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CORTES

CAMARA DOS DIGNOS PARES

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. CONDE DE CASTRO

VICE PRESIDENTE

Conde de Mello

Secretarios, os dignos pares

Conde de Mello

Mello e Carvalho

As tres horas da tarde, sendo presentes 41 dignos pares declarou o sr. presidente aberta a sessão.

Lida a acta da antecedente julgou-se approvada na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Deu-se conta da seguinte correspondencia:

Dois officios do presidente da camara dos senhores deputados enviando as seguintes proposições de lei:

-Sobre ser o governo auctorisado a organisar o ministerio das obras publicas, commercio e industria.—As commissões de obras publicas e fazenda.

-Sobre a aposentação do primeiro redactor na repartição tachygraphica d'aquella camara, João Baptista Gastão. —A commissão de fazenda.

Um officio do ministerio da marinha enviando os autographos dos decretos das côrtes geraes; supprimindo o logar de comprador junto ao conselho de administração da marinha; e fazendo subsistir a favor do segundo tenente da armada, Antonio Francisco Ribeiro Guimarães, as disposições do decreto de 4 de maio de 1847.—Foram para o archivo.

Outro officio do presidente da camara dos senhores deputados communicando que foram ali approvadas as alterações feitas na proposição sobre a conservação dos celleiros communs, monte pios agricolas ou montes de piedade. —Para a secretaria.

Um officio do ministerio do reino enviando o decreto authographo pelo qual Sua Magestade El-Rei, houve por bem prorogar as côrtes geraes até ao dia 18 do corrente mez de junho.

O sr. Secretario (Conde de Mello): — Peço licença á camara para apresentar uma representação que me foi entregue, na qual certos empregados da junta do credito publico, pedem lhes seja applicada a gratificação de que trata o parecer n.º 400.

A representação diz o seguinte (leu).

Requeiro que esta representação vá á commissão de fazenda.

O sr. S. J. de Carvalho: —........................

O sr. Presidente: — Perdoe V. ex.ª que eu o interrompa para lhe dizer, que a representação fica sobre a mesa, e quando se tratar da discussão do parecer n.º 400 será então tomada em consideração.

O sr. S. J. de Carvalho: — Muito bem.

O sr. Marquez de Niza: — Enviou para a mesa a seguinte nota de interpellação:

«Rogo que pela mesa seja convidado o sr. ministro das obras publicas, para ouvir uma interpellação que tenciono dirigir-lhe sobre a liberdade dos cereaes, e proposta de lei que a regula. = Marquez de Niza.»

O sr. Conde d'Avila: — Mando para a mesa uma representação de alguns empregados do arsenal do exercito contra uma parte da proposta do sr. ministro da guerra apresentada na outra camara, que não lhes é favoravel, e como este projecto foi ás commissões de fazenda e "guerra, peço a V. ex.ª que esta representação seja tambem mandada ás duas commissões que se estão occupando do projecto do sr. ministro da guerra.

Sr. presidente, os requerentes queixam-se de ter sido eliminada na outra camara uma disposição no projecto do sr. ministro, em que elles eram contemplados, e pedem que esta disposição seja inserida de novo n'aquella reforma: esta representação deve ser portanto presente aquellas duas commissões para a tomarem na devida consideração.

O sr. Presidente: — Passamos á ordem do dia, que é a discussão do parecer sobre o orçamento...

O sr. S. J. de Carvalho: —......................

O sr. Presidente: — O parecer da receita e despeza do estado é o que foi dado para. ordem do dia em primeiro logar; mas como o sr. ministro da fazenda não está presente, não ha a menor duvida em se continuar na discussão do parecer n.º 400.

O sr. S. J. de Carvalho: —......................

O sr. Marquez de Niza: —.......................

O sr. Presidente: — Então o digno par Sebastião José de Carvalho quer a palavra sobre o parecer n.º 400?

O sr. S. J. de Carvalho: —.......................

O sr. Vellez Caldeira: — Sr. presidente, eu já disse outro dia n'esta camara, que sinto que as circumstancias do nosso paiz fossem taes que não se podesse dar pensões, gratificações e augmento de ordenado a todos que o pedem; mas, sr. presidente, o thesouro não está n'essas circumstancias. Os ordenados foram calculados segundo o serviço de cada uma das repartições do estado, têem estado calados até agora, e quando se lhes faz o beneficio de se lhes tirar uma decima é que vêem pedir este augmento!? (Apoiados.) Peço á camara que considere isto, e que considere ainda mais a que ponto isto nos leva; até agora eram os chefes das repartições do thesouro, agora já são os do tribunal de contas, e ainda hoje veiu aqui uma representação dos empregados da junta do credito publico, e d'aqui a pouco virão as de outros que têem iguaes direitos, porque todos os empregados publicos têem direito a pedir que se lhes augmentem os seus vencimentos. Eu já vi na commissão de legislação um projecto de lei que tambem tem este augmento, e é relativo aos chefes de repartições do ministerio da justiça.

N'esse projecto alega-se que as circumstancias dos empregados d'aquella repartição são iguaes aos das outras secretarias; faz differença isto, porque se se concede aos empregados das outras secretarias d'estado deve conceder-se aos da secretaria da justiça, porque todos têem iguaes direitos.

Não votei vencido n'aquelle projecto, porque vi que o de que tratamos já estava assignado, e eu o que não quero é tirar aquelles o que se concede a estes. O que peço á camara é que considere que é impossivel fazer todos esses augmentos.

O sr. Conde d'Avila: — O digno par, o sr. Vellez Caldeira, collocou esta questão em outro campo, porque me parece que combate o projecto.

O sr. Vellez Caldeira: — Eu o que disse é, que se conceda a todos ou a nenhuns.

O Oraãor: — É esse exactamente o pensamento da commissão.

Sr. presidente, eu estou assignado n'este parecer a favor, porque eu desejava que nós fossemos conformes com as idéas do sr. Vellez Caldeira, e que o parecer comprehendesse todos os empregados (apoiados), que estão nas mesmas circumstancias. Mas nem sempre o fazemos. Ora, o que vou dizer tem referencia aos ordenados dos directores geraes do thesouro, que não estão em harmonia com as elevadas funcções que elles exercem. Por mais de uma vez se tem tratado de augmentar um pouco esses ordenados, e eu confesso, que nas duas occasiões em que tive a honra de reformar as repartições de fazenda, pelas auctorisações que me foram concedidas pelo parlamento, me prendi sempre com as difficuldades do thesouro; mas a verdade é, que essas duas reformas, e com especialidade a primeira, foram feitas em circumstancias muito menos desfavoraveis do que as actuaes, porque todos os dias a carestia augmenta e ha de augmentar ainda por algum tempo.

