isto não tem relação alguma com o digno par.

Tenho dito.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Thomás Ribeiro: - Sr. presidente, eu não quero de modo algum impedir que este projecto se vote hoje, visto ser essa a vontade bom manifesta da camara.

Não será por minha causa que elle se deixe de votar, pois não costumo faltar ao que prometto.

Portanto, vou dizer duas palavras ao nobre presidente do conselho.

Pouco mais de duas palavras e quasi só a elle.

Eu considerei sempre o ministerio homogéneo e solidariamente responsavel o que aliás não exime os conselheiros da corôa de assistirem todos, á discussão de um bill em que todos são interessados, visto que todos mais ou menos delinquiram, violando a constituição.

Estranho é o que hoje aqui se vê, mas é lógico. É preciso que o desdem pelo poder legislativo continue a accentuar-se; e nisto ao menos o governo tem sido coherente.

A esta discussão tem assistido ás vezes um só ministro; hoje temos dois; o sr. presidente .do conselho e o sr. ministro da justiça. É caso para agradecer,

Sr. presidente, o meu costume é, de preferencia, referir-me, tendo de censurar ou arguir, ás pessoas que estão presentes; mas hoje, se o fizer, levanta-se contra mim o sr. presidente do conselho por eu ter deixado de parte os outros collegas; por me ter apenas referido aos dois que se dignaram, vir responder á camara dos pares.

É a lógica, é a consequencia do discurso ha pouco proferido em resposta ao digno par e meu distincto amigo o sr. Barjona de Freitas.

Nestas circumstancias que fazer? que poderia eu dizer que não parecesse obedecer a, uma das duas correntes de sympathia, visíveis e palpaveis no seio do gabinete?

Uma das correntes dirige-se incontestavelmente á porta do sr. presidente do conselho; ao que s. exa. parece não ser insensivel.

A outra vae na direcção do ministerio da fazenda; ao que tambem não é insensivel o nobre presidente do conselho.

Note-se a minha imparcialidade.

Ora dir-se-ia que, mesmo da opposição, ha quem se lance numa ou noutra destas correntes, e eu gosto mais de ir por terra; entre as duas.

O sr. Serpa, que eu não ouvi, mas disso resaram as folhas e repetiu-o deliciado o sr. José Luciano, o sr. Antonio de Serpa foi tão amavel para com sr exa. que até asseverou ser elle uma garantia para a opposição.

Pelo contrario o sr. Barjona apenas arguiu os- actos da dictadura dimanados do ministerio do reino e da justiça) e poupou o outro turno ministerial.

Isto não passou desappercebido ao sr. José Luciano, e o seu coração maguou-se.

Eis a situação em toda a sua transparencia.

Nestas circumstancias não sei qual das correntes devo seguir.

Faz-me isto lembrar a situação daquelle saloio que tinha de atravessar um rio.

Era lusco-fusco, a corrente ia impetuosa; o saloio via pouco e sentia os passos mal seguros. Assim é que, pondo o pé numa das alpondras, affirmava com piedoso alvoroço: Deus é bom! e ao pôr o outro pé na outra alpondra dizia com attenuadora prudencia: Mas o diabo tambem não é mau; (Riso.) e nesta manhosa alternativa passou o rio. Porem, voltou-se, e, certo de que cessara o perigo, concluiu com este scéptico e desagradecido epilogo de villão: Que no fim de contas tanto caso faço eu de um como do outro. (Riso.)

O que no saloio era desprezo é respeito em mim e com estas explicações digo como elle que tanto caso faço de uns como dos outros.

Certo de que os nobres ministros presentes não julgam que, diga eu o que disser, refira-me a quem me referir, não tenho por nenhum preferencias nem antipathias, vou dizer muito á boa paz e á puridade, uma só verdade, e por hoje a unica verdade grave e dolorosa que pretendo expor.

