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N.º 72
SESSÃO DE 24 DE MAIO DE 1879
Presidencia do exmo. sr. Buque d'Avila e de Bolama
Secretarios - os dignos pares
Visconde de Soares Franco
Eduardo Montufar Barreiros
Ás duas horas da tarde, sendo presentes 19 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.
Lida a acta da sessão precedente julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.
Não houve correspondencia.
(Estava na sala os srs. presidente do conselho e ministro da fazenda. Entraram durante a sessão os srs. ministros da justiça e dos negocios estrangeiros.)
O sr. Conde do Casal Ribeiro: - Sr. presidente, mando para a mesa o seguinte projecto de lei.
(Leu.}
O sr. Presidente: - Vae ler-se na mesa o projecto que acaba de apresentar o sr. conde do Casal Ribeiro.
O sr. secretario leu o seguinte
Projecto de lei n.º 40
Senhores. - A votação annual da receita e despeza do estado, em execução do preceito da nossa Constituição, não deve considerar-se formalidade apenas, nem sómente arma politica posta nas mãos do poder legislativo para impedir a continuação da gerencia de governos desattentos ao bom desempenho da sua missão. Quiz tambem o dador da carta sujeitar ás côrtes, em cuidadoso exame annual, o balanço das rendas e despendios do estado, a fim de esclarecer a opinião e provocar o remedio onde se torne necessario. Minuciosa fiscalisação parlamentar sobre os resultados financeiros dos exercicios, tanto pelo que respeita aos haveres, como aos gastos publicos, é o indispensavel complemento das auctorisações orçamentaes. Só assim póde ser apreciada a legalidade dos procedimentos do governo, e só assim tambem se podem aperfeiçoar as previsões do orçamento, confrontando-as com os factos e comprovando-as ou modificando-as pela experiencia.
Compenetrada do seu dever, tanto mais imperioso nas circumstancias actuaes do thesouro, a vossa commissão de fazenda está procedendo a reflectido estudo do orçamento apresentado pelo governo para o futuro anno economico de 1879-1880, comparando-o com o orçamento rectificado do anno corrente, e contas do ultimo exercicio. Convence este estudo de que muitas verbas se acham calculadas por fórma que difficilmente chegarão para os serviços a que se destinam, se n'elles não forem de prompto introduzidas importantes redacções.
Difficultoso será, na altura em que vae a sessão parlamentar, emendar o orçamento, onde de emenda careça, a tempo de tornar- se lei em tempo util. Torna-se, pois, não só opportuno, mas urgente, prover do remedio possivel ás deficiencias do orçamento, auctorisando creditos supplementares.
Qualquer que seja a opinião de cada um sobre as vantagens ou inconvenientes de taes creditos, ninguem preferirá que as despezas continuem a ser feitas com excesso sobre as verbas legaes, por mero arbitrio do governo ou sophismada a natureza dos creditos extraordinarios.
Os creditos supplementares existem entre nós na lei permanente; reconheceu-os o regulamento geral de contabilidade de 4 de janeiro de 1870. Foram, porém, suspensos em 1866. No excellente relatorio, que precede o orçamento para
1866-1867, escrevia o actual sr. presidente do conselho, então ministro da fazenda:
"Na verdade é difficil conceber como se poderia fazer juizo seguro ácerca da importancia do deficit do orçamento, com a valvula dos creditos supplementares sempre aberta, para sairem por ella despezas novas e sem limite, que acrescentavam as verbas auctorisadas e reconhecidamente insufficientes. Descrever, a despeza que effectivamente se faz e eliminar a faculdade de augmental-a é, a meu ver, uma garantia efficaz para o publico, e um elemento de ordem que deve contribuir para melhorar sensivelmente as nossas finanças."
Doutrina é esta louvavel, na verdade e de grande utilidade seria na applicação, se a pratica não viesse evidenciar a inefficacia do remedio contra o mal energicamente diagnosticado. Cessaram em nome os creditos supplementares, mas na essencia continuam, pois outra cousa não são, por exemplo, os que têem sido abertos para prover a manutenção em armas de força do exercito superior á votação do orçamento. Taes creditos, não já para despeza a fazer, mas para sanccionar despeza feita, foram ainda abertos em dezembro de 1878 na importancia de réis 320:700$000, em relação ao exercido de 1876-1877._
Em outros capitulos as contas manifestam consideraveis augmentos da despeza liquidada sobre a auctorisada, sem mesmo se recorrei á abertura de creditos de qualquer especie. Para não multiplicar exemplos, dois serão sufficientes. No capitulo "diversas despezas do ministerio da fazenda" votou-se para 1874-1875 30:922$140 réis e liquidou-se 79:937$749 réis; era 1870-1876 votou-se igual verba e liquidou-se 87:106$719 réis; em 1876-1877 votou-se 36:272$140 réis e liquidou-se 99:432$871 réis. No capitulo "diversas despezas do ministerio da guerra" auctorisou em 1874-1870 153:302$787 réis e liquidou-se réis 296:424$408; em 1875-1876 auctorisou-se 136:357$390 réis e liquidou-se 338:616$860 réis; era 1876-1877 auctorisou-se 151:357$390 réis e liquidou-se 275:928$222 réis. D'onde se segue que no capitulo 10.° do ministerio da guerra o excesso foi em media de 106 por cento, e no capitulo 10.° do ministerio da fazenda de 146 por cento; correspondendo no primeiro toda a despeza auctorisada a menos da despeza effectuada em seis mezes, e no segundo a menos dá que se realisou em cinco mezes.
A pratica dos creditos supplementares, condemnada em Franca na gerencia financeira do sr. Fould, foi novamente restabelecida no regimen republicano, e recentemente ainda apresentou o sr. Léon Say nova lei confirmando e reguraisando essa pratica.
Em 1878 foram propostos os creditos supplementares no nosso orçamento pelo sr. Mello Gouveia, então ministro da fazenda, e já no anno anterior o actual ministro, sr. Serpa Pimentel, os havia tentado restabelecer, acompanhando essa providencia com outras, cuja substancia vae contida n'este projecto. Parecem elles pois, indispensaveis, na presente conjunctura, se aspiramos á regularisação legal das despezas. Mas outra vantagem ainda devem ter, sobremodo apreciavel na actualidade, se, como vae proposto, não só a publicidade official immediata for obrigatoria, mas ainda se impozer ao governo o preceito de apresen-
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tar ao parlamento esses creditos, com os extraordinarios, dentro da primeira quinzena da constituição das camaras. O orçamento rectificado, cuja organisação lembrada era anteriores sessões começou em 1878, deve ser constituido preceito obrigatorio para o governo, e apresentado dentro do mesmo periodo. A experiencia mostra que ha sempre a rectificar; e quando felizmente o contrario acontecesse, com a declaração escripta e official em tal sentido, o governo teria cumprido a lei.
Sendo acompanhado o orçamento rectificado e tambem os creditos, tanto extraordinarios como supplementares, de propostas de lei, e vindo estas munidas de claros elementos de apreciação, como se prescreve no artigo 7.°, os representantes do paiz ficam habilitados, desde o começo de cada sessão legislativa, a formar juizo sobre a gerencia financeira, exercendo aquella salutar fiscalisação, que constitue uma das mais essenciaes funcções dos corpos co-legisladores. Pois é certo que a fiscalisação parlamentar é a suprema garantia das boas finanças; e os repetidos serios estudos das côrtes nesta materia poderosamento contribuirão a evitar desvairamentos da opinião e demazias de exigencias, que ás vezes arrastam es poderes publicos a votar quantiosas despezas, com menos cuidadosa reflexão, sobre os meios de as custeiar.
Para evitar o abuso o a confusão claramente se prohibe qualquer ordenação de despeza ou entrega de fundos fóra das verbas do orçamento, sem previa abertura de creditos, nunca podendo estes servir a legalisar despezas feitas. Limita se a faculdade de abrir creditos extraordinarios ou supplementares aos casos em que seja tal a urgencia da despeza que não se possa esperar pela proxima reunião parlamentar.
Convem conservar a garantia sempre entre nós exigida da audiencia do conselho d'estado; mas ainda mais indispensavel se torna prescrever o processo por onde, em materia de creditos, deve reger-se aquelle alto corpo do estado. As disposições correlativas comprehendidas no artigo 5.° podiam, é certo, e deviam talvez ter-se convertido em regra de regulamento ou praxe. Esta, porém, está longe de corresponder á gravidade e conhecimento dos assumptos, que deve recommendar a efficacia da intervenção do conselho d'estado.
É, pois, de grande importancia legislar sobre a materia para que o corpo politico, natural consultor da corôa, no exercicio d'estas funcções exercidas por uma, especie de delegação parlamentar, possa dignamente e em sã e esclarecida consciencia desempenhar-se da obrigação legal.
Bem póde considerar-se esta, garantia como summamente valiosa. Ampliando-se ella aos creditos extraordinarios, como se propõe, servirá ao mesmo tempo para que estes não mais sejam desviados da sua genuina significação, e para que não se introduzam abusos novos á sombra dos creditos supplementares.
Tal é, senhores, a economia do projecto, no qual foi convertida uma proposta de emendas ao projecto de lei de despeza para 1879-1880. Apresentada e discutida essa proposta na vossa commissão de fazenda, opinaram alguns dos meus illustres collegas que melhor caberia o assumpto em lei permanente e especial. Obedecendo a esta indicação, e aproveitando outras suscitadas para melhorar a primitiva proposta, sujeito á vossa sabedoria este modesto trabalho. Não ha n'elle a pretenção de completar o que na nossa legislação falta, e mais talvez em nossos costumes, para garantir a regularidade das finanças. Convictamente, porém, creio que dignando-vos conceder-lhe a vossa approvação, tereis dado um passo rada insignificante no caminho da boa ordem e administração da fazenda publica.
Tenho, pois a honra de snbmetter á camara o seguinte
PROJECTO DE LEI
Artigo 1.° É absolutamente prohibida a ordenação de despezas pelo ministerio da fazenda e a entrega do fundos pelo mesmo aos outros ministerios, excedendo as sommas respectivamente votadas em relação a cada capitulo do orçamento pelas leis da despeza, ou por leis especiaes, sem previa abertura de creditos extraordinarios ou supplementares abertos nos termos d'esta lei.
Art. 2.° É permittido ao governo abrir creditos extraordinarios exclusivamente para occorrer a despezas exigidas por casos de sua natureza imprevistos e de força maior, como inundação, incendio, epidemia, guerra interna ou externa, ou outros similhantes.
Art. 3.° É tambem permittido ao governo abrir creditos supplementares no caso de insufficiencia provada das sommas determinadas na lei de despeza com applicação a despezas variaveis.
Art. 4.° Tanto os creditos extraordinarios como os supplementares sómente podem ser abertos estando encerradas as côrtes, e quando a urgencia da despeza seja tal que se não possa esperar pela proxima reunião parlamentar. Em nenhum caso os creditos extraordinarios ou supplementares poderão ser abertos para legalisar despezas effectuadas, quer pertençam ao exercicio corrente, quer aos preteritos.
Art. 5.° Os creditos extraordinarios e supplementares nunca podem ser abertos sem previa audiencia do conselho d'estado, o qual para esse fim será convocado em conferencia por avisos com tres dias pelo menos de antecipação, contendo declaração do objecto da convocação. Na conferencia será apresentado um relatorio do ministro competente, explicando desenvolvidamente as despezas a que são destinados os creditos, e bem assim, quanto aos supplementares, aquellas que já foram effectuadas pela verba ordinaria respectiva. Lavrar se-ha acta da conferencia, a qual será apresentada ao Rei com o decreto.
Art. 6.° Os decretos, abrindo creditos extraordinarios e supplementares serão sempre immediatamente publicados na folha official.
Art. 7.° Os creditos extraordinarios e supplementares serão posteriormente apresentados ás côrtes na sua proxima reunião, e dentro dos primeiros quinze dias depois da constituição das camaras, a fim de serem examinados e confirmados por lei. Com os creditos apresentar-se-ha proposta de lei especial, motivada e acompanhada do relatorio a que se refere o artigo 5.°, e bem assim de todos os outros esclarecimentos necessarios.
Art. 8.° Tambem dentro dos primeiros quinze dias, depois da constituição das camaras, o governo apresentará o orçamento rectificado do anno corrente, acompanhado da respectiva proposta de lei, tendo em vista as alterações que a experiencia do 1.° semestre do anno economico tiver demonstrado necessarias, tanto na receita como na despeza, e bem assim as leis especiaes votadas na precedente sessão legislativa, e não comprehendidas no orçamento ordinario.
Art. 9.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 24 de maio de 1879. = Conde do Casal Ribeiro.
O sr. Presidente: - Vae ser remettido á commissão de fazenda.
O sr. Conde de Rio Maior: - Sr. presidente, requeiro que, em attenção á importancia do projecto, seja publicado no Diario do governo de ámanhã.
O sr. Presidente: - O projecto ha de ser publicado no Diario da camara em conformidade com uma resolução já tomada; o digno par o sr. conde de Rio Maior, porem, propõe que seja tambem publicado no Diario ao governo. Vou consultar a camara.
Consultada a camara resolveu affirmativamente.
O sr. Vaz Preto: - Eu desejava que v. exa. me dissesse se pelo ministerio da guerra já foram enviados a esta camara alguns dos esclarecimentos que pedi, e igualmente se pelo ministerio da fazenda já foram satisfeitos os requerimentos que fiz.
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O sr. Presidente: - Sobre a mesa não está documento algum d'aquelles a que alludiu o digno par.
O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, como estão presentes os srs. ministro da guerra e ministro da fazenda, dirigir-me-hei a ambos.
Ao sr. ministro da fazenda perguntarei se ha algum motivo especial particular ou politico que o leve a não satisfazer ao pedido que fiz no principio da sessão, para ser enviada a esta camara uma nota de todas as gratificações e ajudas de custo que se dão a differentes empregados do ministerio a seu cargo.