Todos sabem que a grande abundancia de oiro que se está lavrando em toda a parte, e que parece augmentar de dia para dia com as novas minas que se vão descobrindo, ha de produzir a depreciação dos metaes preciosos, ou a elevação do preço de todos os objectos que com elles se trocam. Portanto na reforma que fiz em 10 de novembro de 1849 as rasões que havia para augmentar os vencimentos dos chefes do thesouro não eram as mesmas, porque nestes quinze annos, como o digno par e todos nós sabemos por experiencia propria, a despeza tem augmentado 60 por cento pelo menos, e por isso quando eu vi este projecto na commissão a que tenho a honra de pertencer, não tive duvida em annuir a que, por esta medida, se compensasse de alguma maneira a mesquinhez dos vencimentos dos empregados publicos a que elle se refere; e pela mesma rasão hei de tambem approvar um projecto que se acha na outra casa do parlamento, e que já teve ali um parecer favoravel da respectiva commissão, o qual tem por fim justamente o que o digna par, o sr. Sebastião José de Carvalho, propõe no seu additamento.

O sr. Marquez de Niza: — Acaba de ser approvado na outra camara.

O Orador: — Ouço ao digno par, o sr. marquez de Niza, que este projecto acaba de ser approvado na outra camara. Desejava ouvir a confirmação d'esta noticia da bôca do nobre ministro da fazenda, que deve ter conhecimento d'este facto, se s. ex.ª não tiver duvida, como creio, em fazer essa declaração.

O sr. Ministro da Fazenda (Lobo d'Avila): — Posso assegurar ao digno par, o sr. conde d'Avila, que o projecto a que s. ex.ª allude já entrou em discussão, foi approvado, e em breve virá a esta camara.

O Orador: — Pois visto que esse projecto já se acha approvado na camara electiva, e elle tem o mesmo fim que o additamento do digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, declaro que retiro a minha approvação agora a esse additamento do digno par; e retiro-a porque o desejo approvar. A rasão é esta — se esse projecto, segundo acaba de affirmar o sr. ministro da fazenda, foi approvado na outra camara, é claro que ha de vir immediatamente a esta casa; e sendo assim, que necessidade temos de approvar agora um additamento que não faz mais do que complicar este negocio, porque dá logar a que este projecto volte á outra camara, a qual ha de necessariamente ver-se um pouco embaraçada para approvar um projecto contendo um artigo ou paragrapho, cuja doutrina fez objecto de um projecto de lei que já approvou. E possivel mesmo que esta insistência da nossa parte pareça um acto de desconsideração para com aquella camara, e é conveniente que não ponhamos de parte estas considerações de cortezia e boa camaradagem. Pela minha parte estou sempre prompto a contribuir para que reine a melhor harmonia entre as duas casas do parlamento. Nós não queremos de certo levantar questões de capricho; o nosso desejo é tornar extensiva esta medida aos empregados do tribunal de contas, esse desejo está satisfeito, nada temos pois mais a fazer. O projecto vem hoje ou ámanhã para esta camara, e será então occasião de o approvarmos, porque estou certo de que ninguem deixará de o approvar. Isto em relação a esta questão; agora passarei a tocar outro ponto.

Sem querer levantar questão sobre algumas expressões que hontem proferiu aqui o sr. ministro da fazenda, em resposta a algumas considerações que fiz, porque apesar do que s. ex.ª asseverou eu não desejo nunca irritar os debates, não posso comtudo deixar do rectificar as palavras que pronunciei, e que foram um pouco alteradas pelo sr. ministro, porque se trata de uma questão de doutrinas.

Quando hontem sustentei que esta camara tinha um caracter politico como o tem a outra camara, o nobre ministro levantou-se, e disse que respondia ás minhas observações de hoje com o discurso que eu havia proferido em 1862, querendo demonstrar assim que eu estava hoje em contradição com o que então affirmára. Ora, em primeiro logar é preciso que se note que a esse tempo já eu tinha a honra de fazer parto d'esta camara, e por isso a minha situação d'essa epocha era a mesma de hoje. Mas, sr. presidente, o que eu disse então, e appello para o Diario de Lisboa, a que se referiu o nobre ministro, foi que, propondo-se um voto de censura ao governo por factos que podiam dar logar a uma accusação na outra casa do parlamento, esta camara prevenindo por esse voto o seu juizo se inhibia de exercer as altas funcções de juiz, que lhe confere a carta, e por consequencia que não podia nem devia votar essa censura. Esta idéa é muito diversa d'aquella que o sr. ministro exprimiu. Eu hei de sempre contribuir quanto possa para que esta camara não se esqueça das elevadas funcções que lhe são dadas pela carta, hei de sempre fazer com que

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ella se lembre que é uma camara moderadora, que não deve instigar as paixões; mas não negarei nunca, que em relação á feitura das leis tem as mesmas attribuições que tem a outra camara, exceptuando unicamente a iniciativa de propostas de lei sobre impostos ou recrutamento; exercida porém essa iniciativa na outra camara, a camara dos pares tem a respeito d'esses projectos as mesmas prerogativas que tem a respeito de quaesquer outros.

O sr. Ministro da Fazenda: — Ouvi com muita attenção as considerações que acabam de fazer os dignos pares os srs. Vellez Caldeira e conde d'Avila; mas o que tenho a dizer á camara é que ella deve ter em toda a consideração a justiça d'estes empregados, por isso que elles não têem emolumentos de qualidade alguma, porque os que tinham foram-lhes tirados, como eram os do contrato do tabaco e os direitos de mercê, que passaram para a secretaria, e não têem o subsidio do Diario de Lisboa, etc... Estes empregados acham-se, por consequencia, em condição muito inferior aos empregados de igual categoria de outras repartições, acrescendo alem disso a circumstancia de que as funcções dos empregados do thesouro são muito espinhosas o importantes, e exigem um trabalho muito assíduo. Pelo que respeita aos empregados do tribunal de contas, entendo que tambem se acham em iguaes circumstancias, por isso que não têem emolumentos de qualidade alguma; o eu já disse na outra camara que approvava a medida. Entendo, por consequencia, que é melhor que a camara rejeite a emenda ou additamento do digno par o sr. Sebastião José. de Carvalho, e espere pelo projecto que se acha na outra camara.

