DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 879
jasse um pouco pelas nossas provincias, e examinasse a constituição da familia, veria que, nas classes laboriosas, marido, mulher e filhos desempenham durante todo o anno um trabalho improbo e duro para agricultar a terra, que o muito que lhes produz são cinco e seis sementes, e que mal chega para o seu sustento, e quando elles obtêem esse rendimento collectavel, é á custa de serviços violentos e de economias reiteradas, limitando-se a, um sustento muito parco, e pouco alimenticio. Basta dizer-se que estes contribuintes de 50$000 réis não comem carne senão nos dias de festa. O sr. ministro da fazenda, está muito enganado emquanto á industria agricola em Portugal.
Sr. presidente, eu vou analysar este imposto, nas diversas classes em que os rendimentos estão divididos.
Tratarei primeiramente da classe A. Este imposto que tem sido discutido n'esta e na outra casa do parlamento, onde se tem mostrado até á evidencia que o governo pretende faltar á fé dos contratos, lançando imposto sobre os titulos da divida interna, pela fórma que o fez, é um imposto que na actualidade revela o pouco tacto politico do governo propondo-o ao parlamento na vespera de fazer um emprestimo.
Não me repugna o imposto sobre os titulos de divida publica, mas o que me repugna é o imposto pela fórma que é lançado e a occasião.
Sr. presidente, sendo principio geral, e inquestionavel, que cada um deve pagar segundo os seus teres e haveres, claro está, que os titulos de divida publica não devem ser isentos n'uma situação normal, quando não haja divida fluctuante, quando não haja deficit, e não seja necessario recorrer ao credito.
Sr. presidente, a rasão, por que agora eu voto contra este imposto, é porque acho da parte do governo um passo arriscadissimo ir lançar um imposto sobre os titulos de divida publica, quando está nas vesperas de contrahir um novo emprestimo.
E porque não propoz o governo n'este imposto sobre-as inscripções tambem o minimo dos 150$000 réis? Pois um creado que faz algumas economias não poderá comprar uma, duas ou tres inscripções de 100$000 réis? Isto parece ser fóra de duvida.
Eu entendo que todos que têem qualquer rendimento devem pagar, mas o que primeiro, era indispensavel para se poder lançar este imposto, era termos o orçamento equilibrado; emquanto tivermos um deficit de 7.000:000$000 réis, emquanto tivermos uma divida fluctuante de 16.000:000$000 réis; emquanto tivermos encargos tão pesados; entendo, repito, que o governo dá um mau passo, um passo errado, em tributar os titulos de divida publica, porque, embora produza alguma cousa o imposto lançado sobre os possuidores d'esses titulos, esse producto será insignificante em virtude das más condições e desvantagens em que for emittido o emprestimo.
N'estas circumstancias a nação é que ha de pagar o imposto.
Sr. presidente, parece estar cego o sr. ministro, não vendo que, desacreditados os titulos que vae emittir fatalmente hão de perder de valor.
Quer v. exa. ver e a camara a situação, em que se acha o governo para emittir o presente emprestimo, e a occasião em que elle pretende tributar os titulos de divida interna?
Enumerarei para esse fim os emprestimos que foram feitos desde 1867 a 1877.
1.° em 1867 no valor de............ 24.750:000$000
2.° em 1869 no valor de............ 54.000:000$000
3.° em 1873 no valor de............ 38.000:000$000
4.° em 1879 no valor de........... 30.000:000$000
Total........ 146.750:000$000
Se juntarmos a estes emprestimos o feito o anno passado, o que se pretende fazer este anno de 15.500:000$000 réis, o de 3.000:000$000 réis para o caminho de ferro da Beira Alta, o que tem de se fazer para o ultramar, e outras, despezas já votadas, teremos cerca de réis 200.000:000$000.
Pois é n'esta occasião, tendo-se recorrido, e continuado á recorrer ao, credito, em tão grande escala, que o governo propõe tributar os titulos de divida, interna!
O argumento de que o emprestimo é feito no estrangeiro, e que os titulos de divida externa estão, isentos do imposto, não tem força. É verdade que o estão agora, mas pela mesma fórma que se não teve contemplação, com os titulos de divida interna, no futuro não se terá tambem com os da divida externa.
Pois quem poderá acreditar nas affirmações dos srs. ministros, quando as declarações feitas nas proprias inscripções não tem valor.
É pois, sr. presidente, quando o governo deseja fazer um emprestimo, importante que vem tributar os titulos de divida publica?! Isto é um erro politico indesculpavel, que não tem precedentes, e que ha de custar, muito caro á nação.
Parece-me que a aprendizagem do sr. ministro da fazenda não sairá muito barata ao paiz.
Passando á classe B, á classe dos empregados publicos, affirmarei que este imposto tem o grande defeito de ser um contrasenso, pois se o governo julga que os empregados publicos estão mal remunerados, a ponto de ser necessario dar-lhes gratificações contra lei, como é que o governo tributa esta classe? Em nome de que idéas e de que principios lança uma contribuição sobre uma classe, que julga mal remunerada e que arbitrariamente e contra lei se está favorecendo por meio de gratificações?
Dar-lhe por, uma parte, sem lei que justifique, esses abonos, é tirar-lhe por outra, indiscretamente eis o systema do governo! Em bom portuguez isto quer dizer, que o governo está illudindo o paiz, é lançando poeira aos olhos do publico.
Este imposto sobre os empregados publicos não ascende a 120:000$000 réis. Pois, mais do que isto está o governo dando em gratificações e ajudas de custo. Basta ler á nota das gratificações, dadas contra lei, que vem publicadas no Diario, para se fazer uma idéa do que assevero.
Pelo ministerio da fazenda dão-se perto de 80:000$000 réis. Note a camara que no Diario ainda não vem publicadas todas as gratificações e ajudas de custo dadas pelo ministerio da fazenda, ao pessoal das alfandegas do serviço externo, ainda não foram enviadas a esta camara, nem publicadas.
Nas obras, publicas o systema continua o mesmo ou peior ainda, como eu já demonstrei.
Como é, pois, que o governo, entendendo que os empregados publicos não podem manter-se com os ordenados que têem, apresenta um artigo no projecto em que os sujeita ao novo imposto?
O governo, por mais que faça, não póde justificar de maneira alguma o seu procedimento. A incoherencia é palpitante, e incontestavel a contradicção.
Quanto ao imposto da classe C sobre a propriedade, considero-o iniquo, desigual e injusto.
O proprio sr. ministro confessou que as matrizes não representavam a expressão da verdade, que havia desigualdades flagrantes de districto para districto, de concelho para concelho, de parochia para parochia.
Sendo assim, lançar um imposto adoptando por base essas matrizes que estão ainda por corrigir, não me parece nem regular, nem acceitavel, nem racional. Isto prova que o sr. ministro da fazenda não leu o Annuario estatistico do sr. Pedro de Carvalho, nem consultou como devia o seu auctor, empregado competentissimo, pelo que sabe e pela posição que occupa.
Se tivesse lido aquelle interessante livro, reconheceria