O procedimento do governo nesta dictadura é de tal forma exorbitante, de tal forma condemnavel, de tal forma injustificado, de tal forma sem attenuarites, que, rio meu entender, sem querer aggravar ninguem, pessoalmente, porque não é esse o meu intento nem está na minha Índole, nem nos meus habitos, nós só deviamos occupar-nos aqui desta questão, não como camara de pares, mas como tribunal de justiça.

Se houvesse neste paiz, como houve noutros tempos, o mesmo amor pelas instituições, pelo respeito reciproco dos poderes do estado e pelas franquias liberaes, uma accusação crime em vez de discussão parlamentar devia ter sido feita na camara dos senhores deputados.

Temos tido muitas dictaduras, temos tido larguissimas dictaduras, temo-las tido sempre justificadas, ou, quando menos, justificadamente desculpaveis.

Não fallo nisto com a idéa de me defender pessoalmente,

Página 948

948 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

porque não está ainda a minha assignatura em acto algum de dictadura; mas acceito á responsabilidade inteira daquelles com quem servi.

Posso asseverar em minha consciencia que desde a dictadura da ilha Terceira até hoje ainda não houve nenhuma em que se mostrasse maior desprezo pelas formulas e pelos principios constitucionaes, nenhuma tão escusada, nenhuma tão prejudicial em parte e em parte tão esteril como esta. S. exa. veiu dizer-nos impudentemente, que tinha feito com o chefe do estado, á entrada no poder, um pacto que traz a lembrança o nosso glorioso épico; pois que nos faz recordar:

"O concerto ... duro e injusto,

"Que com Lépido ... Luciano fez Augusto."

Não se entra por esta forma no poder.

Não se declara perante o parlamento e perante a nação que, ao passo que se estava com as mãos sobre os Santos Evangelhos jurando manter a constituição, se dizia ao chefe do estado que ella havia ide ser completamente violada. Isto não se diz senão por uma grande imprudencia, que ainda ha pouco tempo seria devidamente castigada. Confessar um crime chamando o Rei á auctoria só o sr. José Luciano é capaz de o fazer.

Mas s. exa. está bem; aproveita-se de uma degeneração politica que vae descendo, para a abjecção pela escada violenta das degenerações.

Nós que somos aqui? Um senado accomodaticio, que pede, como honra, a cumplicidade nos crimes do poder executivo.

Não chegámos ainda aos tempos de Tiberio porque Tiberio ainda não appareceu.

Ainda não pedimos a honra de levar aos, hombros ao Campo Mareio os restos de Augusto; mas caminhamos paira isso. Deus sabe onde chegaremos, nesta abdicação completa das nossas faculdades inalienaveis.

Menos me agrada este absolutismo hypocrita do que o francamente proclamado.

Sr. presidente, está dictadura não é comparavel com nenhuma outra dictadura, nem na rasão de ser, nem na essencia, nem na forma; em cousa nenhuma absolutamente.

O sr. presidente do conselho vem propor-nos que tos respeitemos reciprocamente de hoje por diante!!!

Nem sabemos, de pasmo, como aprecia-lo.

Elle, que trouxe um dia ao parlamento uma proposta de lei de responsabilidade ministerial, em que sé declarava que o ataque á constituição do estado era um crime de traição, proposta esta que foi declarada necessaria, urgente, imprescindível, pelos oradores mais notaveis do partido progressista, chegando a dizer a commissão parlamentar que sobre ella deu parecer, que era preciso começar a praticar-se definitivamente o systema representativo, o que só seria quando se respeitasse a constituição, vem hoje, esquecendo tudo quanto se lê nos registos parlamentares e nos artigos dos seus programmas, vem hoje, sem escrupulo algum fazer passar em dois dias nesta casa do parlamento um bill de indemnidade, que para ser devidamente discutido necessitava cada orador de, pelo menos, oito dias para analysar todos os decretos que foram promulgados dictatorialmente.

Aqui está p corpo de delicto; é quando o não fosse pela qualidade dos factos, que são aqui apreciáveis se-lo-ia ao menos pelo peso do volume.