Pelo que diz respeito ás attribuições da camara dos dignos pares, julgo agora inutil entrar n'essa questão, o que desejo é apenas ratificar as minhas idéas a este respeito. A camara dos pares, a meu ver, tem todas as attribuições que lhe confere a carta constitucional, e não póde ter outras (apoiados). N'este ponto estou perfeitamente de accordo com o digno par o sr. conde d'Avila. A camara dos pares tem as mesmas attribuições legislativas que tem a camara dos deputados, excepto no ponto que diz respeito a impostos e recrutamento; mas, em compensação, póde julgar, como tribunal, os membros do corpo legislativo e os delegados do poder executivo. Eu tenho aqui o Diario de Lisboa do dia 17 do fevereiro de 1862, em que vem a sessão do dia 8 do mesmo mez, na qual o digno par o sr. conde d'Avila tratou esta questão, mas julgo não dever agora cansar a camara com a sua leitura; por elle sé vê que o digno par, n'essa occasião, entendia que a camara dos pares nunca devia dar uma direcção politica ao seu modo de apreciar as questões, nem devia proferir votos de censura; que. a missão o a indole d'esta camara eram muito diversas das da camara electiva; e, neste ponto, disse s. ex.ª muito bem, porque são aquellas que estão marcadas na carta constitucional. De modo que o discurso que então o sr. Antonio José d'Avila pronunciou, responde ao discurso que hoje o sr. conde d'Avila proferiu.

Ora, eu partilho daquella mesma doutrina, que foi a que eu hontem apresentei aqui, porque entendo que qualquer de nós está no caso de pugnar pelos principios estabelecidos na constituição do estado, quer seja ou não par. Está demonstrado que os chefes das maiorias parlamentares são os governos, são elles que dirigem essas maiorias; portanto, elles não podem ser inhibidos do dar a sua opinião sobre o andamento dos projectos que são apresentados no parlamento, segundo julgam conveniente á causa publica. Foi n'este sentido que fallei.

O sr. S. J. de Carvalho: —.......................

O sr. Presidente: — O illustre ministro sustenta a idéa de que não é necessario approvar o additamento do digno par, porque na outra casa foi approvado um projecto contendo a mesma doutrina.

O sr. Conde d'Avila: — Sr. presidente, eu colloco a questão n'estes termos. Foi apresentado o projecto, que agora está em discussão, na outra casa do parlamento. Durante a discussão foi offerecido um additamento contendo a doutrina da moção do digno par o sr. Sebastião José de Carvalho; mas quando se foi pôr á votação não houve numero. O sr. ministro da fazenda pediu então para que se não prendesse o projecto por causa d'esse additamento, o que fosse este á commissão. Supponhamos que esse additamento no dia seguinte tinha parecer favoravel da commissão de fazenda, o qual estava já approvado pela outra camara, quando o primeiro projecto entrasse em discussão aqui: havia o digno par propor como additamento a materia do segundo projecto? De certo que não: esperava que elle entrasse em discussão para o approvar. Pois a situação é agora precisamente a mesma, depois do que se acaba de passar daquella camara, e nós não devemos praticar um acto que possa ser ali considerado de menos cortezia para com a mesma camara

As duvidas do digno par deviam ter cessado em vista da declaração do sr. ministro. S. ex.ª concordou com a idéa da moção, o não podia deixar de a sustentar na outra camara. O mesmo tem obrigação de fazer aqui. Se esta fosse rejeitada s. ex.ª não devia continuar a ser ministro nem um minuto mais, ou teria de recorrer ao poder moderador para resolver o conflicto levantado entre s. ex.ª e esta camara.

Eu pediria pois ao digno par que tivesse a condescendência de retirar o seu additamento, que nos colloca n'uma situação difficil; porque, sendo posto á votação nos vae obrigar a rejeitar o que talvez logo tenhamos que approvar. A insistência de s. ex.ª n'este caso não póde senão prejudicar a questão.

O sr. S. J. de Carvalho: —.......................

O sr. Presidente: — Os dignos pares que consentem que o sr. S. J. de Carvalho retire o seu additamento tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado, assim como o projecto n.º 434, e a mesma redacção.

O sr. Presidente: — Vae entrar-se na discussão do parecer n.º 411, sobre o orçamento da receita e despeza do estado.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

PARECER N.° 411

Senhores.—Foram presentes á commissão de fazenda, reunida em conferencia com os dignos pares nomeados pelas commissões d'esta camara, os projectos de lei n.ºs 427 e 428, relativos á receita e á despeza do estado do anno economico de 1864-1865.

Pelo projecto de lei n.º 427 são fixadas para o referido anno economico, na somma de 20.103:831$103 réis, as contribuições, os impostos directos e indirectos, e os diversos outros rendimentos do estado, segundo o mappa que faz parte do mesmo projecto, sendo 16.805:040$828 réis de receita ordinaria, e 3.298:790$275 réis de receita extraordinaria, que continuarão a ser cobrados n'esse anno em conformidade com as disposições que regulam a respectiva arrecadação para o seu producto ser applicado ás despezas auctorisadas por lei.

No mesmo projecto de lei determina-se que continuem a ser cobrados no dito anno economico os rendimentos do estado que ficarem em divida em 30 de junho de 1864, applicando-se o rendimento d'elles ás despezas publicas auctorisadas por lei; estabelecem-se as deducções a que ficam sujeitos os subsidios e os vencimentos dos empregados do estado e dos estabelecimentos pios subsidiados pelo governo, e os dos individuos das classes inactivas de consideração no continente do reino e ilhas adjacentes; auctorisa-se o governo a levantar, pelos meios que julgar mais convenientes e com as restricções estabelecidas no mesmo projecto do lei, a quantia de 3.178:7900275 réis, para ser applicada á despeza extraordinaria do exercicio de 1864—1865, bem como a poder representar, durante elle, a parte dos rendimentos publicos que melhor convier para realisar as sommas indispensaveis a fim de occorrer com regularidade ao pagamento das despezas auctorisadas por lei; designam-se os rendimentos que hão de constituir a dotação da junta do credito publico, o ordenam-se as providencias que pareceram convenientes para obstar a que as contribuições publicas possam ser desviadas da sua applicação legal.