Desejo que s. exa. não só satisfaça a este meu requerimento, mas que responda a esta minha pergunta, e tenho tanto mais empenho em obter os esclarecimentos que pedi, quanto no publico correm boatos bastante desagradaveis com respeito ao ministerio da fazenda.
Diz-se, e insiste-se, que por aquelle ministerio se dão illegalmente immensas gratificações.
Diz-se, por exemplo, que um amanuense, que tem réis 360$000 de ordenado, recebe 900$000 réis de gratificação, e que ultimamente por um serviço especial, por copiar alguns projectos para o sr. Serpa mandar para a camara, recebeu 40 libras, e que outros empregados vendo a manifesta injustiça com que eram tratados, gritaram contra ella e ameaçaram que viriam para a imprensa narrar os factos, passaram a receber mensalmente uma gratificação de 15$000 réis!
Ora, desde que se diz isto, desde que correm estes boatos no publico, torna-se indispensavel que s. exa. se justifique, e satisfaça com a maxima brevidade ao pedido que fiz.
Esperando que o sr. ministro da fazenda se explique ácerca destas noticias que são propaladas com tanta insistencia, passarei a dirigir-me ao sr. ministro da guerra.
Disse s. exa., na ultima sessão, que a consulta do procurador geral da corôa, que havia sido pedida pelo sr. Costa Lobo, estava impressa. Effectivamente está impressa uma parte d'essa consulta, mas a que se refere ás promoções não está; portanto, eu pedia a s. exa. que enviasse á camara a consulta completa ou pelo menos a parte que falta.
Passando a outro ponto, dirigirei algumas perguntas a s. exa.; não sei, porém, se s. exa. quererá que as formule em uma nota de interpellação, e digo isto porque tendo eu lido aqui um artigo do jornal, e fazendo sobre elle algumas considerações, s. exa. começou por me responder, e durando a discussão dois dias, acabou por declarar que não estava habilitado, nem para entrar no debate nem para responder ás minhas observações, e que desejava que lhe enviasse uma nota de interpellação! Não sei, pois, se s. exa. quererá que eu proceda pela mesma fórma com respeito ás perguntas que vou dirigir-lhe, ou se quererá e poderá responder-me desde já.
Quando se discutia aqui o projecto sobre a fixação da força armada, fiz differentes considerações para mostrar quaes eram as causas da pouca disciplina e da falta de instrucção do exercito, fazendo notar, que concorria alguma cousa para este mal, o systema adoptado pelo sr. Fontes, o procedimento do sr. presidente do conselho, de transferir todos os dias de Lisboa para as provincias e das provincias para Lisboa, á custa do thesouro, soldados que pouco depois voltam outra vez para os corpos donde tinham saído, e que não era menos prejudicial á disciplina e á instrucção, a injustiça arvorada já em praxe de transferir para differentes regimentos, sargentos que vão ser n'elles supranumerarios, fazendo falta nos respectivos regimentos onde deixam vaga.
Este insolito escandalo tem por fim promover vagas para serem preenchidas pelos afilhados e compadres dos ministros.
Esta invenção particular do sr. Fontes cria uma classe de officiaes inferiores supranumerarios, que custa cara ao thesouro, e ataca os interesses e direitos d'aquelles a quem estes factos tolhem, a promoção.
Desejava, pois, saber se s. exa. está habilitado a responder a esta pergunta, ou antes accusação, ou se é necessario annunciar uma interpellação!
Como disse ao sr. Fontes, que todas as vezes que eu tivesse a satisfação de o ver entre nós, aproveitaria o ensejo para tratar de assumptos militares, vou-lhe annunciando já alguns, sobre que desejo chamar a sua attenção e fazer-lhe observações.
Um outro assumpto que aqui hei de tratar, e sobre o qual annunciarei interpellação, se for necessario, e ácerca das nomeações, que o sr. ministro da guerra tem feito, de majores, tenentes coroneis e coroneis, para o mesmo regimento, sem passar um anno, contra expressa disposição da lei.
O sr. Presidente do Conselho e Ministro da Guerra: (Fontes Pereira de Mello): - Quando eu disse, em uma das ultimas sessões, que estava impressa a consulta a que se referiu o digno par, foi porque me pareceu que o assumpto, sobre o qual s. exa. chamava mais particularmente a minha attenção, era o que dizia respeito á segunda parte, e portanto devia ficar satisfeito o desejo de s. exa.
Effectivamente não está impressa toda a consulta, e só a parte que se refere ao quadro dos officiaes de engenheiros; mas, como tenho aqui a consulta, junto com os trabalhos de uma commissão, que durante muitos annos foi presidida pelo meu, amigo o sr. general Sousa Pinto, aonde se encontram todos os elementos para poder apreciar este assumpto, estou muito prompto a facultal-a ao digno par, pedindo-lhe apenas o favor de m'a restituir logo que deixe de lhe ser necessaria.
N'esta parte creio que devem estar satisfeitos os desejos do digno par.
Quanto aos outros pontos a que o sr. Vaz Preto se referiu, como não se acham comprehendidos nas interpellações que estão dadas para a ultima parte da ordem do dia de hoje, parecia-me mais regular que s. exa. formulasse uma nota de interpellação, para eu me poder habilitar com todos os esclarecimentos.
(O orador não reviu os seus discursos.)
O sr. Ministro da Fazenda (Serpa Pimentel): - Tenho mandado para ambas as casas do parlamento um grande numero de esclarecimentos, e tenho recommendado que sejam enviados todos os que foram pedidos; portanto póde o digno par estar certo que tambem hão de vir aquelles a que ha pouco se referiu.
Por essa occasião verá o digno par que foi menos bem informado com respeito ás gratificações dadas e á sua importancia, assim como verá que é menos exacto o ter havido queixa por parte dos empregados.
O sr. Gomes de Castro: - O assumpto sobre que desejo fallar é inteiramente diverso; portanto, se v. exa. julgar melhor, póde conceder a palavra ao sr. Vaz Preto.
O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, eu agradeço ao sr. presidente do conselho o ter-me confiado o original da consulta que pedi, e que devolverei. Como s. exa. deseja que lhe envie uma nota de interpellação sobre os outros pontos de que desejo occupar-me, não tenho duvida de formular essa nota, para mandar para a mesa, mas parecia-me, melhor depois de verificada a minha interpellação já annunciada.
Sr. presidente, emquanto ao sr. ministro da fazenda, estimarei muito que s. exa. cumpra a sua palavra e mande a nota que pedi; mas a promessa, que acaba agora de fazer, já a fez aqui no principio da sessão, e note-se, que quando ou fiz o pedido não havia a effervescencia na camara dos senhores deputados em pedir documentos. No em tanto s. exa. não satisfez ao meu pedido. N'este caso e n'estas circumstancias perguntarei agora: terá o sr. minis-
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tro duvida em mandar a nota á camara por toda a somma que vem? Parece-me que não peço muito, desejando e se essa nota que desejo ver com tanta anciedade, e que tenho pedido durante annos, appareça n'esta camara por toda a semana que vem.
O sr. Ministro da Fazenda: - Não sou eu que faço o trabalho, no emtanto não tenho duvida.
O Orador: - Eu bem sei que não é s. exa. que faz o trabalho, mas como dá ordem para o fazer, e como dá tantas gratificações, póde muito bem abonar mais uma gratificação, para ser satisfeito cem urgencia o meu. pedido relativo ás gratificações. (Riso.)
O sr. Ministro da Fazenda: - Seria um esbanjamento.
O Orador: - Seria um esbanjamento, diz s. exa.?
Ainda bem que já sáe da bôca do sr. ministro unir. exclamação de horror contra os esbanjamentos! (Riso.) Felicito o sinceramente e felicito a camara por esta conversão. Ainda bem que s. exa. já considera como esbanjamento o dar-se uma pequena gratificação para satisfazer a um pedido de esclarecimento feito peia camara dos pares, esclarecimentos que era dever do sr. ministro ter dado ha muito.
Desde que s. exa. considera o alvitre como um esbanjamento, não serei eu, sr. presidente, que falte aos bons principios da economia continuando a lembrar a gratificação. O que peço tão sómente a s. exa. é que satisfaça ao seu compromisso, mas que seja, por toda a semana que vem, componentrando-se de que é do seu dever informar esta camara; se esses documentos, porém, não vierem opportunamente, ver-me-hei forçado a ser mais severo nas minhas considerações, e explicar ao para o que significam o adiamento e a recusa do sr. Antonio de Seroa.
U sr. Gomes de Castro: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa um requerimento e uma nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas.
O requerimento é o seguinte.
(Leu.}
A nota de interpellação é a que passo a ler.
(Leu.)
Sr. presidente, não quero nem posso por fórma alguma antecipar a minha interpellação, mas espero que a camara permittirá que eu faça algumas considerações o dê as rasões que me levam a dirigir esta interpellação ao sr. ministro das obras publicas.
A primeira parte da minha interpellação versa sobre a necessidade urgente de que o governo, antes de terminar a actual sessão legislativa, tome alguma medida no sentido de [...] a barra do Porto. É forçoso que se torne alguma disposição a este respeito. O sr. ministro das obras publicas apresentou na outra casa do parlamento uma proposta com relação a este assumpto, mas não me consta que a respectiva commissão tenha dado até hoje o seu parecer sobre essa proposta.
Eu, no caso de s. exa., teria talvez procedido de outro modo; teria encarregado pessoas competentes, tanto no que diz respeito á parte technica, como á parte economica, de examinarem os diversos projectos que têem sido apresentados, quer para a construcção de um porto de abrigo, quer para o melhoramento d'aquella barra. Esta, comtudo, é uma questão para se discutir e tratar depois.
Agora o que é urgente e que antes de terminar a presente sessão legislativo, o governo tome alguma medida.
Realmente não é toleravel, e esta é a expressão que devo usar, que a segunda cidade do reino, tendo um commercio tão importante, esteja sujeita aos inconvenientes de uma paralysação commercial, como succedeu este anno, que esteve com as suas relações mercantis interrompidas durante trinta e cinco a quarenta dias, por não poderem entrar navios n'aquelle porto!
Outro ponto ácerca do qual desejo interpellar s. exa. é a respeito da ponte mstallica com dois taboleiros, que deve ligar o rico e populoso concelho de Villa Nova de Gaia com aquella cidade.
Este melhoramento é igualmente exigido pela cidade do Porto, e por elle têem instado com o governo, sem distincção de cor politica, os filhos d'aquella terra. É effectivamante muito importante a construcção d'essa ponte, com dois taboleiros, e ainda que por isso se torne mais dispendiosa de que se fosse construida com um só, são, comtudo, as vantagens e o alcance economico tão grandes, que os srs. ministros, e especialmente o sr. presidente do conselho e o sr. ministro da fazenda, que estão presentes e que são muito esclarecidos e conhecedores d'aquella localidade, não poderão deixar de attender á conveniencia de dotar o Porto com este melhoramento.
Disse eu que era mais dispendiosa a construcção da ponte com dois taboleiros, mas elevo acrescentar que esse facto pouco deve importar, em presença das consideraveis vantagens que d'aquella construcção hão de provir, e muito menos se deve metter em linha da conta os encargos d'esse augmento de despeza, attendendo a que o thesouro facil a promptamente se exonerará d'esses encargos, pelo rendimento dos direitos de portagem que, apesar de modicos, como são os da antiga ponte pensil, hão de dar receitas consideraveis, como deram aos accionistas d'essa, ponte, que receberam umas poucas de vezes o capital empregado; por consequencia, não deve assustar o sr. ministro das obras publicas a circumstancia de ser mais custosa a construcção da ponte com dois taboleiros.
Alem d'isso, s. exa. não póde ignorar as vantagens d'aquella construcção, que põe em communicação a população de Villa Nova de Gaia com a parte alta da ciciado do Porto. D'ahi hão de resultar as seguintes vantagens:
Em primeiro logar a possibilidade de se organisarem ali, em Villa Nova de Gaia, valiosos estabelecimentos industriaes, pois que d'aquelle lado ha grandes manancias de agua, que podem vantajosamente aproveitar-se para esses estabelecimentos.
Em segundo logar, e para isto chamo a attenção do sr. ministro da guerra em especial, desde que esteja ligada a serra do Pilar com a Batalha, poderá s. exa. collocar no convento da serra um dos corpos que hoje está na cidade, mas pessimamente alojado em um edificio arruinado e bem pouco decente.
Alem d'isto existe no Porto o pensamento muito patriotico e muito louvavel, de estabelecer do outro lado do rio um bairro para operarios.
Tudo concorre, emfim, para que um melhoramento d'esta ordem se leve a effeito, e parece impossivel que o governo não procuro construir a ponte metallica, de dois taboleiros, auxiliando por todos os modos esta idéa; e digo que me parece impossivel que o governo offereça resistencia á realisação d'edste melhoramento, porque não posso comprehender essa resistencia, que effectivamente creio existir, e muito desejaria achar-me em erro.
Segundo se lê nos jornaes, realisou-se no Porto um grande meeting para tratar d'este importante e momentoso assumpto, meeting a que concorreram indistinctamente pessoas de todos os partidos, e onde se apresentou um illustre deputado da maioria, muito afecto ao governo, dizendo que n'esta questão não podia acompanhar o gabinete, porque elle não attendia n'este caso aos altos interesses d'aquella localidade, notando mais por parte do governo uma teimosia em não ceder ás instancias do Porto.
Por todos os fundamentos que expuz, julgo estar motivada a interpellação que mandei para a mesa.
Na presença do sr. ministro das obras publicas, quando realisar esta interpellação, desenvolverei largamente os fundamente d'ella; no emtanto julguei-me no direito de apresentar desde já as considerações que fiz, embora ellas possam desagradar ao governo.