O orador mostra q volume que contem os decretos dictatoriaes. Aqui está. (Riso.)

Foi com este fardo que o governo entrou pela porta do contrabando constitucional na camara dos dignos pares do reino.

É pouco para esta anciã de lhe conceder absolvições e indulgencias.

É muito pouco.

Deixem ao menos que eu proteste energicamente contra este procedimento, que é uma porta aberta a futuros, proximos, inevitaveis abusos.

E agora que protestei, pois que me é impossivel discutir, restrinjo-me a umas perguntas ao governo e a umas queixas sem resultado.

Aguarde a camara. Eu sei com que amisade quer perdoar. Ha de ser hoje. Descanse.

Fallemos do novo codigo administrativo.

O sr. presidente do conselho prometteu apresentar ás côrtes uma proposta de lei annual para a fixação da percentagem maxima consentida aos corpos administrativos sobre as contribuições do estado.

Desejava que s. exa. me dissesse em que tempo e em que termos apresenta o nobre presidente do conselho a sua proposta?

No inicio da execução do seu codigo e quasi passado um anno do seu decretamento não logrou formular a proposta respectiva; pede uma auctorisação para decretar os máximos da percentagem e aguarda ainda das auctoridades superiores os esclarecimentos necessarios para os decretar. Pois bem. No entanto uma cousa me poderá dizer:

Qual é a base que s. exa. escolheu para lhes determinar a auctorisação de modo a não lhes deixar completamente presa a sua acção administrativa?

Se s. exa. quiz aniquilar completamente a acção daquelles corpos, entendo que o conseguiu, mas se pelo contrario os quiz sómente vigiar e tutelar errou nos seus cálculos.

Não ha camara municipal, junta de parochia ou corporação districtal que possa de hoje por diante contar com os meios de acção, que, á primeira vista, parece garantir-lhes o codigo. Não ha.

Figuremos uma hypothese:

Teem, por esta lei, as camaras municipaes, as juntas de parochia e as juntas geraes attribuições que tornem desde logo definitivas, bastando as suas deliberações exclusivamente; e teem outras, as mais importantes, que para se tornarem definitivas é necessario que a auctoridade superior de o seu consentimento.

Entre essas está contratar, por exemplo, o abastecimento de aguas, a illuminação das povoações. Tudo quanto é importante.

A corporação administrativa delibera. A auctoridade superior concede ou deixa passar o lapso de tempo dentro do qual podia annullar; e a deliberação do corpo administrativo torna se para todos os effeitos definitiva. Já se vê que a realisação dessa obra ou á dotação desse melhoramento obriga a um augmento de despe z a, e a corporação respectiva vae sujeitar-se a um encargo novo contando com um certo maximo de percentagem para lhe fazer face. Esse maximo porem é todos os annos sujeito á apreciação do parlamento. Todos os annos, note-se bem. Tem o parlamento obrigação de votar os maximos que cada corporação lhe pede? Fora escusada a lei; póde dar-lhe menos? Pôde; más como ha de a corporação satisfazer os seus encargos?

Quem poderá contratar com as corporações administrativas sem que os seus membros deem á companhia hypothecas ou fiadores especiaes? Pois não é de risco o seu contrato?

Mas ainda no codigo fica outro embaraço.

As corporações deliberam; as auctoridades superiores consentem; a camara procura contratar. Mas as faculdades que ainda ficam aos tribunaes administrativos de interporem as suas acções fica de pé, e sem tempo fixado para prescrever ò seu direito!

È isto verdade, sr. presidente do conselho?

(Signal afirmativo do sr. presidente do conselho.)

Mas nesse caso fica sempre pendente a espada de Damocles dos tribunaes administrativos sobre a deliberação das corporações.

Página 949

SESSÃO DE 12 DE AGOSTO DE 1887 940

E essencial determinar qual a duração do praso dentro do qual os tribunaes podem intentar acção.

Não se diz na lei.

