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N.º 77

SESSÃO DE 7 DE JUNHO DE 1880

Presidencia do exmo sr. Buque d'Avila e de Bolama

Seeretarios - os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Eduardo Montufar Barreiros

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta da sessão antecedente. - A correspondencia é enviada ao seu destino. - O sr. presidente da camara convida a deputação que ha de assistir á trasladação dos restos mortaes de Vasco da Grama e Luiz de Camões no dia 8, a assistir igualmente á solemnidade do dia 10, na praça do Commercio. - Considerações do sr. visconde de S. Januario ácerca do porto artificial de Leixões e de alguns melhoramentos no Tejo. - Ordem do dia. Approvação, sem discussão, do parecer n.° 130 sobre o projecto de lei auctorisando o governo a abrir, no ministerio da fazenda, em favor do da, guerra, um credito extraordinario na importancia de 56:000$000 reis. - Approvação, depois de algumas reflexões do digno par Vaz. Preto, do parecer n.° 142 sobre o projecto
de lei n.° 139, auctorisando o governo a despender até á quantia de 3:000$000 réis annuaes com o pagamento de subsidios a viuvas e orphãos dos officiaes do exercito. - Approvação, sem discussão, do parecer n.° 126, sobre o projecto de lei n.° 94, considerando de utilidade publica a expropriação de terrenos para o estabelecimento de carreiras de tiro regimentaes - Approvação, sem discussão, dos pareceres n.° 91, n.° 90 e n.° 88: o primeiro sobre o projecto de lei n.° 79, permittindo que sejam promovidos ao posto de major, quando pela sua antiguidade lhes pertença, os capitães que forem lentes de escolas superiores, sem necessidade de tirocinio ou exame; o segundo sobre o projecto de lei n.° 76, auctorisando o governo a admittir no collegio militar como alumno pensionista do estado, Bemvindo do Carmo Leal Guimarães 5 e e terceiro sobre o projecto de lei n.° 64, auctorisando o governo a conceder á camara municipal de Vizeu 500 metros quadrados de terreno para alargamento de uma rua. - Discussão do parecer n.° 127, sobre o projecto de lei n.º 114, auctorisando o governo a reorganisar o exercito, repartições e mais estabelecimentos dependentes do ministerio da guerra. - O digno par Fontes Pereira de Mello pede para que o sr. ministro da guerra não insista a que se discuta no ultimo dia de sessão um projecto que devia ser placidamente apreciado pela camara. - Discussão e approvação, depois de varias reflexões dos dignos pares Vaz Preto, Serpa Pimentel, Conde de Valbom, Conde de Rio Maior e Fontes Pereira de Mello, do parecer n.° 135 sobre o projecto de lei que manda comprehender ha rede de caminhos de ferro de primeira ordem o prolongamento da linha de caminhos de ferro do Douro, do Pinhão a Barca de Alva. - Prorogação da sessão. - Discussão e adiamento, depois de algumas considerações dos srs. Vaz Preto e ministro da fazenda, do parecer n.° 80 sobre o projecto de lei n.° 45, auctorisando o governo a emittir pela junta do credito publico, a favor de Robert Stodart Wyld 2:000 libras em titulos de inscripções em substituição dos bonds que lhe foram roubados. - Approvação, sem discussão, do parecer n.° 136 sobre o projecto de lei n.° 133, approvando os contratos de 12 do junho e de 3 de dezembro de 1878 com o banco ultramarino. - Approvação, com uma eliminação, proposta pelo sr. Andrade Corvo, do parecer n.° 117 sobre o projecta de lei que altera os artigos 5.°, 124.°, 172.° e 184.º da pauta geral das alfandegas de 25 de janeiro de 1871. - Approvação, sem discussão, do projecto de lei n.° 97, concedendo a D. João Pedro da Camara a aposentação de governador, civil de Lisboa, e do projecto de lei n.° 73, auctorisando, o governo a contratar com a camara municipal do Porto a expropriação de lojas existentes no edificio da academia polytechnica do Porto. - Approvação do projecto n.° 85, creando no lazareto mais dois logares de facultativos, do parecer n.° 137 sobre o projecto de lei n.° 98, determinando que os actuaes escrivães dos departamentos do centro e norte continuem a receber ordenados e gratificações que lhes foram abonados no exercicio de 1879-1880, do parecer n.° 118 sobre o projecto de lei n.° 106, reorganisando o ensino da academia das bellas-artes de Lisboa e do Porto, sem augmento de despeza, e do parecer n.° 139 sobre o projecto de lei n.° 121, creando uma escola agricola.

Ás duas horas da tarde, sendo presentes 25 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão precedente julgou-se approvada na conformidade do regimento, por não haver, reclamação em contrario.

(Estavam presentes os srs. ministros da fazenda, da guerra e da justiça, e entraram durante sessão os srs. presidente do conselho e ministros da marinha do reino e obras publicas.)

Mencionou-se a seguinte:

Tres officios da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo as seguintes proposições de lei:

l.ª Tem por fim reformar o serviço tachygraphico e redacção nas duas camaras legislativas, e bem assim elevar a assignatura do Diario do governo de 6$000 réis a 9$000 réis por anno.

2.ª Auctorisando o poder executivo a ratificar a declaração assignada no Rio de Janeiro aos 29 de outubro de 1879, entre Portugal e o Brazil, para a protecção das marcas de fabrica, e de commercio.

3.ª Auctorisando o governo a ratificar a declaração assignada em Londres em 6 de janeiro de 1880, entre Portugal e a Gran-Bretanha, para a protecção reciproca das marcas de fabrica e de commercio.

Estas mensagens foram remettidas ás respectivas commissões.

Um officio do ministerio das obras publicas, remettendo os autographos dos decretos das côrtes geraes ordinarias que depois de sanccionados por Sua Magestade El-Rei, foram convertidos nas cartas de lei de 31 de março, 24 de abril, 19 e 20 de maio do anno corrente afim de serem depositados no archivoda camara dos dignos pares do reino.

Pará o archivo.

Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição de lei que tem por fim conceder á camara municipal do concelho de Mèlgaço o poder applicar a outras despezas obrigatorias o tributo sobre o sal, que lhe foi permittido por lei de 14 de março de 1872.

A commissão de administração publica.

Um officio do ministerio do reino, participando, para conhecimento da camara dos dignos pares do reino, que Sua Magestade El-Rei resolveu assistir do pavilhão mandado erigir pela camara municipal de Lisboa, na praça do Commercio, ás manifestações publicas promovidas pela commissão executiva da imprensa para celebrar o tricentenario do grande épico Luiz de Camões, em o dia 10 do corrente mez.

Ficou a camara inteirada.

Outro do mesmo ministerio, participando, para conhecimento dá camara dos dignos pares do reino, que Sua Magestade El-Rei houve por bem decretar que a sessão - do encerramento das côrtes geraes ordinarias se effectue na proxima segunda feira, 7 do corrente, pelas sete horas da tarde, na sala das sessões da camara electiva, reunidos ambos os corpos co-legisladores sob a direcção de s. exa. o sr. presidente, e da camara dos dignos pares, e que por circumstancias occorrentes que impedem Sua Magestade El-Rei de assistir a está solemnidade, assistam ao referido acto, por commissão do mesmo augusto senhor, os ministros d'estado de todas as repartições.

Ficou a camara inteirada.

Um officio do juiz de direita da 3.ª vara, dando parte que tendo vindo uma deprecada da comarca do Porto para

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inquirição de testemunhas, entra no numero d'ellas o digno par do reino o sr. conde de Fonte Nova, e que foi designado e dia 16 de corrente, pelas onze horas da manhã, para a sua inquirição; o que communica á camara para conceder esta licença ao referido digno par, para vir prestar o seu depoimento.

Um officio do digno par conde da Ribeira, agradecendo a prova de consideração de o mandar desanojar.

O sr. Presidente: - Em vista do officio que acaba de ler-se, a actual sessão legislativa encerrar-se-ha ás sete horas da tarde de hoje na sala das sessões da camara dos senhores deputados.

Por consequencia ficam os dignos pares avisados da hora e do local onde ha de ter logar a sessão de encerramento das côrtes.

Continuou a leitura da correspondencia.

Um officio do presidente da commissão que promove a festa popular no novo bairro Camões, que a exma. camara municipal inaugurará officialmente no dia 9 do corrente, para commemorar o tricentenario do principe da poetas portuguezes, convidando os dignos pares que se acharem em Lisboa no dia 11 do corrente a assistirem á festa que se deve realisar n'essa noite no referido bairro.

Ficou a camara inteirada.

O sr. Presidente: - Em consequencia d'este convite ficam sabendo os dignos pares que tencionarem estar em Lisboa no dia 11 e queiram assistir aos festejos que n'essa noite hão de ter logar nos terrenos onde se vae inaugurar o novo bairro Camões, que elevem informar a companhia do numero de bilhetes de que precisam para si e para a sua familia.

O sr. Serpa: - Sr. presidente, mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda ácerca de um projecto de lei, vindo da camara dos senhores deputados, relativo a obras na escola polytechnica. Eu pedia a v. exa. que consultasse a camara sobre se ella dispensa a impressão d'este projecto, para que seja hoje discutido será prejuizo dos pareceres que v. exa. deu para ordem do dia.

Leu-se na mesa.

O sr. Presidente: - Eu peço aos dignos paios que me ajudem mais uma vez a cumprir o meu dever. Os dignos pares sabem que n'esta ultima sessão são numeroso es pedidos de dispensa do regimento, o que produz gravissimos inconvenientes, pondo-se em discussão pareceres que acabam de ser lidos na mesa, e que nem mesmo foram impressos, preterindo-se assim pareceres impressos s distribuidos com a necessaria antecipação, e já dados para ordem do dia. Eu pediria á camara que isto não continuasse. (Apoiados.)

Para este fim vou perguntar á camara se ella é de opinião que se não deva antepor nenhum parecer aos que estão impressos, distribuidos e dados para ordem do dia, ou se, pelo contrario, quer que entrem em discussão quaesquer outros com prejuizo d'estes, embora aquelles não estejam impressos, nem por consequencia dados para ordem do dia.

Vou consultar a camara. Os dignos pares que são de voto que se discutam de preferencia os projectes que estão impressos e estão em ordem do dia, conforme o regimento, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado por grande maioria.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vamos, portanto, entrar na ordem do dia.

O sr. ministro da guerra pediu-me que pozesse em discussão os pareceres n.ºs 141, 142, 126 e 91, impressos ha muito, e já dados para ordena do dia. Vamos, pois, entrar na discussão desses pareceres, emquanto não vem o sr. ministro das obras publicas, porque, como a camara sabe, ficou para hoje a discussão do parecer sobre o prolongamento do caminho de ferro do Douro.

O sr. Carros e Sá: - Mande para a mesa um parecer da commissão de administração.

Leu-se na mesa.

Leu-se o parecer n.° 130, que é do teor seguinte:

Parecer n.° 130

Senhores. - A vossa commissão de guerra foi presente o projecto de lei n.° 122, que tem por fim abrir no ministerio da fazenda, em favor do da guerra, um credito extraordinario na importancia de 56:000$000 réis, para pagamento de quinze torpedos moveis, automaticos, de grande velocidade, systema Whitehead, e material correlativo.

A vossa commissão, acceitando os fundamentos do relatorio da proposta de lei do governo, é de parecer que devo ser approvado o seguinte:

PROJECTO

Artigo 1.° É o governo auctorisado a abrir no ministerio da fazenda, em favor do da guerra, um credite extraordinario na importancia de 56:000$000 réis, para pagamento de quinze torpedos inoveis, automaticos, de grande velocidade, systema Whitehead, e material correlativo.

Art. á.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da camara, 1 de junho de 1880. = Marquez de Fronteira = Fortunato José Barreiros = José Mancos de Faria = Augusto Xavier Palmeirim = D. Antonio José de Mello e Saldanha = Antonio Florencio de Sousa Pinto = José Joaquim de Castro = Tem voto do sr. Fontes Pereira de Mello = Visconde de S. Januario = D. Luiz da Camara Leme, relator.

A commissão de fazenda concorda na parte que lhe diz respeito no projecto anterior.

Lisboa, 1 de junho de 1883. = Antonio de Serpa Pimentel = José de lucilo Gouveia = Joaquim Gonçalves Mamede = Thomás de Carvalho = Sarros e Sá = Conde de Castro == Mathias de Carvalho e Vasconcellos.

Projecte de lei n.° 122

Artigo 1.° É o governo auctorisado a abrir no ministerio da fazenda, em favor do da guerra, um credito extraordinario na importancia de 56:000$000 réis, para pagamento de quinze torpedos moveis, automaticos, de grande velocidade, systema Whitehead, e material correlativo.

Ari. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 31 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Antonio José d'Avila, deputado secretario = D. Miguel de Noronha, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 137-S

Senhores. - Em 1 de dezembro de 1880 foi assignado um contrato entre o governo portuguez e a casa Whitehead & C.a; de Fiume (reino de Hungria), para o fornecimento de cincoenta torpedos moveis, automaticos, de grande velocidade, e para a compra do respectivo segredo.

Para cumprimento d'este contrato falta ainda receber quinze torpedos que se acham já promptos em Fiume, e que devem ser recebidos logo que sejam examinados e approvados pelos delegados do governo.

As despezas que se têem feito com o importantissimo material de torpedos que ternos adquirido attingem a uma verba consideravel, não podendo por isso as despezas que ha ainda a fazer, tanto cem e pagamento dos ditos quinze torpedos como com as experiencias e acquisicão de mais material correlativo que está encommendado, ser feitas por conta das verbas destinadas para fortificações no actual anno economico, e sendo por outro lado indispensavel manter a fé dos contratos, tenho a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação a seguinte;

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a abrir no ministerio ca fazenda, em favor do da guerra, um credito extraordinario na importancia de 56:000$000 réis para pa-

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gamento de quinze torpedos moveis, automaticos, de grande velocidade, systema Whitehead, e material correlativo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 19 de março de 1880. = Henrique de Barros Gomes = João Chrysostomo de Abreu e Sousa.

Foi approvado sem discussão.

Entrou em discussão o parecer n.° 142, que é do teor seguinte:

Parecer n:° 142

Senhores. - Á commissão de guerra foi presente o projecto de lei n.° 139, que tem por fim auctorisar o governo a despender até á quantia de 3:000$000 réis annuaes com o pagamento do subsidio ás actuaes viuvas e orphaos dos officiaes do exercito que não recebam pensão do monte pio official.

Á vossa commissão parece-lhe de justiça que seja approvado o referido projecto de lei.

Sala da commissão, 5 de junho de 1880. = Marquez de Fronteira = Fortunato José Barreiros = Antonio Florencio de Sousa Pinto = A. X. Palmeirim = Barros e Sá = José Joaquim de Castro = José Manços de Faria = D. Luiz da Camara Leme, relator.

A commissão de fazenda, devolvendo á da guerra o projecto n.° 139, vindo da camara dos senhores deputados, auctorisando o governo a despender até á quantia de réis 3:000$000, em pagamento de subsidios ás actuaes viuvas e orphaos de officiaes do exercito que não recebem pensão do monte pio official pelos motivos no mesmo projecto determinados, e estabelecendo que estes subsidios não excederão a 3$000 réis mensaes, é de parecer que o referido projecto deve merecer a approvação da camara.

Sala da commissão, 5 de junho de 1880. = Antonio de Serpa Pimentel = Joaquim Gonçalves Mamede = J. J. de Mendonça Cortez = José de Mello Gouveia = Mathias de Carvalho e Vasconcellos. = Tem voto dos dignos pares: Carlos Bento da Silva = João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens.

Projecto de lei n.° 139

Artigo 1.° É o governo auctorisado a despender até á quantia de 3:000$000 réis annuaes com o pagamento de subsidios ás actuaes viuvas e orphãs dos officiaes do exercito, que não recebem pensão do monte pio official, por algum dos seguintes motivos:

1.° Por fallecimento dos maridos ou pães, antes da creação do referido monte pio;

2.° Por não ter decorrido, depois da data da fundação do monte pio official, o tempo preciso para adquirirem direito á pensão;

3.° Por não ter sido permittido ao official o ingresso na mesma associação.

§ unico. Os subsidios de que trata este artigo serão de 3$000 réis mensaes, e só poderão ser concedidos ás viuvas que careceram absolutamente de meios de subsistencia.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes em 5 de junho de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Antonio José d'Avila, deputado secretario = D. Miguel de Noronha, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 266-A

Senhores. - A carta de lei de 28 de junho de 1843 sus pendeu a inseri peão de socios no monte pio militar e facilitou o levantamento das quotas contribuidas. Esta resolução, que teve por fim promover a transferencia do contribuinte do monte pio militar para o monte pio geral então creado, desafogando o estado, originou outra Ordem de encargos que o sobrecarregou do mesmo modo.

Desde então innumeras pensões foram concedidas, até que em 1867 o estado da fazenda publica obrigou, o governo a restringir as pensões e a crear o monte pio official. Muitas viuvas, porém, ficaram ao desamparo, vendo-se obrigadas, para não morrerem de fome, a estender a mão á caridade publica.

A carta de lei que creou o monte pio official designou o tempo indispensavel para o socio adquirir direito a legar pensão, e impoz certas condições para a sua admissão. Acontecendo, porem, haverem fallecido muitos socios antes de completarem o tempo exigido, deixaram as suas viuvas e filhas ao desamparo, assim como ficaram aquellas cujos maridos não poderam entrar n'aquella instituição por excesso de idade ou por não terem o vencimento preciso.

Movido por estas considerações tenho a honra de vos apresentar a seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a despender até á quantia de 3:000$000 réis annuaes com o pagamento de subsidios ás actuaes viuvas e orphãs dos officiaes do exercito, que não recebem pensão do monte pio official, por algum dos seguintes motivos:

1.° Por fallecimento dos maridos ou pães antes da creação do referido monte pio;

2.e Por não ter decorrido, depois da data da fundação do monte pio official, o tempo preciso para adquirirem direito á pensão;

3.° Por não ter sido permittido ao official o ingresso na mesma associação.

§ unico. Os subsidios de que trata este artigo serão de 3$000 réis mensaes, e só poderão ser concedidos ás viuvas que carecerem absolutamente de meios de subsistencia.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, l de junho de 1880. = Henrique de Barros Gomes = João Chrysostomo de Abreu e Sousa.

O sr. Vaz Preto: - Eu desejo simplesmente declarar que approvo este projecto, apesar de resultar d'elle um augmento de despeza, porque o acho de toda a justiça.

Sr. presidente, apesar de eu ser o mais escrupuloso em votar qualquer despeza, faço as excepções que são recommendadas pela justiça e pela moral.

A minha opinião já estava compromettida de ha muito ácerca do assumpto d'este projecto, pois na occasião em que o sr. duque d'Avila subiu ao poder eu recommendei e pedi ao seu governo que tratasse de examinar quaes as viuvas de officiaes do exercito que estavam em necessidade tal que carecessem de uma esmola, porque assim se podia classificar o pequeno auxilio que recebiam por mero favor do ministro.

Até hoje os governos que têem gasto sommas enormes em gratificações e em favores não se lembraram das pobres desgraçadas, que ainda ficariam esquecidas na completa amargura se não fosse a philanthropia e actividade incansavel de uma alma generosa que não quiz ver morrer de fome e de miseria as viuvas dos seus valentes companheiros de armas,

Se não fosse, pois, a actividade e a philanthropia d'esse distincto general, uma das glorias portuguezas, o projecto que está em discussão não sairía do seio das commissões; e o parlamento regatearia ainda por mais tempo o obulo, que resgatará da fome, e talvez da morte, essas infelizes que têem vivido na miseria e na desgraça.

Carecia de dar estas explicações á camara para justificar o meu vota, e declarar que voto com satisfação este projecto. E aproveito a occasião para lembrar ao sr. ministro da guerra que em toda a parte do mundo onde ha exercitos bem organisados os militares têem certas prerogativas e vantagens, e garantido o seu futuro, que convem que a nossa legislação attenda á necessidade de garantir o futuro dos militares, em harmonia com os interesses do thesouro.

Tudo se póde fazer com boa administração e uma sabia economia,

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Até hoje não se tem gasto com o exercito senão improductivamente e sem resultado, pois não temos exercito.

O sr. Presidente: - Como ninguem mais pede a palavra, vae-se votar o projecto.

Submettido á votação, foi approvado.

Seguidamente foram approvados sem discussão es Careceres n.ºs 126, 91, 90 e 88.

São ao teor seguinte:

Parecer n.° 126

Senhores. - A vossa commissão de guerra examinou o projecto de lei n.° 94, vindo da camara dos senhores deputados, que tem por fim estabelecer que sejam considerados de utilidade publica, e como taes expropriados, os terrenos necessarios para carreiras de tiro;

Considerando que a acção preponderante do fogo, foi uma das principaes causas, e por certo a mais importante, das modificações feitas nas formações tacticas da infanteria; e que os effeitos devidos ao augmento do alcance, justeza e rapidez do tiro das armas actuaes têem excedido todas as previsões, o que levou á adopção da ordem dispersa como formação normal das tropas em primeira linha, a fim de as subtrahir, tanto quanto possivel, ao effeito mortifero dos fogos inimigos;

Considerando que da acção preponderante do fogo deriva a necessidade de augmentar por todos os meies o seu effeito util; e sendo certo que um tal effeito não póde conseguir-se sem uma solida instrucção na pratica do tiro, a qual, sendo da maior vantagem para as tropas, não é de menos alcance para os povos das localidades proximas das carreiras que se estabelecerem:

É a vossa commissão de parecer, pelo que deixa exposto e pelos demais fundamentos da proposta, que o projecto de lei n.° 94 seja approvado e convertido em lei.

Sala da commissão, 28 de maio de 1880. = Marquez de Fronteira = Fortunato José Barreiros = A. M. de Fontes P. de Mello = Antonio Florencio de Sousa Pinto = José Manços de Faria, com declarações = Augusto Xavier Palmeirim = D. Antonio José de Mello é Saldanha = D. Luiz da Camara Leme = Visconde de S. Januario = José Joaquim de Castro.