Na minha opinião, porém, s. exas. até deviam estimar que se laes proporcionasse este ensejo de poderem dar ex-
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plicacões, porque, se não é verdade o que se diz, o governo póde desde já declarar que as suas idéas foram sempre favoraveis à construcção da ponte metallica de dois taboieiros, como da maior conveniencia para a cidade do Porto, e que se o não foram, o governo entendeu agora dever reconsiderar sobre este ponto.
É do interesse do governo, segundo me parece, o fazer declarações explicitas a este respeito, porque os animos estão bastante agitados no Porto por verem que a um melhoramento d'estes o governo offerece uma resistencia tenaz, não querendo annuir ao pedido feito por aquella cidade.
Sr. presidente, não é muito que eu peça sobre um objecto d'esta magnitude uma resposta ao sr. presidente do conselho, porque, se ha solidariedade ministerial para um caso ou para mais de um caso, parece-me justo havel-a tambem para este.
Na sessão passada tinha eu feito um ligeiro reparo, que não chegava a ser censura, ao sr. ministro das obras publicas, e o sr. presidente do conselho levantou-se logo a defender o seu collega e a justifical-o.
N'outro dia tratava-se aqui de um projecto, aliás importante, porque emfim são importantes todos os projectos sobre circumscripção territorial e administrativa, e como não se achasse presente o sr. ministro do reino, tomou a palavra o meu amigo o sr. Thomás Ribeiro, ministro da marinha, declarando-se prompto para entrar n'essa discussão.
A verdade é que não estava habilitado, e que bastaram duas ou tres perguntas do meu digno collega o sr. Costa Lobo para se reconhecer que s. exa. se via em grande embaraço, não podendo responder satisfactoriamente.
Hoje, porém, não pretendemos saber se esta ou aquella freguezia passa do um concelho para outro; trata-se de um melhoramento, dispendioso sim, mas de alta importancia para a segunda cidade do reino, assumpto este que forçosamente deve ter tido larga discussão em conselho de ministros.
Por consequencia, parece-me que não será impertinencia da minha parte exigir nesta occasião que o nobre presidente do conselho diga alguma cousa a tal respeito.
O illustre deputado, a quem ainda agora me referi, e esta referencia é permittida, porque não estou aqui a discutir opiniões emittidas na outra casa do parlamento, mas apresentadas numa outra reunião publica, aquelle sr. deputado, repito, offereceu um alvitre, no qual me pareceu ver o pensamento do governo, e vem a ser: que, se em ultimo caso, este não annuisse ás reclamações, contrahisse a camara do Porto um emprestimo para construir a ponte por sua conta, arrecadasse a receita proveniente da portagem, e pedisse apenas no thesouro um pequeno subsidio.
Isto é uma cousa quasi impossivel de se realisar.
Os srs. ministros, e em especial o sr. presidente cio conselho, andam completamente illudidos ácerca dos recursos das camaras municipaes.
Ninguem como eu deseja e applaude o movimento de descentralisação que resulta das ultimas leis apresentadas ao parlamento; mas o que certo e que os municipios em geral não estão habilitados para fazer face ás despezas com que essa descentralização os sobrecarrega, e por isso não achei opportuno que o sr. presidente do conselho, na proposta de lei que ainda ha pouco apresentou ácerca do recrutamento, e em que eliminou de um só golpe a antiga disposição que isentava do serviço militar os recrutas que pertencessem a familias desvalidas, viesse, com a maior facilidade do mundo, propor que essas familias sejam sustentadas pelos municipios!
Esta medida não está á altura do espirito esclarecido do sr. presidente do conselho, nem mesmo da sua pratica de homem politico, pois é certo que s. exa. tem governado este paiz durante vinte ou trinta annos, e deve possuir vasto conhecimento dos negocios publicos, Portanto, ainda me admiro mais de que inserisse na mencionada proposta similhante disposição.
A outra parte da minha interpellação é mais modesta, porque, emfim, refere-se a uma localidade menos importante, mas é tambem urgente, como ainda agora notei á camara.
Em consequencia da ultima cheia do rio Cavado, a uns restos do antigas obras hydraulicas que ali havia, feitas, segundo creio, no principio d'este seculo, por um engenheiro muito distincto, o, sr. Custodio Gomos Villas Boas, se bem me recordo, succedeu o que succede a todas as obras que ficam por completar.
Os materiaes que ali estavam accumulados, foram rendo arrastados pelas cheias, de fórma que a barra de Espozende é hoje muito menos accessivel do que em outro tempo.
Digo em outro tempo, porque ha já muito que ando requisitando do governo os melhoramentos de que aquelle porto absolutamente carece.
A minha nota de interpellação é precedida do requerimento em que peço os esclarecimentos necessarios para a poder realisar, na sua ultima parte.
Os esclarecimentos a que me refiro, já os pedi, ha mais de dois mezes, na outra casa do parlamento, e não me foram satisfeitos, sendo por isso forçado hoje a pedil os novamente.
Este procedimento por parte do governo é insupportavel; não encontro outra expressão para o qualificar. Sei perfeitamente que esta falta não é devida a desconsideração pessoal para commigo, por parte do sr. ministro, porquanto sei que muitos membros da camara estão em circumstancias identicas ás minhas, tendo pedido esclarecimentos, que não foram ainda enviados.
Maneio pois para a mesa, sr. presidente, tanto o meu requerimento, como a nota de interpellação que annunciei.
Tenho concluido:
O sr. Presidente: - Os dignos pares que quizerem mandar para a mesa notas de interpellação, devem ter em vista a disposição do artigo 63.° do regimento, que diz:
"O par que annunciar a interpellação, nos termos do artigo antecedente, não poderá n'essa occasião motival-a, nem desenvolver os seus fundamentos, o que tão sómente terá logar quando se verificar a interpellação.
O sr. Gomes de Castro: - Eu hei de tratar sempre de me accommodar ás prescripções do regimento, mas parece me que não o infringi.
Não tratei de realisar desde já a minha interpellação, mas tão sómente de a motivar, limitando-me a dirigir uma pergunta ao sr. presidente do conselho, para que a cidade do Porto possa saber se o governo está, ou não, resolvido a annuir ao seu pedido, ou se será necessario que ella se veja compellida a manifestar o seu desagrado.
O sr. Presidente: - Os dignos pares com prebendem que todos têem tanto interesse como a mesa, em que só mantenha a boa ordem nos trabalhos da camara.
Tem a palavra o sr. presidente do conselho.
O sr. Presidente cio Conselho de Ministros: - Protestando a minha consideração pelo digno par que acabou de fallar, e certificando-lhe que não tenho nenhuma intenção em me subtrahir á resposta que o digno par deseja do presidente do conselho, peço todavia licença para, de accordo com a indicação do sr. presidente, adiar para occasião opportuna a resposta que devo dar.
O sr. Presidente: - Vão ler-se na mesa o requerimento e a nota de interpellação que foram apresentados pelo sr. Gomes de Castro.
O sr. Secretario fez a leitura.
Nota de interpellação
Regueiro que seja prevenido o sr. ministro das obras pu-
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blicas de que o desejo interpellar, com a possivel brevidade, ácerca dos seguintes assumptos:
1.° Sobre a conveniencia de não deixar terminar a actual sessão legislativa sem prover de remedio aos prejuizos que cansa ao commercio do Porto o mau estado da sua barra.
2.° Sobre as consideraveis vantagens que para o movimento industrial e commercial d'aquella cidade deverão resultar da substituição da ponte pensil existente por uma ponte metallica de dois taboleiros, que proporciono facil communicação entre o rico e populoso concelho de Villa Nova de Gaia e a parte baixa e alta da mesma cidade.
3.º Sobre a urgente e impreterivel necessidade de melhorar as condições da barra de Espozende muito obstruida pela ultima cheia do rio Cavado. = Gomes de Castro.
Requerimento
Requeiro que sejam remettidos a esta camara, pelo ministro das obras publicas, os seguintes esclarecimentos:
1.° Quaes os estudos para o melhoramento do porto e barra de Espozende, a que o governo mandou proceder em virtude da auctorisação que lhe foi dada por lei de 20 de junho de 1866.
2.° A quanto monta, até o dia 31 de dezembro do anno preterito, a receita proveniente dos impostos creados pela dita lei. = Gomes de Castro.
Mandaram-se expedir
O sr. Presidente: - A interpellação será dada para ordem do dia quando o sr. ministro respectivo se declarar habilitado para responder.
O sr. Mello e Saldanha: - O sr. visconde de Sagres encarregou-me de communicar á camara que por incommodo de saude não tem comparecido a algumas sessões e não comparece á de hoje.
O sr. Presidente: - Tomar-se-ha nota da indicação do digno par.
Tem a palavra o sr. Vaz Preto.
O sr. Vaz Preto: - Pedi a palavra para agradecer ao sr. presidente do conselho o ter-me confiado esta consulta do ajudante do procurador geral da corôa, sobre um ponto tão importante de legislação, e para pedir a s. exa. se permitte que ella seja publicada no Diario cio governo.. pois que esse documento dá muita luz, não só á camara, mas a quem quizer ter conhecimento do assumpto a que ella se refere.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Não tenho duvida, nem a posso ter, em que seja publicada a consulta a que se referiu o digno par, comquanto parte d'ella já fosse publicada em um documento official.
O que, porém, desejava era que v. exa. désse ordem para que fosse mandada uma copia para a imprensa, e não o original, que se póde extraviar.
O sr. Presidente: - Creio que não é necessario consultar a camara sobre este ponto. (Apoiados.)
O sr. Vaz Preto pede que este documento seja impresso no Diario do governo
O sr. Vaz Preto: - Em vista da annuencia do sr. Fontes, eu peço que esta consulta seja publicada no Diario do governo, porque, como é provavel que não se possa verificar hoje a minha interpellação, desejo poder examinar esse documento, que trata de um ponto importante, e que diz respeito á interpellação annunciada.
O sr. Presidente: - Não tenho duvida em satisfazer o pedido do sr. presidente do conselho, mandando uma copia d'esse documento para a imprensa.
Vamos entrar na ordem do dia, que é a discussão do parecer n.° 34 sobre o projecto n.° 26.
O sr. secretario leu-os e são os seguintes:
Parecer n.° 34
Senhores. - A vossa commissão de fazenda examinou o projecto n.° 26, procedente da camara dos senhores deputados, approvando a proposta de lei apresentada pelo governo, que declara livre a fabricação e o commercio da polvora sob certas condições.
Esta proposta não prejudica a segurança das boas qualidades indispensaveis na pólvora para fins militares, porque a fabrica de Barcarena, melhorada ultimamente, continua a laborar por conta do estado.
O commercio da pólvora, feito até hoje exclusivamente pelo governo, foi sempre muito combatido peio contrabando, a despeito das medidas legaes repressoras d'este. A carestia relativa d'aquelle producto excitava a fabricação particular e clandestina, porque tambem, na maioria das vezes, os consumidores não careciam, para seus usos ordinarios, de genero de uma fabricação mais perfeita, e necessariamente mais dispendiosa. A esta circumstancia juntava-se quasi sempre para o governo a difficuldade de trazer abastecidos todos os Jogares em que a pólvora era procurada, isto por falta de commissarios vendedores de um genero que, por perigoso, exigia casas e cuidados especiaes, exigencias só compensaveis por commissões subidas, que algumas vezes se elevavam a 25 por cento do custo. As despezas do transporte tambem eram, para muitos casos, sensivelmente pesadas, já pela natureza especial da mercadoria, como pela difficuldade, e mesmo pela falta de communicações para algumas localidades.
A liberdade proposta removerá grande parte d'estes obstaculos, cessando os defeitos do monopolio, e estabelecendo a concorrencia. Os direitos e as licenças constituirão a receita que deve substituir a do monopolio, que se extingue, e por outro lado continuará á disposição dos compradores a polvora superior da fabrica do estado, garantida pela melhor fiscalisação official no seu processo, e pelo credito que d'ahi lhe deve provir.
Por todas estas rasões, bem como pela adopção das contidas no relatorio especial da commissão de fazenda da outra casa do parlamento, é a vossa commissão de parecer que o projecto de lei n.° 28 merece a vossa approvação e subir á sancção do Rei.
Sala da commissão, 16 de maio de 1879.= Conde do Casal Ribeiro = Carlos Bento da Silva = Augusto Cesar Barjona de Freitas = Joaquim Gonçalves Mamede = Visconde de Bivar = Barros e Sá = Augusto Xavier Palmeirim.
Projecto de lei n.° 26
Artigo 1.° É livre a industria e o commercio da pólvora nos termos da presente lei.
Art. 2.° Os artigos abaixo mencionados, quando importados de paizes estrangeiros; e despachados para consumo, pagarão nas alfandegas do continente do reino e ilhas adjacentes os seguintes direitos por cada kilogramma:
Nitrato de potassa (salitre), 30 réis.
Polvora (incluindo as taras), 200 réis.
Dita em cartuchame (incluindo os projectis e as taras), 300 réis.
Dynamite (incluindo as taras), 200 réis.
Art. 3.° São addicionadas á tabella A da lei de 14 de maio de 1872 as seguintes taxas:
Fabrica de polvora ou dynamite:
Tendo até cinco operarios, 2$000 réis.
Por cada operario a mais, 2$000 réis.
Tendo um só operario e fabricando sómente polvora de minas ou bombardeira, e polvora de caça, 2$000 réis.
Tendo um só operario, e fabricando sómente pólvora de minas ou bombardeira, 1$000 réis.
Art. 4.° Os vendedores de polvora e dynamite devem habilitar-se com licença para esta venda.
§ unico. Estas licenças ficam dependentes do pagamento annual do imposto de 800 réis a 20$000 réis graduado segundo a importancia da venda.
Art. 5.° As fabricas e depositos de polvora e dynamiie ficam sujeitos á legislação geral sobre estabelecimentos perigosos e incommodos.
Art. 6.° O governo fará os regulamentos necessarios
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para a importação, exportação e venda de pólvora e dynamite.
Art. 7.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Palacio das côrtes, em 5 de maio de 1879. = Francisco Joaquim da Costa e Silva, presidente = Antonio Maria Pereira Carrilho, deputado secretario = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, deputado secretario.
