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CAMARA DOS DIGNOS PARES.
EXTRACTO DA SESSÃO DE 19 DE NOVEMBRO DE 1858.
Presidencia do ex.mo Sr. Visconde de Laborim,
Vice-presidente.
Secretarios, os Srs. Conde de Mello
D. Pedro do Rio.
(Assistem os Srs. Ministros, da Fazenda, e das
Obras Publicas.)
Pelas duas horas e meia da tarde, tendo-se verificado a presença de 29 Dignos Pares, declarou o Ex.mo Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta da antecedente contra a qual não houve reclamação.
O Sr. Secretario Conde de Mello deu conta da seguinte correspondencia:
Um officio do Ministerio do Reino enviando para serem archivados os autographos dos Decretos das Côrtes Geraes n.º 16, 18, 19, 23 e 25. Mandaram-se para o archivo. —da Presidencia da Camara dos Srs. Deputados enviando uma proposição de lei sobre o abono de sessenta mil réis para falhas ao Thesoureiro da Escóla Polytechnica em quanto durarem os effeitos do emprestimo destinado á reconstrucção daquelle edificio.
O mesmo Sr. Secretario deu parte de que os Dignos Pares Duque da Terceira e Macedo não compareciam a esta sessão por incommodo de saude.
O Sr. Marquez de Vallada disse que não pertendia fazer uma censura á Mesa, e só pedir ao Sr. Presidente que tivesse a bondade de lhe dar algumas explicações relativamente ao facto de que ia fallar. Que n'uma das sessões do anno passado dirigira uma interpellação ao Sr. Presidente do Conselho, a que S. Ex.ª veio responder, fazendo-o de um modo claro, terminante, e cathegorico. Entendia o orador, e assim o esperava vêr, que a resposta do Sr. Marquez de Loulé appareceria publicada na sessão que foi impressa no Diario do Governo, porque ella não era para envergonhar a S. Ex.ª Com pasmo porém viu, que não se publicou, e que no logar em que devia achar-se o discurso de S. Ex.ª, appareceram tres pontinhos. Alguém fez tambem esse reparo, e com maior razão o fez o orador por ter sido o interpellante. Pensa-se, continuou o orador, que o motivo de se não ter publicado a resposta do Sr. Presidente do Conselho, foi o não ter ella agradado a certos homens que teem imperio sobre os actos dos Srs. Ministros, e governam a situação.
Por esta occasião disse mais o nobre orador, que sentia não vêr no seu logar o Digno Par Sr. Marquez de Ficalho, que na occasião em que teve logar a dita interpellação julgou-o a elle interpellante demasiadamente exigente; pois se S. Ex.ª estivesse presente neste momento, reconheceria, em presença dos factos, que não tinha sido nada exigente. É provavel que houvesse culpa de alguem, culpa que o orador não quer attribuir a este ou aquelle individuo; mas como interpellante que foi, desejaria saber, se da parte da Secretaria se mandou buscar, como é costume, o discurso do Sr. Presidente do Conselho, e se se fez vêr a S. Ex.ª que era conveniente o desse para se publicar? Espera da benevolencia do Sr. Presidente haja de o informar a tal respeito. E tambem do Sr. Ministro da Fazenda, que responde por tudo, e por todos os seus collegas, que diga alguma cousa, se póde, sobre a falta que acabava de notar: e concluiu dizendo, que desde já pedia a palavra para produzir outras observações.
O Sr. Conde de Mello—V. Ex.ª preveniu no fim do seu discurso a resposta, que eu, em nome da Mesa, teria a dar á pergunta que lhe dirigiu, porque V. Ex.ª disse, que se deviam ter mandado os discursos ao Sr. Presidente do Conselho, como era costume tambem mandarem-se aos membros desta Camara. Effectivamente mandaram-se a S. Ex.ª; e o motivo porque na respectiva sessão apparecem os pontinhos no logar em que devia estar o discurso, é porque o Sr. Marquez de Loulé o não mandou. É esta a informação que posso dar ao Digno Par.
O Sr. Ministro da Fazenda — Eu sinto não estar habilitado para podér responder ao Digno Par o Sr. Marquez de Vallada, relativamente á falta da publicação do discurso a que S. Ex.ª alludiu: mas permitta S. Ex.ª que eu pondere, que, segundo as informações que eu tenho de membros desta Camara, a resposta que o meu collega o Sr. Presidente do Conselho deu á interpellação do Digno Par o Sr. Marquez de Vallada não envergonhava o Sr. Marquez de Loulé. Peço pois ao Digno Par que não julgue que a falta desse discurso é filha dos motivos a que S. Ex.ª alludiu, e que são improprios do caracter do Sr. Presidente do Conselho. Eu não sei, Sr. Presidente, qual é o andamento que teem os trabalhos da publicação das sessões desta Camara; mas sei, e disso posso dar testimunho, que se teem publicado sessões nas quaes eu usei da palavra, sem se me mandarem os meus discursos para os revêr, com quanto me tenha dado por satisfeito com os extractos delles que se teem publicado. Ora, póde acontecer que esta circumstancia que comigo se tem dado por vezes, acontecesse similhantemente no caso em questão, ao meu collega o Sr. Presidente do Conselho. Por esta occasião direi, Sr. Presidente, que o Sr. Marquez de Loulé tem o trabalho de duas pastas, e importantes, e esta circumstancia é bastante attendivel para se ter com S. Ex.ª toda a benevolencia, e não o inculpar tanto pela falta da remessa do discurso a que alludiu o Digno Par, se esse discurso foi effectivamente mandado ao meu collega.
O Sr. Marquez de Vallada ouviu com toda a attenção o que acaba de dizer o Sr. Ministro da Fazenda; e agora observará, que é costume da Secretaria mandarem-se os discursos no dia seguinte aos oradores que os proferiram na vespera; isto mesmo tem acontecido com elle orador: mas que, quando o orador não póde revêr o seu discurso, por qualquer impedimento que para isso tenha, remette-o ao Chefe da redacção para que faça o extracto, ou substancia delle, e o publique: e se o orador não entrega o discurso que recebeu, então põem-se pontinhos adiante do seu nome. É esta a pratica usada nesta casa. Agora com relação ao discurso do Sr. Presidente do Conselho, observou que foi elle a resposta á interpellação que elle Sr. Marquez dirigira a S. Ex.ª sobre a liberdade de associação, e nessa occasião fallou das irmãs da caridade, tendo antes offerecido ao Sr. Presidente do Conselho um papel com 19 perguntas, dizendo-lhe nessa occasião que não queria apanhar de surpreza o Ministerio, e por isso desejava antes de formular a sua interpellação, que S. Ex.ª visse a base em que tinha de assental-a: que o Sr. Presidente do Conselho agradecera essa lealdade e delicadeza como S. Ex.ª então lhe chamou, e respondeu depois bem até certo ponto, com quanto no todo o não satisfizesse. Que, porém, a resposta de S. Ex.ª era importante, e convinha publicar-se.
Declarou alli, que em occasião opportuna se propõe amostrar as ilegalidades praticadas pelo Sr. Presidente de Conselho, e Ministro do Reino, com relação a este assumpto; que essa occasião seria a da discussão da resposta ao Discurso da Corôa; observando desde já ao que ouviu dizer ha pouco, que se o Sr. Marquez de Loulé não póde com o trabalho das duas Secretarias a seu cargo, tracte-se de remediar isso, pois é incrivel suppôr que no partido historico não ha já quem seja apto para Governo; será crível que não haja homens de talento nesse partido? ¡0 Sr. Ministro da Fazenda—Então é necessario crear um Ministerio mais...) E acontece o mesmo com a pasta das Justiças que occupa interinamente o Sr. Ministro que fez o áparte: o que o orador sente muito mais, porque vê que o Sr. Ministro das Obras Publicas chorava constantemente durante o Ministerio chamado da Regeneração por o Sr. Fontes accumular duas pastas. E o que acontece? Entra S. Ex.ª para Ministro, e não tem dó do seu collega e amigo!.... Isto serve para se vêr o que os homens são na opposição, e o que são depois no Governo!