Projecto de lei n.° 94

Artigo 1.° É considerada de utilidade publica a expropriação, nos termos da legislação especial que regula esta materia, dos terrenos necessarios para o estabelecimento de carreiras de tiro regimentaes e de guarnição.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 18 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = Antonio José d'Avila, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 181-A

Senhores. - Sendo geralmente reconhecida a necessidade da instrucção nos exercitos, para a qual um dos elementos mais indispensaveis é sem duvida a pratica do tiro, e não podendo esta adquirir-se, não havendo carreiras estabelecidas em locaes proximos dos quarteis, onde o soldado possa sem grande fadiga entregar-se a está especie de exercicios; e convindo alem d'isso que ellas aproveitem aos habitantes que desejem instruir-se n'aquella pratica tão vulgarisada já em muitas nações: não póde deixar de se considerar como de utilidade publica o estabelecimento das referidas carreiras.

Fundado n'estas rasões, tenho a honra do submetter ao vosso esclarecido exame a seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° Serão considerados de utilidade publica, e como taes expropriados nos termos da legislação especial que regula esta materia, os terrenos necessarios para o estabelecimento de carreiras de tiro regimentaes e de guarnição.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado da negocios da guerra, 30 de abril de 1880. = João Chrysostomo de Abreu e Sousa.

Parecer n.º 91

Senhores. - A vossa commissão de guerra examinou o projecto de lei n.° 79, vindo da camara dos senhores deputados, que tem por fim regular a promoção ao posto de major dos capitães das armas de infanteria o cavallaria, que forem lentes da escola polytechnica.

Considerando que no referido projecto se estabelece que aquelles officiaes, depois de promovidos aos postos superiores, não possam ser admitidos ao serviço nas fileiras do exercito, sem terem satisfeito ao tirocinio ou exame, do que trata o decreto de 22 de outubro de 1864 ou a qualquer outra, clausula que posteriormente se estatúa;

Considerando que no relatorio que precede o citado decreto de 22 de outubro de 1864 se faz bem sentir terem assentado sempre as nossas leis sobre promoções, na antiguidade e no merito;

Considerando que o serviço no magisterio é um dos mais importantes que podem desempenhar os officiaes do exercito;

Considerando que os capitães de infanteria ou de cavallaria, quando lentes na escola polytechnica, desempenham o mesmo serviço que os demais lentes militares da mesma escola não sujeitos a tirocinio ou exame para serem promovidos no posto de major;

Considerando, finalmente, que o projecto do lei submettido ao exame da commissão, se por um lado tem em vista conciliar as conveniencias do ensino com as do serviço militar, attende per outro aos justos interesses dos officiaes a que elle se refere:

É a vossa commissão de parecer que o projecto de lei n.° 79 seja approvado e convertido em lei,

Sala da commissão, 1 de maio de 1880 .= Marquez de Fronteira = A. M. de Fontes P. de Mello = D. Antonio José de Mello e Saldanha = Augusto Xavier Palmeirins = Visconde de S. Januario = D. Luiz da Camara Leme = José Joaquim de Castro.

Projecto de lei n.º 79

Artigo 1.° os capitães de infanteria ou cavallaria que forem lentes das escolas superiores, serão promovidos ao posto do major, quando pela sua antiguidade lhes pertencer, independentemente de qualquer tirocinio ou exame para este posto.

Art. 2.° Os referidos officiaes não poderão ser admittidos nos postos superiores ao serviço nas fileiras do exercito senho depois de terem satisfeito ao tirocinio ou exame de que trata o decreto de 22 de outubro de 1884, ou a qualquer outra clausula que essa occasião estiver em vigor.

Art. 3.° Fica revogada a Legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 12 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = Antonio José d'Avila, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 201-G

Senhores. - O decreto de 22 de outubro de 1834, não permittindo que sejam promvidos a majores os capitães do mfanteria ou cavallaria que não tenham sido approvados nas funçcões d'aquelle posto, determina que seis capitães da arma dei nfanteria e dois ca de cavallaria que, á maior antiguidade do posto, juntem boas informações, sejam addidos aos corpos das brigadas da instrucção e manobra na l.ª divisão militar, e ahi exerçam as funcções do major, assim na secretaria como no campo, a fim de mostrarem durante este tirocinio se estão habilitados para bem desempenho taes funcções.

Em vista de exposto, os capitães de infanteria e caval-

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laria que forem lentes da escola polytechnica, têem forçosamente de deixar por algum tempo a escola onde estão regendo, para irem fazer o tirocinio, com grave prejuizo dos seus discipulos, ou, não o indo fazer, de ser graduados nos postos immediatos, com grande prejuizo nos seus interesses e manifesta desigualdade em relação aos seus collegas, que pertencem ás armas especiaes e desempenham funcções identicas;

Considerando, porém, o governo que aquelles officiaes desempenham na escola um serviço completamente igual ao dos officiaes das outras armas, que são tambem lentes da mesma escola, os quaes sobem na escala do accesso sem serem submettidos a tirocinio algum;

Considerando que não é justo que os mesmos officiaes sejam lesados em seus vencimentos, por se dedicarem principalmente ao arduo trabalho de dilatar o horisonte scientifico á nova geração:

Considerando que, desempenhando aquelles officiaes commissões vitalicias, embora façam o tirocinio, voltarão a occupar na escola os logares que ali conquistaram pelo seu estudo, applicação e qualidades;

Considerando que, com os progressivos e incessantes melhoramentos na arte da guerra, e estando os referidos lentes desviados do serviço da fileira, podem, quando a elle voltarem, não estar completamente habilitados para bem desempenhar no exercito as suas obrigações, embora tenham anteriormente feito o tirocinio:

O governo tem a honra de propor á apreciação da camara a seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° Os capitães de infanteria ou cavallaria que forem lentes da escola polytechnica, serão promovidos ao posto de major, quando pela sua antiguidade lhes pertencer, independentemente de qualquer tirocinio ou exame para este posto.

Art. 2.° Os referidos officiaes não poderão ser admittidos nos postos superiores ao serviço nas fileiras do exercito senão depois de terem satisfeito ao tirocinio ou exame de que trata o decreto de 22 de outubro de 1864, ou a qualquer outra clausula que n'essa occasião estiver em vigor.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 10 de maio de 1880. = João Chrysostomo de Abreu e Sousa.

Parecer n.° 90

Senhores. - A vossa commissão de guerra examinou o projecto de lei n.° 76, vindo da camara dos senhores deputados, e que tem por fim auctorisar o governo a admittir no real collegio militar, como alumno pensionista do estado, Bemvindo do Carmo Leal Guimarães, filho do fallecido coronel do batalhão de caçadores n.° 8, Antonio Gomes Pinto Guimarães, não obstante exceder o limite maximo da idade fixado no decreto com força de lei de 11 de dezembro de 1851.

Considerando os bons serviços do referido coronel, durante a sua longa carreira militar; as precarias circumstancias em que deixou a familia; e attendendo a que o collegio tem por fim, não só educar e instruir os respectivos alumnos, mas tambem remunerar os bons serviços prestados por seus pães; parece á vossa commissão, de accordo com os fundamentos da proposta e com o projecto de lei, que este seja approvado.

Sala da commissão, 17 de maio de 1880. = Marquez de Fronteira = A. M. de Fontes P. de Mello = Augusto Xavier Palmeirim = Visconde de S. Januario = D. Luiz da Camara Leme = José Joaquim de Castro.

Projecto de lei n.° 76

Artigo 1.° É o governo auctorisado a admittir no real collegio militar, como alumno pensionista do estado, Bemvindo do Carmo Leal Guimarães, filho do fallecido coronel do batalhão de caçadores n.° 8, Antonio Gomes Pinto Guimarães, não obstante exceder o limite maximo da idade fixado no decreto com força de lei de 11 de dezembro de 1851.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 10 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado Secretario = Antonio José d'Avila, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 137-C

Senhores. - O decreto com força de lei de 11 de dezembro de 1851, que reorganisou o real collegio militar, fixou em doze ou treze annos o limite maximo de idade para admissão dos alumnos, segundo n'elles concorressem, ou não, certas habilitações litterarias.

Em 5 de fevereiro ultimo falleceu o coronel do batalhão de caçadores n.° 8, Antonio Gomes Pinto Guimarães, que deixou um orphão de quatorze annos de idade, inhibido, portanto, de ser admittido n'aquelle estabelecimento de instrucção.

Os reconhecidos bons serviços do referido coronel e ás precarias circumstancias a que, por seu fallecimento, ficou reduzida sua familia, recommendam tão instantemente a pretensão que ao governo acaba de dirigir a viuva d'aquelle official, que elle, julgando desnecessario encarecer aquelles serviços, appella tão sómente para os vossos sentimentos humanitarios ao apresentar-vos essa pretensão traduzida na seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Artigo l.° É o governo auctorisado a admittir no real collegio militar, como alumno pensionista do estado, Bemvindo do Carmo Leal Guimarães, filho do fallecido coronel do batalhão de caçadores n.° 8, Antonio Gomes Pinto Guimarães, não obstante exceder o limite maximo da idade fixado no decreto com força de lei de 11 de dezembro de 1851.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 19 de março de 1880. = João Chrysostomo de Abreu e Sousa.

Parecer n.° 88

Senhores. - A vossa commissão de guerra examinou com a devida attenção o projecto de lei n.ºs 64, que tem por fim auctorisar o governo a conceder á camara municipal de Vizeu uma porção da cerca do quartel de infanteria n.° 14, para alargamento da rua de S. Francisco d'aquella cidade.

A vossa Còmmissão de guerra, acceitando as ponderações exaradas no relatorio da commissão de guerra da camara dos senhores deputados, é de parecer que seja approvado o seguinte:

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a conceder á camara municipal de Vizeu cerca de 500 metros quadrados de terreno pertencente á horta do quartel de infanteria n.° 14, para alargamento da rua de S. Francisco.

Art. 2.° Esta auctorisação ficará sem effeito se a camara não fizer uso, dentro de um anno, da concessão que lhe for feita em virtude d'esta lei.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 15 de maio de 1880. = Marquez de Fronteira = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = D. Antonio José de Mello e Saldanha = Visconde de S. Januario = Fortunato José Barreiros = José Joaquim de Castro = José Mancos de Faria = Antonio Florencio de Sousa Pinto = Augusto Xavier Palmeirim = D. Luiz da Camara Leme.

A commissão de fazenda concorda com o parecer e opinião da illustre commissão de guerra, e não acha inconveniente algum em que seja concedido o predio pedido.

Lisboa, 15 de maio de 1880. = João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens = Thomás de Carvalho =

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Barros e Sá = Conde de Samodães = J. J. de Mendonça
Cortez.

Projecto de lei n.° 64

Artigo 1.° É o governo auctorisado a conceder á camara municipal de Vizeu cerca de 500 metros quadrados de terreno pertencente á horta do quartel de infanteria n.º 14, para alargamento da rua de S. Francisco.

Art. 2.° Esta auctorisação ficará sem effeito se a camara não fizer uso, dentro de um anno, da concessão que lhe for feita em virtude d'esta lei.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 28 de abril de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = Antonio José d'Avila, deputado secretario,

Proposta de lei n.° 137-D

Senhores. - Sendo indispensavel alargar e alinhar a rua de S. Francisco da cidade de Vizeu, segundo as indicações constantes da representação da camara municipal, consulta do commandante da segunda divisão militar, e do director das obras publicas do districto, documentos existentes no ministerio da guerra;

E não podendo realisar-se aquelle melhoramento que a cidade de Vizeu com toda a justiça reclama sem que o governo conceda á mesma camara municipal alguns metros do terreno pertencente á cerca do quartel de infanteria n.° 14, que limita por um lado a mesma rua de S. Francisco;

Tenho a honra de sujeitar á apreciação da camara dos senhores deputados o seguinte:

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a conceder á camara municipal de Vizeu, para alargamento da rua de S. Francisco, 500 metros quadrados, approximadamente, de terreno contiguo á mesma rua, pertencente á cerca do quartel de infanteria n.º 14.

Art. 2.° Fica sem effeito esta auctorisação se a camara municipal de Vizeu não fizer uso, dentro de um anno, da concessão que lhe for feita em virtude d'esta lei.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 20 de março de 1880.== O deputado, J. Simões Dias.

O sr. Presidente: - Passâmos á discussão do parecer n.° 127.

Leu-se na mesa e é o seguinte:

Parecer n.° 127

Senhores. - A vossa commissão de guerra, a que foi presente o projecto n.° 114 adoptando as ponderações de relatorio do governo e introduzindo uma modificação ao artigo 1.°, é de parecer que seja approvado o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a reorganisar e exercito, repartições e mais estabelecimentos dependentes do ministerio da guerra, não devendo exceder a despeza de 4.330:246$185 réis, proposta no orçamento do proximo futuro anno economico.

§ unico. A força do exercito no tempo de guerra não será inferior a 80:000 homens, e no tempo de paz a 30:000 homens.

Art. 2.° É igualmente o governo auctorisado a organisar as reservas do exercito, em conformidade com a carta de lei de 9 de setembro de 1868.

§ unico. A organisação do serviço das reservas não deverá começar a vigorar antes de 1 de julho de 1881, ficando dependente de approvação das côrtes a despeza que possa occasionar.

Art. 3.° O governo dará conta ás côrtes, na proxima sessão legislativa, do uso que tiver feito desta auctcrisação.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das commissões, 28 de maio de 1880.== Marquez de Fronteira, vencido = Fortunato José Barreiros = Antonio José de Mello e Saldanha = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello (com declaração) = José Manços dó Faria = Augusto Xavier Palmeirim = José Joaquim de Castro = D. Luiz da Camara Leme, (com declarações) = Visconde de S. Januario = Antonio Florencio de Sousa Pinto, relator.

Projecto de lei n.° 114

Artigo 1.° É o governo auctorisado a reorganisar o exercito, repartições e mais estabelecimentos dependentes do ministerio da guerra, não devendo exceder a despeza de 4.330:246$185 réis, proposta no orçamento do proximo futuro anno economico.

Art. 2.° É igualmente o governo auctorisado a organisar as reservas do exercito, em conformidade com a carta de lei de 9 de setembro de 1868.

§ unico. A organisação do serviço das reservas não deverá começar a vigorar antes de 1 de julho de 1881, ficando dependente de approvação das côrtes a despeza que possa occasionar.

Art. 3.° O governo dará conta ás côrtes, na proxima sessão legislativa, do uso que tiver feito d'esta auctcrisação.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 24 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = Antonio José d'Avila, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 201-A

Senhores. - O actual plano de organisação da força militar do nosso paiz data de 1864, salvo as alterações introduzidas ulteriormente nas armas de artilheria e engenheria. Do então para cá são recorridos quatorze annos, e tantas e tão profundas têem sido as transformações por que tem passado a maneira de combater dos exercitos, e na todas as nações têem tratado De os reorganizar, excepto Portugal, que se tem conservado indifferente a estas evoluções, e como que estranho ao conhecimento e das causas que as determinaram.

O problema é, na verdade, complexo e difficil de resolver, principalmente no nosso paiz que tem de attender, primeiro que tudo, ao seu estado financeiro. Não é possivel, porém, continuar assim, e urge providenciar para que um dia não tenhamos que arrepender-nos da nossa incuria; tanto mais, que estou convencido de que, com uma zelosa administração e fiscalisação, poderemos realisar importantes economias, que, se não cobrem todas as despezas, podem comtudo concorrer poderosamente para a melhor organisação dos differentes serviços do ministerio da guerra.

A organisação do nosso exercito, attendendo ao papel que elle naturalmente terá a desempenhar n'um caso de guerra, deve ser intentada de modo que possa dividir-se e grupar-se harmonicamente as dififerentes armas, dotando cada unidade tactica com os serviços e accessarios indispensaveis; de maneira que a sua mobilisação seja não só possivel, mas facil e rapida, como impreterrivelmente
é exigido pelo curto espaço de tempo que actualmente medeia entre a declaração do guerra e o rompimento das hostilidades.

Á organisação do exercite segue-se, mui naturalmente, tratar da organisação das reservas. Sem esta, ficaria aquella incompleta.

Varias tentativas têem sido feitas nesta sentido desde 1849, mas infelizmente com pouco resultado. Ao venerando marquez de Sá da Bandeira devemos os primeiro passos para a realisação de alguma cousa util, porque sujeitou á reserva não só as praças que deixara, e efectivo do exercito, mas todos os mancebos que são sorteados e não são chamados ao serviço activo. Conseguiu-se, certamente, obter maior numero de homens a quem é imposta a obri-

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gação de servir na reserva e de concorrer para a defeza do paiz, mas continuaram a subsistir as mesmas difficuldades de execução, por não ter sido estabelecida a maneira de ministrar áquelle pessoal á instrucção indispensavel, nem se haver definido a sua organisação.

Entendo que este importante assumpto não póde nem deve ser adiado por mais tempo, muito mais estando convencido de ser esta uma das primeiras necessidades militares do nosso paiz.

Na organisação das reservas deve attender-se ao duplo fim de effectuar rapidamente a mbilisação do exercito activo, e permittir um augmento no seu effectivo tendente a eleval-o á força indispensavel para a defeza. Esta organisacão deverá ainda ser subordinada á condição de ser acceitavel pela população, não lhe impondo encargos1 desnecessarios, e não inhibindo qualquer cidadão do livre exercicio dos seus direitos e occupações civis, e alem disso não trazer grande augmento de despeza, quasi sempre inevitavel quando se trata de implantar de novo qualquer serviço publico.

Não obstante ter sido incumbido o estudo destes importantes assumptos a uma commissão de officiaes muito conhecedores das questões militares, e de se ter ella occupado d'este estudo com a mais louvavel solicitude, o complexo de similhantes trabalhos, que importam uma reorganisação completa de todos os serviços da dependencia deste ministerio, não permittiu que eu podesse effectuar o exame e apreciação necessaria dos mesmos trabalhos, para que podesse apresentar, desde já, com segurança, á approvação do parlamento, negocio de tamanho alcance e magnitude. Limito-me, portanto, a submetter ao vosso esclarecido exame a seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a reorganisar o exercito, repartições e mais estabelecimentos dependentes do ministerio da guerra, não devendo exceder a despeza de 4.330:650$131 réis, proposta no orçamento do proximo futuro anno economico.

Art. 2.° É igualmente o governo auctorisado a organisar as reservas do exercito, em conformidade com a carta de lei de 9 de setembro de 1868.

§ unico. A organisação do serviço das reservas não deverá começar a vigorar antes de 1 de julho de 1881, ficando dependente de approvação das côrtes a despeza que possa occasionar.

Art. 3.° O governo dará conta ás côrtes, na proxima sessão legislativa, do uso que tiver feito d'esta auctorisação.

Secretaria d'estado dos negocios da guerra, 10 de maio de 1880. = João Chrysostomo de Abreu e Sousa.

O sr. Fontes Pereira de Mello: - V. exa. e a camara comprehendem que na altura em que está a sessão e do modo por que eu vejo que os negocios vão caminhando, talvez mais rapidamente do que conviria, não posso demorar-me em considerações sobre o assumpto de que se trata; mas tem elle tanta importancia, e um negocio de tanta gravidado, que espero me será permittido apresentar algumas reflexões, solicitando do nobre ministro da guerra explicações que possam habilitar-me a modificar talvez as minhas opiniões e os meus receios, e a votar o projecto.

Trata-se de uma auctorisação ou de um voto de confiança puro e simples, com pequenissimas restricções, sobre um dos assumptos de administração mais importantes que ha no paiz - que é a reforma do nosso exercito e a de todas as repartições e estabelecimentos dependentes do ministerio da guerra.

Esta auctorisação é tão larga, é tão vasta, que me parece valer a pena que a camara se demore alguns instantes, ao menos, a consideral-a. (Apoiados.}

Alem de outras duvidas que, nascem da natureza do projecto e das suas disposições, tenho uma que nasce da interpretação geral da lei sobre votos de confiança, da pratica seguida constantemente a este respeito e dos precedentes parlamentares e governamentaes.

Todos sabem que, por maior que seja a confiança que um parlamento possa ter no ministro que dirige uma repartição do estado, tal confiança desapparece logo que esse ministro, por qualquer circumstancia que não esteja na vontade d'elle e que dependa de condições occasionaes, se retira do ministerio.

Os precedentes parlamentares são que os votos de confiança ou auctorisações se concedem não á pessoa de tal ou tal ministro, mas á entidade governo.

Tanto assim, que mesmo no assumpto de que se trata, me lembro agora de uma reforma do exercito que foi feita por um ministro differente d'aquelle a quem se concedeu auctorisação para esse fim!

Eu tenho muita confiança na capacidade e boa vontade do nobre ministro da guerra, mas não deposito igual confiança na capacidade e boa vontade do ministro X ou Y que succeder a s. exa., que não sei quem é, que poderão merecer tambem ao parlamento confiança absolutamente nenhuma.

Lembro-me agora, como disse, da auctorisação que foi concedida em 1849, se não me engano, ao ministro da guerra de então, visconde de Ourem, e de que se aproveitou o seu successor Adriano Mauricio Guilherme Ferreri, o qual publicou o decreto de 20 de dezembro de 1849, relativo á reforma do exercito e repartições dependentes do ministerio da guerra.

A camara vê que não é nem má vontade, nem desconfiança da capacidade do actual sr. ministro da guerra o que me leva a duvidar conceder-lhe este voto, que não é pessoal.

E quando se diz aqui - governo - não quer dizer o sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa, mas sim o ministro da guerra que exercer essas funcções, quando se fizer a reforma que se vae votar.

Posta de parte esta questão, que é importante, e que me colloca mais á minha vontade, porque, como disse, não é ao sr. João Chrysostomo, cuja capacidade não contesto, que eu me refiro, declaro que não posso votar a auctorisação pedida.

E não se supponha que seja por espirito de opppsição facciosa da minha parte que eu nego esta auctorisação ao governo; mas porque não sei qual ha de ser o governo que se ha de aproveitar d'esta auctorisação.

Pondo de parte estas considerações, vou entrar na apreciação do projecto.

Desejo lembrar á camara, que o assumpto de que se trata é de tão vasta importancia, affecta tantos e tão valiosos interesses, prende com tantos e tão importantissimos estabelecimentos litterarios e industriaes, com tantas repartições administrativas e estabelecimentos propriamente militares, que me parece que o sr. ministro da guerra, levado pelo espirito de condescendencia, e conhecendo que o meu intento não é hostilisar o governo, procederia muito melhor se se reservasse para na proxima sessão legislativa, para a qual já não chegam a faltar sete mezes, tratar de trazer á camara uma reforma completa d'esses estabelecimentos, feita em bases solidas, para sobre ella assentar então a reforma do exercito.