O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade, e tem a palavra o sr. Sousa Pinto.
O sr. Sousa Pinto: - Sr. presidente, eu não sou inteiramente hostil ao projecto, porque tenho por systema não combater qualquer medida que este, ou outro governo, apresente, com o fim de augmentar a receita, uma vez que d'essa medida (como da proposta se me afigura) não vier gravame ao publico; mas não posso deixar de fazer algumas observações com respeito á inopportunidade da sua apresentação, ao perigo da fabricação da polvora e á necessidade que ha de dó estabelecer os meios de evitar esse perigo.
A fabrica da polvora, construida ha mais de um seculo, foi modelada pelas que então existiam, e, apesar dos meios que empregava, e que hoje parecem grosseiros, produzia o que se julgava necessario tanto para o abastecimento dos paioes militares, como para o consumo do publico, que então se reduzia á polvora para caça, porque a industria onde actualmente se consome a polvora de minas, só mais tarde se desenvolveu.
Abastecer o exercito, e desenvolver a venda da polvora, foi o pensamento que, em annos mais proximos, tiveram todos os inspectores do arsenal do exercito, a quem estava incumbida a superintendencia d'aquelle estabelecimento.
A fabrica foi passando por diversas phases, e apresentando epochas mais ou menos prosperas, conforme eram mais ou menos prosperas, conforme eram mais ou menos habies os seus directores, ou o governo podia dispor de mais ou menos meios; porém, apesar da boa vontade de todos, pouco adiantou em melhoramento, ficando muito atrazada em relação ás fabricas de novo estabelecidas no estrangeiro.
A direcção ia empregando os meios de que podia dispor. Apresentou-se, porém, uma crise terrivel para a fabrica, que foi quando, por se desviar a agua da ribeira de Barcarena, que era empregada como motor para mover os engenhos, por ter sido dada para abastecimento da cidade, e por ter sido dada para abastecimento da cidade, e por isso cedida a companhia das aguas, paralysaram os trabalhos, porque, apesar da companhia ser obrigada a substituir por outro motor, nunca chegou a realisar-se.
Desde então quasi que a fabrica nada produzia, e o que fazia era de má qualidade, por se ver na necessidade de empregar os bois para trabalhar os engenhos, o que tornava o producto caro, a sua fabricação irregular e muito escassa, do que resultou não poder satisfazer á vigesima parte das exigencias dos commissarios da venda da polvora.
D'aqui nasceu desenvolver-se o contrabando em grande escala.
Esta situação não passou desapercebida ao sr. ministro da guerra; em 1876 pediu alguns meios para desenvolver o fabrico d'aquelle genero, e obteve das camaras réis 80:000$000 para melhoramentos da fabrica. S. exa. mandou proceder a varios estudos ácerca dos referidos melhoramentos, mas não chegou a leval-os á execução.
Quando em 1877 fui chamado aos conselhos da corôa, achei muitos trabalhos já preparados e immediatamente procurei lançar mão do que me pareceu mais urgente; e, coadjuvado pelo muito illustrado e intelligente general, actualmente director geral da arma de artilheria, o sr. João Manuel Cordeiro, fiz estabelecer em Barcarena locomoveis que por meio de um cabo telo-dynamico dão movimento aos engenhos, como disse no relatorio que apresentei na camara dos senhores deputados no principio do anno proximo passado, é de que peço licença para ler a parte respectiva:
"Um estabelecimento importante pelo lado economico e militar chamou tambem particularmente a minha attenção Refiro-me á fabrica da polvora em Barcarena.
"Os melhoramentos que até hoje se tinha diligenciado obter, tanto na quantidade de polvora como na sua qualidade, eram pouco sensiveis, senão por vezes negativos; fazer pois um esforço, a fim de melhorar aquelle estabelecimento; utilisando os fundos que as camaras tinham votado e foram conferidos ao governo pela carta 9 de fevereiro de 1876, tal foi, o meu intuito
" De tempos antigos houve o pensamento de annexar a officina do refino de salitre á fabrica da polvora; este pensamento reviveu na organização do arsenal do exercito de 23 de dezembro de 1868, e não foi de todo abandonado na de 13 de dezembro de 1869; mas a sua realisação era julgada assás dispendiosa, pelo que ficara sem effeito. Pude porem leval-a a execução mediante rasoavel despeza, incluindo transportes, construcção de armazem para o salitro bruto, apropriação da antiga estufa para officina de refino com quatro caldeiras, casas para a secca do salitre ao ar e com lume, gabinete para a escripturação, etc.
" Este facto consummado permittiu dispor do antigo e grandioso edificio de Alcantara, para onde se estão mudando os papeis dos archivos do ministerio a meu cargo e os do archivo dos extinctos conselhos de guerra, que estavam na Ajuda, ficando ainda espaço para outros usos.
"Como é sabido, a irregularidade do motor hydraulico para os quatro engenhos de encascar que possuimos, tornava muito incerta a producção das massas. O movimento por meio do vapor havia sido estudado, tinham-se feito mesmo varias propostas, e até adquirido, alguns terrenos; mas a realisação do que se pretendia, ficára sustada. Mediante a approvação de diversas propostas e a compra de uma locomovel, tudo na importancia de 6:775$000 réis, vae-se dar começo a um ensaio que espero se torne definitivo. Constitui-se uma casa para aquella machina e restabeleceu-se um eixo de movimento para quatro engenhos, podendo porém mover-se cada um d'elles em separado quando convenha.
"A transmissão do movimento da mesma machina para o eixo geral faz-se por maio de um cabo telo dynamico comprado ha pouco em França.
" Espero em breve tempo conhecer a possibilidade de se poder dar completo desenvolvimento ao fabrico da polvora, que tão precisa se torna como objecto de commercio, assim como para o serviço do exercito."
Por consequencia, se esta proposta de lei tivesse sido apresentada antes de se começarem os melhoramentos na fabrica da polvora, parece-me que seria justificada, porque viria supprir a falta d'este genero no mercado; mas, sr. pesidente, quando se tem conseguido augmentar o fabrico da polvora, graças á boa vontade do actual director geral da artilheria, a ponto de se poder (segundo informações particulares, porque, officiaes não as posso ter) fornecer o mercado de toda a polvora geralmente usada, á excepção de uma qualidade, e, que não tardará muito que tambem se obtenha, que é a de Principe fina, não me parece que seja a occasião mais apropriada de apresentar uma proposta da lei para a liberdade do fabrico d'este genero. (Apoiados.)
Eu não sou completamente hostil ao projecto, como já, tive a honra de dizer á camara, mas entendo que, se elle tivesse sido apresentado antes de se ter dado desenvolvimento á fabrica de Barcarena era justificada a apresentação, mas quando é preciso tirar o juro do capital empregado nos melhoramentos, pelo menos não me pacece opportuno, e reconheço que da sua approvação hão de resultar perigos, ou pelo menos um certo mau estar para as povoações, como eu vou mostrar com factos que succederam commigo.
Quando tive a honra de occupar o logar de director geral da arma de artilheria, tratei de mandar fazer um paiol na Cruz dos Quatro Caminhos, em sitio completamente isolado, e aonde, se se désse a fatalidade de haver uma
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explosão, não poderia perigar a vida de ninguem, porque não havia ali habitações proximas. Não obstante todas as circumstancias que recommendavam o local [...], foram taes as apprehensões e os empenhes, que tive ao desistir do meu proposito, e não se fez o paiol.
Mais tarde, sendo ministro da guerra, mandei depositar a polvora algodão em um forte que está á entrada, do Faço de Arcos; ora a polvora algodão é inoffensiva quando está, como aquella, humedecida, e apesar d'isso succedeu que se levantou toda a população, tendo á frente tres dignos pares, pedindo que se removesse d'ali aquele deposito, e eu achei-me collocado na necessidade de mandar a pólvora para o forte das Maias, com prejuizo do serviço.
Por consequencia, se a idéa de que se vae depositar a polvora, embora encartuchada em chumbo, e fechado, quasi hermeticamente em cunhetes, produz um tão grande panico em qualquer povoação, o que acontecerá quando se saiba que se vão estabelecer fabricas de polvora, porque uma lei tornou livre a fabricação d'este genero?...
E têem rasão os que receiarem, porque o fabrico da polvora é muitissimo perigoso, sobretudo não sendo cercado de todas as precauções. Ali mesmo em Barcarena, onde esse fabrico é dirigido por officiaes technicos, ali mesmo teve ainda ha poucos annos logar a explosão de cem arrobas de polvora, e nunca se soube qual foi a origem d'essa explosão.
Para investigar as causas, foram nomeadas commissões de officiaes scientificos e de peritos, mas nada concluiram.
Inventaram-se a proposito diversas causas: uns diziam que eram as nuvens que se tinham condensado em fórma de lente, e que os raios do sol passando através d'ellas, teriam produzido o desastre; outros disseram que a origem tinha sido o phosphoro, levado talvez por algum pombo, dos muitos que ali existem.
O que é facto é que não se póde averiguar a origem d'aquella explosão, que podia ter produzido effeitos muito lamentaveis; felizmente não houve victima nenhuma.
Todos os dias se estão dando desastres, mesmo nas fabricas de polvora mais importantes, e onde as operações do fabrico são cercadas do maior numero de precauções, e onde ha officiaes com conhecimentos technicos, mestres com aturada experiencia, vigias, guardas e regulamentos, muito mais facilmente portanto podem dar-se esses desastres em fabricas onde não haja todas as condições de segurança, nem pericia, nem mesmo uma rigorosa fiscalisação.
Se porém se entende que a adopção desta lei é necessaria, eu julgo que ao mesmo tempo se deve tratar de fazer regulamentos tendentes a evitar os sinistros. Os impostos, as licenças com que vão ser oneradas as fabricas, e os direitos dos artigos importados para o fabrico, tudo isso talvez não compense a despeza a fazer com a necessaria fiscalisação.
Entendo pois que se devem empregar todos os moios de rigor para a fabricação da polvora, por interesse das povoações, onde a existencia de estabelecimentos que fabriquem esse elemento destruidor constitue um perigo permanente.
Póde ser que da liberdade d'esta industria se tirem melhores resultados economicos do que eu supponho; mas o que é facto é que a maior parte das povoações hão de receiar muito o estabelecimento de fabricas, pois que já o têem mostrado pelo de simples paioes.
Ainda direi alguma cousa sobre uma observação que vem no relatorio da commissão de fazenda, isto é, ácerca de ali se dizer que a polvora da fabrica de Barcarena é cara. Eu não a reputo assim, mas ainda que o fosse não deveria admirar, porque esse producto sáe d'ali com meios de precaução, taes como o encartuchamento e o ser resguardada em cunhetes; e terem os commissarios da venda, do a guardar em logares seguros, e para isso recebem percentagem, o que tudo vae influir no preço. Com a liberdade do fabrico vender-se na embarrilada o mesmo a granel, e o publico podel-a-ha obter por menor preço, mas com muito maior risco.
Eram estas as observações que eu tinha a fazer.
O sr. Ministro da Fazenda: - O digno par, o illustre general sr. Sousa Pinto, comquanto se não declarasse inteiramente hostil á doutrina do projecto de que nos occupâmos, pareceu-me comtudo revelar que no seu espirito existia duvida de que elle podesse produzir receita de alguma importancia, se receita chegasse a produzir, sendo a opinião de s. exa. que a fabrica do estado, como hoje se acha melhorada, podia supprir as necessidades do consumo. Creio que o digno par se engana nas suas supposições, e que ao contrario do que s. exa. julga, a fabrica de Barcarena não póde nem poderá fornecer toda a pólvora que é necessaria para o consumo do estado e do publico. Se consultarmos as estatisticas das alfandegas, veremos que a materia prima da polvora, isto é, o salitre, que se importa todos os annos é em quantidade consideravel; e sendo certo que este ultimo producto, a não ser para o fabrico da polvora, quasi não tem applicação, porque apenas uma quantidade diminuia poderá ser destinada a outros fins; e dando-se a circumstancia de ser avultado relativamente o rendimento annual que se cobra nas alfandegas do reino pela entrada do salitre, não obstante o estado não pagar cousa alguma pela importação d'aquella materia prima, é evidente que o fabrico de polvora clandestino que existe no paiz é assas importante.
É d'esse fabrico clandestino que sáe uma grandes parte da que é consumida pelos particulares, e ainda que a fabrica do estado chegasse a produzir a quantidade de pólvora precisa para as necessidades do paiz, ainda assim não poderia fazer concorrencia á industria particular, porque são tão grandes e taes as difficuldades ao transporte d'aquelle genero, que se torna de preço muito elevado quando tem de ser posto em logares distantes.
Por consequencia a polvora fabricada nos locaes mais proximos dos pontos onde d'ella se carece, ha de ter sempre preferencia, embora seja inferior em qualidade á do estado, pela rasão de ser mais barata.
Mesmo por muito inferior que seja o preço da pólvora que a fabrica de Barcarena produza, terá sempre a circumstancia dos transportes a tornai-a cara para aquelles que necessitem d'ella fóra de uma certa área.
Refiro me sobretudo á polvora ordinaria para os usos mais vulgares.
Em Franca, onde o monopolio existe, ha onze fabricas de pólvora, comprehendendo cada uma uma área menor que a nossa fabrica comprehende, em relação ao nosso paiz, como se reconhece facilmente comparando a extensão do territorio portuguez com o d'aquella nação.
Não me parece que possa soffrer duvida que a fabrica de Barcarena de per si só possa satisfazer ao consumo de todo o paiz por um preço tal, que obste ao contrabando ou fabrico clandestino, e, sendo assim, estou persuadido que é da maior conveniencia regularisar um facto que já existe, que não se tem podido evitar, e do que o estado não tirava o minimo interesse, antes damno.