Pelo projecto de lei n.º 428 é auctorisada a despeza do estado, para o exercicio de 1864-1865, na somma do réis 20.103:831$103, sendo 17.337:671$103 réis de despeza ordinaria, e 2.766:160$000 réis de despeza extraordinaria, conforme os respectivos mappas que fazem parto d'este projecto de lei, nos quaes estão comprehendidas as alterações da despeza publica feitas em virtude de differentes resoluções tomadas pela camara dos senhores deputados.

N'este projecto de lei permitte-se ao governo abrir creditos supplementares para as despezas dos diversos ministerios e da junta do credito publico, quando as quantias expressamente auctorisadas pelo mesmo projecto não forem sufficientes e o bem do serviço publico exigir o augmento da despeza devendo o uso d'esta faculdade dada ao governo ser feito com as restricções e pelo modo determinado no citado projecto, para evitar quaesquer abusos e assegurar a regular fiscalisação d'esta auctorisação; suspende-se durante o exercicio de 1864-1865 a amortisação da divida externa, determinada pela carta de lei de 19 do abril do 1845; prohibe-se que seja augmentado nos corpos das diversas armas o numero actual de officiaes supranumerarios; estabelecem-se varias providencias tendentes a evitar o augmento das despezas provenientes da jubilação de lentes e professores; determina-se que o producto da venda já feita, ou que houver de ser realisada pelo thesouro publico, de propriedades de que estava de posse o ministerio da guerra, seja exclusivamente applicado a reparações dos quarteis e fortificações militares; e auctorisa-se o governo a pagar, no anno economico do 1864-1865, a despeza que durante esse periodo houver de ser feita com o lançamento o repartição das contribuições directas do anno civil de 1865.

A vossa commissão de fazenda, coadjuvada pelos dignos pares nomeados pelas diversas commissões d'esta camara, examinou com a attenção devida os referidos projectos de lei n.ºs 427 e 428, e convencida da necessidade de auctorisar a receita o a despeza do estado na fórma das praticas constitucionaes, é de parecer com aquelles dignos pares, que sejam approvados os ditos projectos para, convertidos em decretos das côrtes geraes, serem submettidos á sancção real.

Sala da commissão de fazenda, 7 de junho de 1864. = = Conde de Castro = Conde d’Ávila = Francisco Simões Margiochi = D. Antonio José de Mello e Saldanha — Conde da Ponte = Sebastião José de Carvalho = Barão de Villa Nova de Foscoa = Visconde de Soares Franco = Tem voto do digno par Felix Pereira de Magalhães.

O sr. Conde d'Avila: — É só para tirar uma carta de seguro, em relação a uma disposição que vem n'este projecto.

N'elle está computada a receita das alfandegas n'uma somma um pouco elevada: faço votos para que o rendimento das alfandegas no proximo anno economico dê tal resultado; mas não o acredito. Seria mais regular que o orçamento n'esta parte fosse feito, segundo o principio estabelecido no regulamento de contabilidade, publicado pelo sr. ministro da fazenda, tomando para base do calculo do rendimento das alfandegas, o rendimento d'estas no ultimo anno conhecido quando se fez o orçamento. Assim o rendimento calculado para o anno de 1864-1865 seria o de 1862-1863. Pelo systema seguido no presente orçamento, se o rendimento real não attingir a somma calculada, julgar-se-ha que houve diminuição quando effectivamente houve augmento, ainda que menor do que o que foi calculado.

N'este anno economico, por exemplo, o rendimento das

alfandegas foi calculado com um augmento de 7 1/4 por cento sobre o do anno economico de 1862-1863, e esse augmento não se tem realisado, em relação ás tres alfandegas de Lisboa e Porto; porque o anno economico está quasi acabado, e é já conhecido o rendimento d'essas tres alfandegas nos ultimos onze mezes, o qual, comparado com o dos mesmos mezes do anno anterior, dá apenas o augmento total de 120:000$000 réis; isto é, de pouco mais de 2 por cento, em logar de 7 1/4, e não é provavel, que o rendimento d'este mez de junho compense o que falta.

D'aqui deduzo que dando nós uma auctorisação ao governo para levantar as sommas, em que se calcula o deficit ordinario e extraordinario, essa auctorisação não será sufficiente, e então o governo não terá os meios necessarios para fazer face ás despezas; todavia, como as camaras hão de abrir-se a 2 de janeiro, e como o governo não está preso em relação á epocha em que sejam necessarios esses meios, e póde fazer representar as receitas de todo o anno, quando o julgue conveniente, fica habilitado a satisfazer as despezas até á abertura das côrtes, e no começo do anno civil seguinte ou principio do 2.° semestre do anno economico actual, como tem as camaras abertas, virá pedir os meios de que carecer.

Era unicamente o que eu queria dizer a este respeito, porque approvo o orçamento; mas desejava que se ficasse entendendo que, quando o approvo, não approvo a cifra em que vem calculada a receita, que me parece exagerada.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Desejava que se me desse uma explicação. Eu li no orçamento que se distribuiu por parte do governo, que a receita ordinaria e extraordinaria para o anno economico de 1864—1865 era de dezenove mil quinhentos e tantos contos de réis, e a despeza de uma quantia igual; agora, neste que se distribuiu ultimamente, vejo que a despeza é de vinte mil cento e trinta e tantos contos. Qual é a rasão d'isto? Porque é que se elevou tanto a despeza?