Mas o Sr. Marquez de Loulé tem tanto que fazer que não póde revêr os discursos; e apesar de S. Ex.ª ter assim tanto trabalho, o publico julga que S. Ex.ª não faz nada, porque nada vê: S. Ex.ª promette uma refórma na instrucção publica, e nada apparece... Esta é que é a verdade, confessada pelos proprios amigos do Ministerio, e pelos jornaes que o defendem. Até o Portuguez já disse que o Ministerio ia curar-se da passada indolencia. Todos confessam este mal; e o Sr. Ministro da Fazenda vem dizer todos os annos que o Sr. Marquez de Loulé está na Secretaria occupado de negocios muito graves!...
O orador pede ao Sr. Presidente que mande aviso ao Sr. Marquez de Loulé destas considerações, e que de as suas ordens para que lhe seja pedido o discurso, e para o mesmo ser impresso; pois o publico deve ter conhecimento de um discurso que mereceu os applausos de todos, e mesmo do Sr. Marquez de Ficalho, que o tachou a elle orador de exigente; e assim isto mostrará a S. Ex.ª que foi menos justo do que costuma para com o orador.
Disse o orador que passava a cumprir uma promessa que fez ao Sr. Ministro da Fazenda, quando aqui fallou relativamente a um livro que se publicou nesta capital. Entrega-lhe agora esse livro visto que o prometteu; e dirá a S. Ex.ª que, procedendo contra o auctor do livro, não faz mais do que cumprir a lei. Aqui está o Código Penal no artigo 130 que diz:
«Aquelle que faltar ao respeito á religião do reino, catholica. apostolica, romana, será condemnado na pena de prisão correcional desde um até tres annos, e na multa, conforme a sua renda, de tres mezes até tres annos em cada um dos casos seguintes:
1.° Injuriando a mesma religião publicamente em qualquer dogma, acto, ou objecto do seu culto, por factos ou palavras, ou por escripto publicado, ou por qualquer meio de publicação.
2.° Tentando pelos mesmos meios propagar doutrinas contrarias aos dogmas catholicos definidos pela igreja.»
Fundando-se nestas disposições, e especialmente no § 1.° deste artigo, dirije-se a S. Ex.ª pedindo a execução da lei. Vão notados com differentes signaes os logares mais importantes do livro; mas limitar-se-ha a lêr algumas linhas, de que o Sr. Aguiar ficou espantado. Vem logo no principio (leu):
«N'um estado, onde é livre a cada cidadão seguir a religião que lhe parece melhor, ha grande contradição nos termos, em querer que cada um delles respeite a religião do estado. Qual é pois a religião dominante de um estado, onde cada individuo que o compõe póde ter a sua religião particular?!»
O orador não quer fazer-se cargo nem das herezias, nem dos erros historicos, que transbordam deste livro; mas não póde callar que elle põe o Papa S. Gregorio vn a viajar para França, e a excommungar alli réis, uns poucos de annos depois da sua morte (riso). Disse mais que este livro tinha-se espalhado por entre o povo, e que ninguem póde deixar de dizer que não faz damno uma cousa tão descocada; porque elle orador perguntaria se se publicasse ahi um livro em que abertamente se ensinassem as doutrinas de roubo, sustentadas por Proudhon e outros, havia de dizer-se que o Governo não deveria tolher essas publicações pelos meios que as leis lhes pozeram nas mãos? Isto não são cousas que se lancem ao desprezo. (Deu o livro ao Sr. Ministro.)
Estimará muito que S. Ex.ª proceda contra o auctor como lhe compete, e reserva-se para pedir a palavra sobre o que fizer a este respeito. Em quanto á censura que hontem fez a S. Ex.ª, quando disse que a acção do prelado da diocese era tolhida pelo Governo, porque assim como o Sr. Bispo de Porto prohibiu a leitura da traducção de uma obra de Aimé Martin, tambem o Sr. Patriarcha de Lisboa podia ter feito o mesmo ao livro portuguez de que acabara de tractar; e por isso podia parecer que o Sr. Ministro tinha procedido para com o Sr. Patriarcha como o Marquez de Pombal para com o Bispo de Coimbra, comtudo esperava de S. Ex.ª que ha de proceder como é do seu dever.
Que tambem pedia a S. Ex.ª que fizesse constar ao Sr. Ministro do Reino que elle orador tem uma interpellação que lhe deseja dirigir sobre as sociedades secretas, e lojas maçónicas; e que deseja tambem a presença do Sr. Ministro da Guerra por causa dos militares que nellas se acham iniciados; assim como desejaria muito que o Sr. Patriarcha podesse assistir a essa sessão, porque carece dirigir-se respeitosamente a S. Em.ª sobre algumas circumstancias importantes.
O Sr. Presidente— Queira V. Ex.ª mandar pari a mesa a nota de interpellação.
O Sr. Marquez de Vallada—Vou tractar defa-zel-a.
O Sr. Ministro da Fazenda — Sr. Presidente, parece-me que é inutil affiançar á Camara e ao Digno Par o Sr. Marquez de Vallada que não é por meu prazer que accumulo as duas pastas de Fazenda e de Justiça; S. Ex.ª sabe que nisto não ha nenhum interesse, nem accumulação de vencimento, nem cousa nenhuma de que resulte proveito, e só uma maior somma de trabalho que pésa sobre mim; e tão depressa seja possivel procurarei livrar-me delle. Todavia, S. Ex.ª hade permittir-me que lhe diga, que a hypothese que apresentou é muito diversa daquella em que me acho, porque em 14 de Março houve um Ministro nomeado especialmente para a pasta da Justiça; os Dignos Pares sabem os motivos que deram logar a pedir aquelle cavalheiro a sua demissão, e por essa occasião expliquei á Camara os motivos que levaram o Ministerio a não convidar para essa pasta, n'uma occasião tão difficil, qualquer outro cavalheiro, porque era possivel que o Ministerio tivesse de se retirar diante dessa questão, e então não era digno de nós ir convidar para assumir a responsabilidade de uma questão de alta importancia um homem alheio a ella, e que nos podia substituir. Passaram-se alguns mezes, e o Ministerio encontrou um cavalheiro que quiz occupar essa pasta, mas foi tambem por pouco tempo, e pela sua retirada sujeitei-me de novo a tomar esse encargo; mas assevero ao D. Par, que desejo que esta situação acabe quanto antes, porque reconheço a minha incapacidade para esta pasta, assim como para a da Fazenda; comtudo faço quanto posso para desempenhal-a o melhor que me seja possivel.
Agora vou desempenhar uma promessa que fiz á Camara, e desempenho-a, porque o Sr. Presidente do Conselho, a quem pertencia tomar a iniciativa sobre este objecto, não póde vir agora a esta Camara por motivos de serviço; esta promessa foi a de mandar hoje para a mesa os documentos principaes, que dizem respeito á questão da barca Charles et Georges, a fim de habilitar a Camara a formar o seu juizo sobre esta questão, em quanto não póde ser distribuida a collecção que se tem preparado desses documentos, e cuja impressão o Governo promove. Os documentos que mando para a mesa comprehendem a Portaria de 30 de Julho de 1856. que mandou executar a Portaria de 1855. expedida ainda pelo Sr. Visconde de Athoguia, que tinha prohibido a exportação dos chamados colonos livres; o relatorio do Commandante do cruzeiro dando conta de ter apprehendido a barca Charles et Georges, e referindo as circumstancias que deram motivo a essa apprehensão; a Portaria do Governador geral de Moçambique nomeando uma commissão de inquerito para examinar se effectivamente aquelle navio estava nas circumstancias descriptas no relatorio do Commandante da estação naval; o relatorio dessa commissão; a acta do Conselho do Governo, que resolveu que o navio fosse entregue aos Tribunaes, porque estava fazendo commercio n'um porto prohibido ao commercio estrangeiro, e porque se achava em contravenção com as disposições do Decreto de 10 de Dezembro de 1836; o depoimento do Capitão do navio em Moçambique, e do Delegado nomeado pelo Governador da ilha da Reunião; ha tambem a sentença do Juiz de primeira instancia, e a correspondencia que teve logar entre o Ministro de França nesta corte e o Sr. Marquez de Loulé, como Ministro dos Negocios Estrangeiros; ha as informações que forneceu o Ministerio da Marinhe e Ultramar ao Ministerio dos Negocios Estrangeiros sobre esta questão; ha tambem algumas das correspondencias com o nosso Ministro em París, assim como a proposta que o Governo fez da mediação no caso que o Governo imperial se não convencesse do direito que temos nesta questão, auctorisando o nosso Ministro para propôr ao Governo imperial que esta questão fosse julgada por uma Potencia á escolha da França; ha a recusa dessa mediação; e ha, finalmente, a nota de 23 de Outubro, por virtude da qual o Governo resolveu, da maneira que entendeu que devia resolver, esta questão, e dando conhecimento desta resolução ao Ministro de França.
