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• lar e mais simples começar pelo orçamento da despeza e peço por isso a v. ex.a que ponha primeiro á discussão, o projecto n.* 70.

O sr. Presidente: — A camará ouviu a proposta do sr. ministro da fazenda: os dignos pares que a approvam tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

Abriu-se portanto a discussão sobre o projecto n.° 70. O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, não é possivel tratar tão largamente, como desejaria trata-la, e como tenciono faze-lo n'outra occasião, a parte do orçamento que diz respeito á questão da reforma das cadeias. Vem aqui uma verba de 30:293^200 réis; esta é a que votámos para a policia das cadeias e sustento dos presos. A este respeito queria eu dizer ao sr. ministro da justiça, que conhece perfeitamente os progressos que tem feito o systema penitenciário, e não pôde por isso deixar de conhecer a necessidade de augmentar esta verba, e tratar franca e rasgadamente da reforma,das cadeias. Já por outra occasião aqui n'esta tribuna me comprometti a tratar d'cste assumpto; mas quando tivermos tempo, pois seria pouco prudente, seria uma verdadeira estultícia, attendendo ao adiantamento da sessão e ao cançasso dos espiritos, o virmos hoje inaugurar uma discussão tão digna de ser tratada amplamente e com todos os necessários desenvolvimentos. S. ex.a sabe perfeitamente que se têem reunido congressos em Bruxel-las, em Francfort e em outros paizes civilisados da Europa, para se tratar d'esta importante questão, d'este negocio tão momentoso. As capacidades mais notáveis têem dirigido as suas vistas para esta questão, a fim de introduzirem na reforma das cadeias os melhoramentos que demandam as luzes do século, e sobre tudo os principios da moral em que se fundam todas as verdadeiras reformas, e especialmente estadas cadeias; e finalmente tudo o que a boa rasão e a boa politica aconselham n'um assumpto de tão grave importância até nas suas relações com a sociedade, objecto que todo o homem d'estado, todo o homem que ama verdadeiramente o progresso moral e material, não deve nunca afastar de seu espirito, para conseguir que se realiscm ambos os progressos, e se coadunem perfeitamente um com o outro, como succederá Bempre que se não desvairem nem nos principios, nem nos fins, as pessoas que têem a seu cargo levar a effeito essa reforma.

Sr. presidente, ha uma rasão, alem de outras que me obrigou a tomar a palavra, para em curto summario fazer algumas observações. Eu tenho a honra de pertencer a uma commissão que foi nomeada para propor ao governo a reforma das cadeias. Foi o meu amigo o sr. Antonio José d'Avila quem referendou o decreto para a nomeação d'esta commissão, quando s. ex.a era ministro da justiça. Esta commissão não tem adiantado os seus trabalhos de modo tal, que possa habilitar o governo a aproveitar os esclarecimentos que lhe prestassem os membros da commissão, e o motivo da demora, é o haver uma outra commissão que foi encarregada da reforma do código penal, e Ber preciso que estas duas reformas marchem a par.

Aqui vejo eu n'esta casa sentado nos bancos superiores, um illustre cavalheiro, o meu nobre amigo, o sr. Mello e Carvalho: s. ex.a é um jurisconsulto de primeira ordem e faz parte d'essa commissão; um outro illustre cavalheiro que se não senta n'esta casa, mas que é uma das illustra-ções do nosso paiz, o sr. doutor Levy Maria Jordão, também é membro d'ella, e outro cavalheiro a quem eu muito respeito. Estou certo, e sei que os trabalhos d'essa commissão já vão muito adiantados, e confio, assim como confiava já antes de saber qual era a ordem que segue em seus trabalhos, confiava na illustração de ss. ex.as que esses trabalhos poderiam habilitar o governo, prestando um grande serviço ao paiz. A commissão de qu e eu faço parte, entendeu que devia esperar, depois de uma sessão em que se discutiram pontos importantes, nos quaes eu tomei parte, como bem pôde dize-lo o sr. Sequeira Pinto, a commissão entendeu, repito, que devia esperar que aquella que tinha sido encarregada pelo governo, da reforma do código penal adiantasse os seus trabalhos. Eu sei que já alguns d'elles foram apresentados ao governo, e sei que fazem honra aos illustres jurisconsultos que foram encarregados de os apresentar (apoiados).