Nestas circumstancias tanto pela incerteza do maximo annualmente variável como pela acção indefinidamente ameaçadora dos tribunaes, não haverá ninguem que queira fazer contratos com estas corporações.

E depois qual é a base para decretamento dos maximos? O que pediram? Menos do que pediram? Mais? Um maximo geral para todas as juntas geraes? Outro para todas as camaras? Outro para todas as juntas parochiaes? Mas nesse caso quanta curteza para umas e quanta largueza? tentações para outras! Será um maximo para cada junta geral? Um, para cada camara municipal? Um para cada junta de parochia? Tudo isto, qualquer destes methodos, multiplicará absurdos, e não é isto lei que saia do parlamento.

O codigo nesta parte é inexequivel. Note bem o nobre ministro do reino: - inexequivel.

A primeira prova está em que no começo da sua execução o governo não póde formular a respectiva proposta e pede auctorisação para decretar os maximos. Lá verei as difficuldades e nós veremos as injustiças.

Outro assumpto vou propor á consideração do sr. presidente do conselho, assumpto já lucidamente esboçado pelo meu illustre amigo o sr. Barjona.

Esse ponto é relativo a uma iniquidade: á situação em que ficamos expostos, classe miseranda, infelicissima da nossa sociedade, que tendo obrigação de a respeitar e proteger, joga com ella a sua vida, a sua educação, o seu futuro. Um jogo em que todos perdem, e que é um crime social.

Pois fez-se de afogadilho um codigo administrativo que precisa de um regulamento para se executar na parte relativa aos expostos e ha mais de um anno que os expostos foram novamente engeitados pelas juntas geraes e ainda não adoptados pelas camaras municipaes!

Mais uma das bellezas da dictadura.

Pergunto ao sr. presidente do conselho:

Já se fez o regulamento para a administração e arrolamento dos expostos dos sete até dezoito annos, como é disposto na nova lei?

Já se fez o regulamento para expostos até aos sete annos? Neste intervallo de mais de um anno onde estão os abandonados?

Abandonados.

As juntas geraes já não protegem os expostos até aos sete annos e ainda não tomaram contados de sete a dezoito; as camaras ainda não sabem quaes são e onde estão os seus respectivos expostos. Ha mais de um anno que estamos vendo estas excellencias da dictadura.

E note v. exa. que não fallo da inconveniencia da medida que chamou de novo ás camaras serviços de que nunca se desempenharam satisfactoriamente.

Pergunto ao nobre presidente do conselho se já as camaras municipaes na maior parte dos conselhos tomaram conta das creanças que até aos - sete annos são entregues á sua tutela?

Ou não me responde ou dir-me-ha que não.

Ha treze annos que num districto que eu conheço e prezo se regulou cuidadosamente o serviço dos expostos, então a cargo da junta geral de districto.

Sabe v. exa. qual era a media das exposições nos ultimos dez annos neste districto, aliás um dos mais morigerados do reino?

Era de seiscentos e tantos.

Sabe v. exa., depois que esse serviço se reformou, qual foi a media das entradas dos expostos?

Nunca chegou a trinta, annualmente.

Quer dizer passou de seiscentos e tantos a trinta; a menos da vigésima parte, e anno houve em que o numero dos expostos foi de vinte e um.

Gastava-se anteriormente naquelle districto 13:000$000 réis no serviço dos expostos, póde dizer-se em pura perda e passou-se a gastar apenas 3:000$000 réis, somma que parecerá diminuta se se attender aos cuidados que havia na conducção para o hospicio, em que ás vezes se gastavam tres e mais dias, conforme a distancia e o tempo, attendendo á administração e pessoal do hospicio, em que entravam cuidados de medicina, amas internas, remédios, roupas, banhos, tudo quanto a hygiene aconselha, attendendo tambem aos enxovaes, que em diversas occasiões se forneciam.