Por este projecto, se for convertido em lei, a industria particular do fabrico da pólvora que se exercia contra lei, sem proveito para o thesouro, passa a ser uma industria legalmente reconhecida, que deve produzir receita, porque terá de pagar o respectivo imposto, não prejudicando isto por modo algum o fabrico da polvora por conta do estado.
Quanto aos perigos que podem resultar do estabelecimento de fabricas de polvora, ou depositos d'este genero, devo dizer que tanto as fabricas como os depositos ficara sujeitos á legislação que diz respeito aos estabelecimentos incommodos ou perigosos, e por consequencia hão de tomar-se todas as precausões necessarias para evitar quanto possivel os perigos a que o digno par alludiu.
Uma d'essas precauções será não se poderem estabelecer em povoado as fabricas de polvora, precaução, note a ca-
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mara, que hoje não existe, porque sendo clandestino o fabrico da polvora, as auctoridades não têem sempre meio de fazer cumprir a lei, e por conseguinte actualmente ha maior perigo, do que haverá quando for permittido o fabrico da polvora, na conformidade das disposições legaes que regem para os estabelecimentos perigosos.
É tal o consumo da pólvora, para ò qual não basta a producção da fabrica do estado, que me consta foi ha alguns annos necessario que a auctoridade afrouxasse ou suspendesse a fiscalisação, que fechasse os olhos, como vulgarmente se diz, porque não havia polvora para o serviço das obras publicas, onde, como todos sabem, se emprega uma grande quantidade d'aquelle artigo.
Pelos motivos que apontei, creio que do projecto ha de resultar para o estado um certo rendimento, embora não seja muito importante.
Quanto aos perigos provenientes do estabelecimento, do fabrico ou da venda por conta dos particulares, entendo que podem ser todos conjurados logo que se applique com rigor a legislação que entre nós existe ácerca dos estabelecimentos incommodos, insalubres ou perigosos.
O sr. Vaz Preto: - Não tencionava entrar na discussão d'este projecto, mas as considerações feitas pelo sr. Sousa Pinto e as respostas do sr. ministro da fazenda, obrigam-me a pedir a s. exa. varios esclarecimentos e a dizer tambem algumas palavras.
Eu desejo ver como o sr. ministro da, fazenda destroe o seguinte dilemma.
Ou as fabricas particulares, que vão estabelecer-se em virtude deste projecto, podem ou não podem concorrer com a de Barcarena.
Se podem, é porque a sua producção sáe mais barata; e, n'esse caso, aquella fabrica serve só para o estado despender sem utilidade, podendo, aliás, fazer abastecimento de polvora nas novas fabricas.
Se não podem, então é inutil o projecto, porque ninguem irá despender capitaes n'uma industria que só dará prejuizos.
A este dilemma não póde o governo fugir.
Eu desejo, pois, n'este caso que o sr. Serpa me explique a importancia do projecto.
Segundo a noticia, que deu o sr. Sousa Pinto, que me surprehendeu, e que deveria surprehender a camara, houve ha dois annos uma falta grande de pólvora, porque, em consequencia da estiagem, as aguas que serviam de motor na fabrica foram cedidas pelo governo á companhia das aguas!
Faltando este motor barato, foi necessario substituil-o por outro mais caro, e, portanto, despender-se avultadas sommas.
Era, pois, esta exactamente a occasião de se estabelecer, como disse muito bem. o sr. general Sousa Pinto, a liberdade do fabrico.
Não succedeu porém assim, porque o sr. presidente do conselho julgou que era de necessidade absoluta haver uma fabrica de polvora por conta do estado, aperfeiçoar os processos ali seguidos e gastar para esse fim mais 86:000$000 réis!
Não é um contrasenso, não é uma incoherencia, não é uma leviandade do sr. Fontes manter o monopolio quando elle não deve extinguil-o, quando elle produz receita, agora que a fabrica de Barcarena produz, como acaba de declarar o sr. Sousa Pinto, a polvora necessaria não só para o exercito, mas para as obras publicas e para uso dos particulares?
É, pois, n'esta occasião em que a fabrica póde dar resultado e tirar o thesouro as vantagens das sommas que n'ella se empregaram que os srs. ministros da guerra e da fazenda vem apresentar á camara um projecto para tornar livre o fabrico da pólvora?! Desejava, pois, que se me explicasse o motivo da mudança tão precoce do sr. ministro da guerra, e bem assim quaes as vantagens que o paiz tira com a liberdade do fabrico, e as que provem ao exercito.
Ha outro ponto sobre que eu desejo tambem ser esclarecido pelo governo, e é aquelle a que se referiu o sr. general Sousa Pinto, com relação ao panico que suscita nas povoações o estabelecimento de fabricas de polvora, pelos perigos que d'ahi podem resultar.
Não ha duvida que na nossa legislação ha disposições no sentido de obviar aos inconvenientes que podem provir do estabelecimentos perigosos; mas tambem não ha duvida que todas as vezes que nós possamos evitar difficuldades e deixar de crear complicações é nosso dever fazel-o, o tanto mais quanto não ha certeza nenhuma de que esta modificação de systema de os resultados financeiros que o governo apregoa e imagina que deve dar.
Por todas estas considerações, e porque o projecto não vem acompanhado dos esclarecimentos precisos que demonstrem a sua vantagem e justifiquem a mudança de opinião do sr. presidente do conselho, eu limito aqui as minhas observações, aguardando as explicações do governo para determinar o meu voto.
O sr. Ministro da Fazenda: - Sr. presidente, diz o digno par que, ou as fabricas particulares podem concorrer com a fabrica do estado, e n'esse caso serão ellas as causadoras da sua ruina, ou não podem concorrer, e então o projecto não serve de nada. Acho excellente o argumento de s. exa., mas prova de mais, porque com as fabricas clandestinas devia dar-se o mesmo facto. Se colhesse o argumento do digno par, ou não existiam as fabricas clandestinas ou tinham dado cabo da fabrica do estado. Eu já expliquei á camara como pela circumstancia da difficuldade da conducção, sobretudo quando se trata da polvora mais barata, da que serve para as obras publicas, esse producto, ainda que seja fabricado com economia e possa ser vendido por um preço diminuta, torna se caro quando tem de ser transportado a uma certa distancia, do ponto onde se fabrica, taes são as difficuldades do transporto. Uma fabrica estabelecida a quarenta ou cincoenta leguas do local a que for destinada a polvora, por mais barata e perfeita que seja a sua producção, nunca ha de poder concorrer com outra que esteja mais proxima, do local, embora fabrique peior é um poupo mais cara.
(Interrupção do sr. Vaz Preto que se não ouviu.)
Hoje dá-se já essa vantagem que nota o digno par, e apesar d'isso a fabricação clandestina lucta com a fabricação do governo. Por consequencia o fabrico particular luctará da mesma maneira, mas legalmente e sem inconveniente, pelo que diz respeito á polvora menos fina e para os usos ordinarios.
Quanto aos esclarecimentos a que o digno par vagamente se referiu, devo dizer que, ao ver que na outra casa do parlamento este projecto não soffreu opposição de nenhum dos lados da camara, nem foram pedidos esclarecimentos alguns, esperava que aqui succedesse o mesmo; isto é, não julgava que a camara dos pares carecesse de esclarecimentos em materia que, me parece tão simples. Por isso digo que os esclarecimentos pedidos pelo sr. Vaz Preto não se podem considerar absolutamente necessarios para elucidar o assumpto em discussão.
O sr. Conde do Casal Ribeiro: - Sr. presidente, que voto o projecto, antecipadamente o sabe a camara, porque puz o meu nome no parecer, excellentemente redigido pelo nosso illustre collega o sr. general Palmeirim. Voto o parecer, sem enthusiasmo; voto-o mesmo com desconforto, As observações apresentadas pelo nosso digno collega o sr. general Sousa Pinto são tão sensatas, que ainda aos menos conhecedores do assumpto, aos nada technicos, occorre naturalmente o reparo de que seja agora, pouco depois de se pedirem avultados meios para aperfeiçoar a fabrica do estado, que venha o sr. ministro da fazenda declarar que a industria do estado não póde luctar com a industria particular illegal, com o contrabando.
O argumento vae longe, e não parece que possa appli-
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car-se só á polvora. Elle não prova por certo demasiada confiança que o sr. ministro da fazenda deposite nos seus meios de fiscalisação.
O fabrico da polvora nunca foi considerado só como uma necessidade do exercito; foi considerado tambem como meio de receita. As nossas circumstancias financeiras não são tão prosperas, que nos aconselhem a prescindir dos meios de receita que podem ser aproveitados.
Diz-se agora que o fabrico da polvora não póde luctar com o fabrico particular e clandestino. Assim será. Entretanto, nós vemos que o governo, não contente com a fiscalisação da alfandega, que já existia, com avultada despeza comparada com a de outros paizes, augmentou-a ultimamente em mais 150:000$000 réis. A fiscalisação não está só na raia; está tambem, no interior. Pois a fiscalisação que ha de vir para o real de agua, comquanto se não saiba ainda quando ha de ser posta em execução a lei, (Apoiados.) não poderá fiscalisar mais este rendimento do estado? Devia poder.
Talvez o governo tenha rasão em apresentar esta projecto; mas n'esse caso temos votado muita fiscalisação para o gasto e pouca para o serviço.
Em 1876, o sr. ministro da guerra, mais confiado e esperançado, apresentou um projecto de lei para ser auctorisado a gastar com a fabrica da polvora 80:000$000 réis. Sem difficuldade obteve esta auctorisação do parlamento.
Não se gastou toda a verba, pelo menos até á organisação do orçamento rectificativo. Deste documento deprehende-se que ha um saldo superior a 50:000$000 réis.
Gastaram-se, até ao momento em que o orçamento rectificado se organisou, por conta do credito de 80:000$000 réis, destinados para machinas e melhoramentos na fabrica da polvora, em virtude da lei de 9 de fevereiro de 1876, 26:745$206 réis, e o resto, na importancia de 53:254$794 réis, vem descripto como saldo a gastar n'aquelle documento, cuja discussão está pendente.
Ora, n'estas circumstancias, creio que não seria absolutamente inopportuno, embora possa parecer impertinente, perguntar ao governo se não poderia consentir em que se riscasse do orçamento rectificado este saldo de 53:254$794 réis, ou que, ao menos, se attenuasse, limitando-o á quantia necessaria para concluir melhoramentos já encetados, visto que não temos necessidade de proseguir no empenho de desenvolver aquelle estabelecimento em tão larga escala. (Apoiados.)
A polvora já mereceu a attenção do parlamento portuguez.
Durante o primeiro ministerio regenerador fallou-se muitas vezes n'este assumpto em uma commissão de fazenda, á que eu tive a honra de pertencer, juntamente com o meu amigo o sr. general Palmeirim, e outros cavalheiros que não têem assento n'esta camara.
Então tambem eramos impertinentes com os nossos amigos do governo; e, se bem me recordo, em mais de um parecer da commissão de fazenda da camara dos senhores deputados se chamou a attenção dos ministros para a fabrica da polvora,
pedindo-se que ella fosse considerada como meio de crear receita. D'aqui resultou que o sr. duque de Saldanha que, segundo creio, alem de militar valente e illustrado, não era absolutamente leigo em materias economicas, entendeu dever nomear uma commissão encarregada de propor os melhoramentos que se deviam introduzir n'aquelle estabelecimento, não só debaixo do ponto de vista militar, mas debaixo do ponto de vista da receita publica.
No decreto de 8 de março de 1854, escreveu o marechal duque de Saldanha o seguinte:
"... e convindo tambem, não só prover ao progressivo aperfeiçoamento da mesma polvora, mas ao melhor expediente de obter com regularidade e economia a sua venda no maior numero de povoações, de que resultará consideravel augmento na receita publica; e pelo concurso de tudo com as leis em vigor, o acabamento da fabricação clandestina, e o escandaloso contrabando apparecido em algumas localidades: hei por bem em nome de El-Rei, nomear uma commissão, etc."
D'este decreto resultou... um livro.
A polvora tambem tem o seu livro, e o livro está aqui.
Não foi questão tão insignificante que não merecesse a attenção de cavalheiros illustres, o particularmente a do sr. general Palmeirim, homem que ninguem, excede em zêlo pelas cousas publicas, e cuja intelligencia e amor ao trabalho são já proverbiaes.
Do trabalho do sr. general Palmeirim e dos seus collegas nasceu este livro... tudo está aqui; (mostrando um livro) são melhoramentos a realisar na fabrica da polvora para se obterem os meios de tirar receita para o estado.
A opinião do sr. duque de Saldanha foi partilhada pela commissão, que considerou a fabrica da polvora debaixo dos dois pontos de vista mencionados no decreto.
Depois de longo e illustrado trabalho, a commissão conclue n'estes termos:
" A commissão pensa que, depois de tudo quanto leva escripto, é muito logica e plausivel a crença de que o monopolio da polvora deve fundir grande lucro progressivo para o thesouro desde que se lhe preste desvelo particular."
Ora já vimos que com taes auctoridades são licitas as duvidas, são licitas as observações; e não parece tão estranha a doutrina d'aquelles que pensem que para abolir o monopolio da polvora póde não ser agora a occasião mais opportuna, muito especialmente, e quando ainda ha pouco tempo o sr. ministro da guerra tinha obtido das côrtes um credito para melhorar consideravelmente a fabrica de Barcarena.
A receita proveniente do monopolio da pólvora não se póde conhecer bem pelas contas do thesouro, porque vem ali englobada numa verba que comprehende outras receitas do arsenal do exereito.
Entretanto creio que a principal parte d'aquella verba é a que respeita á vencia da polvora.
Ora, confrontando alguns periodos, temos que o rendimento do arsenal e da pólvora era em 1834-1865 de réis 43:025$948, em 1865-1866 de 47:619$681 réis, em 1866-1867 de 54:254$060 réis, em 1867-1868 de réis 51:092$579.
Quer dizer, ia subindo gradualmente. Em 1873-1874, 1874-1875, manteve-se ainda, quanto ao primeiro anno, em. 47:389$802 réis, e quanto ao segundo em 47:510$588 réis.