Assim sabiá a camara o que votava; mas dar um voto de confiança a um ministro, que não se sabe quem será, para se fazer uma reforma do exercito, não me parece muito conveniente.

A primeira cousa de que se carece para se fazer uma reforma no exercito, é reformar a lei do recrutamento. A não ser- assim, essa reforma não satisfaz em cousa alguma. Esta medida de pequena importancia, para que se pede auctorisação, póde dar algum resultado; mas debaixo do ponto de vista de uma larga reforma do exercito, não satisfaz, não póde satisfazer.

A lei do recrutamento, que foi apresentada na outra ca-

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mara, não póde ser ali discutida nem approvada; por consequencia, vigora a lei existente.

É claro, portanto, que o governo ha de modelar a sua reforma pela legislação vigente, porque não póde ir buscar ao projecto que está na outra casa do parlamento alguma medida util que ali haja.

Á reforma ha de ser feita em virtude do voto do confiança dado pelo parlamento; por conseguinte, não póde deixar de se fazer senão tendo por base a legislação vigente, que é a lei que eu reputo defeituosa, e cuja alteração eu tive a honra de propor ás côrtes.

Se o actual governo não fizer essa alteração, falta-lhe a base essencial para que se faça uma reforma conveniente.

Não me parece, pois, que haja vantagem alguma em que o sr. ministro da guerra esteja a fazer reformas successivas sobre assumpto tão grave, é que prende tanto com interesses tão elevados.

Depois de feita a reforma da lei do recrutamento é que se deve fazer então a reforma do exercito.

Parece-me que era mais util que se esperasse pela lei do recrutamento, e sobre as bases que ella assentasse fazer a reforma do exercito, de maneira conveniente e util, reforma que, a meu ver, não se póde fazer n'estss condições, sem se ter votado primeiro a nova lei do recrutamento.

Ora, esta lei nem se chegou a começar a discutir, e,por consequencia, é necessario que venha outra cessão legislativa para se votar.

Pergunto eu, se feita a reforma da )ei do recrutamento não haverá nada a alterar na reforma do exercito que s. exa. quer fazer, se lhe votaram a auctorisação que pede n'este projecto de lei?

Creio que se não poderá affiançar que nada haverá a reformar na nova reforma, votada que for aquella lei, porque ha de prender com a organisação das reservas, com o modo de fazer a instrucção do exercito, com o tempo do serviço, com o numero de praças de pret, n'uma palavra, com um grande numero de serviços, e isso nscessariamente, inevitavelmente, ha de trazer como consequencia alterações na reforma que o sr. ministro da guerra quer fazer na organisação da força armada.

Tenho outra explicação a pedir ao sr. ministro, e de certo não devem surprehender a camara, nem s. exa., as minhas perguntas, que aliás já tive a honra de dirigir ao sr. ministro na commissão de guerra; por consequencia, s. exa. está prevenido sobre os assumptos para os quaes tenho de chamar a sua attenção perante a camara, o que por motivos que são obvios não posso dispensar do fazer.

Todos têem as suas responsabilidades pessoaes, e eu tambem tenho as minhas, e não quero contribuir com o meu voto para cousas que reputo perigosas, ou que pelo menos podem ser muito inconvenientes.

Todas as organisacões do exercito, que se têem feito ha muito tempo, partem de um principio que julgo errado. Começa-se por estabelecer a força do exercito em pé de paz, depois é que se trata da organisação do que se chama, em termos technicos, pé de guerra ou mobilisação de exercito. Este systema não é adoptado em parte alguma, e, como disse, reputo-o errado.

Votâmos o pé de paz primeiro que tudo, como se o exercito fosse um instrumento creado para a paz. Se nos assegurarem uma paz perpetua sem duvida poderemos dispensar completamente o exercito, e limitar-nos a ter a força necessaria para fazer a policia no pais; poupavamos assim ao thesouro sommas avultadissimas, e davamos á agricultura e outras industrias um grande numero de braços que lhe estão sequestrados pelo serviço militar. Mas a verdade é que não podemos deixar de ter exercito, e como isto é uma necessidade fatal, o nosso devem é organisal-o como deve ser.

Dizia eu que se fixava primeiro o pé de paz, e depois e que se tratava do pé de guerra, e que julgava isto um erro. Talvez a alguem pareça isto uma questão pueril ou do simples methodo; eu, porém, tenho-a como fundamental, por isso mesmo é que sobre ella insisto.

Póde tambem parecer... e seja-me permittido interromper-me a mina mesmo n'este monento, para dizer que póde haver quem supponha que pretendo crear embaraços ao andamento do projecto em discussão; mas eu não tenho culpa de que á ultima hora, depois de estar aberta a sessão legislativa desde 2 de janeiro, tendo-se tratado n'este periodo de perto de seis mezes muita cousa insignificante, no ultimo dia da sessão é que a reforma do exercito e das repartições e estabelecimentos dependentes do ministerio da guerra, assumpto que ninguem julgará de pouca gravidade, venha aqui para ser discutida, não com bases definidas, mas sob a fórma de uma auctorisação pedida pelo governo para esse fim, o que equivale a um amplo voto de confiança (Apoiados.} dado não se sabe a quem. (Apoiados.)

A camara deve, em vista d'este facto, attenuar de certo modo a minha responsabilidade, como a minha consciencia a attenua, por ver que n'esta occasião é que se apresenta ao debate medida tão importante.

E preciso saber qual é a força de que podemos dispor em harmonia com os recursos financeiros e com a população do paiz, quando se de a hypothese de termos que repellir qualquer aggressão estranha.

Por consequencia, os quadros devem ser fixados em harmonia com o pé de guerra, e depois é que deve fixar-se a força do exercito em pé de paz, o que é uma cousa com o caracter inteiramente economico. Não se fazendo isto é melhor deixar as cousas como estão, porque se a organisação actual tem defeitos, não são elles tantos como se pretende inculcar, e evitam-se reformas que podem ser suspeitas (não para mim, que acredito na boa vontade do sr. ministro da guerra) de terem unicamente per fim favorecer certas armas com prejuizo de outras.

Pois não seria melhor que nós soubéssemos antecipadamente, por uma disposição legislativa, que ficasse consignada na lei, e que obrigasse não só o gabinete actual, mas qualquer outro que lhe succedesse, porque estas auctorisações duram até serem revogadas, quaes as bases em que o sr. ministro assentava a sua organisação, qual a força que julgava indispensavel para o pé de guerra, e qual o desenvolvimento que queria dar ás armas especiaes?

Todos sabem que a artilharia, nos ultimos annos, tem tomado um grande incremento na guerra; nós precisamos, pelo menos, trezentas bocas de fogo, suppondo que o exercito é de 100:000 homens, e pergunto eu: Quer o sr. ministro da guerra organisar o exercito em harmonia com esta necessidade, ou quer limitar-se a fazer alguma cousa que, embora de momento pareça melhor, sirva apenas para embaraçar qualquer organisação futura?

Qual é a organisação que s. exa. quer dar ao corpo de engenheria? Julga sufficiente o batalhão de engenheiros como está organisado, apenas com o augmento das companhias, que eu lhe introduzi como ministro da guerra?

Qual é a opinião de s. exa. a respeito do corpo de estado maior? Quer acabar cem elle como têem feito algumas nações? Quer conserval-o? Quer organisar uma entidade nova onde entrem as capacidades das diversas armas?

Tudo isto é preciso saber-se, e parece-me que vale a pena demorarmo-nos em assumpto de tanta gravidade.

Todos igualmente o sabem, não só os militares, mas os que o não são, porque a imprensa muitas vezes o diz, quaes são pouco mais ou menos os pontos sobre que versam as organisacões militares na Europa, qual é a missão que cada uma das armas representa na guerra.

A arma de cavallaria, per exemplo, houve um tempo, depois da guerra franco-prussiana, que se dizia que a cavallaria era uma arma quasi inutil, porque não se podiam dar

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cargas de cavallaria, em virtude dos melhoramentos introduzidos nas armas de infanteria, que impediam que se chegassem a realisar as cargas de cavallaria: e hoje, faz-se dessa arma uma opinião exactamente contraria, por isso que se suppõe que a cavallaria tem uma importantissima missão a desempenhar.

Quer o governo fazer a reforma, augmentando alguns regimentos? Isso não serve de nada, não é reforma.

Sr. presidente, desde o momento que o governo deseja fazer a reforma do exercito, mantendo se dentro do estricto limite da verba auctorisada para o ministerio da guerra, não é possivel fazer-se uma reforma como ella deve fazer-se. (Apoiados.)

Póde a camara estar certa que a reforma só se póde fazer melhorando uns á custa de outros; entenderá o governo que a infanteria é sufficiente, que um corpo deve ter mais ou menos companhias, quatro em vez de oito? Para isso não é necessaria a lei.

Comprehende o governo n'estas reformas as escolas, para as quaes apresentou lei especial? Fica o governo auctorisado a reformar todas as escolas, a do exercito, a de mathematica de Lisboa e Porto? Servem os preparatorios para os estudos militares como estão?

Eu poderia demorar-me em largas considerações a tal respeito, e tomar a attenção da camara, se o meu fim fosse outro; mas eu não quero abusar do meu direito, nem tão pouco abusar da paciencia da camara; tambem não quero prejudicar por modo nenhum a discussão de outro qualquer projecto importante que possa haver sobre a mesa para se discutir, e de certo os ha; eu só o que desejei foi chamar a attenção da camara e do governo: prevejo bem qual será a resposta do illustre ministro da guerra, e se s. exa. quizesse, no interesse do exercito, no seu proprio interesse, adiar a discussão deste projecto, que significa um presente fatal que se daria ao governo, projecto que é uma fonte de difficuldades e embaraços para se poder fazer? reforma, no limite estreito da despeza que lhe está votado, e que é uma seria difficuldade ainda maior para quem, como s. exa., é dotado de um espirito recto, porque quando se fazem estas reformas ha sempre -beneficios para uns, em prejuizos de outros. Os militares já se queixam que as promoções não se fazem de maneira que se mantenha o equilibrio, permitta-se me a expressão, entre as diversas armas.

A lei vigente não a fiz eu, por conseguinte não tenho de que me defender n'esse ponto; mas pelo menos ninguem tem rasão de se queixar dos poderes publicos da actualidade, e se isto passar ha de haver muito quem se queixe do nobre ministro.

É preciso que se convençam de que eu não quero crear difficuldades ao governo; porque se o meu fim fosse crear difficuldades, fallava agora até ás sete horas,

O que é verdade, comtudo, é que este projecto podia ficar para o anno. Pois não ficou para o anno a proposta da lei do recrutamento, que não é menos importante do que este, porque a lei do recrutamento é a base de toda a organisação do exercito? Porque não póde este então ficar?! E sem mesmo só tratar de discutir reformas que occupariam grandemente a attenção da camara, pede-se-lhe um voto de confiança, e um voto de confiança sem se saber a quem é dado, o que é um absurdo. Eu não quero com isto dizer que o nobre ministro sáia do ministerio, dentro de pouco tempo, nem o desejo; mas póde sair assim como póde não sair, porque isso não está na minha mão, nem na mão de s. exa., nem na mão de ninguem.

Portanto, só o nobre ministro quizesse seguir o meu conselho, e eu receio que não queira, porque sei o que são os melindres que ás vezes se tem, pedir-lhe-ia que concordasse no adiamento d'este projecto; porque me parecia melhor que a camara passasse a occupar-se de outros assumptos importantes que estão sobre a mesa, alguns mais urgentes e sobre os quaes mais facilmente a camara se poderá pronunciar.

Hão proponho o adiamento, mesmo porque ultimamente me tenho posto no costume de não propor cousa nenhuma; mas se alguem o propozer voto-o.

Muito menos proponho a rejeição do projecto; mas se, apesar d'estas considerações que fiz, o governo persistir em que elle seja hoje discutido, terei então de votar contra o projecto.

O sr. Presidente: - Devo declarar á camara, para sua informação, o seguinte:

Estava em discussão o parecer n.° 85 sobre o projecto de lei n.° 66, que diz respeito á organisação do quadro da direcção geral das alfandegas. O sr. ministro da fazenda teve que sair da camara e, por consequencia, foi suspensa a discussão desse parecer-e entrou em discussão o parecer, n.° 135, que se refere ao prolongamento cio caminho de ferro do Douro; mas o sr. Vaz Preto ponderou, e verificou-se que, com todo o fundamento, não tinham decorrido ainda os tres dias exigidos pelo nosso regimento para a discussão d'aquelle parecer. Em consequencia d'esta observação eu declarei que esse parecer entraria na ordem do dia de hoje, que é quando termina o mencionado praso.

Não se discutiu logo no principio da sessão de hoje, porque hão estava presente o sr. ministro das obras publicas; mas estava o sr. ministro da guerra, e por isso se discutiram alguns, pareceres relativos ao seu ministerio, e se começou a tratar d'este. Comtudo, o que me parecia regular era continuarmos na discussão do parecer n.° 85, que fora interrompida na ultima sessão por ter saído da saia o sr. ministro da fazenda, ou então discutir se o parecer n.º 135, em conformidade com o que foi resolvido peia camara. (Apoiados.)

O sr. Ministro da Guerra (João Chrysostomo): - Peço licença para declarar a v. exa. e á camara que o governo não tem duvida em. que este projecto fique adiado.

Não seria, por certo, possivel, proximo da hora do encerramento da camara, tratar tão importante questão com o desenvolvimento necessario, visto o digno par que acaba de fallar querer levantar discussão sobre ella, com uma certa largueza.

Em similhante estreiteza de tempo, e havendo ainda hoje outros projectos urgentes para entrar em discussão, mal poderia eu dispor do tempo indispensavel para responder a todas as observações e duvidas do digno par, ou de qualquer outro membro d'esta casa que, porventura, quizesse tomar parte n'esta discussão; de sorte que falta o tempo necessario para que eu, manifestando qual é o pensamento do governo, e as bases que pretende adoptar na organisação do exercito, prestasse todas as explicações desejadas.

Este projecto está dado para ordem do dia ha muitas sessões; eu reputo-o de maximo interesse para o exercita e para a nação.

São graves os prejuizos, inconvenientes e perigos que podem resultar da conservação do actual estado do cousas. Emquanto que todas as nações da Europa têem reformado as suas instituições militares nos ultimos quinze annos, pondo-as de accordo com os modernos principios da arte da guerra e com os progressos e alterações introduzidos na tactica e armamento das differentes armas, nós conservamos a organisação de 1864.

Unia das primeiras necessidades do paiz é organisar as suas finanças;, mus não é menor a necessidade de organisar a força publica, e entendo que o ministro da guerra incorreria em grande responsabilidade se não empenhasse todos os sei]S esforços para chegar a este resultado.

O governo não podia contar que este projecto viesse á discussão no ultimo dia dos trabalhas da camara dos dignos pares; mas, uma vez que se levantam objecções e ha quem deseje ser amplamente esclarecido sobre o assumpto, eu não devia de forma alguma, insistir em que esta discussão proseguisse, não havendo o tempo necessario para prestar to-

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dos os esclarecimentos desejados. (vozes: - Muito bom.)

Cumpria-me responder completamente ás observantes do digno par, o sr. Fontes Pereira de Mello, tanto mais que o meu illustre predecessor conhece melhor que ninguem os negocios da guerra, cuja pasta geriu por tantos annos: mas a escassez de tempo não me permittiria occupar d'este assumpto do modo o mais conveniente e satisfactorio. E verdade que na commissão de guerra prestei alguns esclarecimentos, mas agora seria preciso reproduzil-os com maior desenvolvimento, e responder de novo ás objecções do digno par, vista a sua insistencia.

Ficando adiada esta discussão, não posso comtudo deixar de responder a uma observação do digno par o sr. Fontes Pereira de Mello. Agradecendo as expressões benévolas e lisonjeiras com que s. exa. me quiz honrar, parece-me todavia que s. exa. não fez inteira justiça aos meus sentimentos, pois acrercentou que a pedida auctorisação era um presente funesto para mini, pelas dificuldades e desgostos que d'ahi me poderiam provir, e que, portanto, eu deveria ficar satisfeito de ser alliviado d'esse penoso encargo. Permitta-se s. exa. que eu lhe diga que, quando se trata do cumprimento de um dever, não avalio as minhas forças nem attendo aos incommodos e dissabores que mo póde causar: preencho-o do modo que posso e sei, pendo toda a minha vontade; e quando se trata de reformas de incontestavel utilidade para a nação, não considero se ellas vão ferir muitos ou poucos interesses; o que estudo, o que procuro saber é se o projecto tem vantagens para o paiz, se elle é opportuno e merece ser adoptado.

Uma organisação do exercito, por mais vantajosa que seja ao paiz, não póde satisfazer a todos es interesses particulares, e essa é a sorte de todas as grandes medidas, assim como não ha nenhuma capaz de acabar com todos os abusos. No emtanto, tenho a convicção do que prestava um bom serviço ao paiz, procurando, com o auxilio de pessoas competentes, não deixar para mais tarde a organisação do exercito, que reputo importante e urgente, e cuidei que, neste patriotico intento, encontraria a ccadjuvação e louvor de todos os homens que conhecem bem as necessidades do exercito e que o desejam levantado á altura da sua nobre missão.

Concluindo, repito que não insisto por continuar hoje a discussão deste projecto, em vista do que tenho dito, reservando para mais tarde, em occasião mais opportuna, apresentar ás côrtes as propostas necessarias sobre este assumpto.

(O orador não reviu os seus discursos na, presente sessão.)

O sr. Presidente: - Em vista da declaração que acaba de fazer o sr. ministro da guerra, fica adiado e parecer n.° 127, e passámos á discussão do parecer n.º 135.

Leu-se na mesa, e é o seguinte:

Parecer n.° 135

Senhores. - As commissões de fazenda e de obras publicas, reunidas, examinaram a proposição de lei, vinda da camara dos senhores deputados, tendo por objecto:

1.° Que se preceitue por lei, para que o prolongamento da linha ferrea do Douro, nos limites do Pinhão á Barca de Alva, faca parte da rede dos caminhos de erro portuguezes de primeira ordem, e a entroncar, de accordo cem o governo da nação vizinha, na linha ferrea de Salamanca ao Douro.

2.° Que só auctorise o governo a construir a parte d'este prolongamento, que vae desde o Pinhão á foz do Tua.

3.° Que se auctorise igualmente a construção de um ramal que ligue a estação do Pinheiro, na cidade do Porto, com a margem do rio Douro.

As commissões julgam do seu rigoroso dever observar, que o caminho de ferro do Douro, aos limites d'aquella cidade á fronteira, já de muito se póde dizer de primeira ordem, e sempre assim foi considerado, e porventura um dos mais importantes do nosso paiz, por se darem a seu respeito todos os requisitos necessarios, e que dão direito a similhante clarificação; entretanto, as commissões concordam em que o facto se legalise.

Concordam igualmente na auctorisação para se construir o lanço do Pinhão á foz do Tua; todavia, devem observar que é da mais urgente e instante necessidade a construcção do resto d'aquella linha da rede dos caminhos de ferro portugueses até á fronteira, nas proximidades da Barca de Alva; e que cumpre ao governo empregar todos os esforços e diligencias ao seu alcance para o conseguir com a maior brevidade possivel, e tambem o entroncamento ou ligação a mais directa com o caminho de ferro de Salamanca, mediante a indispensavel e previa convenção com o governo do reino vizinho.

As commissões não entram em outras apreciações com respeito á proposição de lei já citada, por falta de tempo, e tambem porque na proposta inicial do governo n.°185-D vem os fundamentos da dita proposição de lei, desenvolvividos com o necessario detalhe.

Em vista de quanto fica ponderado, são as vossas commissões de parecer que, sob as condições que ficam exaradas, a referida proposição póde ser approvada e convertida no seguinte:

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° Faz parte da rede de caminhos de ferro portuguezes de primeira ordem, o prolongamento da linha ferrea do Douro, do Pinhão á Barca de Alva, a entroncaria linha ferrea de Salamanca ao Douro, desde que, por accordo com o governo de Hespanha, se fixe de modo conveniente o traçado desta linha á fronteira portugueza, e o ponto do seu respectivo entroncamento.

Art. 2.° É auctorisado o governo a mandar construir por empreitada geral um ramal de caminho de ferro, que ligue a estacão do Pinheiro, na cidade do Porto, com a margem do Douro no ponto que os estudos determinarem.

§ unico. As despezas com esta construcção sairão da verba consignada no orçamento extraordinario do ministerio das obras publicas, commercio e industria, para caminhos de ferro.

Art. 3.° É igualmente auctorisado o governo a construir o prolongamento do caminho de ferro do Douro, do Pinhão á Barca de Alva, podendo emprehender a construcção até á foz do Tua, independentemente do accordo de que trata o artigo 1.°, mas em harmonia com os artigos seguintes d'esta lei.

Art. 4.° A construcção d'este prolongamento será feita por empreitada geral, relativamente a cada secção ou lanço, adjudicada em hasta publica, precedendo concurso por sessenta dias, e sobre as seguintes bases:

1.º Que a construcção comprehende:

a) O caminho de ferro completo em todas as suas partes, com todas as expropriações, aterros e desaterros, obras de arte, assentamento de vias, estações e todos os edificios accessorios, casas de guarda, barreiras, passagens de nivel, muros de vedação ou sebes, onde forem indispensaveis, e em geral as obras de construcção previstas ou imprevistas, sem excepção ou distincção, que forem necessarias para o completo acabamento da linha ferrea;

b) O estabelecimento de uma linha telegraphica ao lado da linha ferrea, com todos os materiaes e apparelhos necessarios para se estabelecer o bom serviço telegraphico;

c) A collocação de marcos kilométricos e o levantamento do cadastro do caminho de ferro com a descripção das obras de arte e suas dependencias.

2.ª Que as obras mencionadas na base antecedente serão feitas conforme os projectos definitivos existentes no ministerio das obras publicas, depois de approvadas pela junta consultiva de obras publicas e minas.

3.ª Que nenhum individuo ou empreza poderá ser admittido a licitar sem que previamente tenha feito na caixa geral dos depositos, e á ordem do governo, um deposito pro-

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visorio de 10:000$000 réis, em dinheiro ou em titulos de divida publica, pelo seu valor no mercado.