Tomaram-se tambem providencias para que a pessoa que em certos casos fosse entregar naquelle hospicio a seu filho ficasse a coberto da maledicência publica, ou da curiosidade indiscreta; que ali era assegurado o segredo para as fraquezas a que a inexperiência está sujeita. Nem os nomes dos pães se pretendia saber. Um responsavel pela creança a quem se entregassem findos sete annos, e que assegurasse ao hospicio em certas circumstancias os gastos com a creança depositada.

Nada mais.

Ora aqui está o que acontecia num districto no qual não ha noticia, nem de infanticídios, nem de abortos violentos durante os treze annos em que vigorou este regimen.

O nobre presidente do conselho conheceu o estado da administração lisongeira dos expostos naquelle districto, e ainda quiz ter mão no disbarate, fundando-se em que no seu codigo ha um artigo que diz será regulado em providencias especiaes o que aos expostos diz respeito. Neste artigo fundamentou algumas instrucções, embora timoratas, para o seu governador civil.

É porem tal a incuria, custa-me a dizer a inépcia de muito dos seus delegados, ou a sua má vontade, que ali não fizeram caso das instrucções de s. exa.

S. exa. não poderá negar isto.

Vozes: - É no districto do Porto?

O Orador: - Não, é no de Bragança (Apoiados.)

E nesse districto, onde houve realmente cuidado por este trabalho e onde se conseguiu o que acabo de mencionar.

Fui governador civil de Bragança, cuidei deste serviço, mas vou dizer a quem mais e principalmente se deve o primor daquella administração modelo. Vou dizer o nome de um facultativo da mais erguida e merecida fama, de um conscienciosissimo funccionario, mais que consciencioso, fanático, no cumprimento do seu dever e que se tornara em verdade o pae adoptivo daquella classe miseranda.

Chama-se elle Zeferino José Pinto, o benemerito a quem me refiro. Ha de haver nesta camara quem o conheça, (Apoiados.) e quem fará justiça aos seus meritos e ás suas virtudes.

O sr. General Sá Carneiro: - Apoiado, apoiado. Eu conheço o.

O Orador: - Estimo que s. exa. o conheça, porque é bom podermos prestar em vida o preito devido aos benemeritos, ordinariamente maltratados ou ingratamente apreciados.

Quanto mais elles trabalham, quanto mais illustram o seu nome tanto mais a inveja os procura e os persegue.

Não digo isto pelo sr. presidente do conselho, porque eu sei que s. exa. tem mostrado desejos de por qualquer modo conservar o que estava. Mas na politica - muitas vezes não governam só os ministros, governam tambem procônsules e os emires. Os ministros fingem que governam, emquanto os deixam fingir.

Eu sei que aquella instituição estava ameaçada desde que, ao deixar o districto, quizerem honrar a minha passagem pela sua administração, dando o meu nome ao hospicio. Chamava-se Thomás Ribeiro. Era suficiente para o matar. Não sou tão ingénuo que o não tivesse - previsto e prophetisasse. E, a proposito de ingénuo, quero acompa-

Página 950

950 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO,

nhar com o meu applauso as declarações ha pouco feitas pelo nobre presidente do concelho. Gosto dos sabedores, gosto dos hábeis, gosto dos honrados e dos sinceros. De quem não gosto é dos habilidosos.

S. exa. creio que tambem não gosta, e tem rasão; parque os habilidosos são muito mais úteis aos contrarios do que aquelles de quem se dizem amigos.

Isto apenas, a respeito do codigo administrativo, em parte absolutamente inexequivel, em parte evidentemente calamitoso.

Da dictadura do ministerio da justiça queria dizer alguma cousa, visto achar se presente o nobre ministro, mas é melhor não dizer nada.

É notavel que os srs. ministros, entrando para a administração, de um reino, que tinha unidade nas suas instituições e nas suas leis, o quizessem converter em nação, de coitos, de honras e de fueros.

Não fallo já da multiplicidade de tribunaes e juizes, da confusão entre administração e justiça; basta referir-me aos multiplices modos de nomear substitutos.