Eu quero esperar que ss. ex.as os srs. ministros estejam para novembro n'estas cadeiras, que o sr. Avila, o sr. Carlos Bento e o sr. Moraes Carvalho continuem a fazer parte do ministério, pois me parece se acham em luta e vacillan-tes. (O sr. Ministro da Justiça: — Peço a palavra.)

Peço pois ao sr. ministro, e espero que s. ex.a attenda a esta minha pretensão, que para a sessão seguinte faça da sua parte quanto poder, e pôde muito, para que um projecto d'esta ordem seja discutido: porque o governo pôde faze-lo perfeitamente, pois sempre tem poder para isso todo ó governo que possue maiorias tão grandes como tem o governo. Peço-lhe que faça discutir as suas propostas tendentes ao fim que levo dito, que as faça passar com aquelles melhoramentos que a discussão dictar, e que os hom ens públicos aceitam sempre, quaes são os melhoramentos di-ctados pela experiência e pela boa rasão, e que são o resultado do profundo estudo e conhecimento das cousas. Espero pois que o sr. ministro tome nota d'este meu pedido, e que não terei de lhe fazer censura alguma para a sessão seguinte. Aguardo essa occasião, e estimarei bastante te-la para tratar com o sr. ministro da justiça e discutir com s. ex.1, porque gosto de o fazer com homens que discutem as questões no campo dos principios, como s. ex.a costuma fazer. Embora eu discorde de s. ex.a em muitos pontos importantes, não posso deixar de dizer que o sr. ministro trata estes negócios com dignidade e delicadeza.

O sr. Ministro da Justiça (Moraes Carvalho): — A verba que vem no orçamento, e á qual o digno par se referiu, é

unicamente applicada ao sustento dos presos e á policia das cadeias; e mesmo o digno par vê perfeitamente, que militada como é, não podia abranger a reforma das cadeias. Eu concordo perfeitamente com s. ex.a, em que é necessário tratar d'este objecto quanto antes, porque é d'aquelles que mais devem concorrer para a moralidade; mas também devo dizer que este objecto não tem sido descurado pelo governo, pelo contrario, depois que entrei no ministério tratei logo de apresentar um projecto á camará dos srs. deputados, para se estabelecer uma prisão pelo systema celular, e posso dizer ao digno par que pela commissão encarregada de reformar e confeccionar o código penal, já foi apresentada a primeira parte d'esses trabalhos, os quaes na verdade são dignos das illustrações que compõem aquella commissão. Esta commissão adoptou o principio celular como devendo ser a base do nosso systema penitenciário. Como já disse, eu apresentei um projecto, mas não em toda a extensão, para a definitiva reforma das cadeias, porque entendi que era de absoluta necessidade dar principio, posto que ainda por muitos annos nos acharíamos na necessidade de nos servir das cadeias que ora temos. Portanto é indispensável que este mesmo systema, que tem sido tão applaudido pelos congressos de Francfort e Bruxellas, a que o digno par se referiu, se comece a estabelecer entre nós, e se faça quanto antes uma prisão celular que possa servir de norma e de exemplo para todas as outras que se deverem estabelecer.

Escuso de fazer elogios á commissão a que o digno par se referiu; os seus membros são bem conhecidos para merecerem a attenção e respeito de todos, mas devo dizer que o trabalho completo do systema penitenciário cellular depende muito d'esse trabalho apresentado pela illustre commissão ; e depois o governo não ha de despresar as luzes da commissão nomeada pelo meu collega o sr. Avila, quando foi ministro da justiça.

O sr. Mello e Carvalho:—Sr. presidente, começo por agradecer mui cordealmente as expressões benévolas que me dirigiu o digno par o sr. marquez de Vallada, cuja amisade devidamente aprecio; essas expressões porém, permitia-se-me que o diga, na parte que me respeitam, são mais devidas á urbanidade de s. ex.a do que a mérito meu; mas foram bem cabidas, são merecidos e devidos os louvores dados ao sr. dr. Levy Maria Jordão pela sua erudição, zelo, assiduidade que tem desenvolvido n'este importante trabalho da revisão, ou antes confecção do novo código penal portuguez, e bem assim ao sr. José Antonio Ferreira Lima, distincto magistrado e benemérito juiz da relação de Lisboa.