4.ª Que feita a adjudicação, deverá o adjudicatario, sob pena de perda do deposito provisorio, lazer no praso de quinze dias deposito definitivo correspondente a 5 por cento do valor total das obras, conforme o preço contratado, tambem em dinheiro ou em fundos publicos, pelo seu valor no mercado, levando-se em conta o deposito provisorio.

5.ª Que se o deposito definitivo for em titulos da divida publica, poderá o adjudicatario receber os juros desses titulos, e se for em dinheiro, será abonado ao depositante o juro correspondente aos depositos obrigatorios na caixa geral dos depositos.

6.ª Que os pagamentos e todas as mais obrigações do estado e do empreiteiro serão, nos termos do regulamento de 14 de abrir de 1856, regulados pelas clausulas e condições geraes de empreitada a que se refere a portaria de 8 de março de 1861 e mais disposições em vigor.

7.ª Que o governo poderá ceder ao empreiteiro todo o material de construcção que possuir nas linhas do Douro e Minho, e poder dispensar, sendo esse material entregue por inventario e ficando o empreiteiro obrigado a restituil-o no mesmo estado em que o recebeu, ou a pagal:o integralmente ou nas deteriorações que soffrer em relação ao preço do inventario.

8.ª Que, o governo concederá ao empreiteiro o transporte gratuito pelo caminho de ferro do Douro, desde a estação do Pinheiro até á estação mais proxima da secção ou lanço em construcção, de todo o material preciso para a mesma construcção, não tendo porém o empreiteiro direito a reclamações de indemnisação quando por casos imprevistos se interrompa o transito no caminho de ferro.

9.ª Que o governo concederá a isenção de direitos de alfandega a todo o material, utensilios, madeiras e mais objectos que forem necessarios para a construcção da linha.

10.ª Que a base da licitação será o preço kilometrico da construcção.

Art. 5.° Se para cada empreitada não convierem os preços offerecidos em praça, poderá o governo deixar de fazer a adjudicação, abrindo novo concurso por trinta dias.

§ l.° Se ainda neste segundo concurso não forem offerecidos preços acceitaveis, o governo fará a construcção por administração, estabelecendo empreitadas parciaes e pequenas tarefas, na conformidade dos regulamentos em vigor.

§ 2.° A adjudicação nunca poderá ser feita por preço superior ao dos orçamentos approvados.

Art. 6.° É o governo auctorisado a levantar, pelos meios que julgar mais convenientes, os fundos necessarios para a execução desta lei, sem prejuizo de situação do thesouro.

§ 1.° Para a construcção da secção desde o Pinhão até á foz do Tua são applicados os seguintes recursos extraordinarios no anno economico proximo futuro:

l.º O capital que da companhia real dos caminhos de ferro portuguezes receber o estado como indemnisação pelo uso da estação do Porto;

2.º Os carris em deposito e de que possa dispor-se, sendo cedidos aos constructores pelo seu valor no mercado;

3.° As sobras dos diversos capitulos dos orçamentos ordinario e extraordinario do ministerio das obras publicas, commercio e industria.

§.2.° Todo o augmento do producto liquido do caminho de ferro do Douro, alem do que se acha calculado na orçamento de 1880-1881, será applicado ao prolongamento do mesmo caminho de ferro, constituindo annuidade representativa do capital que lhe corresponder.

§ 3.° O governo consignará todos os annos no orçamento as verbas necessarias para occorrer aos encargos das operações necessarias a fim de concluir até á fronteira o caminho de ferro do Douro.

Art. 7.° O governo dará annualmente conta ás côrtes do uso que fizer dás auctorisacões que lhe são conferidas por esta lei.

Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das commissões reunidas, 3 de junho de 1880. = Marguez de Ficalho = José de Mello Gouveia = Sebastião Lopes, de Calheiros E Menezes = Thomás de Carvalho = Visconde de S. Januario = J. J. de Mendonça Cortez. = Conde de Castro = Antonio de Serpa Pimentel (com declaração) = Mathias de Carvalho, e Vasconcellos = Joaquim Gonçalves Mamede = Marino João Franzini = Luiz de Campos = Barros e Sá = Placido de Abreu.

Projecto de lei n.º 119

Artigo 1.° Faz parte da rede de caminhos de feiro portuguezes de primeira ordem, o prolongamento da linha ferrea do Douro, do Pinhão á Barca de Alva, a entroncar na linha ferrea de Salamanca ao Douro, desde, que, por accordo com o governo de Hespanha, se fixe de modo conveniente o traçado d'esta linha á fronteira portugueza, e o ponto do seu respectivo entroncamento.

Art. 2.° É auctorisado o governo a mandar construir por empreitada geral um ramal de caminho de ferro, que ligue a estação do Pinheiro, na cidade do Porto, com a margem do Douro, no ponto que os estudos determinarem.

§ unico. As despezas com esta construcção sairão da verba consignada no orçamento extraordinario do ministerio das obras publicas, commercio e industria, para caminhos de ferro.

Art. 3.°. É igualmente auctorisado o governo a construir o prolongamento do caminho de ferro do Douro, do Pinhão á Barca de Alva, podendo emprehender a construcção até á foz do Tua, independentemente do accordo de que trata o artigo l.º, mas em harmonia com os artigos seguintes d'esta lei.

Art. 4.° A construcção d'este, prolongamento será feita por empreitada geral relativamente a cada secção ou lanço, adjudicada em hasta publica, precedendo concurso por sessenta dias, e sobre as seguintes bases:

l.ª Que a construcção comprehende:

a) O caminho de ferro completo em todas as suas partes, com todas as expropriações, aterros e desaterros, obras de arte, assentamento de vias, estações e todos os edificios accessorios, casas de guarda, barreiras, passagens de nivel, muros de vedação ou sebes, onde forem indispensaveis, e em geral as obras de construcção previstas ou imprevistas, sem excepção ou distincção, que forem necessarias para o completo acabamento da linha ferrea;

b) O estabelecimento de uma linha telegraphica ao lado da linha ferrea, com todos os materiaes e apparelhos necessarios para se estabelecer o bom serviço telegraphico;

c) A collocação de marcos kilometricos e o levantamento do cadastro do caminho de ferro com a descripção das obras de arte e suas dependencias.

2.º Que as obras mencionadas na base antecedente serão feitas conforme os projectos definitivos existentes no ministerio das obras publicas, depois de approvadas pela junta consultiva de obras publicas e minas.

3.ª Que nenhum individuo ou empreza poderá ser admittido a licitar, sem que previamente tenha feito na caixa geral dos depositos, e á ordem do governo, um deposito provisorio correspondente a 3 por cento do orçamento respectivo em dinheiro, ou em titulos da divida publica, pelo seu valor no mercado.

4.ª Que feita a adjudicação, deverá o adjudicatario, sob pena de perda do deposito provisorio, fazer no praso de quinze dias deposito definitivo correspondente a 5 por cento do valor total das obras, conforme o preço contratado, tambem em dinheiro ou em fundos publicos, pelo seu valor no mercado, levando-se em conta o deposito provisorio.

5.a Que se o deposito definitivo for em titulos da divida publica, poderá o adjudicatario receber os juros desses ti-

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tulos, e se for em dinheiro, será abonado ao depositante o juro correspondente aos depositos obrigatorios na caixa geral dos depositos.

6.ª Que os pagamentos e todas as mais obrigações do estado e do empreiteiro serão nos termos do regulamento de 14 de abril de 1853, pelas clausulas e condições geraes de empreitada, a que se refere a portaria de 8 de março de 1861 e mais disposições em vigor.

7.ª Que o governo poderá ceder ao empreiteiro todo o material de construcção que possuir nas linhas do Douro e Minho, e poder dispensar, sendo esse material entrega; por inventario e ficando o empreiteiro obrigado a restituil-o no mesmo estado em que o recebeu, ou a pagal-o integralmente ou nas deteriorações que soffrer em relação ao preço do inventario.

8.ª Que o governo concederá ao empreiteiro o transporte gratuito pelo caminho de ferro do Douro, desde a estação do Pinheiro até á estação mais proxima da secção ou lanço em construcção, de todo o material preciso para a mesma construcção, não tendo, porém, o empreiteiro direito a reclamações de indemnisação, quando por casos imprevistos se interrompa o transito no caminho de ferro.

9.ª Que o governo concederá a isenção de direitos de alfandega a todo o material, utensilios, madeiras e mais objectos que forem necessarios para a constracção da linha.

10.ª Que a base da licitação será e preço Kilometrico da construcção.

Art. 5.° Se para cada empreitada não convierem os preços offerecidos em praça, poderá o governo deixar de fazer a adjudicação, abrindo novo concurso por trinta dias.

§ 1.° Se ainda neste segundo concurso não forem offerecidos preços acceitaveis, o governo fará a construção por administração, estabelecendo empreitadas parciaes e pequenas tarefas na conformidade dos regulamentos em vigor.

§ 2.° A adjudicação nunca poderá ser feita por preço superior ao dos orçamentos approvados.

Art. 6.° É o governo auctorisado a levantar, pelos meios que julgar mais convenientes, os fundos necessarios para a execução d'esta lei, sem prejuizo da situação do thesouro.

§ 1.° Para a construcção da secção desde o Pinhão até á foz do Tua são applicados os seguintes recursos extraordinarios no anno economico proximo future.

1.° O capital que da companhia real dos caminhos de ferro portuguezes receber o estado como indemnisação pelo uso da estação do Porto;

2.° Os carris em deposito e de que possa dispor-se, sendo cedidos aos construtores pelo seu valor no mercado;

3.° As sobras dos diversos capitulos dos orçamentos, ordinario e extraordinario, do ministerio das obra publicas, commercio e industria.

§ 2.° Todo o augmento do producto liquido do caminho de ferro do Douro, alem do que se acha calculado no orçamento de 1880-1881, será applicado ao prolongamento do mesmo caminho de ferro, constituindo annuidade representativa do capital que lhe corresponder.

§ 3.° O governo consignará todos os annos no orçamento as verbas necessarias para occorrer aos encargos das operações necessarias a fim de concluir até á fronteira o caminho de ferro do Douro.

Art. 7.° O governo dará annualmente conta ás côrtes do uso que fizer das auctorisações que lhe são conferidas por esta lei.

Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio dos côrtes, em 31 de maio de 1880. = José Joaguim Fernandes Vaz, presidente = Antonio José d'Avila, deputado secretario = D. Miguel de Noronha, deputado vice-secretario.

Proposta de lei n.º 185-D

Senhores. - Devendo estar concluida dentro ou pouco tempo a construcção do caminho de ferro do Douro até ao Pinhão, convem pensar no prolongamento d'esta linha até á fronteira, sem o que ficariam em grande parte improductivos os capitaes despendidos na construcção já feito, até ao Pinhão, prejudicado e commercio da cidade do Porto e privada a provincia de Traz os Montes da sua principal arteria.

As opiniões mais auctorisados estão boje conformes em reconhecer que a linha do Douro deve ser prolongada até á Barca de Alva, para se ligar com os caminhos de ferro hespanhoes da provincia de Salamanca. Assim os illustres ministros da fazenda e das obras publicas, os srs. Serpa e Lourenço de Carvalho, em um projecto de determinação da rede geral dos caminhos de ferro portuguezes, escreviam:

"O caminho de ferro do Douro... deve tornar-se, continuado desde a Barca de Alva até Salamanca, a principal communicação entre uma vasta e rica região de Hespanha e a praça do Porto."

E classificavam esta linha como de interesse geral entre as linhas transversaes.

O sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa, no seu luminoso relatorio ácerca de caminhos de ferro, dizia:

"Por estes principios, que refutamos incontestaveis, por isso entendemos que os caminhes de ferro ligando. .. o Porte com o interior da peninsula, tendendo a Valladolid, merecem a consideração de primeiras linhas ferreas de Portual, que mais podem influir na prosperidade nacional.

"Assim, as duas linhas longitudinaes do litoral e fronteira, e as tres linhas transversos da valles do Douro, Mondego e Tejo, de que vimos de fallar, são caminhos de ferro de primeira ordem que, em nossa opinião, devem entrar no plano de viação accelerada."

Era portaria de 5 de setembro de 1864 foram os engenheiros Francisco Maria de Sousa Brandão e José Diogo Mascarenhas Mousinho de Albuquerque, nomeados para conjunctamente com os engenheiros Page e Roldan, escolhidos pelo governo hespanhol, estudarem a melhor ligação dos caminhos de ferro de Portugal com os do vizinho reino, devendo ter particularmente em attenção varias linhas, entre as quaes se contém a da Regua á fronteira de leste.

Aquelles engenheiros apresentaram em 1 de novembro de 1864 o seu relatorio, sobre o qual recaiu consulta do extracto conselho de obras publicas em 1 de novembro. O conselho, apresentando um plano geral da rede portugueza, define como "base subordinada á topographia, á defeza e ao serviço dos portos de mar e terra importantes, entre outras linhas, a do Porto, seguindo o valle do Douro á fronteira em direcção a Salamanca".

Emfim os engenheiros Sousa Brandão, Matos e Teixeira de Magalhães, encarregados de estudar a rede portugueza de caminhos de ferro, no seu parecer datado de 21 de fevereiro do corrente anno, entenderam que o prolongamento da linha do Douro até á Barca de Alva pareço natural e necessario, e deve ligar-se com a linha que de Medina del Campo vem a Salamanca.

Finalmente, a distancia do Porto e Salamanca pela Barca de Alva é cerca de 93 kilometros, mais curta que a distancia entre os mesmos pontes peio Pocinho, Villa Franca de Naves e Villar Formoso.

Não parece, pois, que possa haver duvida ácerca da preferencia da linha da Barca de Alva, faltando apenas celebrar com o governo do paiz vizinho um convenio que estabelece o ponto de encontre da nossa linha com as linhas hespanholas.

Fixada a directriz, propõe-se a continuação da construcção desde o Pinhão até ao porto Cachão de Baleira, na extensão de 21:060 metros. Esta obra, conforme os orçamentos, não excederá a 950:000$000 réis sendo o custo medio Kilometrico de 40:000$000 réis. E se as circumstancias do thesouro o consentirem, convirá emprehendel-a no proximo anno economico, tanto para augmentar o rendimento da linha já construida, como para aproveitar o material de construcção que o estado possue, O systsma pro-

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posto de empreitada geral fará que não sejam excedidos os preços dos orçamentos, e, portanto, que o estado saiba exactamente quaes os encargos que contrahe.

A construcção de quasi 3:800 metros de um ramal desde a estação do Pinheiro até ao rio Douro tambem não traz encargos novos, porque basta para lhe fazer face uma parte da verba inscripta no orçamento extraordinario, do ministerio das obras publicas para despezas com linhas ferreas. Essa construcção diminuirá a despeza de exploração e augmentará consideravelmente a receita de toda a linha.

Por este motivo temos a honra de submetter á vossa apreciação a seguinte:

Artigo 1.° Faz parte da rede dos caminhos de ferro portuguezes de primeira ordem o prolongamento da linha ferrea do Douro do Pinhão á Barca de Alva, a entroncar nas linhas ferreas hespanholas da provincia de Salamanca nó ponto que for determinado por accordo com o governo de Hespanha.

Art. 2.° É auctorisado o governo a construir um ramal de caminho de ferro que ligue a estacão do Pinheiro, na cidade do Porto, com a margem do rio Douro.

§ unico. As despezas com esta construcção sairão da verba consignada no orçamento extraordinario do ministerio das obras publicas, commercio e industria para caminhos de ferro.

Art. 3.° É igualmente auctorisado o governo a construir o prolongamento do caminho de ferro do- Douro na extensão de 21:060 metros desde o Pinhão até ao ponto chamado Cachão da Baleira, incluindo o tunnel da mesma denominação.

Art. 4.° A construcção do prolongamento de que trata o artigo antecedente será feita por empreitada geral adjudicada em hasta publica, precedendo concurso por sessenta dias, e sobre as seguintes bases:

l.ª Que a construcção comprehende:

a) O caminho de ferro completo em todas as suas partes, com todas as expropriações, aterros e desaterros, obras de arte, assentamento de vias, estacões e todos os edificios accessorios, casas de guarda, barreiras, passagem de nivel, muros de vedação ou sebes, onde forem indispensaveis, e em geral as obras de construcção previstas ou imprevistas sem excepção ou distincção que forem necessarias para o completo acabamento da linha ferrea;

6) O estabelecimento de uma linha telegraphica ao lado da linha ferrea com todos os materiaes e apparelhos necessarios para se estabelecer o bom serviço telegraphico;

c) A collocação de marcos kilometricos e o levantamento do cadastro do caminho de ferro com a descripção das obras de arte e suas dependencias.

2.ª Que as obras mencionadas na base antecedente serão feitas conforme os projectos definitivos existentes no ministerio das obras publicas depois de approvadas pela junta consultiva de obras publicas e minas.

3.ª Que nenhum individuo ou empreza poderá ser admittido a licitar, sem que previamente tenha feito na caixa geral dos depositos e á ordem do governo um deposito provisorio de 15:000$000 réis em dinheiro, ou em titulos da divida publica pelo seu valor no mercado.

4.ª Que feita a adjudicação deverá o adjudicatario, sob pena de perda do deposito provisorio, fazer no praso de quinze dias deposito definitivo correspondente a 5 por cento do valor total das obras conforme o preço contratado, tambem em dinheiro ou em fundos publicos pelo seu valor no mercado, levando-se em conta o deposito provisorio.

5.ª Que se o deposito definitivo for em titulos de divida publica, poderá o adjudicatario receber os juros desses titulos; e se for em dinheiro será abonado ao depositante o juro correspondente aos depositos obrigatorios na caixa geral dos depositos.

6.ª Que os pagamentos e todas as mais obrigações do estado e do empreiteiro serão regulados pelas clausulas e condições geraes de empreitadas, a que se refere a portaria de 8 de março de 1861.

7.ª Que o governo poderá ceder ao empreiteiro todo o material de construcção que possuir nas linhas do Douro e Minho e poder dispensar, sendo esse material entregue por inventario, e ficando o empreiteiro obrigado a restituil-o no mesmo estado em que o recebeu, ou a pagal-o integralmente, ou as deteriorações que soffrer em relação ao preço do inventario.

8.ª Que o governo concederá ao empreiteiro o transporte gratuito do material preciso para a construcção desde o Porto até ao Pinhão.

9.ª Que o governo concederá a isenção de direitos de alfandega a todo o material, utensilios, madeiras e mais objectos que forem necessarios para a construcção da linha.

10.ª Que a base da licitação será o preço kilometrico da construcção.

Art. 5.º Se não convierem os preços offerecidos em praça poderá o governo deixar de fazer a adjudicação, abrindo novo concurso por sessenta dias.

§ 1.° Se ainda n'este segundo concurso não forem offerecidos preços acceitaveis, o governo fará a construcção por administração.

§ 2.° A adjudicação nunca poderá ser feita por preço superior ao dos orçamentos approvados.

Art. 6.° É o governo auctorisado a levantar, pelos meios que julgar mais convenientes, os fundos necessarios para a execução desta lei.

Art. 7.° O governo dará annualmente conta ás côrtes do uso que fizer das auctorisacões que lhe são conferidas por esta, lei.

Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado das obras publicas, commercio é industria, 4 de maio de l880.= Henrique de Sarros Gomes = Augusto Saraiva de Carvalho.

O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, na ultima sessão pedi eu á camara e a v. exa. que este projecto fosse adiado e dado para ordem do dia de hoje, a fim de se cumprirem as prescripções do regimento e não ser precipitada a discussão. Eu entendi e entendo que projectos de tanta importancia como este, pelo assumpto de que trata, como pela despeza que resulta immediatamente da construcção de tão difficil caminho de ferro, deviam ser votados depois de debate serio e maduro exame.

A minha intenção, quando pedi o adiamento do projecto para, hoje, não foi evitar a sua discussão, pelo contrario, julgando-a de alta conveniencia, quiz que ella tivesse o cunho de seriedade, e que o projecto fosse approvado depois de se mostrar a leviandade dos governos que, deixando no esquecimento um dos melhoramentos vitaes do Porto, o tem prejudicado sobremaneira.

A linha do Douro, é uma linha de primeira ordem, era uma das melhores linhas internacionaes para nos pôr em communicação com toda a Europa, se não se tivesse mandado proceder á construcção da linha da Beira Alta. Aquella linha era da maxima importancia e da maior vantagem para o Porto.

Se os caminhos de ferro, no nosso paiz, estivessem sujeitos a regras fixas e a um plano elaborado por engenheiros competentes e distinctos, seria aquella linha uma das primeiras a construir em Portugal, uma das que já deveria estar concluida ha muito tempo, não só pelas vantagens que da sua construcção prompta e immediata adviriam para o paiz em geral, mas principalmente para a cidade do Porto, que ligaria a Europa com o oceano e que exportaria e importaria, pelo seu porto, valiosos e importantes productos.

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O alto valor d'aquella linha ferrea era de tal fórma intuitivo, que parece incrivel que não fosse viste pelos governos d'este paiz.

Sr. presidente, quanto ao pensamento do projecto, isto ó, quanto á necessidade da construcção da linha ferres, que, saindo do Porto, siga o Douro até á Barca de Alva, para entroncar com a linha hespanhola de Salamanca, parece-me que toda a camara está de accordo.

As duvidas, porém, que se suscitarem serão respectivas ao modo por que está redigido o projecte.

A minha opinião, desde longo tempo, era que esta linha e a da Beira Baixa, pelo Valle do Tejo e por Malpartida a Madrid, deviam ser as primeiras a construir.

Quando eu fallei, por varias vezes, n'este assumpto, na necessidade urgente de construir estas duas linhas, que se completavam, a minha voz não era nem foi ouvida, damava no deserto.

Homens de differentes partidos ligavam-se para atacar o acerto e sustentar o disparate, e, unidos todos, pozeram de parte os odios politicos, para se opporem ao que era util e conveniente e que daria immediatamente resultados proveitosos para o paiz. Não se fez então caso do que eu dizia, do que eu sustentava com a mais profunda convicção e com a opinião dos mais distinctos engenheiros da peninsula, e o Porto deixou correr á revelia a causa a que estavam ligados os seus mais caros interesses, e por isso está hoje soffrendo as consequencias da sua negligencia e do abandono de tão momentosa questão e tão vital para elle.