O sr. Margiochi: — A rasão é facil. V. ex.ª refere-se a um parecer da commissão do fazenda da camara dos senhoras deputados sobre o orçamento, mas depois esse parecer foi alterado com a discussão que houve, e d'essas alterações resultou serem approvadas diversas despezas propostas que vem a paginas 11. Ora, essas despezas sommadas com as que vinham no parecer primitivo é o que produz a differença.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Isso vi eu, e já esperava essa resposta. Sr. presidente, já se vê que o orçamento cresceu na outra camara com as despezas que se votaram! Ora realmente, se se continua a caminhar d'este modo, não sei aonde iremos parar! Os srs. ministros devem saber as despezas que são necessarias para a conservação do paiz e para tudo aquillo que constituo uma nação independente; mas depois do governo ter feito o seu calculo não se devem aceitar as propostas que vem augmentar as despezas, como está acontecendo.

Eu logo vi qual a rasão que se me havia de dar, mas isto é uma cousa inaudita.

O orçamento em toda a parte é para que os representantes do povo examinem as despezas que são necessarias e embaracem qualquer demasia; mas entre nós é exactamente o contrario, do modo que o que convem é, como eu já disse uma vez, não discutir o orçamento, porque aliàs sempre se ha de augmentar a despeza (apoiados). Isto assim não é possivel, é preciso acabar com este systema, porque a fazenda publica está sendo uma vela a arder pelas duas pontas que se derrete em pouco tempo (riso).

É preciso que isto attraia a attenção dos membros d'esta camara, porque se trata do nosso sangue e da conservação da nossa independencia, e quem não tem força para negar despezas desnecessárias não póde governar. Isto assim é uma parodia do governo representativo! Eu mais de uma vez tenho aqui feito estas reflexões.

A respeito das despezas propostas por esta camara tem sido minha opinião que as não póde propor. Mas não basta que esta camara não tome iniciativa sobre despezas que careçam novos impostos, é preciso que não se votem senão aquellas que são essencialmente necessarias (apoiados).

O sr. Ministro da Fazenda: — Sr. presidente, o digno par o sr. conde d'Avila receia que as receitas não se elevem tanto como estão calculadas, o que o deficit cresça. Eu não posso assegurar com uma exactidão mathematica qual será o resultado, mas não julgo provavel que haja essa alteração, e se realisem os receios de s. ex.ª

Felizmente as alfandegas têem tido algum augmento de rendimento nos ultimos mezes, e outros impostos tambem augmentaram.

Fez-se uma lei para facilitar o commercio por meio da baldeação das mercadorias que vem a Lisboa, e por isso uma parte da receita d'antes figurada na alfandega grande, vem a figurar nas alfandegas menores, e se por um lado diminue a receita da primeira, augmenta e muito a das segundas. Isto é uma compensação.

Este anno diminuiu tambem alguma cousa o despacho do tabaco por circumstancias extraordinarias, mas no anno proximo ha todas as probabilidades para suppor que o rendimento cresça, porque ha todas as esperanças que o consumo se desenvolva (apoiados).

Também tem havido diminuição nos direitos do assucar, o eu mandei fazer uma estatistica para ver qual a rasão d'esta diminuição, e vim nó conhecimento de que vinham aqui despacha-lo para a reexportação, e que introduzindo-o na Madeira, o traziam depois para cá como assucar nacional, ficando assim a fazenda defraudada; para prevenir esta fraude, apresentei um projecto de lei na outra camara, que já foi approvado, que tem por fim evitar este desvio dos direitos, e então o rendimento ha de augmentar. Alem d'isso nós temos outros rendimentos que vão crescendo, como o

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da contribuição de registo, por exemplo, e espero que excedam o que está calculado no orçamento; e portanto acredito que a receita não será inferior ao que foi previsto, e se houver alguma falha, o governo quando se abrirem as camaras em janeiro, virá pedir ás côrtes o que faltar; entretanto têem a faculdade de representar as receitas proprias do anno do modo mais conveniente para satisfazer os encargos do estado (apoiados).

O que nós vemos, felizmente, é que a nossa prosperidade vae crescendo, e que o nosso estado de cousas vae melhorando, principalmente com a facilidade das communicações; o que nós vemos é que os caminhos de ferro vão inspirando todos os dias maior confiança; o que nós vemos é que o nosso credito tem crescido consideravelmente; o que nós vemos é que as despezas productivas promovem a riqueza do paiz, pelo augmento da materia collectavel, que é a fonte da receita publica; e portanto do. que devemos convencer os povos, é que para ter todas as commodidades da civilisação é necessario paga-las (apoiados).

Por consequencia a nossa receita deve ir crescendo todos os dias, porque a nossa prosperidade augmenta. A receita ha de crescer tambem com a diminuição que se fez no custo dos transportes, que attenua as despezas que faziam os productores dos generos do nosso paiz; e portanto todas estas considerações me levam a crer que a nossa receita deve augmentar muito. O quadro portanto não é tão feio como o apresentou o digno par o sr. visconde de Fonte Arcada, e não é tão feio porque nós vamos no caminho da prosperidade, e forçoso é confessa-lo, apesar de se ter clamado contra certos augmentos de despeza, principalmente a respeito dos empregados publicos, porque devemos confessar que os differentes serviços do estado estão muito mal remunerados (apoiados).

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Peço a palavra.

O Orador: — Não se póde dizer que n'esta parto ha exageração; e o que vemos é que o nosso credito tambem tem crescido, porque as inscripções estão a 50 por cento, preço a que nunca chegaram; e os nossos fundos de Londres estão cotados a 49 por cento firmes, com tendencia para a alta, como nunca aconteceu em epochas anteriores (apoiados). Portanto o que nós vemos mais é que tendo diversos ministros "tentado representar a divida fluctuante em bonds do thesouro sem penhor, não poderam realisar esse pensamento por falta de confiança, e agora o credito tem crescido de modo que se tem podido representar a divida fluctuante por bonds do thesouro sem penhor (apoiados). Todos estes factos revelam o crescimento do nosso credito, e elle não cresce senão quando o nosso estado é favoravelmente apreciado.

Portanto, sr. presidente, o nosso estado não é feio, nós seguimos o caminho do progresso, a riqueza publica vae-se desenvolvendo, e as nossas condições financeiras vão melhorando, e hão de melhorar ainda mais, e isto não quer dizer que não haja ainda alguns defeitos a corrigir e emendar (apoiados).