O Governo desejava juntar a esta collecção de documentos a nota do Ministro dos Negocios Estrangeiros do Imperio, de que o Ministro de França nesta corte deu confidencialmente conhecimento ao Governo portuguez; mas tendo sido perguntado ao Ministro de França se consentia que essa nota fizesse parte dos documentos sobre este assumpto, elle declarou—que, sendo aquella nota confidencial, não podia ser publicada, e esta é a razão porque este documento não vem aqui: mas o extracto delle está na nota em que o Governo respondeu. São estes os documentos que mando para a Mesa, e que julgo que dão uma idéa exacta deste negocio; entretanto os Digno! Pares depois de verem estes documentos acharão talvez algumas lacunas; mas eu declaro, em nome do meu collega o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, que esses documentos não dispensam a apresentação da collecção completa, para a prompta impressão da qual se empregam todos os meios possiveis, a fim de que as doai casas do Parlamento e o publico possam ter conhecimento quanto antes de tudo o que tem havido sobre esta questão.
O Sr. Visconde de Athoguia—Sr. Presidente, eu faço minhas as expressões do Digno Par e meu amigo o Sr. Conde de Thomar, quando declarou hontem, que todos os membros desta Camara desejavam achar motivos para louvar o Governo; e faço votos sinceros para que assim aconteça.
Senti não ouvir mencionar na enumeração dos documentos, que acaba de mandar para a Mesa o nobre Ministro da Justiça, cópia alguma das notas trocadas entre o nosso Governo e o Governo de Sua Magestade Britannica, e o seu representante nesta corte sobre a questão do navio
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francez Charles et Georges. E pediria a S. Ex.ª, que, a não haver inconveniente, tivesse a bondade de mandar para esta Camara a cópia dessas notas.
Tambem me causou surpreza ouvir a declaração do nobre Ministro, de que o Governo francez não conviera, em que fosse publicada a nota (por ser confidencial) pela qual aquelle Governo exigiu do Governo portuguez a entrega da barca Charles et Georges. Ninguem poderá sustentar que o caracter de confidencial, que se indica em algumas correspondencias diplomaticas, possa dar-se naquellas notas que um paiz dirige a outro, nas quaes formula exigências—dá os motivos em que as fundamenta, e indica as consequencias que se seguiriam a não serem satisfeitas; servindo as mesmas notas pelos seus termos e argumentação para ser resolvida a questão a final. Por agora nada mais direi sobre este ponto.
O Sr. Ministro da Fazenda—Não ha inconveniente nenhum, e esses documentos mesmo fazem parte da collecção que se está imprimido; mas, infelizmente, nenhum dos documentos a que se referiu o Digno Par ahi se acha, porque depois de ter eu dito hontem que havia apresentar hoje nesta Camara os documentos principaes, não houve tempo para tirar cópias daquelles a que se referiu o Digno Par; mas eu comprometto-me a apresentar esses documentos no primeiro dia de sessão, e não ha duvida nenhuma em que o Governo os mande publicar na lingua em que foram escriptos; o que foi ordenado a respeito de todos os documentos escriptos em lingua estrangeira, que são publicados no original com a traducção ao lado.
O Sr. Ministro das Obras Publicas—Sr. Presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta para que a Camara consentisse que os Dignos Pares, constantes desta relação, possam accumular as suas funcções nesta Casa com as dos empregos que exercem no Ministerio a meu cargo (leu).
Por esta occasião V. Ex.ª permittirá que eu responda ao que acabou de dizer o Digno Par e meu nobre amigo o Sr. Marquez de Vallada. e tenho que accrescentar muito poucas palavras ao que acabou de expôr o meu illustre collega e amigo o Sr. Ministro da Fazenda, encarregado interinamente da pasta da Justiça, sobre uma supposta contradição em que o Digno Par encontrou o actual Ministro das Obras Publicas, porque na qualidade de Deputado combateu muitas vezes taes accumulações, por essa inspiração que tinha quando combatia uma Administração, sem compromettimento da boa fé e justiça que deve haver no logar que se occupa.
O Digno Par achou uma contradição na opposição que fiz ao Ministerio anterior, pela censura que dirigi ao Governo pela accumulação de pastas, com o meu procedimento a respeito do Gabinete de que tenho a honra de fazer parte, em que ha tambem a accumulação das pastas em um Ministro. Mas o meu collega da Fazenda parece-me que explicou muito bem que essa contradição não combate a idéa de que o Ministerio entende que todas as pastas deviam ser providas; e tanto assim que a pasta que elle occupa já foi provida em dois cavalheiros, e se houve a infelicidade de terem deixado o logar que occupavam, isso não invalida a necessidade de ser provida em outra pessoa.
Por esta occasião não posso deixar sem resposta o argumento que da accumulação da pastas na propria pessoa resulta um inconveniente, porque entendo que havendo uma solidariedade ministerial não póde haver essa contradição. Se não se desse o facto do Governo ter feito esforços, por mais de uma vez, durante todo o tempo da sua administração, para que as pastas tivessem sido occupadas, havia razão de suppôr que desejava estas accumulações; mas a sua opinião é que é altamente inconveniente para o serviço publico a existencia de ta] accumulação, e torno a dizer que convem que as pastas estejam providos nos cavalheiros que as devem exercer: e a historia deste Ministerio mostra que pelo provimento que por duas vezes teve logar na pasta hoje exercida interinamente, elle acha inconveniente na accumulação das pastas, apesar de eu reconhecer os talentos e qualidades do meu nobre collega, e tanto elle como eu estamos convencidos de que não deve continuar essa accumulação.
(Leu-se o pedido do Sr. Ministro.)
«Estando o Governo auctorisado, pelo artigo 3.° do Acto Addicional, para pedir ás Camaras que, em casos de urgentes necessidades, permittam aos seus membros que accumulem o exercicio do serviço publico com as funcções legislativas, se assim o quizerem, são nesta conformidade requisitados á Camara dos Dignos Pares do Reino, por se dar effectivamente o caso indicado, os seguintes Srs.:
Visconde da Luz, Director geral das obras publicas.
Joaquim Larcher, Director geral do commercio e industria.
José Feliciano da Silva Costa, Membro do Conselho de obras publicas e minas.
Marquez de Ficalho, Vogal do Conselho geral do commercio, agricultura e manufacturas.
Francisco Simões Margiochi, Membro da Commissão central de estatistica do reino.
Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria, em 17 de Novembro de 1858. = Carlos Bento da Silva.»
Posto a votos foi approvado; concedendo a Camara a licença pedida.
O Sr. Conde de Thomar agradece ao Sr. Ministro a promptidão com que satisfez á sua promessa, mandando para a Mesa alguns dos documentos relativos á questão do Charles et George; e observa que lhe parece dever dar-se-lhes uma direcção, mandando-os a uma commissão que dê sobre elles o seu parecer em occasião opportuna.