As consequencias funestas dos actos, das loucuras e dos desvarios dos homens politicos que a nação está soffrendo, provem da falta de bom senso dos governos. Se effectivamente os nossos goremos procedessem com acerte, se tivessem juizo e prudencia, antes de mandarem começar as obras importantes e qualquer caminho de ferro, fariam o mesmo que fez a Hespanha, mandariam, por urna, commissão importante de engenheiros, elaborar um plano geral do todos os caminhos de ferros portuguezes com a respectiva classificação. Se se tivesse feito isto, o paiz teria lucrado muito, porque não se teriam feito caminhos de ferro cuja inutilidade está já hoje reconhecida, por estarem prejudicadas por outras linhas, que são urgentemente reclamadas. Se se tivesse feito, o que era de simples intuição, os caminhos de ferro mais importantes, as linhas internacionaes seriam as primeiras a construir, e estas duas, a que me referi, já estariam ha longo tempo em exploração.

Sr. presidente, eu vou fazer a historia deste caminho de ferro, e vou narrar o que se tem passado ácerca d'elle, para que o paiz e o Porto conheçam come têem sido illudidos.

Ha annos, estando no poder o partido regenero der. que eu tinha a honra de apoiar então, apresentou o governo um projecto para a construcção dos caminhos de ferro do Douro e Minho, e num artigo desse projecto fasia-se uma promessa á Beira Alta de lhe dar um caminho de ferro tambem. N'essa occasião, ergui aqui a minha humilde voz, e combati o governo por apresentar um projecto tão insignificante, tão acanhado, o qual revelava o nenhum conhecimento da materia. Mostrei que a linha do Douro era uma linha internacional e que n'aquelle projecto era proposta como linha de segunda ordem, como um caminho de ferro caseiro, que isto revelava a ignorancia do governo ácerca de um assumpto de tanta gravidade. Combati, sendo ministerial, o governo regenerador, sobretudo pela promessa que fazia á Beira Alta de um caminho de ferro, inscrevendo essa promessa n'um artigo do projecto. Provei que um similhante artigo era ridiculo e fazia rir, e que o caminho da Beirea Alta, que elle promettia, se um dia se fizesse em condições de linha de primeira ordem, prejudicaria inteiramente a linha do Douro, porque ligar-se-ía com a linha de Salamanca e tornar-se-ia uma linha internacional, pondo em communicação Portugal com a Hespanha e com o resto da Europa.

Sem duvida esta linha será preferirei á do Douro, porque será construida em condições technicas muito supeirores, o que impedirá que de future a Hespanha faça o entroncamento com a linha do Douro por Ledesma, Vitigudino, Freigeneda á Barca de Alva, porque a Hespanha não carece n'aquella região mais do que uma linha internacional e uma só ligação com Portugal.

Se em Portugal se tivesse estudado esta questão como devia ser e como ella merecia, chegar-se-ia facilmente á conclusão de raie a commissão de engenheiros hespanhaes, tendo estudado e proposto nos seus relatorios differentes soluções para resolver o problema do entroncamento da linha ferrea de Salamanca a Portugal, só acceitavam uma, e que, acceitada ella, outra qualquer ficava prejudicaria, e se a acceitassem seria com grande reluctancia. O Porto não viu o perigo, não o reconheceu, só o viu e reconheceu agora, depois da concessão do ramal da Figueira; mas agora é tarde. Difficilmente se trará hoje a Hespanha a entroncar a linha de Salamanca a Freigeneda com a da Barca de Alva.

O caminho de ferro da Beira Alta como prejudicava a linha do Douro, não podia ser apresentado tal qual hoje elle se vê, e por isso primeiro se inscreveu um artigo no projecto para construcção da linha de Douro e de Minho, a promessa de um caminho de ferro para a Beira Alta. Explorado o terreno, como o Porto não se impressionou com a promessa e não reconheceu que ia ser ferido nos seus irais vitaes interesses, e os deixasse correr á revelia, converteram a promessa em projecto de lei, o qual foi convertido em realidade, apesar da minha opposição, visto essa linha ferrea prejudicar tambem a linha da Beira Baixa.

O Porto agora está soffrendo as consequencias da sua indifferença, da sua incuria, e de não ter examinado maduramente uma questão que lhe tocava muito de perto.

Antes de continuar as minhas ponderações a proposito da linha do Douro, parecia-me conveniente que o sr. ministro das obras publicas dissesse á camara o que tem havido entre Portugal e Hespanba ácerca de ponto de entroncamento; que declarasse se tem havido negociações, quaes as difficuldades que surgiram, se se chegou definitivamente a qualquer accordo ou combinação cem o governo hespanhol ácerca do entroncamento da linha do Doure, e se se levantaram algumas complicações pelo que respeita ao entroncamento da Beira Alta com as vias ferreas de Hespanha, porquanto se têem espalhado no publico boates a tal respeito, que talvez fosse bom explical-os e desrmersil-os Sr. presidente, a mim não me surprehendem nem os boatos, nem as noticias que correra com mais eu menos insistencia. São consequencias fataes dos erros praticados.

Os acontecimentos têem vindo dsr rasão á minha opinião, ou entes á minha prophcda, e por isso estaria satisfeito e muito satisfeito, se os desacertos dos nossos governos não fossem pagos bem caros pelo paiz, que é sempre a victima inoffensiva d'estas successivas faltas.

Sr. presidente, sustentei sempre que a linha do Douro, pela Barca de Alva á Freigeneda, Vitigudino e Ledesma, a liga com o caminho de ferro do Salamanca era a mais racional e de maior interesse para o paiz, e sobretudo para o Porto, Esta opinião não é minha só. Tem a seu favor a auctoridade dos primeiros engenheiros da peninsula, homens competentissimos que estudaram, esta questão, e um livre importante, que é a memoria da commissão ccs engenheiros hespanhoes, nomeada expressamente para estudarem aquelle importante assumpto, e apresentada ao seu governo com o plano dos caminhos de ferro de Hespanha e ligação com Portugal.

Pugnei pelas idéas exaradas n'aquellas memoria, antes da discussão do caminho de ferro da Beira, Alta, durante essa discussão e depois de votado o caminho do ferro da Beira Alta.

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A minha voz não foi ouvida, o Porto dormia a somno socegado, sem perceber que lhe davam na sua vida commercial o golpe mais profundo. Não se attendeu então ao
que eu pedia e sustentava, e as consequencias fataes estão já a sentir-se e de um modo um pouco serio e grave para o Porto.

Eu como julgo e julguei sempre esta questão do maximo interesse para Portugal, trouxe a memoria a que me referi, para ler d'ella alguns trechos significativos, e dar assim conhecimento á camara, ao paiz e ao governo d'este interessante trabalho. Se os governos portuguezes, já que não mandaram fazer trabalho identico, o tivessem diante dos olhos, não teriam praticado os erros palmares que já não têem remedio.

Os hespanhoes, julgando de necessidade absoluta e de interesse de primeira ordem a ligação de alguns dos seus caminhos de ferro com Portugal, estudaram maduramente essa questão.

No plano geral, para tornar mais facil a comprehensão da rede dos seus caminhos de ferro, para melhor se fazer idéa d'elles, dividiu-os em cinco grupos ou classes, baseando a divisão na ordem das necessidades variadas a que satisfazem as lindas incluidas em cada um dos grupos.

Sobre este ponto lerei á camara um trecho importante da memoria.

"El estado numero 8 de la parte cuarta, contiene la relacion de todas las lineas concedidas y que se proponen para constituir el plan general; pero para que sea más fácil formar-se cabal idea de estas, se agruparán en cinco clases, basando la division en los diferentes ordenes de necesidades á que satisfacen las vias incluidas em cada uno. Los cinco grupos serán los siguientes:

"1.º Lineas radiales derivadas de las ya concedidas, y destinadas principalmente á mejorar las comunicaciones internacionales y las dei centro em los puertos más proximos del litoral.

"2.° Lineas radiales derivadas tambien de las ya concedidas á de las anteriores, y, en primer termino, destinadas á enlazar con la red á las capitales de provincia que no están aun servida por ferro-carril.

"3.° Lineas radiales derivadas asimismo de las ya concedidas, y que tienem por objecto poner en comunicacion a los centros productores con los de exportacion ó consumo.

"4.° Lineas trasversales que tienem por objecto ligar entre si grandes arterias é influir en el mejor porvenir de los que hoy se hallan en exploracion.

"5.° Ramales derivados de las lineas trasversales, cuya importancia estriba, ya en estabelecer nuevas comunicaciones internacionales, ya en servir á zonas productoras, ya en mejorar relaciones existentes.

"Suin perjuicio de explicar detenidamente en la tercera parte los intereses generales y locales á que toda linea nueva satisface, y de hacer indicaciones respecto á sus trazados, se usenarán ya las razones de más peso que las motivan.

"Los ferro-carriles que incluyen en el plany que forman parte del primer grupo, son los seguientes:

Longitudes approximadas

Baides, por Almazan, á Castejon............. 198 kils.

Pamplona á la frontera franceza, por los Alduides.........38 "

Cuenca á Valencia......................... 221 "

Malpartida de Plasencia, por Coria, á empalmar en Abrantes con la red portugueza....................................... 82 "

Tuy á Valencia (Portugal).................. 1 "

Total.........................................530 "

N'estes cinco grupos, que a commissão julga indispensavel para completar a sua rede do caminho de ferro, lá vem dois alvitres para ligar Hespanha com Portugal.

A ligação de Tuy a Valença, ficando por esta forma a linha do Minho ligada com as linhas Hespanholas, e a ligação da linha de Malpartida e Placencia, por Coria, a entroncar em Abrantes com a rede portugueza.

Esta linha consideram-n'a os hespanhoes como a primeira linha internacional, copio a mais importante para ligar Lisboa com Madrid, e bem assim com o centro da Europa, seguindo de Malpartida a transversal de Salamanca a Zamora.

Como é governo portuguez não tinha plano, e como não attendeu a este, os desacertos succedem-se, e esta linha, que deveria ser a primeira a construir em Portugal, ficou prejudicada pelo ramal de Caceres. A concessão d'esta linha de Caceres é um dos maiores erros praticados por um governo é uma violação de lei, e revela a ignorancia mais crassa do ministro que fez a concessão.

O prurido de fazer caminhos de ferro de graça atacou por tal forma p ministro das obras publicas d'aquella epocha, que concedeu como ramal á companhia de leste uma linha internacional, como tal reconhecida em Hespanha, e prejudicada em Portugal pela lei que auctorisava o governo a contratar um caminho de ferro que, partindo de Abrantes seguisse o valle do Tejo, e fosse entroncar na fronteira hespanhola com a linha de Malpartida, nas proximidades de Monfortinho

Pois apesar de ser em Hespanha o ramal de Caceres considerado linha internacional, e uma das soluções para ligar Portugal com aquella nação, pôr um caminho de ferro, que entroncasse na linha de leste, apesar de haver lei que resolva a questão adoptando uma das quatro soluções apresentadas pelos hespanhoes, houve um ministro das obras publicas que violou a lei, e concedeu a linha de Caceres, abrindo toda a provincia do Alemtejo ás forças hespanholas no caso de uma invasão, annullando assim os esforços patrioticos dó honrado marquez de Sá, que obrigou o governo a fazer passar o caminho de ferro de Badajoz, debaixo das muralhas de Elvas.

Estas duas linhas que mencionei e que ligam com Portugal, pertencem ao quinto grupo, mas não são só estas linhas que satisfazem os interesses internacionaes.

A linha que vae de Ledesma por Vitigudino a Fregeneda, a entroncar com a linha do Douro, que é importantissima, assim é considerada na memoria, emquanto o caminho de ferro da Beira Alta é apenas olhado como caminho de ferro.

Vou ler á camara ainda outro trecho da memoria:

"La breve exposicion que precede de las lineas que se preponem para completaria red de caminos de hierro de la Peninsula, da á conocer los principales fundamentos en que su adopcion esta baseada. Mayores detalles sobre cada una de ellas pueden verse en la parte tercera de esta Memoria, en la que se indican tambien cuantas noticias han podido adquirirse sobre la direccion general de las mismas. Resta, sin embargo, hacer un estudio de bastante interés, con el cual se pondrá fin á este capitulo, y que consiste en determinar si los intereses de diverso genero, que motivan esta clase de vias perfeccionadas, quedan satisfichos con las existentes y las que se adicionan en este proyecto. Los referidos intereses pueden clasificarse en cuatro grandes grupos:

"1.° Los internacionales que exigen la fácil y rapida communicacion de nuestro pais con el estranjero, y sobretodo, con las naciones fronterizas.

"2.° Los comerciales que reclaman elconveniente en lace de los focos productores con los de exportacion y consumo.

"3.° Los de politica interior, que aconsejan la union mas ó menos directa con la residencia del gobierno, y entre si, de los puntos más importantes de la Peninsula, tanto en la administracion civil, como en la militar, judicial y eclesiástica.

"Y 4.° Los de orden estrategico, que imponen el deber

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de admitir las lineas que puedau contribuir, en gran escala, á la defensa del territorio.

"Los ferros-carriles destinados á satisfacer intereses internacionales se detallan en el estado numere 16. Para las comunicaciones con Francia existen ya dos concedidos, uno por Avila, Valladolid, Burgos, Vitoria y San Sebastian, Irun, y otro por Guadalajara, Zaragoza, Lérida, Barcelona y Gerona, á entrar en el vecino imperio por el extremo oriental de la cordilera pirenáica; es indudable que ambas satisfacem bastante bien á las necesidades que las raotivan. Sin embargo, se adiciona otra mas, que quedará constituida, desde el centro, por la parte del ferro-carril de Zaragoza comprendida entre la Côrte e Baydes por el camino que se propone desde este punto a Castejon, por el ya explctado entre dicha poblacion y Pamplona, y por el que se incluye en el plano que debe penetrar em Francia por los Alduides.

"La importancia de esta via internacional se comprenderá con sólo consignar el hecho de que economiza 185 kylometros de trayecto entre la mayor parte de las provincias y aquel imperio, con sólo construir 236 kylometros de linea, de los cuales, como ya se ha indicado anteriormente, 38 no exigiran sacrificio alguno dei estado, y 100 próximamente de los 198 restantes, hubieran sido indispensables de todoos modos para enlazar con la red á la ciudad de Soria.

"Del referido estado numero 16, se deprende que las communicaciones con Portugal seran cinco, si se aproeba el plan de la comision. Esta cifra podrá parecer exagerada á primera vista, pero no lo es, atendiendo:

"1.° Al gran desanollo de la frontera que separa á ambos paises.

"2.° A la corta longitud de los ferro-carriles que se proponen para completar los referidos enlaces.

"3.° A que todos elles están justificados por exigencias comerciales, segund se ha indicado ligeramente en este miesmo capitulo.

"Y 4.° A la conveniencia de estudiar, por tan poderoso medio, los lazos entre dos naciones hermanas, llamadas por la naturaleza á marchar unidas en cuantas cuestioues politicas puedan surgir en Europa, y á regir-se por leyes analogas, en armonia con la semejanza de su suelo y con las iguales condiciones de sus habitantes. De las cinco lieas hay una construida en toda su extension, la que marchando por el Valle dei Guadiana, pasa por Badajoz y empalma con la red portugueza, no léjos de la estacion de Elvas. Las cuatro que se proponen son las de Malpartida de Plasencia, por Coria á Abrantes, como continuacion de la del Tajo, y porque con ella se consigue acortar la distancia entre Madrid y Lisboa, ou cerca de 300 kylometros; la de Ledesma, por Vitigudino, á la Fregeneda, que seguirá el valle del Douro, satisfaciendo á las necessidades del comercio, ya desarrollado entre várias provincias de Castilla y Oporto, constituyendo á la vez la comunicacion más directa entre el norte de Portugal y casi toda Europa; La de Huelva á la frontera y la de Tuy á Valencia, que, con muy poCos kylometros de nueva construccicn, favorecem el tráfico de importantes regiones españolas, respectivamente con las meridionales V septentrionales del reino viccino. Las
cuatro meden por junto un desarrollo de 233 kylometros, bien insignificante, por cierto, con relacion á lo satisfactoriamente que realisan la union de los dos paises".

Por este periodo que acabo de ler, manifesta-se claramente o pensamento da commissão hespanhola. Ella classifica os seus caminhos de ferro em relação aos interesses a que principalmente satisfazem.

Esses interesses classifica-os a commissão em quatro grandes grupos:

1.° Os internacionaes;

2.° Os commerciaes;

3.° Os de politica interna;

4.° Os de ordem estrategica.

As linhas internacionaes que devem ligar com Portugal são cinco, sendo as principaes a de Madrid, Malpartida, Lisboa, e a de Ledesma, Vitigudino, Fregeneda pela Barca de Alva a e Porto.

O objectivo de Hespanha era e é principalmente u ligação com Lisboa e Porto, pela fórma proposta.

O objectivo de Portugal, pelos seus interesses immediatos, deve ser a ligação com a Hespanha por estas duas linhas, que deviam ser as primeiras a construir, e que já deviam estar construidas.

Pois não succede, nem succedeu assim, não sei se devido á incompetencia dos ministros das obras publicas, se á falta de systema e plano dos governos se á sua ignorancia, ou a pressões estranhas.

O facto é que a linha do Valle do Tejo, a linha de Malpartida ficou altamente prejudicada com o ramal de Caceres; e a linha do Douro, a linha do Porto á Barca de Alva com o caminho de ferro da Beira Alta.

Sr. presidente, são ponderosas todas as considerações que aconselhavam estas duas linhas, pois apesar d'isso o governo não attendeu a cousa alguma, e foi conceder o ramal de Caceres.

Quer dizer, admittiu uma das soluções mais combatida pela commissão, e que ha de trazer consequencias serias, porque a concessão d'aquelle ramal, alem do alongar consideravelmente o trajecto de Lisboa a Madrid, traz a desvantagem de collocar a provincia do Alemtejo em precarias circumstancias, em poder do exercito invasor.

A este grave inconveniente procurou obstar o nosso sempre admirado collega marquez de Sá da Bandeira, pelo seu amor patrio, e persistencia tenaz em procurar a defeza do paiz.

r. presidente, para que a camara faça uma idéa completa a este respeito, das linhas de Malpartida e de Ledesma, deve ler ainda periodos d'essa interessante memoria respectiva a cada uma d'estas linhas. Note a camara o estudo serio e o exame profundo que a commissão fez d'este ponto.

Eis os periodos:

"No es preciso insistir en la gran inporiancia de esta linea, que os una de las que con más urgencia reclaman los intereses generales del país, ya porque estabelece una communcacion internacional en extremo conveniente, ya porque sirve los intereses de una extensa y rica zona, privada hasta hoy de esta clase de vias"

"Estando concedido, como se ha dicho, un ferro-carril de Madrid a Malpartida de Plasencia, claro es que, prolongandolo oportunamente, quedará realizado de una manera directa el enlace de Lisboa com nuestra côrte. Sólo se examinarán, pues, las soluciones propuestas, que tionen por punto comun á Malpartida, haciendo desde luego caso unico de todas aquellas que se defendi an en la hipótesis de que no llegára á conceder-se el camino de Madrid al referido pueblo.

"En su consecuencia, las direcciones que hay que discutir, son las seguientes:

"De Malpartida, por Cáceres y Alburquerque, á Badajoz;

"De Malpartida, por los mismos puntos, á Assumar;

"De Malpartida, por Cáceres y Valencia de Alcántara, e Crato;

"De Malpartida, por Coria, á Abrantes.

"La primera solucion empalmaria en Badajoz con el ferro-carril de Ciudad-Real, el vecino reino sin enlazar.

"La segunda penetraria con la linea dei Guadiana, empalmado con la portugueza, en la estacion de Assumar, distante 54 kylómetros de Badajoz y 227 de Lisboa.

"La torcera iria a unirse con el camino de Lisboa á Badajoz en Crato, punto situado á 82 kylómetros de esta capital y á 199 de aquella.

"Finalmente, la cuarta entraria en el reino lusitano por las immediaciones de Monfortinho continuando hasta em-

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palmar con la mesma linea que las anteriores, en Abrantes, a 146 kylómetros de Badajoz y 135 de Lisboa.

"Entre todas ellas se juzga preferible la ultima: primero, porque es la que completa una via internacional más corta, sin oponer difficultades de ejecucion, segun resulta de los reconocimentos praticados de órden del gobierno; segundo, porque más distante del Guadiana que todas las demas vias, ejerce su accion en una zona propia, siendo, por lo tanto, la que menos perjudica á la liena de Badajoz; tercero, porque bajo el punto de vista de la riqueza de la zona recorrida, no ofrece desventajas respecto á las otras, y cuarto, porque esta linea no sólo ha sido propuesta por una comision mixta de ingenieros portugueses y españoles sino que además está ya hoy aprobada la parte portuguesa por la junta consultiva de caminos de aquel pais.

"El único inconveniente que parece ofrecer la traza adoptada, es que aleja algun tanto de Lisboa a Cáceres y á algunos otros pueblos de su provincia; pero este obstáculo es de bien poça monta, si se atiende á que las vias de comunicacion más neeesarias para dichas locaiidades, son las que desde las mismas se dirijan á Sevilla y á Madrid, las cuales, como se verá, quedan perfectamente establecidas con las lineas que se incluyen en el plan.

Del reconocimiento que se ha ejecutado, resulta que el trazado de Malpartida á Ia frontera puede hacerse en condiciones tecnicas y economicas muy aceptables; pasando cerca de Galisteo, Monte Hermoso, Coria, Las Casillas, las immediaciones de las cascas de Don Gomes y por entre Moraleja y Zarza la Mayor, atravessando la ribera de Hérjas, que sirve de limite á ambos reinos y entrando en Portugal por Monfortinho.

"El desarrollo de la parte española será de unos 82 kylómetros.

"En cuanto á la portuguesa, tampoco ofrecerá dificultados de ejucucion, pudiéndo-se llevar á Abrantes, desde Monfortinho, por el sud de Idanha Nova y Castello Branco, cruzando el Tajo en las Portas de Rodão. Se calcula su longitud en 138 kylómetros.

"Se terminará lo relativo á esta linea manifestando que apesar de todo lo expuesto deberá subordinarse en ejecucion á lo que el gobierno portugues determine, por más que parecia muy probable, en vista de las razones que se han apuntado, que está concedida la linea de Abrantes á Monfortinho."

Se entre nós se tivesse mandado fazer um trabalho tão consciencioso como esta memoria a que tenho por varias e repetidas vezes alludido, por certo não se teriam praticado os erros e os desacertos que se têem succedido uns aos outros, e que tão caros têem custado ao paiz, sem responsabilidade alguma para os ministros que foram a causa desta serie de prejuizos.