D'ahi por diante começa a descer: em 1875-1876 areis 34:580$247, em 1876-1877 a 27:758$857 réis, em 1877-1878 a 28:816$956 réis. Isto é, votados os melhoramentos, baixa a receita quasi a metade.
Não sei bem explicar este phenomeno, mas não podendo deixar de reconhecer a fatalidade d'elle, acceito o projecto tambem como uma fatalidade.
Ha sobretudo uma cousa que eu acceito, e é a parte do relatorio do ministerio da fazenda, em que o illustre ministro fundamenta o projecto com estas notaveis e eloquentes palavras:
"O estado é por via de regra inhabil fabricante."
Por via de regra é assim e na hypothese actual, ainda mais. Temos outras demonstrações mais valiosas d'aquella affirmativa. Não parece, por exemplo, que o estado seja extremamente habil fabricante de caminhos de ferro, quando, havendo-se calculado em 30:000$000 réis o custo de cada kilometro, importa em cerca de 60:000$000 na construcção das linhas do Minho e Douro, (Apoiados.) e quando as expropriações na provincia do Minho foram pagas pelo preço de quasi 1:000 libras por kilometro, o que corresponde a um valor medio de terrenos que não se realisa, nem no mais ricos condados de Inglaterra, nem nas mais afamadas regiões do Bordelais. (Apoiados.)
Não é facil negar que o estado seja inhabil fabricante
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de penitenciarias, que custam mais do dobro da quantia que estabelecimentos de similhante ou approximada grandeza têem custado n'outros paizes. (Apoiados.) Não parece contestavel que o governo seja inhabil concertador de palacios de justiça militar, quando num palacio que comprou por 15:000$000 réis, gasta 100:000$000 réis em concertos que estavam orçados em 6:000$000 réis. (Apoiados.) Tambem se póde affirmar que o governo é inhabil fabricante de orçamentos, quando esses orçamentos se apresentam de maneira que são mais uma illusão para o paiz do que: o rol exacto do seu estado economico, e financeiro. (Apoiados;)
É preciso, portanto, applicar a theoria em mais larga escala, e quando isto aconteça não me parece tambem que o governo prove ser extremamente habil fabricante de administração, (Apoiados.) quando por- necessidade politica ou supposta como tal entrega ao desbarato os dinheiros da nação pela annuencia a quantas exigencias lhe provem da necessidade de conciliar certos apoios; e quando tolera que administrem ou malbarateem aquelles a quem cumpria legislar, para em vez d'elles ser o governo que legisla ou finge legislar, importando lhe sómente conservar-se no poder.
Parece, pois, exuberantemente demonstrada a these do que o governo é inhabil fabricante, e por isso lhe voto este projecto.
E não é só de polvora que o governo é inhabil fabricante; é tambem inhabil fabricante de tantas outras cousas!...
Olhemos tambem pelo que elle póde fazer na construcção de linhas ferreas, quando de futuro tenhamos de votar auctorisações para o estabelecimento de novas vias de communicação accelerada, e muito principalmente quando forem construidas por conta do estado. Olhemos pelas obras hydraulicas que tenham de ser feitas pelo governo. Olhemos por outras muitas obras em que elle haja de ser o fabricante, como as que tenham relação com a installação em certos edificios de tribunaes militares, ou que sejam pagas, por exemplo, em concertos de igrejas. E n'esta parte direi que apesar de reconhecer que devemos o maior respeito ao culto que professâmos, é cada localidade que deve sustentar a sua igreja e proceder aos concertos que exija; e o estado só deve encarregar-se da reparação, e conservação d'aquellas que são verdadeiros monumentos nacionaes, e não monumentos de favores eleitoraes.
Assim, pois, voto o projecto pela rasão do governo ser inhavel fabricante de polvora. E porque realmente o é, não só deste producto, mas de tantas outras cousas, seria bom que emendasse os seus methodos de fabricar, ou deixasse a outrem, fosse quem fosse, fabricar melhor do que elle sabe ou pôde.
O sr. Vaz Preto: - Que posso eu dizer, sr. presidente, depois do brilhante discurso que acaba de pronunciar o sr. conde do Casal Ribeiro? Que posso eu dizer, quando o governo, em face das severas apreciações feitas por aquelle digno par com relação á conducta do ministerio, se conserva mudo e silencioso nas suas cadeiras, não obstante correr-lhe o dever imperioso de apressar-se a justificar o seu procedimento, e a repellir as acres arguições que lhe foram feitas?
O silencio e a mudez dos srs. ministros provam mais uma vez que s. exas. se sentem vergados sob o peso enorme das suas faltas, dos seus erros, dos seus desvarios, e que a sua consciencia lhes brada que tudo quanto se tem dito n'esta casa para condemnar os seus actos é pouco, para o que merecem.
Infelizmente o governo, como já são tantos os seus actos censuraveis,
acostumou-se a ouvir a miudo as mais acres censuras, sem d'ellas fazer cargo. A que estado de abatimento nós chegámos!
Se os srs. ministros soffrem paciente e resignadamente os severos castigos que aqui todos os dias lhes inflingimos, o paiz, porém, é que não póde soffrer a má administração do actual gabinete, e por isso nós não devemos deixar um só momento de a censurar e condemnar com todas as nossas forças até que o povo, conhecedor da sua força, abramos olhos e cure dos seus interesses.
Voltemos á questão da polvora.
O sr. ministro da fazenda respondeu de um modo infelicissimo ao dilemma que eu estabeleci. Disse eu que ou ás industrias particulares podiam concorrer com a fabrica do estado, e, por consequencia, produziam mais barato, o que equivaleria a mostrar que aquella fabrica era um puro prejuizo para o paiz, ou essas industrias não podiam concorrer com ella, e, por conseguinte, era inutil o projecto que se discute.
S. exa. responde a este argumento, dizendo que assim como a industria clandestina tem podido concorrer com a fabrica do estado por meio do contrabando, tornando-se agora essa industria legal, muito melhor podia concorrer.
Sr. presidente, eu não comprehendo este systema de argumentar do sr. ministro da fazenda, que está censurando a sua incuria, o seu desleixo a sua falta de vigilancia, deixando correr á revelia os interesses do povo pela falta de fiscalisação!
Eu não comprehendo esto argumento do sr. Antonio do Serpa!
Entendo, pelo contrario, que a industria legal, sendo onerada com tantos encargos, tendo, de pagar tantos direitos, na importação das materias primas, não póde concorrer com vantagem, como o fazia a industria clandestina, que se subtrahia a todos estes encargos e a todos estes direitos.
O que eu tambem vejo é que o dinheiro que se tem empregado na fabricar da pólvora de Barcarena tem sido muito mal gasto, e que o monopolio do estado não deu lucro algum.
D'aqui se mostra que n'este ponto, como em todos 09 serviços dependentes do ministerio da fazenda e da guerra, onde tudo é mal fiscalisado, não tem havido a fiscalisação que devia haver.
O livro que o sr. conde do Casal Ribeiro citou indicava os meios pelos quaes o estado podia ter tirado uma receita effectiva da fabrica.
Este livro é formado pelos pareceres da commissão que o governo nomeou para estudarem aquelle assumpto.
Estudou, apresentou ao governo o seu trabalho, o governo não fez uso d'elle, não o leu sequer, e vem em seguida, depois das despezas grandes que fez, trazer á camara este projecto!
Os esclarecimentos, ou documentos, quedou queria que acompanhassem o projecto eram todos aquelles que o elucidassem e os que destruissem o effeito d'aquelle livro.
Sr. presidente, o que eu não comprehendo é que o sr. ministro da guerra gastasse ha dois annos sommas enormes coma fabrica de Barcarena para aperfeiçoar áquella estabelecimento com o intuito de tirar e auferir uma valiosa receita do monopolio da fabrica da polvora, e quando ella está nassas circumstancias, venha propor ao parlamento a abolição d'aquelle systema por ante-economico!
Por isso multo bem disse o sr. Sousa Pinto, que este projecto tinha a sua monção ha dois annos, quando o governo cedeu as aguas da ribeira de Barcarena á companhia das aguas, e tinha de fazer dispendios avultados, não só para substituir aquelle barato motor, mas para dotar á fabrica de machinas e utensilios de que carecia.
Sr. presidente, gastar com a fabrica sommas a fim d'ella poder fabricar polvora para todo o paiz, gastar com a fiscalisação, como o sr. Serpa sabe gastar, dando aos empregados gratificações e ajudas de custo enormes, e na occasião em que se podia tirar resultados d'estes sacrificios vir dizer ao parlamento que todas estas despezas foram inutilisadas, é obra do sr. Fontes e do sr. Serpa.
Sr, presidente, o que parecia rasoavel, o que parecia lo-
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gico, o que seria para desejar, era que ao menos se tivesse tirado alguma vantagem de dinheiro que se tem gasto ultimamente com aquella fabrica: mas uma vez que se não t rou resultado algum d'esse dispendio, e o sr. ministro da fazenda nos vem dizer que o catado na o é bom fabricante, e que por isso propoz a livro concorrencia á fabrica do estado, a qual todavia conserva; parecia-me preferivel que se adoptasse uma medida radical, acabando com a fabrica de Barearena, da qual o governo vae tirar ainda menos vantagem depois da approvação do projecte que se discute, e que se estabelecesse a liberdade completa.
Eu não gosto dos monopolios, e tenho sustentado constantemente as idéas de liberdade; não obstante as circumstancias, a civilisação o estado do paiz, as nações vizinhas, o seu adiantamento, e o systema que seguem influem poderosamente muitas vezes na acceitação d'esta ou d'aquella theoria.
Quantos e quantos monopolios não existem ainda disseminados pelas differentes nações da Europa produzindo-lhe valiosas receitas?
É pois forçoso attender as circumstancias que se dão no paiz, pois ha casos em que se não podem dispensar convenientemente certos e determinados monopolios.
N'estes ter aios, o que temos a considerar é se ha conveniencia para o estado e para o paiz na abolirão do monopolio da polvora.
Se ha vantagens n'essa abolição, o sr. ministro da fazenda devia tel-o demonstrado já, e é exactamente o que não fez.
Portanto eu continúo na duvida se ha mais vantagem na conservação dos monopolio do que na sua abolição.
Pedia, pois, ao sr. ministro que me esclaresse a este respeito, que me dissesse o que pensa das affirmativas que vem n'aquelle livro de que fallou o sr. conde do Casal Ribeiro, que mo explicasse como põe de parte os conselhos da illustrada commissão que estudou profundamente o assumpto, em fim que me apontasse quaes as vantagens immediatas que resultam d'este projecto.
O meu espirito está perplexo e eu desejava convencer-me, o fixar a minha convicção, e portanto espero pelas reflexões do sr. Serpa.
O sr. Costa Lobo: - Desejo apenas pedir uma simples explicação ao governo.
O sr. general Sousa Pinto disse que o motor da fabrica de Barearena era a agua que fôra concedida á companhia das aguas, e eu desejo que o governo me explique qual a rasão por que fez essa cessão, do que resultou, segundo disse o digno par, ter o machinismo nos ultimos tempos de ser movido por bois, o que deu logar a uma grande diminuição no rendimento da fabrica, como notou o sr. conde do Casal Ribeiro.
Portanto, espero que o sr. ministro me explique este ponto, declarando não só a rasão por que se fez a cessão das aguas, mas tambem se ella foi gratuita.
Talvez do facto proveniente da cessão das aguas, tendo por consequencia havido uma diminuição na receita da fabrica, resultasse a necessidade de tornar livre o fabrico da polvora.
Quando ha uma unica fabrica para fornecer o paiz, e essa fabrica não póde occorrer As necessidades do consumo, o resultado é que as fabricas clandestinas desenvolvem-se rapidamente, e uma voz estabelecidas é difficil extinguil-as. Esta rasão parece-me que me auctorisa a pedir explicações ao governo a respeito do facto, que foi apenas levemente mencionado pelo sr. Sousa Pinto, mas que fez impressão no meu espirito, como me parece que fez tambem no espirito de outros dignos pares.
É necessario saber se a companhia das aguas 5 tambem uma das muitas felizes individualidades sobre quem chove o mana do orçamento.
O sr. Vaz Preto: - Confesso ingenuamente que me admira como o governo responde á camara que me admira a pouca importancia que ella merece ao sr. Serpa!
O sr. ministro da fazenda devia saber se as aguas que alimentavam a fabrica de Barearena foram ou não concedidas á companhia, e eu não tenho duvida que o foram, pois acaba de o dizer o sr. general Sousa Pinto, o não mo admira que o governo cedesse essas aguas quando deu á companhia as aguas de Bellas, em que gastou 480:000$000 réis!
Eu já me pronunciei aqui contra este freto, e o sr. ministro da fazenda comprometteu-se a levar ao conselho de ministros a questão com relação a obrigar a companhia a pagar essas aguas.
A prova de que as aguas de Barearena foram concedidas á companhia e que ella sem auctorisação do governo, que estava de posse d'ella não se atrevia a
usufruil-as.
Se o governo não consentisse, não as cedesse, manteria a posse que tinha, e faria valer o seu direito.
Que fez, pois, o governo, como é que estas aguas passaram para a companhia, é isto que o sr. Serpa tem obrigação de saber e tem obrigação do dizer á camara.
Que papel é este que representa um sr. ministro, quando vem dizer em assumptos da sua competencia que não sabe nada, e que nada lhe constava!
Pois se s. exa. não sabe que as aguas foram concedidas, sabe-o o nosso illustre collega, sr. Sousa Pinto, que acaba do declarar que essas aguas foram concedidas á companhia. Isto é, a companhia tomou conta das aguas e a fabrica ficou privada d'ellas, sem que o governo desse um passo, nem se oppozesse.
Sobre este ponto é que s. exa. devo dar explicações.