Mostrou desejos de saber se a collecção impressa de todos os documentos que respeitam a esta questão, que o Governo prometteu, seria possivel vir antes de entrar-se na discussão da resposta ao discurso do Throno, como lhe parecia conveniente para habilitar a Camara a entrar nella (apoiados; que era uma pergunta simples que fazia, á qual esperava que o nobre Ministro respondesse, a não ser que fosse exacto o que se lhe tinha dito, que S. Ex.ª promettêra mandal-a no primeiro dia de sessão, no qual caso nada mais tinha a dizer senão que estava satisfeito com aquella promessa.
O Sr. Ministro da Fazenda—Se o Digno Par se refere á collecção impressa não me posso comprometter a isso, porque é impossivel; se S. Ex.ª se refere aos documentos a que alludiu o Sr. Visconde d'Athoguia, que é a correspondencia que houve com o Governo inglez sobre esta questão, é isso que me comprometto apresentar na primeira sessão.
Parece-me que o Digno Par perguntou se entre esses documentos havia alguma correspondencia, que tivesse havido com o Governo inglez directamente, ou com o seu representante nesta corte. Eu respondi a S. Ex.ª que na collecção, que mandei para a Mesa, não se achava nenhum desses documentos; entretanto repito, que me comprometto a satisfazer na sessão de ámanhã aos desejos do Digno Par.
O Sr. Conde de Thomar não insiste, nem póde insistir, uma vez que o Governo diz ser isso impossivel. Aguarda o projecto de resposta ao discurso da Corôa, para vêr como a commissão se explica sobre o paragrapho relativo a esta questão: se a questão ficar alli intacta para se decidir, quanto á avaliação do procedimento do Governo, quando elle apresentar a proposta para o bill de indemnidade, então elle orador limitar-se-ha a pedir ao Governo que apresse a impressão dessa collecção, para que se distribua pelos membros do Parlamento com a necessaria antecipação.
O Sr. Ministro da Fazenda—É só para dizer, que o Governo ha de apresentar necessariamente na outra Camara um projecto de bill de indemnidade (apoiados), durante a discussão do qual ha de ser de certo avaliado o procedimento do Governo, subtraindo á acção dos Tribunaes um navio, e o seu capitão, que tinham sido condemnados por contravenção ás Leis do reino. Esse projecto ha de conter tambem a auctorisação ao Governo portuguez para pagar o que se entender devido aos interessados; mas eu aproveito esta occasião para declarar, que, como Ministro da Fazenda, não terei duvida em tomar a responsabilidade desse pagamento, tenha ou não recebido já a auctorisação no momento em que se me der conhecimento da quantia que se pede (apoiados). (Vozes—Muito bem.)
O Sr. Presidente—Não sei se o Digno Par o Sr. Conde de Thomar lembrou a necessidade da nomeação de alguma commissão?
O Sr. Conde de Thomar disse que não tinha feito proposta para commissão especial; que sómente dissera que lhe parecia que esses papeis deviam ter destino para alguma commissão.
O Sr. Visconde de Algés disse que ouvira lembrar o Sr. Conde de Thomar que fossem os papeis da questão Charles et Georges a uma commissão, sem com tudo indicar a qual, nem propôr alguma especial, e neste caso pediria elle orador licença para observar que lhe parece que por em quanto não ha logar á remessa indicada: que na sua opinião esses papeis devem ficar na secretaria para serem consultados por todos os Dignos Pares, e depois de tudo colligido, irem então a uma commissão que de o seu parecer, e esse tenha de ser o thema da discussão, para a qual já todos estarão habilitados (apoiados).
Approveitou a occasião para dizer, em relação ao que hontem se passou entre o mesmo Digno Par e o Sr. Ministro da Fazenda sobre a exigencia feita pelo Sr. Conde de Thomar para que a Camara ficasse habilitada com os esclarecimentos necessarios ácerca deste tão importante assumpto, exigencia que o Sr. Ministros e prestou logo, como devia, a satisfazer; que elle orador entende que o Ministerio deve prestar ao Parlamento todos os esclarecimentos que possam haver sobre o negocio; (O Sr. Ministro da Fazenda, apoiado) e que devem ser mandados a esta Camara com a igualdade de partilha, com que forem para a outra Camara, pois que a dos Pares tem de preparar-se do mesmo modo para tomar conhecimento da questão; (apoiados) e que depois quando todos os documentos estiverem impressos, é claro que é necessario que venham para esta Camara os necessarios exemplares para que cada um dos seus membros tenha o seu, e que o mesmo se faça para a outra Camara.
Entrando na parte que respeita a querer-se que no projecto de resposta ao discurso da Corôa se proceda de modo que, na occasião da sua discussão, ou não fique prejudicado este negocio, ou esteja a Camara habilitada já a emittir conscienciosamente a sua opinião, disse o illustre orador:
Que a commissão da resposta, no seu peculiar modo de vêr, não póde dizer nada a respeito desta questão, porque para podér dizer alguma cousa era necessario possuir taes dados e esclarecimentos, que para obtel-os teria de demorar-se muito a apresentação do projecto de resposta, (apoiados) que além disso parecia-lhe pelo menos muito difficil tractar ambos os assumptos simultaneamente, até pela incompatibilidade do tempo; (apoiados) razões estas pelas quaes era a sua opinião que esta questão das reclamações fique reservada para quando a Camara estiver habilitada para avalial-a como fôr de justiça, e de politica nacional, pois tem de fé que está no coração e na cabeça de todos, que isto não é uma questão de parcialidade, nem um negocio de partido: (apoiados) mas verdadeira e rigorosamente nacional, de independencia e liberdade de um Governo livre que sabe apreciar e manter os seus direitos, por tanto não póde ser tractada nem avaliada senão com toda e expansão da verdade n'um julgamento puro e isento de todas as paixões (apoiados).
O Sr. Conde de Thomar não lhe parece que seja esta uma questão em que valha a pena insistir para que estes papeis vão a uma commissão; mas entende ser do seu dever declarar as razões que para isso teve.. Devendo a commissão de resposta ao discurso da Corôa alludir no projecto ao paragrapho relativo á questão para que são esses documentos, a que o Sr. Ministro chamou os principaes, era natural que lhe fossem remettidos para se possuir do seu conteudo, e guiar-se pelo que delles deprehendesse. E posto que elle orador não a designasse, era bem claro que não podia ser outra a sua mente.
O seu unico desejo é que se exclareça bem esta questão, e que elle ache no estudo dos documentos razões que o habilitem a pôr-se ao lado do Governo nesta questão, na qual a sua maior satisfação era que todos os partidos podessem fazel-o sem quebra do que devem ao paiz e á sua consciencia (apoiados.)
O Sr. Barão de Porto de Moz—O Digno Par o Sr. Conde de Thomar preveniu-me e tirou-me o motivo de eu fazer ainda uso da palavra, visto que S. Ex.ª não insiste no que parecia propôr, mas sempre direi alguma cousa.
Quanto a mim a commissão de resposta não tem que dar parecer sobre a questão, porque esta ha de ter logar na occasião em que se tractar do bill de indemnidade, e este começa na outra Camara, eis o motivo porque eu entendo que a commissão de resposta não se podia occupar do exame de taes documentos. Os documentos quanto a mim estão agora aqui para a Camara se ir esclarecendo, como lhe convenha, em geral e em particular a cada um de nós, mas para se apreciar a questão na resposta ao discurso da Corôa, não póde ser, porque ha de ter o seu logar proprio e natural no bill de indemnidade, tendo a iniciativa na outra Camara a quem pertence.
Estimo pois muito que o Digno Par concluisse pela não insistencia na sua proposta e talvez mesmo pela retirada della.
O Sr. Conde de Thomar sente que o Digno Par se explicasse de modo que alguem podesse inferir de suas palavras que elle orador tinha sustentado o absurdo de que a questão do bill de indemnidade podia principiar nesta Camara; ainda que sejam pequenos os seus conhecimentos de direito constitucional, são assim mesmo bastantes para arredar de si uma tal suspeita (apoiados). (O Sr. Barão de Porto de Moz — Pois quem duvida disso?)
