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1955

CAMARA DOS DIGNOS PARES Do REINO

SESSÃO DE 14 DE JUNHO DE 1886

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. CONDE DE CASTRO, VICE-PRESIDENTE

Secretarios, os srs.

(Assistem os srs. ministros do reino e da justiça.)

Pelas duas horas e meia da tarde, tendo-se verificado a presença de 22 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente contra a qual não houve reclamação.

O sr. Secretario (Marquez de Sousa): — Deu conta da seguinte correspondencia:

Um officio do ministerio do reino, participando que Sua Magestade EL-Rei tem resolvido receber no proximo sabbado 16 de junho pela meia hora depois do meio dia, ao real paço da Ajuda, a deputação da camara dos dignos pares do reino, que ha de apresentar ao mesmo augusto senhor alguns decretos das côrtes geraes para obterem, a sua real sancção.

Inteirada.

O sr. Secretario (Marquez de Sousa): — Leu os nomes dos dignos pares que hão de formar a deputação que ha de ir no sabbado apresentar a Sua Magestade os autographos das côrtes geraes; que são os

Ex.mos srs. Presidente

Conde de Alva Visconde de Seabra.

Visconde de Soares Franco

Barão de Villa Nova de Foscôa

Alberto Antonio de Moraes Carvalho

Antonio de Azevedo Coutinho Mello e Carvalho.

O sr. Conde d'Avila: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda, que peço licença para ler (leu).

O sr. Gosta Lobo: — Na ultima sessão d'esta camara, por motivos superiores á minha vontade, entrei na sala um pouco tarde. Discutia-se a concessão do subsidio á sociedade do palacio de crystal portuense. Desejava eu antes da votação explicar o meu voto; mas a camara, que se achava suficientemente esclarecida, estava impaciente pela votação, e eu não me atrevi a importuna-la. É por isso que peço licença para dizer hoje duas palavras explicativas do meu voto, que foi contrario á concessão d'aquelle subsidio.

O sr. Silva Cabral: — Não póde.

O Orador: — Não posso? Não sei que haja artigo no regimento que prohiba a um membro d'esta casa o declarar qual a significação que tem o seu voto. Comtudo, como sou novo na camara, não tenho um conhecimento profundo do regimento, peço a v. ex.ª, sr. presidente, que me diga se posso ou não explicar o meu voto.

Ouço um digno par que se senta junto de mim dizer-me que posso, e portanto segundo o parecer de pessoa tão auctorisada vou continuar.

Sr. presidente, nasci no Porto, e tenho por aquella cidade um certo amor filial, que tem todo o homem pela terra que o viu nascer. Terei tambem a franqueza de dizer que me ufano de ser natural d'essa gloriosa cidade, que tem prestado a este paiz, nas circumstancias mais criticas da sua existencia, serviços de valor e dedicação, a que serão sempre gratas as gerações vindouras. E o Porto continua merecendo a nossa estima e respeito, não só pela, parte importante que toma no desenvolvimento nacional, mas, pelo seu amor ao trabalho, pela sua actividade energica, pela confiança nas proprias forças, e pelo exemplo que de tudo isto dá ao paiz, exemplo que contrasta favoravelmente com a indolencia e ociosidade que se observam por toda a parte.

E por isso que não podia deixar de declarar que foi com sentimento que ouvi as expressões de menosprezo que aqui lhe foram dirigidas, ás quaes eu me não associo, e que julgo são injustissimas. O Porto não as merece, e, pelo menos é digno do nosso respeito.

Apesar de tudo isto votei contra o subsidio concedido á empreza do palacio de crystal, e fiz isto por duas rasões. A primeira é que não posso deixar de considerar aquella empreza como particular, e por consequencia não póde participar das attenções, que nos merece a segunda cidade do reino. É uma empreza que teve uma idéa arrojada, commetteu uma obra grandiosa, cuja opportunidade e conveniencia não tratarei agora de apreciar. Teve essa empreza um exito infeliz. É, porém, necessario assentar de uma vez para sempre que as emprezas particulares não têem direito a exigir que o estado tome sobre si os encargos resultantes da sua imprevidencia, dos calculos errados ou das eventualidades a que estão sujeitas as emprezas de qualquer ordem que sejam. Quando lucram vem ellas partilhar com o estado os seus interesses? Que principio é este que só considera o estado para o obrigar a indemnisar os males resultantes das casualidades, a que estão sujeitas todas as cousas humanas? (Apoiados.)

A segunda rasão por que votei contra o subsidio é a seguinte. Vale pouco o meu voto e muito menos a minha palavra; mas desde o momento em que tomei assento n'esta camara fiz, em face da minha consciencia, o solemne compromisso de não votar despeza alguma que não tenha uma das seguintes condições: que seja reclamada por uma necessidade imperiosa, ou cuja utilidade sensivel e apreciavel compense palpavel e visivelmente os encargos que ella importa.

Esta regra me foi imposta pelo estado deploravel da fazenda publica; e todas as minhas debeis forças empenharei para obstar áquella desastrosa ruina, que na ultima sessão, aqui nos foi prophetisada por um digno par.

É necessario que nos convençamos de uma cousa, sr. presidente. É que não ha despeza, que não tenha o seu lado util e defensavel. Por isso o sr. Fould, n'aquelle celebre relatorio que serviu de base á reorganisação do systema financeiro em França, insistia na necessidade de resistir á attracção das despezas uteis.

É que não ha nenhuma que não tenha o seu lado plausivel. Quando uma despeza não corresponde a uma necessidade real, nada mais facil do que justifica-la por uma d'estas necessidades facticias de invenção do nosso espirito...

O sr. Presidente: — O digno par ha-de-me permitir que lhe diga que está fóra da ordem.

O Orador: — Sei que v. ex.ª é severo mantenedor do regimento. Como disse a v. ex.ª não tenho conhecimento profundo d'elle, mas tenho observado que muitos dignos pares antes da ordem do dia costumam explicar o seu voto. Se porém v. ex.ª entende que não devo continuar não continuarei.

O sr. Presidente: — Eu não quero tirar a palavra ao digno par, mas julgo dever dizer-lhe que me parece que está fóra da ordem.

O Orador: — V. ex.ª entende que estou fóra da ordem. Eu estou convencido do contrario. Entretanto não querendo contrariar as ordens de v. ex.ª, não direi mais nada e sento-me.

O sr. Margiochi: — Pedi a palavra para mandar para a mesa quatro pareceres da commissão de fazenda (leu).

O sr. Presidente: — Mandam-se imprimir.

O sr. Ministro do Reino (Mártens Ferrão): — Sr. presidente, sem pretender alterar e estorvar a ordem dos trabalhos da camara, eu pedia a bem do serviço que se discutisse hoje o projecto da desamortisação, que o governo reputa de grande interesse, e que eu desejava que fosse ainda discutido n'esta sessão. Ora restando-nos poucos dias, eu desejaria que v. ex.ª consultasse a camara sobre o pedido que acabo de fazer.

A camara resolveu affirmativamente.