DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 857
muito accumuladas. Em Inglaterra este imposto é correctivo, é compensador, por isso que elle fere de preferencia as grandes rendas. As fortunas estão ali muito accumuladas, tanto a mobiliaria, como a immobiliaria. Como todos sabem, n'aquelle paiz ha a liberdade de testar, o que equivale quasi á vinculação, porque as fortunas conservam-se assim accumuladas, e d'aqui resulta que o numero de proprietarios em Inglaterra, apesar de nos ultimos annos se ter tornado um pouco maior, é pequeno em proporção do que ha nos outros paizes, onde não existe similhante legislação. Ali, pois, o imposto de renda é productivo, ainda que assenta n'uma taxa que só fira rendimentos elevados, porque ali ha muitos individuos que disfructam esse rendimento; mas, no nosso paiz, onde a divisão da propriedade é grande, onde abundam principalmente as pequenas fortunas, onde a quota media tributaria, segundo um trabalho estatistico publicado ultimamente anda por 1$300 réis, ou pouco mais, onde, de 263 concelhos que a nação tem, ha 150 em que predomina a quota media de 700 a 1$300 réis, onde apenas a quarta parte dos proprietarios tem rendimento superior a 50$000 réis, num paiz constituido n'estas condições economicas, é evidente que o imposto de renda, para ser equitativo e justo, ha de produzir pouco, porque o minimo do rendimento deixa muito reduzida a classe sobre que elle póde recair, e portanto ha de ser muito exiguo o seu producto. (Apoiados.} É preciso saber que mais de metade da população, dois milhões quatrocentos e tantos mil habitantes, são comprehendidos nos 150 concelhos em que predomina a quota media de 700 a l$300 réis.
Foi por causas analogas ás que se dão no nosso paiz, que em França nunca se póde estabelecer aquelle imposto, e eu direi o motivo por que, se se torna mais rendoso, maiores são os vexames que d'ahi resultam para os proprietario que tem de renda de 50$000 réis para cima.
Digo, portanto, que este imposto não está estabelecido em paiz algum, nas condições que se pretende introduzir entre nós 5 e que, na propria Inglaterra, elle existe transitoriamente, e sendo sempre mais ou menos combatido por todos os seus economistas mais distinctos. (Apoiados.}
Alem d'isso, um dos actuaes srs. ministros, o sr. Saraiva de Carvalho, condemnou o imposto de rendimento em 1870, "por iniquo, opposto á formação de capitaes, inquisitorial, sem base possivel, inapplicavel á raça latina", citando a auctoridade de Stuart Mill, a quem chamou principe dos economistas ou cousa similhante.
Mas, voltando á Inglaterra, lá todos são contrarios ao income tax; Mac Culloch combate-o, e o proprio Grladstone, que hoje está á testa da administração britannica, manifesta a idéa de acabar com elle, logo que lhe seja possivel, e tem-no, conservado para aliviar o povo de outros impostos.
Dizem tambem os defensores do projecto que este imposto existe em Italia; não é completamente exacto, o que lá existe é o imposto mobiliario.
Na Italia havia diversidade de impostos directos que se supprimiram, ficando só a contribuição predial e o imposto mobiliario.
Não ha senão estes dois tributos directos, se exceptuarmos o sello e o registro, que têem um outro caracter e assentam noutras bases. Não ha ali ao lado do imposto mobiliario o imposto sumptuario, o da renda das casas, o industrial e o bancario, como acontece entre nós com a creação do imposto de rendimento, que, alem de se accumular com aquelles, peza igualmente sobre a renda predial, já tributada, quando na Italia é isenta da contribuição mobiliaria, e não paga nenhuma taxa do imposto de rendimento. Portanto, em Italia não se lançou este imposto sobre o que já pagava outros impostos.
Este imposto, como lá existe, affecta só os capitaes mobiliarios e o producto do trabalho do homem, mas não vae ferir materia nenhuma que já esteja collectada.
Não se queira, portanto, estabelecer paridade entre o imposto de renda que existe em Italia e o imposto que aqui se propõe agora; isso só se poderia admittir se se abolissem outros impostos para então os substituir por este. (Apoiados.)
Quando em 1870 o sr. Braamcamp propoz a alteração da contribuição pessoal, dava-lhe uma outra fórma, no intuito de a tornar mais rendosa, mas supprimia a percentagem complementar d'aquella contribuição, creada pela lei de 10 de junho de 1860.
Na Italia, repito, não existe o que aqui se propõe. (Apoiados.)
Ali não se tratou de estabelecer uma taxa compensadora nem correctiva, mas sim de dar unidade ao systema financeiro do novo reino, acabando com a diversidade de tributos que havia nos differentes estados que se reuniram para a formar, fundindo no imposto, mobiliario muitos outros impostos que deixaram de existir, e tendo o cuidado de não comprehender n'elle as manifestações de riqueza que já eram ou ficavam tributadas por outro modo.
Na Baviera e na Saxonia, como já disse, supprimiram-se outros impostos para estabelecer este. Nos Estados Unidos, emquanto durou a guerra, tambem se estabeleceu o imposto sobre a renda; mas, apenas se fez a paz, logo o supprimiram.
Portanto, de duas uma: ou este imposto junto com o directo, fórma um systema differente, e é necessario alterar o nosso systema. tributario; ou então não se póde admittir, sobrepondo-se aos que já temos, porque vem perturbar a economia financeira do nosso systema, (Apoiados.) systema que não se deve tão facilmente votar ao desprezo, porque é muito nacional, e tem a vantagem de estar encarnado nos habitos do povo, porque entra ha muito tempo em todas as relações da nossa economia publica.
Era, pois, muito mais conveniente que se procurasse melhorar os impostos que já existem, do que introduzir um systema novo. (Apoiados.}
Estes principios são os que sustentam todos os auctores, e que praticam os homens de estado que governam as nações.
São as doutrinas proclamadas por sir Robert Peel, Gladstone, Thiers, e por todos os homens que conhecem praticamente o modo de governar as nações. (Apoiados.)
Não se muda de impostos sem que tenham sido aperfeiçoados os que existem, sem se lhes terem corrigido as imperfeições e desigualdades; e o modo de as corrigir e aperfeiçoar, não é introduzindo um novo imposto, que vae aggravar os que já existem e lançar novas perturbações no mechanismo fiscal, e no modo de ser economico. (Apoiados.)
Não é, pois, exacta, a proposição estabelecida pelo sr. ministro da fazenda, de que este imposto existe nas outras nações, porque em parte alguma ha cousa analoga a esta.
Citou s. exa. o tantas vezes citado Beaulieu, que parece ser o evangelho de todos os financeiros. (Riso.)
Este escriptor é na realidade muitissimo distincto, estudou profundamente estas questões e tratou-as com muita proficiencia em dois grossos volumes; mas, emfim, não é infallivel e unico, nem a gente deve acreditar piamente e sem exame tudo que elle diz e escreve.
Beaulieu diz, é verdade, que se póde admittir este imposto como correctivo e compensador, porém não como o quer apresentar o sr. ministro da fazenda; isto é, como ponto de apoio, eixo ou quicio, sobre o qual deva girar d'aqui em diante todo o systema financeiro entre nós.
Mr. Le Roy Beaulieu diz que todos aquelles que formam esta idéa do imposto de renda estão completamente illudidos.
Este economista diz tambem que esse imposto, sendo applicado a paizes onde a fortuna está muito dividida, tem graves inconvenientes, porque, ou ha de ir affectar o pequeno rendimento, ou aliás é pouco productivo.
Se o sr. ministro quer soccorrer-se á auctoridade de