Entre pronunciar um juizo sobre o fundo da questão, e dar uma redacção mais ou menos favoravel ao periodo da resposta ha tanta differença como entre o essencial e o accidente: este compete á commissão da resposta considera-lo — aquelle, como muito bem disse o Digno Par o Sr. Visconde de Algés, tem outro processo e solemnidades que lhe são proprios; e era ao accidente que o orador se referia quando fallou na commissão de resposta. Já agora entende que devem cessar os seus escrupulos, pois vê que a commissão nem uma palavra diz a este respeito, quer de louvor quer de censura; e por isso lendo repellido a suspeita de absurdo, póde sentar-se tranquillo.
O Sr. Barão de Porto de Moz — A respeito do modo porque a commissão de resposta ao discurso da Corôa ha de fazer uso destes documentos, nem eu pertendo entrar nessa questão, nem me parece que alguem o possa, porque a commissão ainda não apresentou essa resposta.
Mas pertendeu-se que fossem remettidos esses documentos á commissão. Eu levantei-me para dizer que o Sr. Conde de Thomar foi procurar não sei onde (por certo não foi ás minhas palavras) motivo para dizer que já sabia que não se tractaria na resposta ao discurso da Corôa esta questão, e soccorreu-se a essa razão para affirmar que os membros da commissão (e eu sou um) não pensavam que os documentos lhe fossem necessarios.
O que eu disse foi que na resposta ao discurso da Corôa não era logar proprio para a questão, e nunca que a ella se não havia alludir; disse que os documentos eram necessarios á commissão, como a qualquer outro membro desta Camara, porque a remessa delles só podia significar a necessidade de estabelecer sobre elles o seu juizo, o que me parecia e parece não póde alli ter logar; mas tambem me parece, que daqui a não alludir á questão vai muita distancia. Eu ignoro o que a commissão ha de dizer, porque a resposta ainda não está feita. Eu não attribui ao Sr. Conde de Thomar casta nenhuma de ignorancia.
O que disse sobre a iniciativa do bill de indemnidade na Camara dos Deputados, precisava dize-lo para justificar a minha opinião sobre o requerimento do Sr. Conde de Thomar, isto é, que não tendo a commissão de resposta ao discurso da Corôa de dar a sua opinião sobre a questão, que havia de tractar-se de outro modo, começando em outro logar, era inutil que se lhe remettessem os documentos.
O Sr. Presidente—Eu creio que a Camara me dará licença para que diga alguma cousa a este respeito.
V. Ex.ª sabe que o Presidente é a pessoa que redige o primeiro esboço da resposta, para depois combinar com os individuos nomeados para o coadjuvar na factura desse trabalho; a Camara sabe tambem que eu presto sempre muita attenção ao que nella se diz, e não me persuado que possa suppôr que me esqueça do que se tem aqui dito.
Agora passâmos á
ORDEM DO DIA.
Discussão do parecer (n.° 55).
Parecer n.º 35.
A commissão de marinha e ultramar examinou com a devida attenção o projecto de lei n.º 49, que veio da Camara dos Senhores Deputados, estabelecendo que os empregados civis com graduações militares, pertencentes ás Repartições dependentes do Ministerio da Marinha, possam ser reformados, segundo os seus annos de serviço effectivo, na conformidade do Alvará de 16 de Dezembro de 1790; e que nestas circumstancias possam tambem ser admittidos no Corpo de Veteranos de Marinha pela fórma determinada na Carta de Lei de 28 de Agosto de 1848.
A commissão, considerando que as vantagens que se propõem para os empregados civis mencionados já foram conferidas aos empregados civis com graduações militares das Repartições dependentes do Ministerio da Guerra, e que estes estão em identicas circumstancias aquelles; é de parecer que o dito projecto de lei n.° 49 deve ser approvado por esta Camara, e submettido á Sancção Real para ser convertido em lei.
Sala da Commissão, 11 de Agosto de 1858. = Conde do Bomfim—Visconde d'Athoguia = Conde de Linhares (D. Rodrigo)= Visconde de Villa Nova de Ourem.
projecto de lei n.º 49.
Artigo 1.º Os empregados civis com graduações militares, pertencentes ás Repartições da dependencia do Ministerio da Marinha, serão reformados, segundo os seus annos de serviço effectivo, na conformidade do Alvará de 16 de Dezembro de 1790.
Art. 2.º Os diplomas dos empregados mencionados no artigo primeiro são as suas patentes, pelas quaes pagarão os mesmos direitos de sêllo e emolumentos que pagam os Officiaes da Armada.
Art. 3.° Os empregados civis com graduações militares das Repartições do Ministerio da Marinha poderão ser admittidos no Corpo de Veteranos de Marinha, ou a elle addidos, quando reformados, pela fórma determinada na Carta de Lei de 28 de Agosto de 1848, que creou o mesmo Corpo.
Art. 4.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Palacio das Côrtes, em 9 de Agosto de 1858. = Manoel Antonio Vellez Caldeira Castel-Branco. Deputado Presidente = Miguel Osorio Cabral, Deputado Secretario = Guilhermino Augusto de Barros, Deputado Secretario.
O Sr. Presidente—Antes de principiar a discussão direi á Camara que os documentos apresentados pelo Sr. Ministro vão para a Secretaria.
Entramos na discussão do projecto na sua generalidade.
Vozes—Votos, votos.
Approvado sem discussão na generalidade e especialidade; e a mesma redacção.
O Sr. Presidente—Passamos ao n.º 26. parecer (n.° 26).
A commissão de fazenda foi presente o projecto de lei n.º 26, vindo da Camara dos Senhores Deputados, concedendo á Camara Municipal de Abrantes os materiaes das ruinas das igrejas da Ordem Terceira e de Santo Antonio, e outros objectos pertencentes aos mesmos arruinados edificios, sem exceptuar a cisterna, tudo com o objecto, por um lado de abastecer de agoa os povos daquelle concelho, e por outro de edificar um cemiterio publico.
A commissão, observando que a fazenda publica nenhuma vantagem tem na posse dos objectos daquella concessão, que aliás vão ser applicados a fins tão convenientes e necessarios; é de parecer que seja approvado o projecto, e submettido á Real Sancção.
Sala da commissão, 7 de Agosto de 1858. = Visconde de Castro = Visconde de Castellões = Francisco Simões Margiochi = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão = Barão de Chancelleiros —Felix Pereira de Magalhães.
projecto de lei n.º 26.
Artigo 1.° São concedidos á Camara Municipal do concelho de Abrantes os materiaes das ruinas das igrejas da Ordem Terceira e de Santo Antonio, e os do convento dentro do forte de Santo Antonio, bem como a cisterna, a fim de construir o cemiterio e abastecer de agoa os povos daquelle concelho.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.
Palacio das Côrtes, em 3 de Agosto de 1858. = Manoel Antonio Vellez Caldeira Castel-Branco, Deputado Presidente—Miguel Osorio Cabral, Deputado Secretario = João Antonio Gomes de Castro, Deputado Secretario.
Foi igualmente approvado sem discussão; e a mesma redacção.
Entrou em discussão o parecer (n.° 51).
A commissão de fazenda viu e examinou com a devida attenção o projecto de lei n.º 61, da Camara dos Srs. Deputados, auctorisando a Camara Municipal da villa de Setubal a celebrar um contracto, já por ella maduramente discutido, de illuminação a gaz daquella notavel villa, com sujeição ás clausulas que se estabelecem nos differentes artigos do mesmo projecto; e attendendo ao evidente interesse publico que dictou a instancia daquella municipalidade, e que lhe mereceu não só a iniciativa do Governo, mas o favoravel acolhimento que encontrou na Camara electiva, como se observa do illustrado parecer da sua respectiva commissão, tem a honra de propôr á Camara que seja approvado o projecto de lei n.º 61, para ser submettido á Sancção Real.