Parece-me que da leitura d'estes periodos não resta a mais leve duvida emquanto á excellencia da linha, de Malpartida sobre as outras; não obstante houve um ministro de obras publicas em Portugal, que, não fazendo caso da lei, nem dos interesses da nação, concedeu o ramal de Caceres, isto é, satisfez a segunda solução de que falla a commissão hespanhola, e os interesses da companhia de leste. Pelo que respeita aos caminhos de ferro do Douro á Barca de Alva, a mesma ignorancia, a falta de alcance de vistas, e nenhum estudo no assumpto, levou o governo a contratar a construcção do caminho de ferro da Beira Alta, e a conceder agora o ramal da Figueira, e portanto a dar um golpe mortal na linha do Douro.

A Hespanha, tinha todo o empenho n'aquelle entroncamento com aquella linha, emquanto não tinha outra solução; hoje que tem o entroncamento com o caminho de ferro da Beira Alta, o resto é-lhe indifferente. Sobre este ponto vou ainda mostrar á camara qual é a opinião da commissão hespanhola.

Eis o que ella diz:

"La conveniencia de enlazar con el norte de Portugal á Salamanca, Zamora y elcentro de España, está reconocida y comprobada por el tráfico ya establecido en dicha direccion, como lo demuestran patentemente los productos que rinden las aduanas situadas en esa parte de la frontera.

"Y esta circunstancia indujo á la comision á decir, ai comparar la linea de Béjar á Avila con la de la misma poblacion á Zamora, que no podria prescindirse de construir el trozo de ferro-carril de la última capital á Salamanca: es evidente, en efecto que si ambas provincias han de quedar enlazadas con el norte de Portugal en vez de á cabo dos lineas distintas, que penetren eu la nacion vicina y partan respectivamente de Salamanca y Zamora, convenderá, atendiendo á la proximidad de estas capitales, enlazarlas por una via ferrea, de una de cuyos puntos se dirive un solo ferro-carril que cruce la frontera.

"Las diferentes soluciones propuestas en la informacion son las seguientes:

"De Salamanca a lá frontera de Portugal, aproximándose lo posible á la sierra de Gata;

"De Salamanca á Aldea del Obispo;

"De la linea directa de Salamanca á Zamora, a entrar en Portugal por Fermosello;

"De Ledesma, por Vitigudino, a lá Fregeneda;

"De Zamora directamenta a lá Fregeneda;

"De Zamora á Braganza.

"La primera, la tercera y la sexta, deben desde luego desecharse, porque segun resulta de los informes facultativos, no tienen prolongacion conveniente, en el vecino reino.

"La quinta tampoco es aceptible porque so o satisfaria cumplidamente á las necesidades de Zamora.

"Entre las dos restantes no queda duda alguna de que procede rechazar la do Aldea del Obispo, porque aumenta la distancia al norte de Portugal, y si bien parece que facilita las comunicaciones con el centro de ese pais, hay que tener en cuenta que las lineas de Salamanca á Malpartida, y de ese punto á Abrantes, acertando más que aquella las distancias, serian naturalmente las preferidas por el tráfico.

"En concepto, pues, de la comision, la linea internacional debe dirigirse á la Fregeneda, consiguiendo asi acercar á Oporto una considerable zona, cuyas exportaciones se vienen haciendo por esa plaza.

"Proponiendose, si se juzga ser conveniente, que el camino de Salamanca á Zamora pase por Ledesma, claro es que el ferro-carril de que se trata deberá partir de la última ciudad, lográndose de esa manera, no solo servir igualmente bien a las provincias de Zamora y Salamanca, sino realizar un importante ahorro en la construccion, segun se ha indicado ya al hablar de la transversal bético-extremeno-castellana. La parte da linea que habrá de construir-se entre Salamanca y la Fregeueda, será pues, solo la de Ledesma á dicho punto, caso de que el gobierno de Su Majestad adopte esta solucion.

"La linea de la Fregeneda deberá enlazar con otra portuguesa que desde Oporto se dirija á Barca d'Alba, seguiendo la cuenca del Duero.

"En Portugal se han hecho estudios desde Oporto hasta Régoa, importante centro vinatero; desde este punto hasta Barca d'Alba no se ha formado proyecto alguno, pero de los reconocimientos practicados resulta que esta seccion se halla en condiciones casi idénticas á la primera: ambas reunidas medirán un desarrollo de unos 200 kylómetros, y su coste será elevado, por la naturalesa del terreno que atraviesan. El rio Aguada, que sirve de frontera, podrá cruzarse con un viaducto de 30 á 40 metros de altura.

"Para continuar la linea por el interior de España se presente la deficultad de salvar el desnivel que existe entre las aguas del Duero y la meseta en que está situada la

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provincia de Salamanca, pues la Fregeneda se halla á unos 400 metros sobre Barca d'Alba y á sua distancia de 9 kylómetros; este obstaculo puede salvarse, en concepto do la comision mixta de ingenieros ya citada, subiendo por el Duero hasta llegar á Yéltes, continuando por esta para elevarse á la alta meseta hácia Vitigudino, y siguiendo ya á Ledesma sin entorpeciraiento do ninguna especie. Adoptando este trazado, se calcula la longitud del camino, en la parte española, em 90 kylómetros.

"La comision, apesar de que incluye esta linea en el plan, debe hacer presente que su realisacion no tendrá carácter de urgencia hasta que las obras del ferro carril de Oporto á la Fregeneda, cuyo coste será bastante crecido, están suficientemente adelantadas. Convendrá, pues, que el gobierno de Su Majestad no auctorice la ejecucion del camino, interin no hayan adquirido gran desarrollo los trabajos en la nacion portuguesa.

"Igualmente se hará constar que aun cuando la linea de Aldea del Obispo quede reducida á tener tan solo un interés local, el gobierno español podria autorisar su ejecucion en el caso de que el lusitano llevase á cabo el difcil camino de Coimbra (estacion del ferro-carril de Lisboa á Oporto, situada á 115 kylómetros dol ultimo punto) á la conocida plaza fuerte de Almeida, con el cual habria de enlazar el que se examina. La longitud de la linea entre Coimbra y Almeida se calcula en 180 kylómetros; los 9 que median desde la ultima poblacion a Aldea del Obispo se salvarian sin dificultad, pudiendo atravesar el rio frontezico,; Turones, por un ponton de poca importancia. Desde Aldea del Obispo á Salamanca se ha verificado un estudio, del que resulta ser la distancia entre ambos puntos de no kylómetros; bay que advertir, sin embargo, que con ese trazado se deja á Ciudad Rodrigo á 14 kilómetros de la via em linea recta, pareciendo natural, caso ds ejecutarse esta nueva comunicacion internacional, que se varie la traza, con objeto de acercaria á aquella poblacion, aun cuando sea á costa da aumentar el desarrollo en 20 é 30 kylómetros.

Considerava o caminho de ferro da Beira Alta como uma linha caseira, e que a unica conveniencia era a do Douro, porque favorecia Samora e Salamanca.

Hoje o Porto está soffrendo as consequencias do abandono em que deixou os seus interesses e ha de ver-se em grandes difficuldades, porque hoje a Hespanha, tendo a solução do seu problema pelo entroncamento da linha ferrea da Beira Alta e Villar Formoso, pouco distante da Aldeia do Bispo, por certo não quer nem lhe convem o entroncamento na Fregeneda com a linha do Douro, porquanto para conseguir esse intuito tinha de fazer ainda um longo troco de caminho de ferro muito dispendioso sem resultados importantes para a nação.

Desde que estiver construido o caminho de ferro da Beira Alta e o ramal para a Figueira, por elle fica a linha de Salamanca logo em communicação com o oceano e com o Porto pelo caminho de ferro do norte. N'esta conjunctura o governo hespanhol, defendendo e promovendo os interesses da sua nação, ha de oppor-se á ligação que a Hespanha desejou n'outra epocha e que ficou prejudicada peia linha da Beira Alta.

Não mo cabem remorsos; da minha parte fiz todos os esforços para impedir a construcção do caminho de ferro da Beira Alta, que annullava o do valle do Tejo e o do Valle do Douro; expuz todos os perigos; não me attenderam, e o Porto dormia a somno tranquillo emquanto os seus interesses corriam á revelia. Agora ahi têem as consequencias. A responsabilidade cabe a todos os governos. Romorleiem o mal se podem. Eu desejo nesta occasião, e a camara convem-lhe sobremaneira saber circumstanciadamente o estado da questão. Pergunto, pois, de novo sr. ministro das obras publicas o que diz o governo ácerca do entroncamento do caminho de ferro do Douro. Ha algumas complicações, como a imprensa espalha? Quaes são as duvidas que se apresentam agora? Será verdade que o governo hespanhol pretende que o entroncamento do caminho de ferro do Douro seja sobre as muralhas de Ciudad Rodrigo? Se esta ultima noticia fosse verdadeira, e os hespanhoes não cedessem do seu proposito de que a linha, de Salamanca bifurque em Ciudad Rodrigo para entroncar nas linhas do Douro e da Beira Alta, de modo nenhum poderá ter logar o caminho da Barca de Alva. Isto mataria completamente a linha do Douro, ou pelo menos dar-lhe-ia um golpe profundo, e o Porto perdiria uma das principaes arterias do seu commercio.

Como o sr. ministro pede a palavra e eu desejo muito ouvil-o, limitar-me-hei, por agora, a estas modestas considerações, acrescentando ainda que, se dos erros que mencionei dos differentes governos não fosse victima o paiz, eu teria verdadeiro orgulho e satisfação completa por ver que no fim de alguns annos se fez justiça ás minhas apreciações, e se proclamam hoje as idéas que hontem eu defendia só calorosamente.

Se eu tivesse podido acordar então o Porto ao som da minha humilde voz, se eu tivesse podido calar no espirito dos seus filhos a convicção profunda que eu tinha ácerca da vantagem das linhas do valle do Tejo e Douro, eu ter-lhe-ia evitado os males que os ameaçam, e as decepções porque está passando. Fui propheta, mas infelizmente fui propheta de calamidades para o Porto e para a Beira Baixa. Oxalá que ellas possam ainda ter remedio. Se o têem que lho dêem promptamente.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Saraiva de Carvalho): - Sr. presidente não me farei cargo de responder ou de acompanhar o digno par, o sr. Vaz Preto, em todas as considerações que s. exa. apresentou ácerca do caminho de ferro do Douro, mas responderei ás perguntas que s. exa. me dirigiu com relação ao entroncamento da linha da Beira Alta e do Douro com as linhas hespanholas.

Quando ultimamente esteve em Lisboa o sr. conde do Casal Ribeiro, eu tive uma larga conferencia com s. exa. ácerca deste assumpto, que s. exa. com aquelle zêlo e talento que todos lhe reconhecem se tem occupado de tratar, procurando quanto possivel que nós não fiquemos prejudicados. Quando aquelle cavalheiro esteve em Lisboa trocámos algumas idéas, dando-lhe eu os esclarecimentos de que elle carecia, e eu fiquei sabendo a forma como me poderia guiar: as negociações têem continuado por parte do ministerio dos negocios estrangeiros, e na altura em que ellas se acham reconhece de certo o digno par e a camara que não é occasião para que eu possa dizer cousa alguma, por isso que são negociações pendentes. (Apoiados.)

Com relação aos entroncamentos diante de Villar Formoso e Barca de Alva, as duas commissões que se juntaram, portugueza e hespanhola, foram accordes em que a juncção se deve fazer 70 metros ao sul, entre o rio Douro e o Aguada, isto é, 70 metros abaixo do ponto de confluencia, é este o ponto que nos parece mais conveniente até para os interesses de Portugal; todavia ha sempre interesses feridos, e é preciso remover os conflictos que trazem; o que eu posso asseverar á camara é que o nosso representante procura, pelo modo mais satiscfatorio para os dois paizes, resolver esta questão.

São estas as considerações que n'este momento posso dar ao digno par.

(O orador não reviu este discurso.)

O tr. Presidente:- Chamo a attenção da camara, como se achava nomeada uma deputação que deveria acompanhar a El-Rei, na occasião da trasladação dos restos mortaes do almirante D. Vasco da Gama e do grande poeta Luiz de Camões para a igreja dos Jeronymos, se os dignos pares que compõem essa deputação quizerem acompanhar o prestito, fallo dos dignos pares que estiverem em Lisboa nesse dia, praticarão um acto digno na camara, concorrendo para que ella seja dignamente representada n'essa solemnidade, que tantas sympathias deve merecer a

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esta nação. O mesmo digo com relação ás festas do dia 10 do corrente. Os dignos pares que se quiserem reunir no Terreiro do Paço á referida deputação devem considerar-se como fazendo parte d'ella.

O sr. Serpa: - Sr. presidente eu voto a favor da generalidade d'este projecto; mas, estando assignado com declaração, desejei dizer em poucas palavras os motivos por que assignei com declaração.

Eu voto estas obras, porque acho, conveniente, util e mesmo indispensavel que ellas §e concluam; muito mais quando o caminho de ferro do Douro chega já ao Pinhão, quando existe, material de construcção, estudos definitivos e pessoal technico, e até mesmo attendendo ás circumstancias desgraçadas em que se encontra a provincia do Douro. Seria, pois, prejudicial que estas obras se interrompessem e julgo urgente que se concluam.

Entretanto, no projecto, não como o apresenta o sr. Saraiva de Carvalho, mas como elle veiu da camara dos senhores deputados, vem disposições, com que eu não concordo.

(Leu.)

Esta verba de 210:000$000 réis foi introduzida no orçamento do ministerio das obras publicas em novembro do anno passado quando se elaborou o mesmo orçamento. Era destinada ás necessidades do serviço que havia ou que se previam n'aquella epocha, para estudos, para fiscalisação dos trabalhos do caminho de ferro, e até para construcção.

Todas estas applicações d'aquella verba subsistem e absorvem a sua importancia. Estão-se fazendo neste momento estudos sobre o caminho de ferro do Pombal e da Beira Baixa. Está-se fiscalisando a construcção do caminho de ferro da Beira, o qual, estando a ser construido em toda a sua extensão, precisa de uma fiscalisação dispendiosa. Estão-se fazendo obras nos caminhos de ferro do sul, por exemplo, no cães do Barreiro; e. estas obras não podem parar de maneira nenhuma. Alem d'isto não está ainda inteiramente terminada a linha de ferro do Minho até Valença, nem mesmo a do Douro, porque depois de aberto á circulação um caminho de ferro ficam ainda muitas obras por concluir e aperfeiçoar.

Quando o sr. ministro das obras publicas inscreveu esta verba no orçamento do seu ministerio, era uma verba de que elle carecia, e de que ainda carece. Tem um emprego necessario. E seria absurdo que assim não fosse, e que emquanto o sr. ministro da fazenda estivesse luctando com as difficuldades de um grande déficit, o seu collega de obras publicas estivesse a inscrever no orçamento verbas de despeza de que não carecia, ou que não tinham applicação. Como póde desta. verba saír agora o necessario para se construir uma obra importante, com que se não contava, quando se elaborou o orçamento?

Mas não é só isto.

O artigo 6.° diz:

(Leu.)

Pergunto, o que significam estas palavras sem prejuizo da situação do thesouro? Não sei.

Se nós tivessemos o orçamento equilibrado, podia-se dizer sem alterar o equilibrio do orçamento; mas nós temos deficit e as obras hão de fazer por força que esse deficit seja maior.

Ser esta construcção, que eu acho importante, conveniente e de urgencia que se faca, importar em 400:000$000, 600:000$000 ou 1.000:000$000 réis, infallivelmente o deficit ha de augmentar outro tanto como essa quantia.

Logo o caminho de ferro não se continua, porque prejudica a situação do thesouro, ou o governo tem de transgredir a lei.

Este projecto, como vem da camara dos senhores deputados, finge que cria receita.

Eu podia examinar cada um d'estes artigos; mas, pela sua rapida leitura e sem ser necessaria demonstração, a camara vê que o projecto não cria receita nova, cria despeza.

As receitas que elle manda applicar á continuação do caminho de ferro do Minho já existiam, não são criadas agora.

É um principio hoje reprovado em toda a parte estar a designar no orçamento do estado receitas especiaes para as applicar a despezas tambem especiaes.

Isso, fazia-se no antigo regimen.

Os dignos pares de certo conhecem o primeiro orçamento constitucional apresentado ás camaras pelo sr. Manuel Antonio de Carvalho, pae de um nosso collega que não vejo presente.

Esse orçamento, feito segundo a legislação vigente, era dividido em varios orçamentos. Alem de certas receitas geraes, para despezas tambem geraes, havia receitas especiaes que tinham applicação especial. Havia, por exemplo, receita para as despezas da patriarchal, receita do terreiro publico, com applicação especial, receita das ilhas dos Açores, da ilha da Madeira, com applicação especial ás despezas dessas ilhas Hoje não é assim.

Ora o projecto não cria receitas novas, mas applica especialmente ás obras do caminho de ferro do Douro receitas já creadas, o que é um mau principio financeiro, e augmentando o deficit, prejudica a situação do thesouro, o que póde ser um pretexto para o governo não fazer as obras de que se trata.

Não quero cansar mais a camara.

Resta-me sómente dizer que, passando este projecto, espero continue o caminho de ferro do Douro, e pelo preço que elle ha de custar e pelo tempo que ha de levar a construir, o paiz fará inteira justiça ao dignissimo engenheiro, o sr. Lourenço de Carvalho, que dirigiu a construcção de quasi toda a parte já construida.

Então se verá, sejam quem forem os engenheiros que o governo encarregue da continuação da obra, se pela comparação com a parte, já construida esta se não póde reputar em excellentes condições de construcção, tanto pelo custo, como pela perfeição das obras, como pelo tempo em que a construcção se realisou.

O governo póde escolher para dirigir estes trabalhos os engenheiros que quizer, sejam elles quaes forem, a continuação desta linha não será feita em menos tempo, nem com menor perfeição, nem menos despeza do que a parte construida por aquelle cavalheiro. (Apoiados.)

O sr. Conde de Valbom: - Usou da palavra sobre o projecto em discussão.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, tinha pedido ao sr. ministro das obras publicas algumas explicações com relação ao entroncamento da linha do Douro, que julguei que s. exa. devia dar á camara n'esta occasião. Explicações que, a meu ver, poderão mostrar excellente este projecto, ou tirar-lhe completamente o valor.

S. exa. respondeu que não podia dar essas explicações!

Mas porque? Qual o inconveniente? %Que duvida póde haver em que a camara saiba se são ou não verdadeiros os boatos espalhados pela imprensa?

É cousa celebre, estes srs. progressistas, os homens das idéas avançadas, querem tudo menos o que lhe cheira a progresso!

O systema de publicidade não agrada ao sr. ministro das obras publicas!

Pois que duvida podia haver agora, se s. exa. entendia que não devia apresentar á camara algumas notas trocadas entre Portugal e Hespanha ácerca d'este negocio, de declarar que effectivamente surgiram difficuldades que o governo portuguez trata de resolver?

Sr. presidente, se são verdadeiros estes boatos o projecto de lei não tem rasão de ser na actualidade, por agora é inutil.

Emquanto a questão do entroncamento não for decidida

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não se póde marcar qual deve ser o trajecto da linha do Douro.

A directriz pela Barca de Alva presuppõe o entroncamento em Fregenada seguindo a linha para Vitigudino Ledesma.

Se pelo contrario o entroncamente fosse proximo de Ciudad Rodrigo a directriz pela Barca de Alva ficaria inteiramente prejudicada.

Era por estas rasões que eu desejava que o sr. ministro das obras publicas désse algumas explicações.

De outra fórma, tendo sido apresentado á ultima hora um projecto de caminho de ferro, cuja construcção está dependente da resolução do governo da nação vizinha transparece da parte do governo portuguez a pressão e o receio do Porto.

Este systema de incensar e adular o Porto pelo modo é mesquinho e dá uma triste idéa dos governos que recorrem a similhante meio.

N'esta pretensão o Porto tem rasão porque foi illudido e ludibriado, e a satisfação que o governo pretende dar-lhe não póde satisfazel-o, porque negocios d'esta ordem não se tratam tão levianamente, nem tão precipitadamente.

Este projecto apresentado n'esta conjunctura é uma vergonha para o governo. Revela a sua fraqueza, a falta de tacto politico e a ausencia de idéas de administração. Tenham ao menos a coragem e a dignidade de fallarem francamente ao Porto e expor-lhe a questão como ella é.

Creiam que serão melhor recebidos e mais facilmente desculpados.

O governo queixe-se de si e só da sua leviandade.

O governo antes de fazer a concessão á companhia da Beira Alta do ramal da Figueira devia ter resolvido com o governo hespanhol a questão do entroncamento do caminho de ferro do Douro.

Não o fez, os resultados fataes não se fizeram esperar.

Os hespanhoes, tendo a linha da Beira Alta, que os põe em communicação com o oceano em boas condições e com Lisboa e Porto, prescindem completamente da linha do Douro, que os forçaria a fazer um caminho de ferro despendiosissimo, em condições inferiores á outra linha, e sem grande vantagem para o seu paiz.

Parece incrivel que o sr. ministro das obras publicas não visse o que era mais claro do que a luz do dia.

Parece incrivel que o sr. ministro das obras publicas olhasse tão pouco para o Porto, e descurasse por tal fórma os interesses d'aquella laboriosa cidade; que não comprehendesse que a concessão do ramal da Figueira daria fatalmente funestos resultados para a linha do Douro!

Parece mesmo extraordinario que deixasse dormir até agora a questão do entroncamento da linha do Douro para só agora e nesta occasião a tratar!

Sr. presidente, d'este dilemma não sáe o sr. ministro das obras publicas, ou o governo tem tratado do entroncamento da linha do Douro já de ha muito, ou só começou a tratar agora esse assumpto?

Na primeira hypothese teriam apparecido logo todas as difficuldades, que era mister remover de prompto e não aggraval-as com a concessão do ramal da Figueira.

Na segunda hypothese o governo tinha descurado dos interesses do Porto e tinha-os sacrificado completamente a outros devido á falta de zêlo e á sua grande leviandade.

Escolha o sr. ministro das obras publicas um d'estes alvitres, e veja quão triste é a sua situação.

