894 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
palavras sem deducção alguma, que se encontram no artigo 1.° do decreto, e que abrangem claramente não só aquelle sacrificio, senão tambem toda e qualquer futura deducção.
Todos os titulos emittidos desde; a promulgação do decreto de 1852 o foram com a solomne promessa de Isenção de todo o imposto.
N’isto não póde haver duvida; e se a houvesse, removia-a para logo o luminoso relatorio que precedeu o decreto.
Peço licença para ler á camara alguns trechos cresse importante documento:
«É necessario, diz elle, fixar de uma vez para sempre uma taxa de juro uniforme, unica, para a divida interna e externa... que não seja uma promessa fallaz.»
Promessa fallaz seria a de um juro de 3 por cento que não viesse a ser pago integralmente.
«Que se deve, continua, fazer uma grande conversão, pela qual se reduza ao juro de 3 por cento definitivos, sem deducção alguma, toda a divida consolidada.»
É evidente a referencia tanto á divida existente, como á futura.
«Por este decreto, prosegue, habilita-se o governo r, cumprir religiosamente as obrigações do thesouro, desapparecem as deducções, que são como o sêllo de depreciação imposto nos proprios titulos.»
«Mandando emittir novos titulos por toda a divida consolidada interna e externa, com 3 por cento de juro, sem deducção alguma, pareceu ao governo...»
É inutil continuar esta leitura. O pensamento do decreto de 1852 é evidente, e até hoje ninguem o havia posto em duvida.
A clausula sem deducção alguma refere-se tanto aos titulos que já estavam emittidos como aos que haviam de emittir-se; nunca ninguem entendeu este decreto por outro modo.
Depois de ter sustentado que antes da promulgação da lei de 10 de maio de 1879 não havia disposição legislativa que isentasse de impostos as inscripções, quando é corto que o decreto de 18 de dezembro de 1852 tem força legislativa, acrescentou o meu amigo, o sr. Barros e Sá, em abono da sua opinião, que se existisse essa isenção era escusada a referida lei.
Está na memoria de todos o facto que deu origem á lei que o anno passado aqui votámos por unanimidade. Não se tratava de isentar de deducções os titulos de divida publica, porque estavam isentos d’ellas, mas de obstar a que as camaras municipaes os tributassem. Não foi outro o fim da lei.
Mas essa lei, ou qualquer outra, observa s. exa., póde ser revogada pelo corpo legislativo. Assim é, mas os contratos celebrados á sombra de qualquer lei, e na conformidade d’ella, é que não o podem ser.
Procurando dar ás palavras do decreto do 1852, sem deducção alguma, um sentido favoravel á sua argumentação, adverte o digno par, que importo e deducção não são synonimos, e que, portanto, a isenção de deducções não envolve a isenção de impostos, como aquelle de que se trata.
Não é novo este argumento, que já foi apresentado quando ha um anno se levantou a questão da camara de Coimbra.
Mas se n’essa especie tinha plausibilidade, porque as camaras, tributando os titulos de divida publica, realmente não faziam deducções, não procede na hypothese presente em que o imposto é deducção, e assim tem de ser cobrado na conformidade do artigo 25.° do projecto.
Essa questão, como é sabido, á que deu logar á lei interpretativa do artigo do codigo administrativo, era que as camaras se fundavam para sustentar o seu direito de tributar os titulos de divida publica.
Continuou s. exa., dizendo que se não devem confundir os contratos de direito civil com aquelles que são puramente administrativos.
A que vem esta reflexão? São porventura, os primeiros maio sagrados que os segundos?
O vinculo obrigatorio é o mofino em todos.
Não se confundem na fórma, que é onde fazem differença, mas na essencia são o mesmo, quer se regulem pelo direito civil, quer pelas leis e preceitos administrativos. E na fórma que divergem e ainda nas consequencias da sua inexecução.
Nos contratos em que o estado outorga como pessoa juridica, as duvidas que se levantam são da alçada dos tribunaes civis.
As que resultam dos outros em que o estado e outorgante, como poder publico, como gerente do patrimonio nacional, resolvem-se nos tribunaes administrativos, ou, em casos determinados, no juizo arbitrai, como acontece com os contratos de obras publicas.
Mas, perguntarei eu a s. exa.: se ao governo não e licito faltar aos contratos de direito civil, ser-lhe-ha acaso permittido faltar aos que celebra como gerente dos negocios publicos?
É demais, em que qualidade contrata o governo emprestimos?
Precisamente na mesma em que contrata obras publicas.
Em que divergem quanto á força obrigatoria os contratos de emprestimos dos de caminhos de ferro?
Pois o governo, que não se póde afastar das condições que acceitou nos contratos de caminhos de ferro, póde deixar de cumprir as dos contratos de emprestimos ou de quaesquer outros contratos em que da mesma fórma se obrigou?
Se póde faltar a uns, quem lhe tolhe a faculdade de faltar aos outros?
Nos contratos de caminhos da ferro de 4 de janeiro de 1860, artigo 34.°; de 11 de junho de 1864, artigo 11.°; e do 14 de setembro de 1809, artigo 39.°, estipulou se a isenção de impostos geraes e municipaes em favor das companhias.
Porque se ha de manter esta isenção e postergar a que se estabeleceu nos emprestimos contratados á sombra de iguaes principios?
Sr. presidente, por mais que eu busque a differença entre contratos de caminhos de ferro e de emprestimos, ou enfim entre estes e outros quaesquer contratos feitos pelos administradores da fazenda publica, declaro a v. exa. que me não é possivel encontral-a. Todos elles são regidos pelos mesmos principios.
Com o mesmo direito com que o estado póde faltar a uns póde violar os outros, mas esse supposto direito tem o nome que lhe deu um distincto estadista brazileiro, e que já foi repetido n’esta camara por um dos seus mais eloquentes e illustrados oradores.
É escusado repetil-o.
Argumenta-se em abono do projecto com o artigo 145.° da carta constitucional, que no § 14.° diz, que «ninguem será isento de contribuir para as despezas do estado em proporção dos seus haveres.»
O digno par e meu amigo repetiu estas palavras sublinhanso-as com toda a energia da sua voz. Ninguem póde ser isento, bradava s. exa.! Mas contra esta affirmativa do digno par estão protestando os contratos de caminhos de ferro, a que ha pouco me referi.
Como e que se fizeram estes contratos com expressa isenção de impostos, se ninguem póde ser isento de contribuir para as despezas do estado?... É claro que esta isenção tem um motivo que a justifica, como succede com as inscripções.
Se estes titulos têem sido até hoje exceptuados de impostos é por que representam um contrato celebrado com o estado, e tanto importava ao thesouro receber mais no acto