Os dos juizes municipaes de tres em tres annos, os dos juizes de Lisboa e Porto todos os annos na forma antiga.

Nos outros districtos do reino ora são os membros dos tribunaes administrativos, ora os presidentes das camaras; ora os conservadores, ora os proprios juizes municipaes, deixando sem juiz o municipio que paga por - carecer absolutamente de juiz; noutras são juizes ad-hoc.

Nesta parte não foi o nobre ministro original, copiou do antigo, regimen.

Ad-hoc eram as commissões mixtas e as alçadas, que se mandavam para toda a parte onde era preciso enforcar alguem.

Como um ministro de uma situação progressista arranjou isto, é que eu não sei.

Bete maneiras de substituir juizes mostram que o nobre ministro da justiça é homem de numerosos expedientes; uns peiores que os outros, é verdade, mas numerosos.

Quizera examinar fundamentalmente o trabalho de s. exa. mas não o posso fazer por muitas rasões, sendo uma dellas que, francamente, não lhe encontro fundo.

Empressionou-me o paiz ad-hoc pela origem da medida e porque se achou o meio pratico das grandes injustiças. O magistrado judicial preza a sua dignidade e não subscreve uma iniquidade mas ... pede uma licença, no intervallo chega o juiz ad-hoc, o partidario sem escrupulos, e faz-se a iniquidade. Quando chega o juiz legal está feita, e elle d'ahi lava as suas mãos!

Ai, da justiça!

Que acervo de iniquidades estão aqui neste grosso volume, neste magnum lexicon, que contem os decretos da dictadura que a maioria está morta por approvar!

Pois assim seja. Eu termino. Votem, votem, mas olhem que votam a sua propria exautoração.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Respondendo ao sr. Thomás Ribeiro, diz que não fallara em dictadura, mas que apenas se referira a factos que tiveram Jogar por occasião de Sua Magestade o encarregar de constituir o actual ministerio.

Quanto á percentagem das camarás, ao ellas organisarem os seus orçamentos, já saberão qual deve ser, porquanto ha de ser fixada com a devida antecedencia.

O sr. ThomáS Ribeiro: - Mas será uma percentagem geral ou não?

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Redargua que para os camaras municipaes tenciona propor a percentagem de 50 a 60 por cento, e para-as juntas geraes a de 25 por cento; mas que em todo o caso procederá consoante as circumstancias lho indicarem.

(Tambem se publicará na integra o discurso relativo a, estes extractos, quando o orador haja revisto as notas tachygraphicas)

O sr. Conde de Castro: - Requeiro a v. exa. se digne consultar a camara sobre: se permitte que se prorogue a sessão até se votar este projecto.

Consultada a camara resolveu affirmativamente.

O sr. Presidente: - Como não ha mais ninguem inscripto, vae votar-se o projecto na generalidade.

Os dignos pares que o approvam tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Passa-se á especialidade.

Vae ler-se o artigo 1.°

Leu-se na mesa e foi approvado sem discussão.

O sr. Presidente: - Vae ler se o artigo 2.°

Leu-se na mesa e poz-se em discussão.

O sr. Pereira Dias (relator): - Ergo-me unicamente para declarar a v. exa. e á camara que, de accordo com o governo, acceito as propostas feitas pelos dignos pares dr. Senna e Francisco de Albuquerque.

O sr. Conde de Margaride:- Sr. presidente, estava fora da sala quando o sr. presidente do conselho de ministros me fez a honra de se referir a mim. Informaram-me que s. exa. invocara o meu testemunho sobre o seu procedimento com Guimarães e commigo, na questão dos concelhos autónomos. Não precisam, da minha confirmação as palavras do sr. conselheiro José Luciano, que é geralmente reconhecido como um homem de bem; mas, se precisassem, aqui a tinham. O sr. presidente do conselho procedeu não só leal, mas cavalheirosamente.