Sala da commissão, 16 de Agosto de 1858. = Visconde de Castro = Visconde de Castellões —Barão de Chancelleiros = Felix Pereira de Magalhães—Francisco Simões Margiochi.
projecto de lei n.º 61.
Artigo 1.° É auctorisada a Camara Municipal da villa de Setubal a celebrar o contracto que por ella foi previamente ajustado com Luiz Louge, Felix Canier e Pedro Leré, segundo as condições ou clausulas juntas á presente Lei, a fim de realisar a illuminação daquella villa por meio de gaz.
Este contracto, celebrado por escriptura publica, com todas as seguranças e solemnidades legaes, e admittindo no theor das mencionadas clausulas as modificações que forem convenientes para mais clareza de redacção e segurança delle, e a bem do municipio, será submettido á approvação do Conselho de districto, sem a qual não terá effeito.
Art. 3.º O Governo, ouvidas as estações e au-
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ctoridades competentes, assim as locaes como as que funccionam junto delle, e tomando por base o Decreto de 10 de Outubro de 1848 e o de 10 de Março de 1847, naquillo em que as suas disposições forem justamente applicaveis á execução desta Lei e do contracto a que ella se refere, e á inspecção e fiscalisação dos processos, apparelhos, machinas, officinas e mais objectos necessarios para a boa illuminação da villa de Setubal por meio de gaz, expedirá quaesquer novos Regulamentos que forem convenientes, fixando-se nelles as competentes attribuições do Conselho de Districto ácerca deste assumpto, em harmonia com a natureza das funcções legaes deste corpo administrativo, e com a posição que elle eccupa na escala da administração publica.
Art. 4.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Palacio das Côrtes, em 14 de Agosto de 1858. Manoel Antonio Vellez Caldeira Castello-Branco, Deputado Presidente = Manoel Osorio Cabral, Deputado Secretario Guilhermino Augusto de Barros «Deputado Secretario. Condições para a illuminação da villa de Setubal, por meio de gaz, e que se refere a presente Lei.
1.ª
Os emprezarios obrigam-se a estabelecer o apparelho de distillação, condensadores, depuradores e gazometros n'um local previamente escolhido para esse effeito, não povoado, sendo para a sua approvação e escolha ouvido o Delegado de saude.
2.ª
Se o local escolhido para este fim fôr dos que a Camara actualmente possue, os emprezarios pagarão por elle a renda annual de 20$000 réis por cem metros de comprimento sobre cincoenta de largura, mas não poderão construir casas na dito local, exclusivamente destinado para o estabelecimento dos gasómetros. A Camara porém não poderá despedir os emprezarios do dito arrendamento, quer durante o contracto, quer depois delle, em quanto os mesmos emprezarios alli quizerem ter o seu estabelecimento.
3.ª
Será licito aos emprezarios construírem um caes de madeira em frente do dito estabelecimento para nelle desembarcaram carvão de pedra, madeiras e mais utensilios e objectos necessarios para esta Empreza; e a Camara solicitará juntamente com os emprezarios a necessaria auctorisação dos poderes competentes para que o carvão de pedra e ferro necessarios para serviço da Empreza, vindos directamente do estrangeiro, possam ter despacho na Alfandega desta villa.
4.ª
Se aos emprezarios convier Outro qualquer terreno que esteja nos termos da condição 1.ª serão obrigados ao pagamento delle.
5.ª
O numero de candieiros será de cento e cincoenta, e o preço de cada um 18$000 réis annuaes!
6.ª
Quanto á Garrara convier augmentar o numero de candieiros marcados na condição antecedente não pagará por cada um maior preço do que o estipulado para cada um dos outros.
7.ª
A collocação e distribuição dos candieiros de gaz será feita com approvação previa da Camara.
§ unico. Se a Camar em qualquer tempo julgar necessario alterar a collocação de algum candieeiro, essa mudança será feita á sua custa.
8.ª
Os candieiros serão de chapa de cobre, assentados sobre braços ou candelabros de ferro fundido, e todos numerados.
Nas praças o ruas largas, designadas pela Camara, os candieiros serão collocados em columnas. Tanto estas como os candieiros e mais pertences dos mesmos serão por conta da Empreza.
§ 2.° Os modelos dos candieiros, braços, columnas e bicos serão dà approvação da Camara, depositados nos paços do concelho para servirem de padrões.
§3.° Os candieiros, braços o columnas serão pintados a oleo pelo menos de dois em dois annos, e por conta da Empreza.
9.º
A conducção do gaz será feita por tubos de ferro fundido, de sufficiente capacidade e solidez, e devidamente experimentados perante o delegado da Camara.
§ unico. Os canos parciaes da conducção do gaz para os edificios publicos e particulares serão de chumbo, feitos com segurança.
10.ª
Os Emprezarios abrirão, á sua custa, as vias de canalisação pelas ruas e praças, restituindo as mesmas ao seu antigo estado.
11.ª
O systema da illuminação será de leque, como se acha estabelecido nas principaes cidades da Europa; e a chamma da luz não será menor de Oito a nove centimetros de largura, clara, brilhante, e sem o menor traço de fumo.
12.ª
A illuminação dos edificios publicos ou particulares, assim como o systema da luz, será feito a avança das partes, e nunca o seu preço excederá a 2 por pé cubico de gaz, sendo este completamente purificado. A collocação dos tubos, conductores, lustres, candieiros ou bicos luminosos para a illuminação dos ditos edificios não será da obrigarão dos Emprezarios.
13.ª
Os candieiros de gaz serão accesos ao anoitecer, e apagados ao amanhecer. Nas noites de luar claro, desde o nascimento até ao occaso da lua, se dará á chamma seis centimetros de largura.
§ 1.° Quando aconteça que uma ou mais lutes de gaz não tenha a altura e mais requisitos marcados nas condições 11.* e 12.* será descontada aos Emprezarios a quantia de 240 réis por cada luz, e em cada uma das noites em que occorrerem essas faltas.
§ 2.ª O Inspector da illuminação avisará a Camara da falta mencionada, e sendo verificada, o preço da muleta ou muletas a que se refere o paragrafo antecedente será descontado no primeiro pagamento que se houver de fazer aos Emprezarios.
A Camara cederá gratuitamente aos Emprezarios os candieiros e mais objectos da actual illuminação, os quaes lhe serão entregues á medida que forem substituidos pelos do gaz.
§ unico. Os primeiros quarenta candieiros que vagarem são exceptuados desta disposição, e ficarão pertencendo á Camara como propriedade municipal, sendo depositados nos paços de concelho, para no caso de incidente imprevisto poderem substituir temporaria e parcialmente a illuminação a gaz, e para augmento da illuminação a azeite nos locaes aonde se julgar necessario.
15.ª
Antes que os Emprezarios principiem a illuminação a gaz, todas as obras o apparelhos deverão ser examinados e approvados pela Camara, e só precedendo esta approvação é que a Camara ficará obrigada aos respectivos pagamentos do contracto.
16.ª
Para os processos de distillação, purificação, canalisação e mais particularidades relativas á illuminação, os Emprezarios deverão empregar todos os meios conhecidos, tendentes a evitar todo o perigo na segurança ou detrimento da salubridade publica, e para esse fim ficam obrigados á observancia dos Decretos de 10 de Março de 1847 e 10 de Outubro de 1848, e bem assim das Instrucções do Prefeito de París de 31 de Marro de l842.
17.ª
As obras da illuminação deverão começar sessenta dias depois do contracto estar completamente approvado, e estarão acabadas no praso de Vinte mezes.
18.ª
Logo que os Emprezarios concluam toda a illuminação, terá principio o tempo da duração do contracto estipulado na condição 23.ª, e serão obrigados a tomar a seu cargo a illuminação a azeite aonde necessario fôr, e a Camara designar.
§ unico. O preço da illuminação a azeite será calculado para cada candieiro pelo termo medio do seu custo nos ultimos cinco annos.