É forçoso que as dê, tinha obrigação de saber o que se passou aquelle respeito; e o sr. ministro da guerra e se nenhum sabe o que deviam saber, vão informar-se, das cumpram o seu dever de ministres, e dêem á camara os esclarecimentos que ella tem direito a pedir.
O sr. Ministro da Fazenda: - Eu assevero ao digno par que essas aguas não foram cedidas.
O Orador: - Ora ainda bem!
Parece que o Espirito Santo desceu sobre a caberá do sr. ministro da fazenda, e lhe segredou ao ouvido a resposta que havia de dar.
Ainda bem, repito.
Já s. exa. pôde declarar que essas aguas não foram cedidas.
Mas o que eu desejo é que o nobre ministro declare á camara como é que estas aguas, estando no puder do governo, passaram para o da companhia, e se estas aguas foram compradas, e com que condições.
O que eu não comprehendo é como estando o governo ha tanto tempo de posse d'ellas, sem mais nem menos, pelo facto de haver uma estiagem, a companhia o desapossasse.
Sr. presidente, na questão de aguas eu estou sempre de prevenção, estou de opinião antecipada contra e governo, o parece-me ter rasão.
No anno passado, tratando-se da pesquiza das aguas de Bellas, eu mostrei que o governo gastou 480:000$000 réis para favorecer a companhia, e o sr. Serpa comprometteu-se formalmente a levar a conselho de ministros a questão da companhia indemnisar o governo, e até hoje nada fez.
Interpellei aqui n'esta sessão o sr. ministro das obras publicas, tomou igual compromisso, e o resultado foi o mesmo, nada fez; portanto, á vista d'estes factos parece que ha da parto do governo proposito em beneficiar a companhia.
Por isso eu peço e espero que o sr. Serpa nos explique a revelação que fez o sr. Sousa Pinto.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - A fabrica de Barearena era movida desde longos annos pela força matriz de uma ribeira, que tinha aquelle nome.
Esta ribeira deixou, não sei por que circumstancias, de
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ter agua sufficiente para poder ser empregada como motor, principalmente nas epochas de estiagem.
Em consequencia d'isto, n'estes ultimos annos, e quando digo ultimos annos, refiro-me ao espaço de tempo comprehendido n'estes ultimos vinte ou trinta annos), a direcção geral da artilheria, que superintende na fabrica de Barcarena, substituiu o motor da agua pelo motor de sangue (é o termo technico), quer dizer o motor animal, para o fabrico da polvora.
Ora, este motor, pela sua desigualdade nos movimentos, não correspondia ás necessidades do fabrico; e todos sabem que, para que a granulação fique regalar, é indispensavel: que haja a maior regularidade no movimento.
Em consequencia, pois, das difficuldades que apresentava o motor animal, a polvora saía imperfeita; e, apesar dos esforços, da intelligencia e da capacidade dos diversos; officiaes que têem dirigido aquelle estabelecimento, comquanto o fabrico da polvora tenha melhorado consideravelmente, está muito distante ainda de attingir o grau de perfeição desejada.
Em vista d'isto, pretendendo obter o fabrico da polvora com a maxima perfeição possivel, e vendo ali um elemento de receita provavel, apresentei um projecto em 1876. que foi convertido em lei.
Por esse projecto era o governo auctorisado a despender 80:000$000 réis para melhorar as condições da fabrica da polvora, e por consequencia o seu fabrico.
Pouco depois saí do ministerio, e o meu illustre successor continuou a empregar a somma auctorisada em melhorar as condições d'aquella fabrica.
Como disse, tem-se luctado com grandes difficuldades, por causa de ter faltado a força matriz, produzida pelas aguas da ribeira de Barcarena, e foi necessario substituir o motor de vapor ao de agua, que não satisfazia em todo o anno, e ao motor animal, que ainda menos preenchia o fim que se tinha em vista.
Foi por este motivo que se votou a quantia, a que se referiram os dignos pares que me precederam n'este debate.
As sommas despendidas até ha poucos dias, ou ha poucas semanas, subiam a 51:000$000 réis, o que excede a quantia descripta no orçamento rectificado, a que se referiu o digno par o sr. conde do Casal Ribeiro, porque esse documento é um pouco anterior, e não podia descrever todas as despezas que estão feitas.
Como o objecto que se tem em vista não é augmentar a receita, mas obter melhor qualidade de polvora, para que armas de guerra possam ter o alcance que lhes corresponde, não deve o governo prescindir dos meios de melhorar as condições da fabrica de Barcarena, porque só assim poderá conseguir o resultado que pretende.
Entretanto, é possivel que não - se gaste toda a verba auctorisada na lei, mas a camara comprehende bem que tendo-se encommendado algumas machinas, e estando em execução obras, quer por meio de empreitadas quer por meio de administração, não é facil parar com essas obras nem suspender as encommendas.
Sr. presidente, ha paizes onde o fabrico da polvora é por conta dos particulares, mas a esse fabrico assistem delegados dos respectivos governos, porque _se trata de uma questão importante para o exercito.
Outros paizes têem fabricas unicamente por conta do estado, é essas fabricas abastecem os arsenaes e satisfazem ao consumo particular, com acontece entre nós.
Mas o que é certo é que a par da fabricação por conta do estado, existem no paiz fabricas de polvora clandestinas.
Para acabar com este estado de cousas, sem comprometter o fabrico necessario para o exercito, porque este continua pior conta do estado, entendeu o governo que de via tornar livre o fabrico e commercio da polvora, sujeitando tanto um como o outro aos regulamentos, e direi mesmo ás garantias necessarias para a segurança das povosções aonde se estabeleça esse fabrico.
O sr. Presidente: - Como não ha mais nenhum digno par inscripto, vae votar-se a generalidade do projecto.
Posta á votação a generalidade do projecto, foi approvada.
Passando-se á especialidade, foram approvados sem discussão todos os artigos.
O sr. Presidente: - Entra agora em discussão o parecer n.° 35.
É o seguinte:
Parecer n.° 35
Senhores. - Foi presente á vossa commissão de fazenda o projecto de lei apresentado pelo digno par o sr. e conde do Casal Ribeiro, relevando o governo da responsabilidade incorrida pelos contratos de emprestimos celebrados com o banco ultramarino, e revalidando os mesmos contratos.
Considerando que subsequentemente foi apresentado pelo governo, na camara dos senhores deputados, um projecto de lei com identico fim, e a commissão de parecer, de accordo com o digno par o sr. conde do Casal Ribeiro, que se sobreesteja em adoptar uma resolução ácerca do projecto do mesmo digno par.
Sala das sessões da commissão, em 20 de maio de 1879.= Conde do Casal Ribeiro = Barros e Sá = Augusto Xavier Palmeirim = Antonio de Sousa Silva Costa Lobo = Joaquim Gonçalves Mamede = João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens = Carlos Bento da Silva.
Projecto de lei n.° 29
Artigo 1.° São legiilisados os contratos de emprestimos feitos ao banco nacional ultramarino, celebrados entre o governo e o mesmo banco, em 14 de junho e 3 de dezembro de 1878, sendo o primeiro pela somma de 200:000$000 réis. e o segundo pela de 500:000$000 réis, ficando relevada, ao governo a responsabilidade em que incorreu pela outorga e execução dos referidos contratos.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 16 de maio de 1879.= Conde do Casal Ribeiro.
O sr. Ferrer: - Sr. presidente, o objecto d'este projecto e do seu parecer tem uma pequena historia, que eu vou fazer em poucas palavras; porque entendo que é conveniente que a camara lhe preste attenção para .poder julgar com conhecimento de causa.
O sr. conde do Casal Ribeiro indicou, ha tempo, ao sr. ministro da fazenda a necessidade de se legalisarem os adiantamentos que o sr. ministro fez ao banco ultramarino. O sr. ministro da fazenda comprometteu se a apresentar ás camaras o projecto. Mas se até então se não tinha lembrado do cumprimento d'este dever, depois esqueceu-se da promessa. Passado mais de um mez, vendo o sr. conde do Casal Ribeiro que o sr. ministro não se importava com os seus deveres e que era necessario legalisar aquelle contrato entre o governo e o banco, apresentou o seu projecto n'esta camara, que o acceitou e remetteu á illustrada commissão de fazenda.
Depois d'isto o sr. ministro apresentou na camara dos senhores deputados uma proposta identica á do sr. .conde do Casal Ribeiro; e a illustrada commissão de fazenda é de parecer que se sobreesteja em adoptar uma resolução sobre o parecer do digno par.
O parecer da illustre commissão declara que fôra de accordo com o digno par conde do Casal Ribeiro. Eis a historia..
Principiarei por dizer este accordo não é um argumento a favor do parecer. O accordo significa somente, que o digno par quiz ser condescendente e mostrar que não era pyrrhonico a favor do seu projecto, que, não sendo rejeitado, havia de vir necessariamente á discussão.
Ora, eu entendo que se não deve sobreestar no andamento regular do projecto.
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Porque se ha de sobreestar? Será porque a iniciativa do sr. ministro é mais alta e legal do que a do sr. conde do Casal Ribeiro, e por isso preferivel?
O que diz, a esse respeito a carta constitucional? Diz que a iniciativa das leis é concedida aos ministros e aos membros das duas casas do parlamento; e sobre esto ponto apresenta apenas duas limitações: a primeira é que os projectos da iniciativa do governo devem ter incoativa na camara dos senhores deputados, e a segunda que todas as propostas sobre os tributos de dinheiro e de sangue tambem devem de ter incoativa na camara dos senhores deputados. Na carta constitucional não ha a este respeito mais nada. (Apoiados.) Estas concessões das iniciativas aos ministros, pares e deputados não contêem differença nenhuma. Logo são iguaes.
Se são iguaes as iniciativas e não sendo necessarios dois projectos identicos, qual das iniciativas e dos projectos deve preferir? Para mim parece-me incontestavel que deve ser o projecto de iniciativa mais antiga, que foi a do sr. conde.
Ha uma regra de direito que diz o seguinte: Qui prior est in tempore fortior est in jure.
Esta regra traduz-se por um adagio portuguez, bem conhecido, que diz: Quem primeiro vae á fonte, primeiro enche. (Riso.)
Quando muitos têem direito a occupar um objecto, quem primeiro usa d'esse direito occupa o direito de o adquirir. A prioridade dá a preferencia. Esta doutrina geralmente recebida faz com que esta camara prefira o projecto do sr. conde do Casal Ribeiro ao do sr. ministro.
O sr. ministro, pois, já não podia apresentar na outra casa do parlamento uma proposta que vencesse a do sr. conde do Casal Ribeiro. A sua proposta era desnecessaria. O fim estava preenchido. E o direito não póde sanccionar um absurdo; porque absurdo é tudo o que é inutil.
O que s. exa. devia fazer era associar-se ao sr. conde do Casal Ribeiro, acceitar o seu projecto, votar por elle e acompanhal-o á outra casa do parlamento, e fazel-o lá votar. E estava tudo concluido em paz e sem os conflictos que a apresentação trouxe ao parlamento, como veremos logo.
O sr. ministro não fez caso da proposta do sr. conde do Casal Ribeiro e apresentou a sua na camara dos senhores deputados.
Qual seria a rasão que teve o sr. ministro para assim proceder? Ignorava elle os principios de direito publico constitucional que regulam a questão? Não o posso acreditar, porque a ignorancia de direito não escusa ninguem. Curia hovit jura.
Confesso, sr. presidente, que por mais que meditei não pude descobrir nenhum motivo, ao menos plausivel, que possa justificar o sr. ministro.
A dizer a verdade (e porque a não direi?) o que determinou o sr. ministro foi talvez um caprichosinho de não querer ser absolvido por um projecto do lado da opposição. Mas o parlamento é uma instituição muito seria e grave, que só cuida dos remedios para as necessidades publicas, e não se occupa de caprichos e paixões pessoaes pequeninas.
Talvez fosse tambem a censura que lhe vinha da approvação do projecto. Mas a censura moral ou da opinião publica está já infligida pela demora do sr. ministro em cumprir o seu dever de pedir o bill de indemnidade, logo que as camaras se reuniram. E á censura legal tambem não póde escapar, porque o projecto do sr. conde vence o do sr. ministro. (Apoiados.)
Note a camara que a proposta do sr. ministro da fazenda dá origem a um grave conflicto entre as duas casas do parlamento, que importa resolver do melhor modo.
Approvemos o projecto do sr. conde do Casal Ribeiro, remettamol-o para a outra camara, e esta o preferirá de certo, pondo de lado o do sr. ministro como extemporaneo.
Porque havemos adiar se temos de o approvar ao depois? Só se é pelo argumento do amanhã, tão conhecido dos portuguezes. (Muitos apoiados.) Resolver uma questão é um trabalho, o adiar essa resolução é um allivio muito agradavel. (Riso.)
A opinião publica ha de fazer-lhe justiça, censurando-o, porque o paiz não é de barbaros; ha n'elle quem tenhaintelligencia bastante para saber apreciar os factos como elles realmente devem ser apreciados.
Acabo, finalmente, dizendo que parece que a illustre commissão de fazenda deu mais importancia ao accordo do sr. conde do Casal Ribeiro para sobreestar na resolução da questão, do que devia.
Primeiramente não devia de uma condescendencia e de um acto de côrtezia fazer um argumento juridico. Nem o accordo do sr. conde do Casal Ribeiro póde significar outra cousa senão côrtezia, generosidade e grandeza de alma, porque depois que apresentou á camara o seu projecto, e esta o acceitou e remetteu á commissão, saiu da esphera juridica do sr. conde, e ficou pertencendo exclusivamente á camara para o discutir e approvar ou rejeitar.
O accordo, pois, do sr. conde não póde ser considerado como um acto juridico d'onde se possa deduzir um argumento acceitavel.
E tanto é verdade o que acabo de asseverar, que o sr. conde nem póde retirar hoje o seu projecto nem addital-o ou emendal-o sem pedir licença á camara, como é pratica dos parlamentos.