Tendo pronunciado estes dois nomes tão justamente acolhidos, permitta-se me, para que não falte ao reconhecimento de animo agradecido, que faça menção de outros, que tão sabia como efficazmente tem procurado auxiliar com suas luzes, interesse pela sciencia e aperfeiçoamento de penalogia a commissão. Refiro pois os nomes bem conhecidos pelos seus trabalhos scienficos dos srs. A. Bonne-ville de Marsangg, conselheiro da relação imperial de Paris, condecorado com varias ordens honorificas por diversos monarchas estrangeiros em reconhecimento do seu eminente merecimento; Mittermaier, conselheiro privado do gran-duque de Baden, professor na universidade de Hei-delberg; Ortolan, professor na faculdade de direito de Paris; Molinier, na de Toulouse; Hans, professor na universidade de Gand e membro da commissão de revisão do código penal da Bélgica; Eduardo Calmelo, advogado na re-j lação de Paris; Bassolini, professor na faculdade de direito | de Modena; Carlos Levita, professor na universidade de Giessen; Hermann Schletter, professor na de Leipzig. Todos estes distinctos jurisconsultos têem visto, examinado e apreciado a parte geral e philosophica do código penal portuguez e feito suas observações, de que a commissão dará conta opportunamente.

Devo aqui declarar que aos trabalhos, dedicação e decidido amor pela sciencia do sr. Bonneville de Marsangg se deve em grande parte o conhecimento d'este trabalho da commissão. Este distincto jurisconsulto e que justamente pôde ser contado entre os primeiros criminalistas, deu-se ao trabalho de estudar a lingua portugueza, e traduziu para francez os dois relatórios da commissão e os annotou, Ambos correm impresos na Revista critica de legislação e de jurisprudência, tom. 17, pag. 56, 119 e 500, e tom. 18, pag. 123.

Na Allemanha com as suas observações tem também feito conhecer este mesmo trabalho o nunca assas louvado profundo jurisconsulto, o sr. Mittermaier, que tem uma parte tão importante nos códigos criminaes de Allemanha. O sr. Levita dedicou-se igualmente ao estudo da lingua portugueza para melhor comprehender no original as prescripções legislativas e os seus motivos, tanto pôde o amor das sciencias, e o desejo de ser prestavel ao verdadeiro progresso moral e intellectual, e á causa da humanidade.

Sinto grande satisfação em pronunciar os nomes de todos estes eminentes caracteres, e tanto mais pronuncian-do-os na camará dos dignos pares do reino, que sabe apreciar o merecimento e prestar respeito a quem o merece: é também um sincero testemunho de gratidão pelo valioso auxilio que tem dado á commissão e a tão importante assumpto. A influencia de um código penal sobre a moral, sobre os costumes, sobre a segurança, sobre a ordem publica, sobre a propriedade, a industria, finalmente sobre a prosperidade geral, é tão profunda como para assim dizer incalculável. Espero ter occasião em ,que possa desenvolver mais detidamente este meu pensamento.

Em quanto ao systema de prisões, cuja reforma é uma das nossas primeiras necessidades, considero-o não só complexo, como com diversas relações, devendo attender-se a cada uma d'ellas, sem o que as melhores disposições de

um código penal, por melhor elaborado que seja serão improfícuas, principalmente quando as penas na sua máxima parte se reduzem a prisão, e a melhorar o condemnado. O systema cellular adoptado pela commissão, assim como a creação de colónias agrícolas tem merecido dos homens doutos e mais competentes, elogios, que também não approvam o systema mixto. A commissão nos seus relatórios pjocura justificar esta sua preferencia, no que está accorde também o muito digno e illustrado ministro da justiça. Este objecto, sendo como é da mais subida importância não pôde ser tratado por accidente; quando venha a ser impugnado, o que não é de esperar, terá o seu desenvol-mento não só pela sua natureza, como pelas doutrinas de escriptores que mais detidamente se tem oceupado d'esta matéria.

A commissão propõe o complexo de todas estas medidas, porque não podia deixar de o fazer, e espera apresentar 03 seus trabalhos até outubro ou novembro, e talvez já os teria apresentado se não fossem as grandes demoras que tem havido na imprensa; mas com isto não pretendo fazer censuras a ninguém.