Antes da promulgação do codigo administrativo fez o favor de me mostrar o que respeitava aos municipios com organisação especial, e eu affirmei-lhe que s. exa., depois das suas declarações no parlamento, não podia fazer-nos mais, sem incompatibilidade com essas declarações, e sai satisfeito.

Alludo unicamente a esta parte, porque sobre o resto do codigo não fallamos nem tivemos tempo para isso.

Agora peço licença para dirigir a s. exa. uma pergunta.

O artigo 54.° do codigo administrativo diz que a junta geral delibera definitivamente sobre. (Leu o n.° 7.)

Como esta disposição não abre excepção, tornou-se questionável se abrangeria os municipios de regimen especial. Respondeu negativamente a portaria de 22 de setembro dó 1886, mas deixou em duvida a quem em taes concelhos competia esta faculdade.

Penso que ás respectivas camaras; mas, como nenhum diploma official o diz, desejo ouvir sobre este ponto o sr. presidente do conselho, auctor do codigo, tomando a sua resposta como uma interpretação authentica.

Para isso pergunto:

1.° A faculdade conferida ás juntas geraes no artigo 54.° n.° 7 é devolvida ás camaras com organisação especial?

2.° No caso affirmativo, torna-se consequentemente applicavel ás deliberações municipaes a legislação que se applica ás deliberações analogas das juntas?

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Responde ás observações apresentadas pelo digno par o sr. conde de Margaride.

O sr. Conde de Margaride: - Agradece a resposta, do sr. presidente do conselho.

O sr. Bandeira Coelho: - Eu tencionava, conforme o tinha declarado quando apresentei nesta camara alguns dos muitos requerimentos que os officiaes da arma de engenheria dirigiram ás duas casas do parlamento, representando contra o decreto da organisação dos serviços technicos do ministerio das obras publicas, occupar-me nesta occasião desse assumpto, propondo profundas modificações naquelle decreto.

Nas circumstancias, porem, em que se acha a sessão, vejo-me na necessidade de desistir do meu proposito, reservando-me para occasião mais propicia, e limitando-me agora a uma simples declaração1.

Declaro que, approvando o bill, tanto na generalidade como na especialidade, o meu roto não significa acquies-

Página 951

SESSÃO DE 12 DE AGOSTO DE 1887 951

cencia ou conformidade com ás disposições do decreto a que me referi, porque eu continuo a professar a este respeito as mesmas idéas que sempre tive, e cuja realisação depende da adopção dos principies consignados na reforma de 1868, convenientemente ampliada de forma a attender aos interesses creados segundo umas bases para organisação do pessoal technico dos ministerios da guerra e obras publicas, bases que foram elaboradas por uma grande commissão de engenheiros militares á qual eu tive a honra de pertencer, e que foram presentes ao sr. ministro das obras publicas antes delle publicar o seu decreto.

Eu sinto que s. exa. rejeitasse aquellas bases, e tanto mais quanto estou convencido que a sua organisação de engenheria está condemnada a ter a mesma ephemera duração que tiveram as organizações dos seus antecessores.

O sr. Serra e Moura: - Mando para a mesa um parecer de commissão.

A imprimir.

O sr. Pinheiro Borges: - Faz tambem as suas reclamações e protestos apresentados. pelo digno par Bandeira Coelho, supposto, como elle, vote igualmente o projecto.

(O breve discurso de s. exa. será .publicado na integra quando haja revisto as notas tachygraphicas.).

O sr. camara Leme:- Peço licença para retirar a minha moção.

Eu podia n'este momento fazer ainda algumas observações, mas limito me a pedir a v. exa. que mande consignar na acta e nas notas tachygraphicas que eu votei contra o projecto. . (S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: - Far-se-ha a declaração pedida pelo digno par.

Consultada a camara, consentiu que fosse retirada a moção do sr. Camara Leme.

O sr. Telles de Vasconcellos: - Peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que eu retire a minha, moção.

Assim se resolveu.

O sr. Visconde de Bivar: - Faço declaração igual á do sr. camara Leme.