Disse o digno par que na outra camara cresceu muito a despeza em relação á que vinha no orçamento e que s. ex.ª entendia que o governo devia ter mais força para impedir este crescimento da despeza. S. ex.ª deve attender que as verbas que fizeram crescer a despeza, foram os 450:000$000 réis que se applicam para estradas, votadas pela lei de 10 de agosto de 1860. Emquanto aos outros ministerios avulta pouco, e se o digno par quizer ver os trabalhos da outra camara verá que quasi todas as outras propostas de augmentos de despeza foram rejeitadas; porque, só no ministerio das obras publicas, importava em réis 300:000$000 que foram rejeitados, e no ministerio do reino tambem foram rejeitado» 70:000$000 réis. O governo na outra casa empenhou-se em não augmentar senão aquellas despezas que eram de grande vantagem para o serviço do estado; e portanto não ha rasão para dizer que o governo constitucional é uma parodia, e não trata de evitar as despezas desnecessárias (apoiados). Parece-me que esta asserção do digno par é exagerada, e que s. ex.ª devia ter procedido ao exame dos factos para apreciar as cousas como ellas são (apoiados).

São estas as reflexões que eu tinha a fazer a este respeito, e não digo mais nada.

O sr. Conde d'Avila:-—Sr. presidente, isto é uma conversação que costuma ter logar nas casas do parlamento, o de que se tira sempre vantagem.

Eu não contestei, nem contesto, que haja augmento na receita publica; o que contestei é que elle haja do ter logar na escala em que vem calculado no orçamento, e o que disse a este respeito teve por fim habilitar-me quando o governo vier pedir ao parlamento os meios que julgo indispensaveis para supprir a falta de receita e poder fazer face ás despezas votadas no orçamento, a notar que era uma cousa prevista por mim, porque as receitas calculadas não me pareciam realisaveis.

O nobre ministro disse — que nós estamos em prosperidade, e que os nossos fundos tinham obtido um preço muito elevado, e por essa occasião ouvi dizer a s. ex.ª que os nossos fundos em Londres estavam cotados a 49, ex dividendo. Não me parece possivel, e houve de certo engano da parte de s. ex.ª, porque ainda se não pagou os juros, cujo pagamento ha de começar em 1 de julho; se estão pois a 49, é com o dividendo, e por consequencia calculam-se de facto a 47 1/2, preço que tiveram por vezes durante a minha administração.

Estimarei muito que os nossos fundos cheguem a obter o preço elevado que têem os das nações que têem credito, o s. ex.ª sabe que eu empreguei todos os meios, como ministro, para conseguir esse resultado, sendo uma das medidas que tive a fortuna de levar a effeito, e de que o governo tem tirado muitas vantagens, o pagamento dos juros das inscripções nas capitães dos districtos, pagamento que eu pretendia levar ás capitães das comarcas, o muito contribuiu para facilitar a desarmortisaçâo dos bens ecclesiasticos; medida que eu sinto não ver adoptada na escala em que a propuz ao parlamento poucos dias antes da minha saída do ministerio.

O nobre ministro disse mais: = que tinha havido effectivamente alguma diminuição nos rendimentos das alfandegas =. Eu sustento o contrario; porque -houve augmento nas duas alfandegas grandes de Lisboa e Porto, embora não tivesse sido na cifra em que foi calculado. Aonde houve realmente diminuição foi na alfandega municipal. Eu não tenho conhecimento de nenhum documento official que explique esta diminuição, e parece-me que era um objecto que valia a pena de ser estudado. Já li n'um jornal que era por não haver importação de cereaes; mas parece-me que esta rasão não explica bem essa diminuição, que anda já nos onze mezes d'este anno, em relação aos do anno antecedente, por perto de 40:000$000 réis. Nas duas alfandegas grandes de Lisboa e Porto o augmento no rendimento foi, em relação á de Lisboa, apenas de 29:000$000 réis; na do Porto foi, porém, de 130:000$000 réis. Deduzida a diminuição na alfandega municipal houve ainda um augmento de 120:000$000 réis. O orçamento tinha calculado este augmento em 425:000$000 réis! Apesar d'isso, s. ex.ª ainda acredita que o rendimento das alfandegas, no anno de 1864-1865, se elevará á cifra com que vem calculado. Faço votos sinceros para que se realisem as esperanças do nobre ministro.

Eu tambem conto com o augmento progressivo da receita publica, em consequencia dos melhoramentos que se effectuam todos os dias; mas não devemos esperar que a riqueza do paiz vá n'esse augmento accelerado que se suppõe, e não vamos augmentar, n'essa esperança, sem conta nem medida, as despezas e aggravar a situação, que já nos deve assustar, ' se continuarmos n'este caminho (apoiados).

O nobre ministro tem milhares de rasões quando diz, em resposta ao digno par o sr. visconde de Fonte Arcada = que o nosso estado financeiro não é tão feio como s. ex.ª indicou =. Quanto á receita tambem eu digo que não é feio, mas entendo que é feissimo quanto á despeza; e o sr. ministro precisa que o parlamento o ajudo, para que possa repelir certas exigencias com que se vê embaraçado (apoiados).

Á receita publica augmentou, sr. presidente, mas o augmento da despeza quadruplicou em relação ao augmento da receita. Ora isto é serio, e para isso é que é necessario que nós appliquemos absolutamente a nossa attenção (apoiados). Eu sei que uma grande parte d'estas despezas são productivas, como disse o sr. ministro da fazenda, nem chamarei improductivas as sommas que se têem gasto na construcção das nossas estradas, dos nossos caminhos de ferro, no desenvolvimento da nossa marinha; e oxalá que o nobre ministro da marinha tivesse empregado todas as sommas que têem sido postas "á sua disposição para despezas extraordinarias em melhoramentos uteis, como os que já tem emprehendido; caso em que se não acha a construcção de uma fragata, a que se está procedendo, e a respeito da qual não tenho fallado com pessoa alguma que não desapprove tal despeza. Mas essa questão ficará reservada para quando se tratar do orçamento do ministerio da marinha, e n'essa occasião hei de solicitar do nobre ministro algumas explicações a este respeito.

Eu estou prompto a dar o meu apoio e o meu voto ao illustre ministro para tudo o que seja concernente ao desenvolvimento da nossa marinha, ao melhoramento das nossas colonias, por isso que confio em que da prosperidade dellas póde mais tarde vir a diminuição dos embaraços da metropole (apoiados). Emquanto porém a esta despeza da fragata que se começou já a construir, tenho alguns receios de que nos vamos envolver n'uma despeza, que poderia ser mais bem aproveitada.