O sr. conselheiro administrador geral da imprensa nacional tem-se prestado da melhor vontade, mas a affiuencia de trabalhos quando o parlamento está aberto e muitos outros negócios tem feito talvez com que não tenha podido dar o desejado andamento e expediente, não obstante as minhas reiteradas recommendàções; devendo porém declarar que não tem havido regularidade da parte da mesma imprensa em se me remetter as segundas provas, o que digo com sentimento pelo cuidado que tomo, e que é devido em tão grande assumpto. E de esperar porém que agora affluindo á imprensa menos trabalhos, o expediente seja mais prompto e regular, pelo menos assim o espero e confio do digno conselheiro administrador geral d'aquelle estabelecimento, attendendo mesmo que fará um bom serviço ao paiz no zelo que empregar a este respeito, e é n'este presupposto que digo que a commissão apresentará estes seus tão difficeis como importantíssimos trabalhos no tempo indicado, sem tomar sobre mim a responsabilidade por actos que ine sejam estranhos.

É preciso também dizer, que a commissão nomeada para a revisão do código penal encontrou se em circumstancias de apuro; limitou-se a uma simples revisão, teria sim muito menos trabalho, mas deixaria defficiente e incompleto o systema tal qual está e não satisfaria as idéas do século, as prescripções da sciencia e ás necessidades da sociedade; emprehendeu portanto um trabalho completamente novo debaixo de um outro systema e direcção de idéas, como a camará terá occasião de vêr.

Espero e confio que os tachygraphos tomariam principalmente nota das expressões que proferi com relação aos illustres caracteres estrangeiros que nos têem auxiliado para que se saiba que a camará dos dignos pares sabe fazer-lhes justiça, e que tem por elles a devida veneração.

O sr. Marquez de Vallada: — Apenas farei pequenas observações sobre o que disse o sr. ministro da justiça e o digno par o sr. Mello e Carvalho.

Sr. presidente, eu felicito-me de ter provocado esta discussão, que produziu a promessa que acaba de fazer o digno par, promessa que sendo feita no parlamento tem um muito maior valor do que áquellas que se fazem em particular, e que por isso com dobrada rasão espero ver cumprida. Parece-me ter ouvido dizer ao sr. ministro da justiça, que espera apresentar na próxima sessão, ao corpo legislativo um trabalho que tem por base o systema cellular. Eu estimava, sr. presidente, que se inaugurasse uma discussão franca e larga sobre este importantíssimo assumpto, desejava mesmo que a imprensa o tomasse em toda a consideração, e emittisse a sua opinião, e desenvolvesse, desejo que a tal respeito sejam todos ouvidos, e na ultima estação desejo que nas camaras a matéria se trate largamente e com toda a madureza de que o objecto é credor. Eu não desejo que se apresente um projecto d'estes para se discutir em uma ou duas sessões, e á pressa; não, senhores, quero que se estabeleça essa qualidade de prisões como ha n'outros paizes, mas quero também que se discuta o melhor systema a adoptar, porque ha auctores que votam pelo systema cellular puro, ^outros querem-n'o modificado, outros preferem o mixto. É portanto para se investigar qual dos methodos convirá mais ao fim que se tem em vista, que eu quero uma discussão e larga. A propósito d'isto lembrarei que pedi ao governo remetesse aqui uma estatistica criminal, que me é muito precisa para me servir na argumentação que em occasião opportuna hei de fazer, e para servir igualmente de base ao que terei de propor; e com quanto os srs. ministros saibam, e todos nós, quanto é perigosa e quasi sempre fundada em dados inexactos a confecção de uma estatistica, comtudo ellas sempre ministram algumas bases que podem ter sua utilidade, e por isso peço ao governo que logo que esteja feita a que eu pedi, haja de a mandar a esta camará.

O digno par o sr. Mello e Carvalho, tocou de passagem nas colónias agrícolas, estabelecimentos reconhecidamente úteis, e sobre esta matéria espero também que o governo, na seguinte sessão apresentara algum trabalho, porque tenho a convicção de que nas nossas colónias, ricas como são, podemos não só melhorar o individuo, mas também o território, do qual uma mui grande parte está inculta. Limi-to-me por agora a estas ligeiras observações, e em occasião opportuna melhor as desenvolverei.

O sr. Barão de Villa Nova de Foscoa: — Como se trata de um objecto importante, foi por isso que eu pedi a palavra para dar um esclarecimento á camará, que poderá aproveitar á commissão se o julgar conveniente. Ha vinte e tantos annos que o sr. José Antonio Guerreiro, sendo ministro das justiças, nomeou uma commissão, á qual encarre-