Sr. presidente, o governo traz agora á camara este projecto forçado pelo desgosto do Porto. Este projecto será mais uma illusão para o Porto, porque é poeira que lhe lançam nos olhos. O governo não tem cumprido com o seu dever, pois primeiro que tudo precisava ter chegado a um accordo com a Hespanha, accordo a que ella é obrigada em virtude do convenio que existe entre as duas rações, em segundo logar o governo carecia de ter mandado fazer um estudo minucioso e circumstanciado d'esta linha ferrea, pois todos sabem o que tem custado até ao Pinhão, e as condições em que tem sido feita.

Era emprezas d'esta ordem deve haver todo o cuidado e o maximo estudo, porque se assim se poderá chegar a um resultado satiscfatorio.

Depois do governo ter feito da sua parte o que devia, depois de ter a segurança que tinha todos os elementos indispensaveis para resolver o problema é que deveria ter vindo ao parlamento pedir auctorisação para fazer essa linha, que é de tanta utilidade, que deveria já estar de ha muito construida se no paiz os governos olhassem para os negocios publicos com a seriedade que ellas reclamam. Se o governo tivesse feito o que lhe competia fazer, a directriz até á Barca de Alva seria cousa acertada, agora é problematica, e está inteiramente dependente de Hespanha. Agora esta linha só poderá ir á foz do Tua, por não se ter tratado a tempo do accordo com o governo do reino visinho.

Sr. presidente, este projecto vem, como todos os outros d'este governo, desacompanhado de documentos e esclarecimentos.

Nós não sabemos se até á foz do Tua os estudos estão feitos. Sabe porventura o governo qual deve ser a directriz i melhor e mais conveniente, ou se haverá alguma variante?

A camara ignora tudo, e votará este projecto ás cegas, porque o governo entendeu poder desculpar es seus erros vindo apresentar aqui esta proposta, só para agradar ao Porto. Não se deixe o Porto illudir, e lembre-se que e governo só á ultima hora, quando o parlamento se está a fechar, é que se lembrou de tratar á pressa e precipitadamente dos assumptos que lhe dizem respeito. Lembre-se que quando se trata de organisar as finanças, é que o governo cede a toda a qualidade de pressão, a pressões estranhas e á pressão dos amigos, fazendo votar na outra casa do parlamento projectos sobre projectos augmentando todas as despezas publicas. Lembre-se que um governo assim, fraco, sem idéas nem pensamento politico, obedecendo mormente ao instincto da conservação, é uma calamidade para o paiz, como o tem sido já para a segunda cidade do reino.

Sr. presidente, um governo forte, que tem por norma do seu proceder a justiça e a moral, é sempre respeitado. Nem amigos, nem inimigos, nem cidades nem aldeias se atrevem a exercer sobre elle pressão.

Sr. presidente, eu creio que o Porto é justo e rasoavel, o que só pedirá e quererá o que é justo e possivel, conceder-se-ha na situação critica em que se acha o paiz,

A construcção do caminho de ferro do Douro está sem duvida n'esse caso, é urgentemente reclamada, oxalá que os erros e as loucuras do governo não a tenham prejudicado de vez.

Sr. presidente, eu deploro que o governo só no ultimo dia de sessão viesse discutir este projecto.

Uma discussão, á pressa sem documentos nem esclarecimentos de qualidade alguma, não póde ser vantajosa; e eu receie que d'aqui não se tire resultado algum. Se a discussão fosse seria e meditada, poder-se-ia esclarecer o assumpto em toda a sua altura, avaliar a questão com todas as circumstancias que a acompanham, sugerir alvitres ao governo para se chegar ao estado desejado. Mas assim, á ultima hora, com a impaciencia que o governo tem de que se lhe vote este e outros projectos ainda, é impossivel.

Portanto limitarei aqui as minhas observações, porque ellas não conseguirão realisar as minhas boas intenções.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Saraiva de Carvalho): - É unicamente para dar uma nova explicação ao digno par o sr. Vaz Preto.

Eu não posso dizer mais ao digno par sobre o ponto de entroncamento das linhas portuguezas com as hespanholas senão que ha negociações pendentes, e a camara o s. exa. devem comprehender que, emquanto essas negociações se

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não acharem concluidas, eu nada mais poderei avançar (Apoiados.}

Só posso dizer, o que é costume de todos os governos que empregâmos os maiores esforços para que possamos contratar com a maxima vantagem; isto fazem todos os governos, não somos só nós, que assim procedemos. (Apoiados.)

Acrescentou porém o digno par que o governo não procedia bem cedendo ás pressões dos amigos e da cidade do Porto para fazer um caminho para que lhe faltam os esudos.

Ora os estudos estão feitos, mas duvidava-se que estivessem até á foz do Côa, e o facto é que estão realmente feitos, não só até ahi más até á Barca de Alva.

Fallou um outro digno par na illusão dos meios com que se contava; e eu tenho a dizer que não só não considero os meios illusorios, mas até estou persuadido de que se cria receita, não só pelo desenvolvimento da linha, mas pela vantagem que traz o caminho de ferro e mesmo pelo aproveitamento dos carris.

O sr. conde de Valbom estranhou que se désse esta applicação aos carris. Os carris foram comprados de sobra como nós temos uma porção consideravel de carris podemos applical-os; porque temos, setenta e tantos contos de réis em carris de aço, não fallando nos carris de ferro que temos, que tambem são bastante importantes, para vias de resguardo. Por consequencia o acrescimo de receita o desenvolvimento do commercio das localidades atravessadas pelo caminho, o valor dos carris que já temos e alem d'isso as verbas inscriptas no orçamento futuro destinadas a juro e amortisação das sommas levantadas para este caminho, tudo isto, emfim, deve ter-se em consideração para que se não diga que os meios são illusorios.

Quanto a pressão, o governo não cedeu a pressão nenhuma. A cidade do Porto usou do seu direito de petição, muito regularmente, e já anteriormente o tinha feito allegando rasões muito categoricas.

O sr. Fontes Pereira de Mello: - Sr. presidente, levanto-me para dizer só quatro palavras sobre o assumpto, não porque elle não mereça mais, mas porque o adiantado da sessão o não comporta.

Sr. presidente, não voto contra o projecto, não só porque o julgo necessario, mas porque foi durante a administração a que eu tive a honra de presidir que se votou este caminho, tendo resolvido o governo assumir ã responsabilidade do prolongamento d'esse caminho. Creio que é de uma vantagem incontestavel e que seria lastima que depois de se ter despendido n'elle uma somma avultada não se levasse até á fronteira.

N'esta parte estou do accordo. Estimo que o nobre ministro resolvesse associar a sua responsabilidade á continuação d'este caminho de ferro; mas eu creio que o projecto, como está redigido, é uma completa illusão; com a approvação d'elle, ou ha de o governo ter uma illusão, ou praticar uma illegalidade. Os meios de receita que vejo aqui auctorisados estão muito longe de poderem satisfazer ás necessidades da obra que se pretende effectuar.

Parecia-me que era melhor propor ao parlamento uma auctorisação para levantar os meios de que se carece, não dizendo todavia que tal cousa se faz sem prejuizo do thesouro, como eu leio no projecto, porque a somma que se levantar ha de ter uma annuidade e esta annuidade tem de ser paga pelo estado.

Repito, seria mais efficaz que o governo pedisse ao parlamento uma auctorisação no sentido que indiquei, porque entendo que os meios de receita com que se conta não são sufficientes.

Os rails, a que alludiu o nobre ministro das obras publicas, para que sejam empregados, ainda ha de passar muito tempo. Antes d'isso têem de realisar-se outras despezas de grande importancia,

Se o governo for obrigado, como creio que é, no caso de querer levar avante a construcção do caminho de ferro do Douro, a praticar uma illegalidade, antecipando despezas que não estão auctorisadas, despezas para que não ha receita sufficiente; se quizer praticar esta illegalidade, levado pela necessidade imperiosa de prolongar o caminho de que se trata, eu desde já declaro que na proxima sessão legislativa lhe votarei um bill de indemnidade por similhante infracção de lei. Voto o com muito gosto. Preferiria, porém, que elle não fosse preciso; mas, uma vez que na illegalidade praticada haja em vista a continuação do caminho de ferro do Douro, que é de uma alta importancia para o paiz, associo-me ao governo e á maioria, e, torno a dizer, comprometto-me a votar o bill de indemnidade que por similhante motivo for proposto na sessão proxima.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Saraiva de Carvalho): - Parece-me que foi o sr. conde de Valbom que calculou em 1.200:000$000 réis a despeza a fazer ainda com a construcção do caminho de ferro até á foz do Tua e com o ramal do Pinhão.

Respondo. Relativamente ao Pinhão, não ha orçamento feito; não podemos estabelecer senão hypotheses mais ou menos fundadas.

Quanto á linha até á foz do Tua, lembro-me que são 11,5 os kilometros que teem de ser construidos, e que esses 11,5 kilometros estão orçados em 33:000$000 réis cada um.

O sr. Conde de Rio Maior: - Na altura em que vae o debate, não prolongarei a discussão sobre este projecto. Comtudo, como me impuz o dever de contestar sempre a apresentação n'esta camara de projectos para augmentar a despeza, sem que se prove a recita correspondente; projectos que demonstram a maneira por que o governo contradiz os bons principios, sustentados pelos srs. ministros nas cadeiras da opposição, protesto mais uma vez contra a nova proposta de lei de iniciativa ministerial.

Eu não nego a vantagem do caminho de que se trata; não sou contrario, antes sou muito favoravel á construcção de caminhos de ferro; mas protesto contra a parte financeira do projecto, contra o modo por que se quer levar o caminho de ferro do Douro á fronteira.

Não é necessario repetir quaes são as despezas da construcção; disseram-n'o os oradores que me precederam, e nem me parece indispensavel indicar qual a verdadeira receita, pois o digno par, o sr. Fontes, demonstrou á saciedade, considerando os artigos do projecto, quanto elles se afastam da realidade, sendo impossivel acudir a estas despezas com as receitas com que o governo conta.

O sr. ministro das obras publicas, quando fallou pela segunda vez, indicou como principal receita a venda dos carris; mas o sr. Fontes já disse a s. exa. que elles são muito bons, mas que ha muitas obras, a fazer primeiro, antes d'elles serem necessarios.

Declarou tambem o sr. ministro das obras publicas, em relação á continuação d'esta linha desde o Tua á fronteira, que não sabia quanto ella havia de custar, que não havia orçamento. Por consequencia, votamos um caminho de ferro, sem termos conhecimento da despeza de construcção.

A respeito d'este caminho ha uma questão importante; qual é o ponto da fronteira onde elle se ha de ligar com o caminho de ferro hespanhol?

A deputação provincial de Salamanca, a quem o governo heapanhol concedeu agora seis mezes para terminar os estudos, ainda não apresentou o resultado do seu exame.

Sabe se tambem que Q sr. conde do Casal Ribeiro está empenhado em que este assumpto se resolva vantajosamente para Portugal, e espera-se que em breve tempo haja este respeito noticia satisfactoria: mas por ora é simples aspiração e desejo!

Sr. presidente, tudo isto são promessas vagas, e o proprio sr. ministro das obras publicas está n'esta parte tão como nós; s. exa. não sabe ainda onde ha de

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entroncar o caminho; pois então que motivo existe para tanta pressa?

Alem disto, sr. presidente, este importante melhoramento não póde, não deve ser votado sem sabermos primeiro o estado financeiro do paiz, depois de cobrados os novos impostos. Vejamos, antes de mais augmento da despeza, o deficit do futuro orçamento.

O sr. ministro da fazenda veiu contar-nos, quando pediu imposto, o triste estado da fazenda publica, disse-nos ao mesmo tempo que é indispensavel occorrer ao déficit por todos os meios possiveis, e, todavia, s. exa. permitte que o desequilibrio seja aggravado por meio de novas e fortes despezas! S. exa. fez votar ultimamente um imposto cruel para o contribuinte, não sabe qual o resultado financeiro; comtudo, s. exa. concorda n'este projecto!

S. exa. ignora quanto custa este caminho!

S. exa. desconhece a exigencia do deficit no anno economico proximo, se, como é muito natural, s. exa. terá de reclamar novos sacrificios do paiz, mas s. exa. approva e consente tudo quanto póde prejudicar uma situação já bastante difficil!

Não entendo.

Eu acho muito conveniente que o contribuinte possa transitar com a maior commodidade possivel, mas comprehendo tambem que não se deve começar por lhe tirar a camiza.

Portanto, declaro que, apesar da consideração que tenho para com a cidade do Porto, e pelos interesses que para ella possam representar estes melhoramentos importantes, não posso votar este projecto na presente conjunctura.

O sr. Presidente: - Não ha içais nenhum digno par inscripto e, portanto, vae votar-se o projecto na sua generalidade.

Posto á votação o padecer n.° 135, e o respectivo projecte de lei, approvou-se na sua generalidade. Passou-se á especialidade, leu-se e artigo 1° e submetteu-se á discussão.

O sr. Conde de Valbom: - Fez breves reflexões sobre a especialidade do projecto.

(O discurso do digno par será publicado quando s. exa. o devolver.)

O sr. Presidente: - Vae votar-se o artigo 1.°

Posto á votação foi approvado. Passou-se ao

Artigo 2.°

O sr. Vaz Preto: - Pedi a palavra para observar, a meu ver, que o governo teria feito muito melhor trazendo só a proposta para o prolongamento da linha do Douro, porque já são bastante avultadas as despezas que tem proposto, subindo a mais de 20.000:000$000 réis as votadas este anno.

Quer dizer, as auctorisações que têem sido votadas já excedem esta somma.

O governo devia ter começado pelas obras mais necessarias, por aquellas que fossem julgadas impreteriveis, e o caminho de ferro do Douro estava n'este caso.

Todavia, o que parece incrivel é que uma obra tão urgente e de tão reconhecida importancia, só viesse á discussão no ultimo dia e nas ultimas horas da sessão, sem ser acompanhada dos esclarecimentos necessarios para poder ser devidamente apreciada.

Isto prova, como disse ha pouco, que o governo só apresentou este projecto em virtude de grande pressão, e não por vontade, nem convicção; porque se tivesse verdadeiro empenho em que fosse convertido em lei, tel-o-ía trazido á discussão ha muito mais tempo e devidamente documentado.

Foi necessario que v. exa., sr. presidente, fizesse manter o regimento, para que este projecto não fossa votado no sabbado, sem discussão nem exame. O que faria parecer que a camara dos pares tambem estava vergando só D a mesma pressão do governo, o que seria altamente indecoroso para ella.

Sr. presidente, desejaria que as negociações com a Hespanha, ácerca do entroncamento d'esta linha, tivessem tido bom resultado; e por certo tel-o-íam, se não tivessem sido descurados, pois v. exa. e a camara sabem [.....] e que existe um convenio entre Portugal e aquelle paiz, pelo qual as duas nações se obrigam a combinar e entroncamento das linhas que vão á fronteira, e n'este numero entram as do Douro e Beira Alta, aliás tornar-se-ía improductiva a despeza feita com estes dois caminhos de ferro, como linhas internacionaes.

Foi por esta rasão que eu insisti com o sr. ministro para que me dissesse se, effectivamente, da parte do governo hespanhol tem havido algum inconveniente para a combinação do ponto de entroncamento.

S. exa. disse que não podia fazer declaração alguma n'este sentido; mas, se não as quer fazer, é porque sabe que o governo do reino vizinho só tem querido attender ás condições estrategicas, e porque entende que a ellas é que principalmente deve attender.

Sr. presidente, se os governos das nações que estão em melhores circumstancias do que a nossa attendem sempre ás condições estrategicas, é esta, pois, uma rasão para nós não descurarmos os nossos interesses por esse lado.

É essa, pois, mais uma rasão para se fazerem os estudos engeitando as condições estrategicas.

Não se tem feito isso, e o resultado de não se ter feito e que se deveria fazer, é o nosso paiz estar completamente indefezo em circumstancias precarias, no caso de uma invasão estrangeira.

Se se attendesse a estas rasões e a outras tambem importantes, a linha do Douro e a do valle do Tejo deveriam ter sido as primeiras a construir. A do valle do Tejo foi sacrificada ao ramal de Caceres, que entrega indefesa a provincia do Alemtejo aos bespanhoes no caso de conflicto com aquella nação, e a do Douro foi sacrificada á da Beira Alta, que recebe no Porto a sua principal fonte de riqueza.

Foi necessario que o Perto abrisse os olhos e execcesse grande pressão sobre o governo; para elle tratar de um negocio que já devia estar concluido.

Duvido que nas circumstancias a que as cousas chegaram, o attendendo ás vantagens que a Hespanha tira pela construcção da linha da Beira Alta, se possa chegar ainda a uma solução vantajosa para o Porto. Oxalá que o talento e o saber do nosso ministre em Hespanha possam remediar a ignorancia ou, pelo menos, a leviandade do governo n'esta questão.

Eu vou concluir, e se por um lado folgo que as minhas idéas, sustentadas por longo tempo, sejam as que realmente se reconhecem agora como verdadeiras, por outro lado lamento que a obcecação do governo tenha produzido tantos e tão grandes males, de que o paiz too sido victima.

Sr. presidente, como eu, não tinha auctoridade, quando fallava em propostas d'esta ordem, por falta de competencia, o se não eram ellas da minha especialidade, não me admirava que as minhas palavras as levasse o vento; o que me admirava, porém, é que os estudos de engenheiros distinctos e competentes, o trabalho de uma commissão escolhida para tratar pelo governo hespanhol d'este assumpto, apesar de eu me escutar ar com elle, não fossem attendidos nem se désse a mais leve importancia a sua auctoridade, e que os levasse tambem o vento!

Isto é que me admirava, e admira agora. Hoje reconhece-se-me a rasão, e esse escripto é consultado e attendido. Oxalá que não seja tarde,

O Presidente: - Está extincta a inscripção; vae-se votar o artigo 2.° e o seu § unico.

Consultada á camara, foi approvado, como o foram os artigos 3.°, 4.° e 5.° sem discussão; entrou em seguida em discussão o

Artigo 6.°

O sr. Vaz Preto: - Peço a palavra.

O sr. Presidente: - Tem v. exa. a palavra.

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O sr. Vaz Preto: - Este projecto, se não fosse a escassez do tempo, e se podesse voltar ainda á outra casa do parlamento, com emendas, devia ser combatido, porque até lhe falta a redacção, mas n'esta occasião é impossivel fazel-o.

Não posso deixar, comtudo, de chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas, provocando uma explicação de s. exa. ácerca do artigo 6.°, cuja redacção está escura e incomprehensivel.

Eis o artigo:

"É o governo auctorisado a levantar, pelos meios que julgar mais convenientes, os fundos necessarios para a execução d'esta lei, sem prejuizo da situação do thesouro."

Sem prejuizo da situação do thesouro! Que quer dizer esta phrase? Que significa esta prevenção? Não sabem todos que os governos têem obrigação de zelar os interesses do paiz?

Esta phrase sem duvida significa a desconfiança que o proprio sr. ministro tem da sua pessoa, que até carece de pôr peias ás suas inclinações e tendencias esbanjadoras.

Sr. presidente, este caminho de ferro tem forçosamente encargos para o thesouro importantes, o caminho até á Barca de Alva na rasão de 45:000$000 réis por kilometro, sendo pouco mais ou menos o que falta a construir 93 kilometros, traz um encargo de cerca de 31:000$000 réis todos os annos, portanto o governo ha de ver-se na necessidade de fazer um emprestimo de perto de 4.500:000$000 réis.

Era melhor que o governo fosse franco e expozesse ao paiz com clareza e lealdade o estado d'esta questão.

O caminho de ferro até á Barca de Alva é dispendiosissimo; e de difficuldades technicas talvez sem iguaes nas outras linhas ferreas de Portugal, ha de custar muito mais do que o orçamento;

Estou convencido, julgando pelo troço que já está feito, que nem 5.000:000$000 réis chegarão para a sua conclusão.

A receita que se propõe nos paragraphos do artigo 6.° faz rir: é uma receita ridicula e insignificante, e prova a pouca seriedade com que o sr. ministro trata uma questão, de tão alta magnitude.

A camara conhece o alcance d'este assumpto, apresente-o pois o governo como deve e diga que precisa de mais 5:000:000$000 réis para a conclusão d'aquella linha ferrea.

Eis o que diz o artigo 6.º e seus paragraphos:

"Artigo 6.° É o governo auctorisado a levantar, pelos meios que julgar mais convenientes, os fundos necessarios para a execução d'esta lei, sem prejuizo da situação do thesouro.

"§ 1.° Para a construcção da secção desde o Pinhão até á foz do Tua são applicados os seguintes recursos extraordinarios no anno economico proximo futuro:

"1.° O capital que da companhia real dos caminhos de ferro portuguezes receber o estado como indemnisação pelo uso da estação do Porto;

"2.° Os carris em deposito e de que possa dispor-se, sendo cedidos aos constructores pelo seu valor no mercado;

"3.° As sobras dos diversos capitulos dos orçamentos ordinario e extraordinario do ministerio das obras publicas, commercio e industria.

"§ 2.° Todo o augmento do producto liquido do caminho de ferro do Douro, alem do que se acha calculado no orçamento de 1880-1881, será applicado ao prolongamento do mesmo caminho de ferro, constituindo annuidade representativa do capital que lhe corresponder.

"§ 3.° O governo consignará todos os annos no orçamento as verbas necessarias para occorrer aos encargos das operações necessarias a fim de concluir até á fronteira o caminho de ferro do Douro."

Isto quer dizer em bom portuguez que o governo vem pedir mais uma auctorisação ás côrtes, lata, e sem se dignar esclarecel-as nem dar-lhes explicações.

Esta auctorisação é latissirna desde que o governo, segundo a doutrina do § 3.°, fica com a auctorisação de consignar no orçamento todas as verbas necessarias para occorrer aos encargos d'este melhoramento.

N'este paragrapho resume-se o essencial, e effectivamente se elle não fosse inserto no projecto, a linha de que se trata ficaria rio papel, porque a receita consignada pelos outros paragraphos é irrisoria.

O governo continua no seu programma e systema: tudo illusão, tudo poeira aos olhos do publico. Era melhor que o governo fallasse franca e desassombradamente e dissesse que era necessario e forçoso fazer um emprestimo muito importante de cerca de 5.000:000$000 réis.

Esta é que é a verdade, este é que é o estado da questão.