Resta ainda vermos o que significa o sobreestar do parecer da commissão. Será um adiamento indefinido para sempre? Não, porque o sobreestar n'este sentido inutilisava o projecto, que é necessario não só para absolver o sr. ministro da usurpação que fez ao poder legislativa, mas o que é mais, para legalisar o contrato feito com o banco ultramarino.
Significa o sobreestar um simples adiamento temporario de alguns dias até vir a esta casa o projecto do sr. ministro, enviado pela outra casa do parlamento? Não, porque isso seria recuar a questão e não resolvel-a. A camara ha de discutir necessariamente o projecto, visto que o recebeu e enviou á illustre commissão.
Finalmente, significa o desejo de favorecer o projecto do sr. ministro, para não lhe obstar e pôr impedimento a approvação anterior do projecto do sr. conde? Tambem não, porque a illustre commissão é composta de cavalheiros muito independentes, e porque com isso nada ganharia o projecto do sr. ministro, porque a prioridade do projecto do sr. conde occupou a preferencia, segundo os principios de direito, coma já disse. (Apoiados.)
Concluo, sr. presidente, d'estas breves considerações que voto contra o parecer, mas approvo o projecto. Desejo que elle passe e que seja remettido á outra casa do parlamento. Ali, onde ha quem saiba muito bem direito publico, se decidirá qual dos dois projectos ha de ter preferencia, se o da iniciativa do sr. ministro da fazenda ou o do nosso collega.
Sempre quero ver como aquella camara resolve a questão. Não póde deixar de preferir o projecto do sr. conde.
Peço desculpa á camara e muito especialmente á illustre commissão de fazenda.
O sr. Ministro da Fazenda: - Não tendo a honra de ser jurisconsulto, não me proponho tratar a questão de saber se o projecto do sr. conde do Casal Ribeiro fica inutilisado com a apresentação da proposta do governo na outra casa do parlamento.
Essa questão não é commigo, é com a illustre commissão.
Se pedi a palavra, foi apenas para responder á pergunta que me dirigiu o digno par.
Perguntou-me s. exa. a rasão porque eu tinha apresentado na outra camara a proposta para o bill de indemnidade.
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O motivo é simples: porque não a podia apresentar n'esta casa.
Entendi que me assistia o direito de expender as rasões justificativas do procedimento do governo; exarei-as no relatorio que precede a proposta, e fiz acompanhal-as de esclarecimentos que me parecerem convenientes e necessarios.
Aqui está porque, apesar da iniciativa tomada pelo sr. conde do Casal Ribeiro, julguei que não devia considerar-me desobrigado de cumprir a promessa que fizera n'esta casa.
Disse o digno par que o projecto do sr. conde do Casal Ribeiro importa uma censura que já está consummada.
De certo foi uma censura, porque a. exa. apresentando-o, mostrou a desconfiança que tinha no desempenho da minha palavra.
Mas esta censura do sr. conde do Casal Ribeiro não significa uma censura da camara.
É sempre desagradavel receber censuras, mas aquella a que me refiro, póde magoar-me, mas não tem os effeitos, politicos que produziria, se partisse da camara.
O sr. Conde do Casal Ribeiro: - Se é censura, s. exa. não duvidou acceital-a.
O sr. Carlos Bento: - Não falta muito para que de a hora, mas, apesar d'isso, farei algumas observações.
Ouvi com toda a attenção as reflexões apresentadas pelo digno par e meu nobre amigo o sr. Ferrer.
Effectivamente a rasão apresentada pelo digno par não se póde negar que seja ponderosa; comtudo, parece me facil de explicar a posição em que se achava a commissão em relação ao projecto que foi apresentado n'esta casa, antes que o sr. ministro da fazenda apresentasse um projecto de igual natureza na outra camara; e n'esta occasião devo dizer ao illustre ministro, que ligou ao projecto apresentado pelo sr. conde do Casal Ribeiro a significação de uma censura ....
O sr. Ministro da Fazenda: - Eu peço licença ao digno par para o interromper. Se houve censura foi só na apresentação do projecto depois de eu ter promettido que havia de apresentar um projecto identico; mas o projecto em si não é censura.
O sr. Carlos Bento: - O que o sr. ministro da fazenda diz não- altera a apreciação que seu estava fazendo do nunciado das suas palavras.
Estou de accordo que o projecto em si não é uma censura; mas é preciso que a camara reflicta sobre uma circumstancia, e é que quando o sr. conde do Casal Ribeiro apresentou o seu projecto tinham já decorrido mais de quatro mezes, isto é, havia já passado bastante tempo depois de ter terminado o praso fixado pela carta para a duração das sessões, quando não era conveniente demorar mais a apreciação do acto que o governo tinha praticado, e qual era a responsabilidade em que tinha incorrido, por isso que restava já pouco tempo para se fazer aquella apreciação. (Apoiados.)
Então, digo eu que, se acaso o sr. ministro da fazenda veiu a reconhecer a necessidade de ser relevado o governo da responsabilidade era que tinha incorrido, era rasoavel que não se deixasse expirar o praso das sessões parlamentares sem se tomar uma resolução a este respeito.
Houve, porventura, impaciencia da parte do sr. conde do Casal Ribeiro?
S. exa. esperou que decorressem quatro mezes e meio, e só depois é que apresentou este projecto.
Reconhecendo o governo a responsabilidade em que estava envolvido, havia de se esperar que fosse apresentado um projecto á ultima hora sem tempo para se discutir e tomar uma resolução qualquer? Parece-me que não.
Por consequencia, entendo que se por acaso houve censura no facto da apresentação do projecto do sr. conde do Casal Ribeiro, as circumstancias em que elle foi apresentado é que podem constituir essa censura.
Ora, n'este caso, parece-me que tanto o sr. conde do Casal Ribeiro, como os membros da commissão que assignaram o parecer, estão em boa posição.
O meu amigo o sr. Ferrer entende que nem a esta conclusão do parecer se devia chegar; mas foi o proprio digno par que mencionou um facto importante sobre o perigo que havia na apresentação simultanea, nas duas casas do parlamento, de um projecto da mesma natureza, o que podia trazer comsigo um conflicto entre as duas camaras, conflicto aliás de que não era responsavel nem o sr. conde do Casal Ribeiro, nem o sr. ministro da fazenda, nem esta camara.
N'estas circumstancias a prudencia aconselhava a commissão a apresentar o parecer na fórma que o apresentou.
O digno par reconhece que podem resultar inconvenientes da applicação d'este projecto e que póde haver conflicto; mas a responsabilidade de tal facto nunca" poderá pertencer aos membros da commissão, e não direi a quem ella pertence.
O parecer da commissão não póde ter senão a significação de um acto pendente, para evitar esse conflicto, estabelecendo que se sobreesteja na apreciação d'este projecto; mas o sobreestar na apreciação d'este projecto, não é de modo nenhum deixar de considerar as circumstancias que nos podem levar até á sua não adopção completa, nem que nenhum de nós deixe, nesta occasião, de discutir as rasões que o governo teve para o seu procedimento, nem se o acto d'elle ser relevado da responsabilidade em que incorreu póde ser adoptado n'esta ou na outra casa do parlamento. Desde que o projecto do governo foi apresentado na outra camara, e desde que foi publicado no Diario, eu entendo que podemos discutir n'esta occasião o projecto do sr. Conde do Casal Ribeiro, o projecto do governo e as circumstancias da responsabilidade em que incorreu o governo quando fez os contratos com o banco ultramarino.
Talvez, sr. presidente, houvesse alguma previsão na apresentação d'este projecto, porque havendo necessidade de se discutir o orçamento n'esta camara, não haverá tempo de apreciar devidamente o projecto apresentado pelo sr. ministro da fazenda, apesar das circumstancias especiaes que o revestem.
Persuado-me, portanto, que o parecer da commissão, longe de impedir a discussão do projecto do sr. conde do Casal Ribeiro, conduz-nos a poder apreciar as condições, em que elle foi apresentado; as quaes, e peço perdão ao sr. ministro da fazenda, considero superiores ás da apresentação do seu projecto, apesar de ter sido apresentado subsequentemente. E como devemos ter conhecimento dos inconvenientes do projecto apresentado por s. exa., não deixará de certo de ser opportuno citar um facto. No projecto apresentado pelo sr. ministro da fazenda, estabelece-se n'um artigo, creio que é o 2.°, o direito, para o governo, de inspeccionar este estabelecimento, emquanto não estiver concluida esta operação, parecendo assim que se dá uma garantia ao governo, pelo facto d'esta fiscalisação. -Mas eu peço humildemente desculpa ao sr. ministro da fazenda para affirmar que é exactamente o contrario d'isto.
Pois o governo não tinha já o direito de fiscaiisar as operações do banco ultramarino? Pois os estatutos e o contrato de 1864, que foram approvados pelo governo, não lhe impõem a obrigação de fiscalisar as operações d'aquelle estabelecimento, no continente por intervenção do ministerio das obras publicas, e no ultramar pela do ministerio da marinha?...
Então, como é que o governo quer agora crear o direito de fiscalisar,
limitando-o ao tempo que durar esto contrato, quando a auctorisação legal era para exercer essa fiscalisação durante a existencia do banco?
Já se vê que na occasião em que parece que se vae dar
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ao governo um direito, que elle já tinha obrigação de cumprir, limita-se esse direito!
O governo, como já disse, está obrigado, pela legislação actual, a vigiar e fiscalisar as operações d'aquelle estabelecimento bancario, não só como direito, mas como dever, e pelo projecto apresentado na outra casa do parlamento o governo estabelece como direito o que para elle era já um dever.
Mas, sr. presidente, n'esta questão ha mais do que parece á primeira vista.
Em primeiro logar, este projecto de bill de indemnidade para relevar o governo da responsabilidade em que incorreu pelos adiantamentos feitos ao banco ultramarino não é um facto que se deu pela primeira vez. Já antecedentemente, em 1876, o governo entendeu que estava, obrigado a prestar auxilio aos estabelecimentos bancarios, em consequencia da crise commercial que se deu n'aquella epocha. Essa crise teve a intensidade que todos conhecem, e fez com que o governo, apoiado pela opinião de corporações muito respeitaveis, prestasse a varios estabelecimentos bancarios o auxilio de lhes proporcionar capitaes, mobilisando as sommas que n'esses estabelecimentos estavam immobilisadas em virtude de contratos feitos com o estado. Ambas as camaras relevaram o governo da responsabilidade que contrahíra.
Ninguem dirá, de certo, que n'essa occasião as circumstancias eram normaes, porque a intensidade da crise foi de tal ordem, que o primeiro estabelecimento bancario do paiz, ainda que momentaneamente, foi tambem obrigado a fechar as portas.
Portanto, não se póde censurar o governo por ter tomado medidas extraordinarias, e ninguem dirá que o parlamento não foi justo relevando o governo da responsabilidade em que incorrera. N'essa occasião, porém, a illustre commissão de fazenda da camara dos dignos pares deu o seu parecer sobre o projecto que relevava o governo da responsabilidade contrahída, mas fez ao mesmo tempo considerações muito judiciosas, e naturalmente suggeridas pelo acto extraordinario que tinha sido praticado.
Dizia o parecer da illustre commissão d'esta camara.
(Leu.)
Ora, sr. presidente, está claro que esta observação era applicavel em todos os casos, quanto mais a um tão excepcional como aquelle de que se tratava.
Toda a gente entendeu que os soccorros prestados pelo governo aos estabelecimentos bancarios n'aquella occasião, não o dispensava de prestar attenção á legislação que existia relativamente as sociedades bancarias; e o proprio sr. ministro da fazenda o entendeu assim, porque se apressou a nomear uma commissão especialmente encarregada de estudar as causas da crise e de propor os meios que julgasse necessarios para occorrer aos perigos que podessem provir d'essas crises.
Entretanto, foi tal a impressão que o sr. ministro soffreu com aquelle acontecimento extraordinario, que não aguardou o resultado dos trabalhos da commissão, para propor um alvitre que garantisse a acção ordinaria dos estabelecimentos bancarios, e apresentou uma proposta de lei para regular a circulação fiduciaria, mostrando assim que entendia não serem sufficientes os soccorros temporarios para collocarem as condições economicas do paiz ao abrigo de novas crises.
Vozes: - Deu a hora.
O Orador: - Ouço dizer que deu a hora, e como tenho ainda algumas considerações a apresentar, peço a v. exa., sr. presidente, que me reserve a palavra para a seguinte sessão.
O sr. Presidente: - A proxima sessão terá logar na terça, feira, 27 do corrente, sendo a ordem do dia a continuação da que estava dada para hoje.
Ficam inscriptos para tomar parte na discussão do parecer n.° 35, alem do sr. Carlos Bento, que continua com a palavra, os srs. Ferrer e conde de Rio Maior.
Está levantada a sessão.
Eram cinco horas da tarde.
Dignos pares presentes na sessão de 24 de maio de 1879
Exmos. srs.: Duque d'Avila e de Bolama; João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens; Marquezes, de Fronteira, de Sabugosa, de Vallada, de Angeja; Condem, do Casal Ribeiro, de Paraty, da Fonte Nova, de Bertiandos, de Rio Maior, da Torre, do Bomfim, da Louzã, do Porto Covo; Viscondes, de Alves de Sá, de Bivar, das Laranjeiras, de Portocarrero, da Praia, do Seisal, de Soares Franco, da Praia Grande; D. Affonso de Serpa, Ornellas, Sousa Pinto, Barros e Sá, D. Antonio de Mello, Fontes Pereira de Mello, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Barjona de Freitas, Palmeirim, Carlos Bento, Sequeira Pinto, Montufar Barreiros, Gomes de Castro, Braamcamp, Pinto Lautos, Vaz Preto, Franzini, Dantas, Ferreira Novaes, Vicente Ferrer, Reis e Vasconcellos, Couto Monteiro.
Entraram depois de aberta a sessão, os dignos pares: Marquez de Ficalho e João de Andrade Corvo.