O sr. Ministro da Marinha: — Peço a palavra.

O Orador: — Se o nobre ministro quer agora dar as suas explicações, eu não terei remedio senão concluir as observações que tinha a fazer a este respeito, e repito, que todas quantas pessoas têem fallado comigo sobre este assumpto têem as mesmas apprehensões, e entendem que nas nossas circumstancias, era melhor empregar esses 900:00$000 réis pouco mais ou menos, em que importará a fragata, na construcção de tres corvetas, ou de outros navios mais pequenos, que prestariam muito melhor serviço ao paiz.

Osr. Visconde de Soares Franco: — Mas não são 900:00$000 réis, serão quinhentos e tantos.

O Orador: — Eu estimarei que quando a fragata estiver acabada, nos encontremos aqui, sendo ainda ministro da marinha o mesmo cavalheiro que com muita satisfação vejo n'aquelle logar, o então veremos emquanto importou, porque a conta que eu tenho visto fazer é regulada pelo que custam as fragatas em França.

O sr. Ministro da Marinha: — Ha fragatas de differentes tamanhos.

O Orador: — Alem d'isto hoje está-se n'uma epocha de transição, e não se construem fragatas de madeira em parte alguma. Consta-me mesmo, que a Hespanha, que mandára construir uma, trata hoje de a vender.

Folgarei muito que as explicações do nobre ministro sejam completas, e que esta construcção mereça os mesmos louvores, que me merecem as outras construcções com que s. ex.ª tem augmentado a nossa esquadra (apoiados.) V. ex.ª sabe que quando o nosso collega, o illustre e nobre marquez de Sá da Bandeira, na qualidade de ministro d'esta mesma repartição, quiz um auxilio de 800:000$000 réis, que se elevou a 1.000:000$000 réis (O sr. Visconde de Soares Franco: —Mil e tantos.) já para o fim tambem de augmentar a nossa marinha de guerra, eu, na qualidade de ministro da fazenda, não puz o menor embaraço a s. ex.ª, antes o auxiliei com a melhor vontade em tudo o que de mim dependia para um tão justo e louvavel fim (apoiados.) Sinto que o nobre marquez não esteja presente n'este momento, porque s. ex.ª seria de certo o primeiro a confirmar o que acabo de dizer. Faço esta observação para que se não diga, que eu sou avesso ao augmento da nossa marinha de guerra pelas despezas que traz comsigo, e que é este o motivo que inspirou as observações que fiz contra a construcção a que alludi.

Voltando á questão do orçamento, direi que é necessario que não nos extasiemos e illudamos com o augmento de receita: não o exageremos, mesmo porque d'ahi hão de resultar alguns desapontamentos e um d'elles já é o dizer-se que decrescem o rendimento das alfandegas, e todavia isso não é exacto; porque esse rendimento augmentou, ainda que não na cifra em que se calculava.

Tenha-se pois em muita consideração que effectivamente as receitas augmentam, fallando em geral; mas que esse augmento não é tanto quanto se diz, nem quanto se deseja, ou para melhor dizer, não vae na mesma proporção em que vão as despezas (apoiados).

Oxalá que para os annos seguintes se dê mais attenção a este assumpto (apoiados); faço votos os mais fervorosos para que se estude attentamente esta questão, a fim de que se evite o aggravar-se a nossa situação financeira, que póde vir a dar-nos serios cuidados (apoiados).

Termino aqui, para que reste tempo ao nobre ministro da marinha para fazer uso da palavra, segundo o seu desejo e por certo o desejo da camara, que terá muito gosto em ouvir a s. ex.ª (Vozes: — Muito bem.

O sr. Ministro da Marinha (Mendes Leal): — Expoz que as suas explicações seriam muito breves, visto estar a hora para dar.

E fóra de duvida, que algumas pessoas tem censurado a construcção de uma nova fragata para a marinha de guerra, e talvez que essas pessoas explicassem ao digno par que acabava de fallar os motivos d'essa mesma censura. Elle orador principiará portanto dizendo que ordinariamente nada se faz que não possa ser sujeito á censura; o que cumpre portanto, é averiguar se as rasões que se adduzem são justificadas e a proposito applicadas. Convirá saber-se que a construcção da fragata não se levou a effeito por uma simples indicação ou por uma determinação sem base; foi ouvida a commissão consultiva de marinha, foram consultadas as pessoas technicas e todas aquellas, por assim dizer, que mais conhecimentos especiaes tinham do serviço de marinha; o risco foi approvado pelas respectivas commissões. Exporia tambem a rasão porque todos convieram em que tal construcção se fizesse. Existiam no deposito da Azinheira grande quantidade de madeiras que não podiam ter applicação senão para navios de grande lote; e portanto o corte d'essas madeiras para as affeiçoar a navios de lote inferior pareceu contrario mesmo aos principios de economia (apoiados). Acresce alem d'isto, haver fragatas de differentes lotações, e de vario numero de toneladas. As que são de 400 toneladas poderão importar em 900:000$000 réis, como quer o digno par, mas d'ahi para baixo ha muito que descer em lote, e por consequencia no preço ou custo de taes embarcações. Certo é tambem que esta fragata é adequada ao serviço colonial, para que muitas vezes com uma só embarcação se possa fazer o que exigiria duas ou tres, e com a dupla vantagem do chegar ao mesmo tempo ao seu destino, o que disperso nos outros vasos chegaria em intervalladas epochas (apoiados). Não ha muito: foi no anno de 1860 que a metropole teve de enviar uma expedição do 800 homens a Angola, e empregaram-se n'isto cinco navios, dois dos quaes eram fretados, e s. ex.ª não ignora que essa expedição custou no todo ao estado para mais de 180:000$000 réis. Presume pois elle orador que se porventura já houvesse então esta fragata, transportaria ella toda a expedição a seu bordo, sem necessidade de tanta despeza, o sem o inconveniente de irem divididos. Indubitável é tambem que não podemos dispensar alguns navios que sirvam como que de verdadeira machina de guerra, e verdadeira escola n'este sentido; e todavia não temos actualmente navio algum de bateria coberta, a não serem a nau e a fragata D. Fernando. Aqui no continente nenhuma pessoa entendida dirá que não tenhamos necessidade de um navio de bateria coberta, para completar mesmo a instrucção maritima, o que a não ser em navios d'esta classe, não se póde jamais bem conseguir.