19.ª
Todas as despezas da promptificação das obras e reparos, limpeza necessaria e custamento da illuminação são da competencia dos Emprezarios, e a Camara sómente fica obrigada ao pagamento mensal do preço por que é contractada a illuminação.
20.ª
Todo o incidente imprevisto que obrigar a interromper a illuminação a gaz e a substituil-a pela de ascite em algum ponto da villa deve ser participado á Camara, e perante ella justificado no praso de vinte e quatro horas.
§ 1.° As despezas da substituição serão feitas a custa dos Emprezarios e a Camara será sómente obrigada a prestar-lhes os candieiros que houver em deposito, Se ainda os não tiver empregado.
§ 2.º O preço da illuminação a azeite por cada candieiro desta substituição será calculado e pago aos Empresarios conforme o estipulado na condição 18.º § unico.
21.ª
Todas as perdas e damnos causados a particulares ou ao publico pelos Emprezarios, e resultantes das obras da illuminação, serão por elles indemnisados conforme a Lei.
§ unico. Para este fim prestarão fiança quando se approvar o contracto, assignando termo ou escriptura publica.
22.ª
Para segurança de todas as condições estipuladas, os Emprezarios serão obrigados a depositar no Banco de Portugal a quantia de 1000$000 réis em metal, a qual só lhe será restituida logo que tenham empregado em materiaes existentes em Setubal e nas construcções necessarias para a illuminação a gaz o sextuplo do mesmo valor.
23.ª
A duração do contracto será pelo tempo de vinte annos. contados desde a época marcada na condição 18.ª
24.ª
As fabricas, apparelhos, utensilios e quaesquer outros materiaes ou obras que a Empreza adquirir ou fizer para levar a effeito a illuminação a gaz serão no fim do contracto cedidas á Camara, e por ella pagas á mesma Empreza, precedendo a avaliação por peritos, se á Camara convier este contracto.
25.ª
Um anno antes de finalisar a duração do contracto, quando tenha de se abrir novo concurso, os Emprezarios serão preferidos em igualdade de circumstancias.
26.ª
Os Emprezarios ou Companhia perderão as fabricas, apparelhos, utensilios e quaesquer outros materiaes ou obras que fizerem para levar a effeito a illuminação a gaz, e ficarão sendo propriedade municipal, se durante o praso deste contracto abandonai em a illuminação, sem que possam exigir indemnisação alguma, exceptuando unicamente o motivo imprevisto de forca maior.
27.ª
No caso de duvida, contestação ou divergencia entre os emprezarios ou companhia e a Camara, será essa duvida, contestação ou divergencia, decidida por arbitros da maneira seguinte:
§ 1.º A Camara nomeará dois vogaes e um supplente, e os emprezarios nomearão igualmente outros dois vogaes e um supplente;
§ 2.° Estes vogaes e supplentes não serão empregados da Camara nem dos emprezarios;
§ 3.º Os quatro vogaes reunidos resolverão a
duvida, contestação ou divergencia; e no caso de empate decidirá um dos supplentes tirado á sorte.
28.ª
Quando a Camara julgar necessario fiscalisar ou examinar a densidade e pureza do gaz, e tudo o mais que respeita á policia da illuminação, os emprezarios serão obrigados a facilitar todos os meios para isso necessarios; o não o cumprindo assim pedirão da prestação que a Camara é obrigada a pagar-lhes a parte correspondente ao tempo que durar -a sua repugnancia.
29.ª
Os emprezarios desistem de todos os privilegios que possam ter como estrangeiros, sujeitando-se em tudo á legislarão portuguez».
30.ª
Os actuaes empregados da illuminação desta villa serão preferidos em igualdade de circumstancias, para o serviço da empreza, e da mesma fórma serão preferidos operarios nacionaes a estrangeiros.
Se por causa do nivelamento, alinhamento de ruas ou quaesquer obras que a Camara mandar fazer, os emprezarios forem obrigados a alterações» mudanças ou trabalhos na canalisação do gaz já estabelecida, as despezas occasionadas por essas alterações ou mudanças, serão por conta da Camara, que as pagará aos emprezarios logo que estejam concluidos.
Palacio das Côrtes, em 14 de Agosto de 1858.
Manoel Antonio Vellez Caldeira Castel-Branco, Deputado, Presidente Miguel Osorio Cabral, Deputado, Secretario = Guilhermino Augusto de Barros, Deputado, Secretario.
O Sr. Barão da Vargem — Este projecto que vai entrar em discussão, já aqui está ha muito tempo; lembro pois á Camara que a villa de Setubal soffreu muito com o tremor de terra, que teve logar no dia 11 do corrente mez, e pôr consequencia a Camara municipal da mesma villa tendo de acudir a tantas desgraças alli acontecidas, como geralmente se sabe, não estará por Certo habilitada com os meios necessarios para executar o melhoramento que antes queria, e neste Caso parecia-me conveniente que este projecto ficasse adiado por algum tempo, pois se não sabe se a Camara poderá agora tractar deste negocio, visto que ella tem de certo muito a fazer, porque os prejuizos são incalculaveis.
O Sr. Presidente— Queira o Digno Par mandar para a mesa a sua proposta de adiamento.
O Sr. Margiochi — Peço a palavra,
O Sr. Conde de Penamacôr — Parece-me que o Digno Par retirará a sua proposta, attendendo a uma pequena consideração.
O Sr. Presidente — Perdoe-me V. Ex.ª o Digno Par está escrevendo a sua proposta, que hade ser submettida a […] da Camara, e depois disso poderá então V. Ex.ª fazer as observações que julgar conveniente.
Leu-se na mesa a seguinte proposta
«Proponho que o projecto n.°61 fique adiado, pelo motivo dos estragos que soffreu a villa de Setubal pelo tremor de terra, que teve logar no dia 11 do corrente. Camara dos Pares, 19 de Novembro de 1858. = Barão da Vargem.»
Não foi admittida.
O Sr. Presidente — Continua portanto a discussão do projecto na sua generalidade.
O Sr. Barão de Porto de Moz — Pelo que eu vejo por este projecto, existe um contracto celebrado, que vem aqui para receber a approvação desta Camara, mas não consta que se tivesse procedido a hasta publica; desejo portanto que a illustre commissão me informe, se este contracto que se diz celebrado pela Camara municipal de Sambai foi posto em praça.
Espero que algum dos membros da commissão me responda sobre esta duvida.
(Pausa)
Pelo que vejo a illustre commissão não está habilitada para me responder, e eu tambem não estou habilitado para votar. A minha habilitação é pelo menos igual a ria commissão!
É cousa extraordinaria, Sr. Presidonte, que cousas em que devia haver severidade e exame se tractem tão […], e isto succede a respeito dos negocios de todas as Camaras do reino. (O Sr. Margiochi — Peço a palavra.) Se o Digno Par que acaba de pedir a palavra me póde informar a este respeito, estimalo-hei muito.
O Sr. Margiochi,...
O Sr. Baião de Porto de Moz — E que eu tinha dirigido uma pergunta á commissão e aguardava pela resposta.
(Continuando.) Se e verdade a declaração que faz o Digno Par, nem elle era capaz de asseverar um» cousa de que não estivesse certo: dou-me por satisfeito; mas parecia-me que estes projectos deviam vir aqui acompanhados de todos do documentos para, permitta-se-me a expressão por vulgar, não passarmos por baixo das forcas caudinas. Aqui falta muita cousa; não sei mesmo se no meio de tudo isto foi ouvido o Conselho de districto. Se o foi para que ha de ser ainda, como se expressa no contracto, se o não foi, para que o ha de ser approvando-o esta Camara? Eu sinto que a Camara rejeitasse o adiamento deste projecto até saber se a Camara municipal de Setubal podia hoje satisfazer esta despeza, talvez que o estado della em circumstancias tão difficeis, como as em que se acha pela calamidade porque acaba de passar, o terremoto do dia 11, a impossibilita de pagar a illuminação a gaz; receio que só tinha que este melhoramento fosse esclarecer ruinas. Setubal tem um bairro quasi destruido, muitas ruas perdidas, todas as casas prejudicadas; e quando isto succede não haverá tanta cousa que se deva antepor á illuminação? Setubal viveu, e prosperou por muitos seculos sem illuminação a gaz, mas sem moradas, isso não.