Tambem declararam que o seu voto tinha sido contrario ao projecto os dignos pares srs. Telles de Vasconcellos e Barbosa du Bocage.

O sr. Presidente: - Todas estas declarações serão consignadas na acta e no Diario das sessões. Leu-se na mesa a seguinte:

Proposta

Proponho a eliminação do § unico inscripto como emenda em seguida ao artigo 13.° "Plano de reorganisação do ministerio das obras publicas, approvado por decreto de 28 de julho de 1886", tendo essa emenda sido introduzida pela camara dos senhores deputados e havendo sido mantida no parecer n.° 114 da commissão especial desta camara.

Camara dos pares, em 12 de agosto de 1887. = 0 par do reino, Francisco Simões Margiochi.

Foi rejeitada a proposta do digno par o sr. Margiochi.

Leu-se na mesa o additamento apresentado pelo digno par sr. Antonio Maria de Senna, que é do teor seguinte:

Additamento

§ 1.° Os subsidios que serão pagos mensalmente não poderão, em caso algum, exceder a quantia de 500$000 réis.

Camara dos pares, 11 de agosto de 1887. - Antonio Maria de Senna.

O sr. Presidente: - Este additamento foi acceito pela commissão de accordo com o governo.

Consultada a camara, deu-lhe a sua approvação.

Leu-se a proposta do digno par o sr. Francisco de Albuquerque.

É do teor seguinte:

Proposta

Proponho que no. decreto sobre aposentações civis n.° l, de 17 de julho de 1886, se acrescente o seguinte ao paragrapho - unico:

"É levado em conta para a aposentação nos differentes cargos do estado o serviço prestado pelos governadores civis, administradores dos concelhos e dos secretarios dos governadores civis."

Sala das sessões, em 11 de agosto de 1887.- Francisco de Albuquerque.

O sr. Presidente: - Tambem esta proposta foi acceita pela commissão de accordo com o governo.

A camara approvou-a.

Considerou-se prejudicada a proposta do digno par sr. Miguel Osorio.

O sr. Presidente: - Está concluida a votação.

A ordem do dia para amanhã é a discussão dos pareceres n.ºs 123, 126, 131, 132, 133, 134, 138, 139, 140, 141, 142, 143, 145, 146, 147, 148, 149, 150 e 151.

Está levantada a sessão.

Eram quasi cinco horas e meia da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 12 de agosto de 1S87.

Exmos. srs. Antonio José de Barros e Sá; Marquez de Vallada; Condes, de Alte, do Bomfim, de Castro, de Ficalho, da Folgosa, de Margaride, de Paraty, de Valenças; Bispo de Bethsaida -; Viscondes, da Azarujinha, de Benalcanfor, de Bivar, de Borges de Castro, de Carnide, da Silva Carvalho; Agostinho Lourenço, Aguiar, Pereira de Miranda, Quaresma, Antunes Guerreiro, Barreiros Arrobas, Couto Monteiro, Senna, Telles de Vasconcellos, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Augusto Cunha, Carlos Testa, Sequeira Pinto, Pinheiro Borges, Hintze Ribeiro, Fernando Palha, Cardoso de Albuquerque, Margiochi, Ressano Garcia, Henrique de Macedo, Jayme Moniz, Candido de Moraes, Holbeche, Mendonça Côrtez, Andrada Pinto, Gusmão, Bandeira Coelho, Baptista de Andrade, Costa Pedreira, Castro, Fernandes Vaz, Silva Amado, José Luciano de Castro, Lobo d'Avila, Sá Carneiro, José Pereira, Mexia Salema, Sampaio e Mello, Bocage, Camara Leme, Seixas, Pereira Dias, Franzini, M. Osorio Cabral, D. Miguel Coutinho, Costa e Silva, Thomás Ribeiro, Thomás de Carvalho, Serra e Moura, Melicio.

Redactor = Ulpio Veiga.

Página 952

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×