Havia de estragar-se a madeira propria para construcção d'este lote, mandando-a cortar para a applicar á construcção de navios pequenos? Parece-lhe que sem duvida e com plausivel rasão as proprias pessoas que têem censurado tal construcção não deixariam de censurar, pela mesma fórma ou mais acremente, o estrago que se fazia. A verdade é que sempre se procura uma base para censurar qualquer cousa; o que é porém regular, conveniente e justo é que antes de se fazer a censura se faça o exame (apoiados). Não se refere a pessoa alguma designada, mas diz que no grande numero de informadores que sempre ha, encontram-se tambem sempre differentes doutores, e os ha em marinha, sem que a ella pertençam, como existem do mesmo modo n'outros ramos, por exemplo, na magistratura, no exercito, n'uma palavra para tudo.

O sr. Visconde de Soares Franco: — Na marinha principalmente.

O Orador: — Ha muitas pessoas mesmo que entretêm a sua vida a indagar o que se faz o o que deixa de se fazer só para censurar o que se fez e o que se deixou de fazer (apoiados), mas esses ordinariamente é que não fazem cousa alguma que se veja (apoiados). Assim, desejando muito elle orador que taes doutores se informem das cou-

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sas e vejam o que na realidade é, está mui frequentes vezes perguntando no ministerio a seu cargo, se têem concorrido pessoas de fóra a examinar as obras que se hão feito, as machinas que se têem preparado e montado, as madeiras que se têem apparelhado, as construcções em andamento, etc... Resposta constante: não senhor! E porque acontece assim? E porque se averiguassem, se examinassem não tinham talvez que fallar, e pelo modo como procedem é mais commodo; censura-se sem querer ter o trabalho e incommodo de examinar (apoiados).

A construcção d'esta fragata foi reconhecida como muito conveniente, e bem acertada, pelo aproveitamento das madeiras proprias que existiam já em deposito; e demais, não ha marinha alguma de guerra, digna desta denominação, que não tenha alguma fragata a vapor, tanto para do prompto poder ser armada em transporte, como para servir de instrucção maritima a grande força reunida, o que é sempre para esse effeito de maior vantagem, como acontece no exercito, comparando esse systema com o da força dividida em destacamentos de um só corpo. O governo portanto, attendendo a isto, nem por isso deixa do conhecer tambem a utilidade, conveniencia e propriedade dos navios pequenos para certas commissões, para entreter a maior parte das communicações, e finalmente, pela vantagem do custo em harmonia com as nossas circumstancias e posição.

O governo mandou construir a fragata quando já estavam construidas oito corvetas, e em construcção outros dois navios, isto é, tinha augmentado, quanto possivel, o numero de navios de guerra. N'esta conjunctura pede agora mais 200:000$000 réis para novas construcções, e para melhoramentos no arsenal. A camara ha de conhecer que tem havido uma consideravel economia nas construcções desses navios, e deve attender a que o vapor Mindello foi transformado e é hoje uma corveta que está fazendo bom serviço; deve attender que se completou o armamento, machinas e apparelhos da escuna Napier, da corveta Sá da Bandeira; construiram-se as corvetas Infante D. João, Duque de Palmella e Duque da Terceira. Na primeira estão-se collocando os apparelhos e á machina; procedeu-se á reparação e melhoramentos no vapor Lynce e nas corvetas D. João I e Goa. Temos actualmente 10 navios em commissão, e 4 estão no Tejo promptos a cumprir qualquer commissão de que se encarreguem, podendo saír ao primeiro aviso! Não exponho estes factos para d'elles tirar gloria, que pertence ella aos funccionarios superiores da marinha, mas sim porque quero que a camara reconheça que as sommas votadas têem tido uma applicação util (apoiados). Os nossos navios de guerra têem apparecido ultimamente em pontos onde ha muito não iam, como acontecera ha pouco em Tunis. As communicações por via dos vasos de guerra com as nossas colonias têem-se amiudado, o que é de reconhecida vantagem; emfim tem-se procurado desenvolver a nossa marinha e dar-lhe um emprego util.

Emquanto á fragata póde elle orador estar em erro, mas se o está é de accordo com as auctoridades competentes n'esta materia, que têem reconhecido que a fragata é construida por um dos melhores typos que se conhece.

Portanto o digno par póde estar certo que as sommas votadas não hão de deixar de ter um emprego util como o têem tido até agora.

O sr. Pinto Basto: — E para mandar para a mesa um parecer (leu).

O sr. Presidente: — Manda-se imprimir.

O sr. Conde de Santa Maria: — Peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida.

Consultada a camara julgou-se discutida.

Propostos o parecer e projecto á votação foram approvados na generalidade.

O sr. Presidente: — Está approvado o projecto na generalidade. Amanhã se tratará da especialidade, sendo a ordem do dia a mesma que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão do dia 10 de junho de 1864

Ex.mos srs.: Conde de Castro; Marquezes, de Ficalho, de Fronteira, de Ponte de Lima e de Sá da Bandeira; Condes, das Alcaçovas, de Alva, d’Avila, da Azinhaga, de Fonte Nova, de Mello, de Peniche, da Ponte, da Ponte de Santa Maria e de Rio Maior; Viscondes, de Santo Antonio, de Benagazil, de Condeixa, de Fonte Arcada, de Ovar, de Porto Côvo e de Soares Franco; Barão de Foscoa; Mello e Carvalho, D. Antonio José de Mello, Teixeira de Queiroz, Caula Leitão, Custodio Rebello de Carvalho, Sequeira Pinto, Felix Pereira de Magalhães, Ferrão, Margiochi, João da Costa Carvalho, João da Silva Carvalho, Aguiar, Pestana, Larcher, Braamcamp, Pinto Basto, Silva Costa, Ferreira Passos, Reis e Vasconcellos, José Lourenço da Luz, Baldy, Eugenio de Almeida, Silva Sanches, Castro Guimarães, Vellez Caldeira,.Sebastião José de Carvalho e Ferrer.

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