Não digo mais nada.
O Sr. Margiochi.
O Sr. Conde de Thomar este parecer, na opinião do orador, resente-se algum tanto da data em que foi lavrado, que é a de 16 de Agosto ultimo, vespera ou antevéspera do encerramento da sessão; que é a occasião em que cáe sobre as commissões um diluvio de projectos, que n»o cabe no tempo attendel-os, mas em que se Vêem perseguidas para darem sobre elles seus pareceres á ultima hora, como á ultima hora vieram da outra Camara: que, por isso, a commissão provavelmente suppoz que a outra casa do Parlamento attendêra convenientemente ao assumpto, e deu-lhe este parecer favoravel em tempo de examinar bem a questão.
Sem se referir ao que disse o Digno Par o Sr. Barão de Porto de Moz, notou o orador que bastava comparar o 1.º com o 2.º artigo do projecto vindo da outra Camara para se conhecer que estão em contradicção, e que esta Camara, approvando-o, não approva nada.
Lendo-se o artigo 1.° que diz: (leu) parece que se approvam as condições que veem juntas ao projecto, e que veem neste artigo mencionadas; mas comparando-o com o artigo 2.° que diz: (leu) vê-se que estas condições ainda podem ser alteradas, e que essas alterações teem de ser submettidas ao Conselho de districto para lhes dar a approvação. O que approva então a Camara dos Pares? Nada; dá-se um voto de confiança ao Conselho de districto. Isto não pode ser.
Pelas razões ditas, o orador entende que é melhor que o projecto volte á commissão, o que não é em desabono seu pelas considerações que fez ao começar, e que lha parecem justas (apoiados).
O Sr. Visconde de Castro—Eu tambem entendo que este projecto de lei deve voltar á commissão; mas a qual commissão, Sr. Presidente? Isso é que convem examinar. Já o Digno Par o Sr. Conde de Thomar explicou multo bem quaes são os motivos que fazem apressar Os pareceres das commissões no fim de qualquer sessão á legislatura; e eu accrescentarei que a commissão de fazenda não quiz retardar á villa de Setubal o melhoramento da illuminação por meio de gaz, e foi por mais esse motivo que na ultima sessão do anno passado apresentou este parecer. Hoje porém, depois do que se tem passado aqui, entendo que o projecto de lei devo ser remettido á commissão de administração publica; que é aquella a quem devidamente pertence tomar conhecimento deste negocio: foi pois para fazer este requerimento que eu pedi a palavra a V. Ex.ª, e rogarei mesmo que lhe seja remettido com urgencia. Ainda que o Digno Par e meu amigo o Sr. Barão dê Porto de Moz disse, ou me pareceu ouvir-lhe, em censura á commissão, que o povo de Setubal só pensa actualmente em restaurar os grandes estragos produzidos pelo terramoto, e que por essa circumstancia não da attenção a este melhoramento; eu observarei comtudo ao Digno Par o á Camara, que este parecer foi dado antas de ter logar esse infeliz successo; e direi tambem que áquella povoação não foi, graças ao Altissimo, anniquillada; e que não me parece o melhor meio de lhe dar vida começar por lhe negar os melhoramentos materiaes.
O Sr. Conde de Thomar: ou mandar para a mesa a seguinte proposta, na qual inclui a idéa do Digno Par Visconde de Castro.
(Leu-a.)
«Proponho que o projecto n.º 61 volte á commissão de fazenda, ouvida a de administração publica, com urgencia. Camara dos Pares, 19 de Novembro de 1858,—Conde de Thomar.»
O Si. Visconde de Castro — Peço licença para tambem a assignar.
O Sr. Baião de Porto de Moz - Eu tambem «poio a proposta que acaba de lêr-se, porque ella tende aquillo mesmo que ou quer estabelecer, e dar logar a discussão da materia. Sr. Presidente, eu não tenho empenho em rejeitar este projecto de lei, lhas o que quero e que elle seja discutido com lodo o conhecimento de causa: e por isso approvo o requerimento que foi mandado para a mesa, porque elle da logar a que haja uma mais larga discussão. E por esta occasião pedirei, Sr. Presidente, que as illustres commissões peçam a prova de que houve praça para este contracto, como afirmou o Digno Par o Sr. Margiochi; convem que venha aqui para todos o verem.
O Sr. Presidente— V. Ex.ª não póde estampando da palavra sobre o requerimento antes de elle estar admittido.
O Sr. Baião de Porto de Moz—Já que eu tenho usado della, ainda que fôra de logar como V. Ex.ª acaba de dizer, permitta V. Ex.ª que eu diga mais duas palavras em resposta ao que ouvi ao Digno Visconde de Castro. Eu não avancei a proposição de que Setubal tinha ficado anniquilada, não Srs. mas o facto é que se áquella povoação não ficou anniquilada, ficou sim muitissimo arruinada. Agora perguntarei—de que se deve tractar primeiro De accudir á miseria em que ficou áquella villa, reconstruindo um bairro, e algumas outras ruas que foram destruidas, ou fazer esse melhoramento de illuminação a gaz? Reconheço que é um melhoramento muito util, mas todos nós por certo reconhecemos tambem que ha certos melhoramentos que devem vir depois de outros. Eu rejeito, Sr. Presidente, a idéa de que os melhoramentos se devem fazer todos a um tempo: não concordo com isso, porque tenho para mim como certo, que isso não póde ser, e sendo assim, creio que os mais necessarios devem preferir a outros; todos, serão impossiveis ao mesmo tempo. E por tanto, que com preferencia se deve primeiro fazer surgir de novo essas casas que estão em terra.
Foi admittido á discussão o requerimento do Sr. Conde de Thomar.
O Sr. Barão da Vargem: — Apesar da minha proposta de adiamento ter sido rejeitada, estimei muito que a proposta que se acha em discussão, que é no mesmo sentido, viesse da parte do meu nobre amigo o Sr. Conde de Thomar, o que sinto é que se rejeitasse a minha, porque se teria poupado esta discussão; mas Como o meu fim está preenchido, nada mais digo.
O Sr. Conde de Thomar observa que não ha paridade alguma entre as duas propostas; porque se a Camara admittiu a proposta delle orador, tendo rejeitado o seu adiamento, é bom notar-se a differença de uma para a outra. S. Ex.ª proponha o adiamento por causa do estado de Setubal,
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e o orador propoz que o projecto voltasse á commissão por não estar a materia bem estabelecida. É portanto evidente que não ha paridade nas propostas, nem contradicção nas decisões da Camara, por ter rejeitado o -seu adiamento. (O Sr. Barão da Vargem da Ordem — Não disse isso).- Não o disse, mas podia entender-se isso das suas palavras.
Foi approvado o requerimento.
O Sr. Presidente — Como não ha mais objecto para nos occuparmos; a ordem do dia para ámanha é os pareceres 27, 30 e 29. Está levantada a sessão.
Eram quatro horas e um quarto da tarde.
Delação dos Dignos Pares que estiveram presentes na sessão de 19 de Novembro de 1858.
Os Srs.: Visconde de Laborim; Marquezes: de Ficalho, de Fronteira, de Niza, e de Vallada; Condes: d'Alva, d'Azinhaga, do Bomfim, de Mello, de Paraty, de Penamacôr, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, de Samodães, do Sobral, e de Thomar; Viscondes: d'Algés, d'Athoguia, de Balsemão, de Benagazil, de Castellões, de Castro, de Fornos de Algodres, da Luz, e de Ovar; Barões de Porto de Moz, e da Vargem da Ordem; Mello e Saldanha, Margiochi, Silva Carvalho, Aguiar, Silva Sanches, e Brito do Rio.