Sr. presidente, tenho pena que a sessão esteja tão adiantada, e que seja necessario votar o pensamento do projecto, aliás discutida circumstanciadamente na especialidade este conjuncto de leviandades e incoherencias.

Não admira que o projecto venha eivado de incoherencias e de leviandades, pois o sr. ministro nunca pensou em submetter ao parlamento uma similhante medida.

O caminho de ferro do Douro tinha sido riscado da sua memoria pelo ramal da Figueira e linha de Torres Vedras. A sua imaginação viva e o seu elevado pensamento tinham se concentrado inteiramente e esgotado n'aquellas linhas, que s. exa. julgava e julga as mais uteis ao paiz, e da maior urgencia a construir.

O Porto, porém, acordou, viu que os seus interesses corriam á revelia, o seu despertar aterrou o governo, que immediatamente, sem attenção para as circumstancias do thesouro, sem attenção para> o seu programma governativo, sem attenção para a opinião accentuada do sr. ministro da fazenda, poz tudo de parte, todas as considerações desappareceram, e fez logo votar o projecto da ponte pensil em ambas as casas do parlamento; este projecto veiu até votar-se aqui, e o porto de Leixões foi votado na outra camara.

Sr. presidente, é triste e vergonhoso este systema de governar, só, unica e exclusivamente por pressões.

Um governo assim não tem idéas nem convicções suas, está á mercê dos outros e abaixo de toda a critica.

Sr. presidente, muito tinha que dizer, mas limito aqui a minha ordem de considerações, porque o tempo não permitte que eu seja mais extenso; não obstante, peço ao sr. ministro que declare por dignidade sua quaes são as idéas que tem ácerca do assumpto que se discute, visto o projecto vir desacompanhado de documentos, e que diga como se deve entender este artigo 6.°, cuja redacção é absurda.

Desejo tambem que s. exa. explique como o governo, com esta serie de despezas avultadas e successivas, pretende attingir o equilibrio orçamental.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Saraiva de Carvalho): - Pedi a palavra para responder ao digno par, que desejou saber como entendo as palavras "sem prejuizo da situação do thesouro".

O motivo por que se acham n'este artigo as palavras "sem prejuizo da situação do thesouro" é para salvar a receita actual, consagrando apenas o accrescimo ou excesso d'essa receita ao pagamento da annuidade e juro das sommas levantadas para as obras de que se trata.

É este o pensamento que presidiu á redacção do artigo. Não sei se me fiz comprehender.

(Áparte do sr. Vaz Preto, que não se ouviu.)

Deve chegar, pelo menos durante o primeiro semestre do proximo anno economico, porque temos a liquidação que se deve fazer com a companhia do norte relativamente á estação do Pinheiro, que versa sobre uma quantia de 340:000$000 réis.

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Ainda que não se receba senão metade, assim mesmo é uma verba importante.

Temos tambem os carris, de que ha pouco fallei, que representam uma quantia importante, que deve ser entregue aos constructores. Só em carris do aço, come disse, temos 55:400 metros correntes, não fallando nos de ferro.

Temos igualmente o acrescimo de receita da linha do Douro.

Pelo que respeita ao ramal do Pinheiro, a que o digno par se referiu, cumpre-me dizer que ligo a maior importancia a esse ramal, porque espero que traga um grande augmento de receita.

Estou persuadido, e commigo os que têem conhecimento d’esta linha, que a construcção de um ramal do Pinheiro até ao esteiro de Campanhã, ha de dar um grande augmento de receita.

O sr. Presidente: — Como não ha mais nenhum digno par inscripto, vae se votar o artigo 6.°

Posto á votação o artigo 6.° foi approvado, sendo em seguida tambem approvados os artigos 7.° e 8.°

O sr. Costa Lobo (sobre a ordem}: — Como ainda ha muitos projectos sobre a mesa, proponho que a sessão seja prorogada até ás 6 horas.

O sr. Pontes Pereira de Mello: — Sr. presidente, não tenho duvida de approvar que se prorogue a sessão logo que os srs. ministros declarem quaes são os projectos de que carecem; mas concorrer para uma prorogação, sem que saiba o que se pretende discutir, isso não faço eu. (Apoiados.}

O sr. Costa Lobo: - Sr. presidente, eu tenho a declarar ao digno par que não sei quaes são os projectos. Naturalmente é o sr. presidente a pessoa competente para designar quaes são os projectos. Naturalmente é o sr. presidente a pessoa competente para designar quaes são os projectos que convem discutir de preferencia.

Pela minha parte faço a proposta, porque me consta que ha muitos projectos do lei sobre a mesa, que têem corrido todos os tramites do regimento, e que a camara pedia trabalhar mais uma hora.

O sr. Presidente: — Eu vou perguntar aos srs. ministros quaes são os projectos que julgam indispensavel que entrem em discussão, para que a camara fique habilitada a declarar se se oppõe ou concorda na prorogação da sessão, sabendo o que se pretende discutir. (Apoiados.}

O sr. Mendonça Cortes: — Sr. presidente, eu tinha pedido a palavra sobre a ordem para indicar a conveniencia de se discutir o parecer n.° 80, que versa sobre assumpto que já em tempo a commissão de fazenda analysou e que tinha ficado adiado por falta de uns documentos que já vieram.

No mesmo caso está o parecer n.° 17 e o parecer da commissão de fazenda sobre o projecto de lei n.° 84.

Pedia, portanto, a v. exa. que pozesse desde já em discussão estes pareceres.

O sr. Mathias de Carvalho: — Mando para a mesa o parecer sobre a convenção entre Portugal e o Brasil.

O sr. Presidente: — Eu vou dizer ao sr. Fontes quaes são os projectos que eu tenho de propor para discussão, a pedido dos srs. ministros.

Se os dignos pares concordassem em me deixar fazer esta indicação ficariam mais habilitados a votar. (Apoiados.)

Muito bem. Eu tinha tenção de pôr em discussão o parecer n.° 136, que approva os contratos feitos com o banco ultramarino, e depois, attendendo ao pedido que me foi feito pelo sr. ministro do reino, tencionava pôr em discussão os pareceres n.ºs 106, 107, 101 e 118, e o n.° 138 pedido pelo sr. ministro da marinha e o n.° 137.

Alem d’estes pareceres ha tambem o parecer agora indicado pelo sr. Mendonça Cortez, que é o n.° 80 cobre o projecto de lei n.° 54, que diz.

(Leu.)

Este projecto já esteve em discussão e tinha voltado á commissão, em vista das observações feitas pelo digno par o sr. Vaz Preto até que chegassem á camada uns documentos que faltavam; mas agora o sr. Mendonça Cortez, como relator da commissão, diz que já examinou esses documentos e que não lhe parece que haja motivo para demorar mais a decisão d’este projecto.

Ora, eis-aqui os pareceres que eu tenho tenção de pôr em discussão.

O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro): — Sr. presidente, eu devo declarar que entre os pareceres relativos a negocios do meu ministerio e indicados por v. exa. ha alguns que reputo mais indispensaveis e entre elles o que é relativo ao Lazareto, que não traz augmento de despesa e é de conveniencia para a saude publica.

Devo ponderar que só n’este anno eu já despendi com os facultativos extraordinarios cerca de 2:000$000 réis. Julgo, pois, indispensavel esta proposta, porque trata de acudir a uma urgentissima necessidade e, alem d’isso, não traz augmento de despeza, pelo contrario, produz uma importante economia.

Necessitava tambem que se discutisse o projecto relativo á creação de uma escola agricola e o que tem por fim auctorisar o governo a adquirir uma casa para a estação de saude em Belem.

Com esta proposta, que julgo igualmente importante, procuro salvar a capital de um perigo imminente, qual é a invasão de uma epidemia que a possa assolar.

Devo ainda lembrar outro projecto que tem por fuá aposentar com o ordenado que lhe couber o sr. D. João Pedro da Camara, que foi governador civil de Lisboa. E uma questão do gratidão para com um empregado que se tornou distincto no serviço publico. (Apoiados.) Demais, a despeza para o estado não é senão de 600$000 réis, porque este empregado não tem o tempo de serviço necessario para se aposentar com o ordenado por inteiro.

Estes são os projectos mais urgentes que eu desejo que a camara possa approvar.

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): — Por minha parte e em nome do governo eu instava para que fosse discutido o projecto a que alludiu o sr. Mendonça Cortez e que diz respeito a um certo numero de bonds da nossa divida que foram queimados.

Em tempo competente vieram aqui os documentos e o respectivo processo devidamente informado pelo sr. procurador geral da corôa. Parecia-me, pois, que este projecto estava nas condições de ser discutido hoje.

O sr. presidente: — A primeira cousa a fazer é votar o requerimento do sr. Costa Lobo. Os dignos pares que o approvam tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Ministro da Marinha (Marquez de Sabugosa): — Eu pediria que o parecer n.° 137 fosse posto em discussão, visto que traia de um negocio de toda a justiça. Igual pedido faço a respeito do projecto para a creação de uma medalha de oiro,

Leu-se na mesa o parecer n.° 80.

É o seguinte:

Parecer n.° 80

Senhores. — A vossa commissão de fazenda examinou com a devida attenção o projecto de lei n.° 45, da camara dos senhores deputados, pelo qual é o governo auctorisado a mandar emittir pela junta do credito publico, a favor do cidadão inglez Robert Stodarf Wyld, 2:000 libras em titulos de inscripções de assentamento, com vencimento da juros desde 1 de julho de 1876, e intransmissiveis até igual dia de 1906, alem de outras clausulas especiaes.

A vossa commissão

Considerando que esta somma é a correspondente pelo cambio de 54 a 10 bonds do fundo de 1853 n.ºs 12:266 e 12:348 de £ 500 cada um 5 n.ºs 306 e 367 de £ 200, o n.ºs 113:524,191:531, 203:297; 215:029, 244:506, 245.453

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de £ 100, que o referido Robert Stodart Wyld allega terem-lhe sido roubados o destruidos;

Considerando que do exame dos affidavits respectivos, communicados ao governo pelo ministro de Sua Magestade Britannica, e existentes no ministerio da fazenda, consta a presumpção fundada da verdade d’aquellas allegações;

Considerando que esta presumpção mais se corrobora com o facto significativo de até hoje não terem sido apresentados a pagamento aquelles titulos desde a epocha do seu extravio (junho de l877);

Considerando não convir ao credito publico que o estado se recuse a renovar os titulos emittidos, quando se prove, ou haja forte presumpção, de que foram destruidos; parecendo querer locupletar-se com o damno e desgraça dos respectivos proprietarios;

Considerando que o precedente estabelecido pela portaria de 28 de julho de 1859 com os portadores dos bonds extorquidos por um delegado da agencia financial em Londres, e pela lei de 16 de maio de 1878 com o banco lusitano, impõe ao estado a obrigação de deferir a pretensões identicas;

Considerando que as clausulas d’esta remissão, attinentes ao capital e ao pagamento dos seus juros, garantem sufficientemente a fazenda publica contra a eventualidade improvavel do apparecimento dos bonds extraviados:

É a vossa commissão de parecer que merece a vossa approvação o seguinte projecto de lei, vindo da camara dos senhores deputados.

Sala da commissão de fazenda da camara dos dignos pares, em 8 de maio de 1880. = Carlos Bento da Silva = Conde de Castro = Conde de Samodães = Antonio de Serpa Pimentel = Mathias de Carvalho e Vasconcellos = Thomás de Carvalho = Barros e Sá = José de Mello Gouveia — J. J. de Mendonça Cortez.

Projecto de lei n.° 45

Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar emittir pela junta de credito publico inscripções de assentamento a favor de Robert Stodart Wyld, subdito inglez, com vencimento de juros, do segundo semestre de 1876 inclusive em diante, e com a clausula de intransmissiveis durante trinta annos, contados do 1.° de julho de 1876, pela importancia correspondente ao cambio de 54, a dez bonds extraviados no total de £ 2:000 do fundo de 1853, sendo dois de £ 500, n.ºs 12:266 e 12:348, dois de £ 200, n.ºs 366 e 367, e seis de £ 100, n.º 113:523, 191:531, 203:297, 215:029, 244:606 e 245:453.

Art. 2.° Os juros das ditas inscripções só poderão ser pagos cinco annos depois de findo o semestre a que respeitarem, isto é, depois de prescriptos os juros dos titulos que se reputam destruidos.

Art. 3.° Se, durante o praso indicado no artigo 1.°, forem apresentados a pagamento os coupons dos bonds que desappareceram, proceder-se-ha á amortisação das inscripções creadas por esta lei, sem que o interessado Robert Stodart Wyld tenha direito a indemnisação alguma da parte do estado;

§ unico. O interessado, dada a hypothese do presente artigo, será obrigado a restituir ao estado os juros que houver recebido das inscripções creadas por esta lei.

Art. 4.° Decorrido o praso marcado para a prescripção dos creditos representados nos bonds, será annullada a clausula de intransmissibilidade exarada nos novos titulos e estes ficarão livres para todos os effeitos.

Art. 5.° Reciprocamente, se depois do praso da prescripção reapparecerem os bonds, serão estes considerados de nenhum valor e fôra das garantias que as leis da respectiva creação lhes conferiram.

Art. 6.° Annullada a clausula de intransmissibilidade a que se referem os artigos 1.° e 4.°, poderão ser pagos os juros vencidos e não satisfeitos em virtude do disposto no artigo 2.°

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 9 de abril de 1880. = Antonio José da Rocha, deputado vice-presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = Antonio José d’Avila, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 139-I

Senhores. — Em presença das considerações que precederam a proposta de lei apresentada pelo meu illustre antecessor na pasta da fazenda em sessão de 21 de abril de 1879 e publicada no Diario do governo n.° 89 de 22 do dito mez, tenho a honra de pedir a vossa approvação para o referido projecto concebido nos seguintes termos:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar emittir pela junta do credito publico inscripções de assentamento a favor de Robert Stodart Wyld, subdito inglez, com vencimento de juros do segundo semestre de 1876 inclusive em diante e com a clausula de intransmissiveis, durante trinta annos, contados de 1 de julho de 1876 pela importancia correspondente ao cambio de 54, a dez bonds extraviados no total de £ 2:000 do fundo de 1853, sendo 2 de £ 500, n.ºs 12:266. e 12:348, 2 de £ 200, n.ºs 366 e 367, e 6 de £ 100, n.ºs 113:523, 191:531, 203:297, 215:029, 244:606 e 245:453.

Art. 2.° Os juros das ditas inscripções só poderão ser pagos cinco annos depois de findo o semestre a que respeitarem, isto é, depois de prescriptos os juros dos titulos que se reputam destruidos.

Art. 3.° Se, durante o praso indicado no artigo 1.°, forem apresentados a pagamento os coupons dos bonds que desappareceram, proceder-se-ha á amortisação das inscripções creadas por esta lei, sem que o interessado Robert Stodart Wyld tenha direito a indemnisacão alguma da parte do estado.

§ unico. O interessado, dada a hypothese do presente artigo, será obrigado a restituir ao estado os juros que houver recebido das inscripções creadas. por esta lei.

Art. 4.° Decorrido o praso marcado para a prescripção dos creditos representados nos bonds, será annullada a clausula de intransmissibilidade exarada nós novos titulos e estes ficarão livres para todos os effeitos.

Art. 5.° Reciprocamente, se depois do praso da prescripção reapparecerem os bonds, serão estes considerados de nenhum valor e fóra das garantias que as leis da respectiva creação lhes conferiram.

Art. 6.° Annullada a clausula de intransmissibilidade, a que se referem os artigos 1.° e 4.°, poderão ser pagos os juros vencidos e não satisfeitos em virtude do disposto no artigo 2.°

Art. 7.° Fica revogada a legislarão em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, 30 de março de 1880. = Henrique de Barros Gomes.

Proposta de lei n.° 102-M

Senhores. — O dr. Robert Stodart Wyld era possuidor de dez bonds da divida externa portugueza da emissão de 1853, no total de £ 2:000, sendo dois n.ºs 366 e 367 de £ 200, dois n.ºs 12:266 e 12:348 de £500, e seis n.ºs 113:523, 191:531, 203:297, 215:029, 244:606 e 245:453 de £ 100, que lhe foram roubados, juntamente com outros valores, quando viajava pela Escocia em setembro de 1876.

Descobertos os roubadores, foram estes sentenciados pelo tribunal de Edimburgo em 25 de junho e 9 de julho de 1877, declarando então a mulher de um dos mesmos roubadores que, ignorando o valor dos papeis roubados, tinham, ella e o marido, queimado a carteira que os continha.

Os factos assim expostos acham-se circumstanciadamente narrados nas peças officiaes (affidavits) extrahidas do processo e existentes no ministerio a meu cargo, com recommendação ao governo portuguez, do ministro de Sua Magestade Britannica em Lisboa.

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Considerando que, embora não se prove plenamente a destruição dos titulos, é ella presumivel, não tendo sido apresentados a pagamento até hoje os respectivos coupons vencidos;

Considerando não ser justo nem conveniente para o credito publico que o estado se recuse absolutamente á renovação dos titulos que emittiu, lucrando com o prejuizo do proprietarios, quando ha extravio d’aquelles titulos;

Considerando que, passando-se novos titulos de assentamento, sujeitando-lhes a livre disposição á prescripção de trinta annos, com os juros pagos com atrazo de cinco annos, como se praticou com o banco lusitano pela carta de lei de 16 de maio de 1878, fica sufficientemente garantida a fazenda contra a eventualidade pouco provavel do reapparecimento dos bonds que se reputam queimados:

Tenho a honra de apresentar á vossa consideração a seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar emittir, pela junta do credito publico, inscripções de assentamento a favor de Robert Stodart Wild, subdito inglez, cem vencimento de juros do segundo semestre de 1876 inclusive em diante, e com a clausula de intransmissiveis, durante trinta annos, contados do 1.° de julho de 1876, pela importancia correspondente ao cambio de 54, a dez bonda extraviados no total de £ 2:000 do fundo de 1853, sendo dois de £ 500, n.ºs 12:267 e 12:348, dois de £ 200, n.ºs 866 e 367 e seis de £ 100, n.ºs 113:523, 191:531, 203:297, 215:029, 244:606 e 245:453.

Art. 2.° Os juros das ditas inscripções só poderão ser pagos cinco annos depois de findo o semestre a que respeitarem, isto é, depois de prescriptos os juros dos titulos que se reputam destruidos.

Art. 3.° Se durante o praso indicado no artigo 1.° forem apresentados a pagamento os coupons dos bonds que desappareceram, proceder se-ha á amortisação das inscripções creadas por esta lei, sem que o interessado Robert Stodart Wyld tenha direito a indemnisação alguma da parte do estado.

§ unico. O interessado, dada a hypothese do presente artigo, será obrigado a restituir ao estado os juros que houver recebido das inscripções creadas por esta lei.

Art. 4.° Decorrido o praso marcado para a prescripção dos creditos representados nos bonds, será annullada a clausula de intransmissibilidade exarada nos novos titulos e estes ficarão livres para todos os effeitos.

Art. 5.° Reciprocamente se, depois do praso da prescripção, reapparecerem os bonds, serão estes considerados de nenhum valor e fóra das garantias que as leis da respectiva creação lhes confiram.

Art. 6.° Annullada a clausula de intransmissibilidade a que se referem os artigos 1.° e 4.°, poderão ser pagos os juros vencidos e não satisfeitos em virtude do disposto no artigo 2.°

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, 21 de abril de 1879. = Antonio de Serpa Pimentel.

O sr. Presidente: — Está em discussão na sua generalidade.

O sr. Vaz Preto: — Eu tinha pedido a palavra quando o sr. Cortez fez um requerimento, em que insistiu o sr. ministro da fazenda, para que se discutisse o parecer n.° 80. Esse parecer não póde entrar em discussão agora, porque tinha sido enviado de novo á commissão, e esta não viu ainda os documentos que lhe deviam ter sido apresentados e não deu o seu parecer. Causa-me espanto que o sr. Cortez, por sua conta, sem auctorisação da commissão, mande o projecto para a mesa sem parecer. Então o que foi o projecto fazer á commissão? Por que rasão, quando eu discutia este projecto, veio o digno par aconselhar-ma que propozesse o alvitre para voltar á commissão, que elle era acceito?

Sr. presidente, então a opinião do digno par era que voltasse o projecto á commissão para de lá não sair mais, e o proprio sr. ministro estava de accordo em tudo isto. Agora os ventos mudaram, e com elles a convicção do sr. ministro da fazenda e tambem a do sr. Cortez. Qual o motivo de tão momentanea transformação? S. exas. o sabem, o presentem-o. Como o governo não faz cousa algum a não ser pelo medo e pela pressão, sem duvida n’este proceder do sr. ministro da fazenda ha pressão forte e pressão estranha.

A commissão não leu os documentos que, a requerimento meu, foram enviados á camara, porque de certo não lhe foram presentes. Eu tambem os não li, embora elles fossem remettidos á camara, porque esperava pelo parecer da commissão, ou antes, porque suppunha que o projecto morreria na commissão.

Alem d’isso, precisava trazer varios apontamentos e documentos que não trouxe, porque não suppunha que este projecto podesse entrar agora em discussão; tanto mais que estão dados para ordem do dia muitos outros projectos do governo, como v. exa. já indicou, que devem ser discutidos de preferencia a este. Por todos estes motivos entendo que o regimento não deve ser dispensado.

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): — Sr. presidente, pedi a palavra unicamente para repetir á camara o que ha pouco disse de um modo bem acentuado. Trata-se de restituir a um subdito inglez uma porção de bonds que lhe foram queimados, como já muitas outras vezes tem succedido. A restituição já se devia ter feito, desde muito, mas até hoje ainda se não realisou. N’este ponto appello para o testemunho do meu digno antecessor; e de certo ninguem desconhece que isto é uma questão que até certo ponto tende a acreditar o paiz, devendo notar-se que, havendo-se queimado, na mesma occasião, titulos de diversas nações, por todas teem sido substituidos os titulos queimados por outros, com excepção unica de Portugal.

Eu enviei á camara todos es documentos logo que foram pedidos pelo digno par; portanto, continuo insistindo, em nome do governo, pela discussão d’este projecto.

O sr. Vaz Preto: — O sr. ministro da fazenda, para impressionar a camara, começou por discutir o projecto em elle estar em discussão. Não me parece regular o proceder, e muito menos quando os argumentos do sr. ministro não são verdadeiros, e são só para produzirem effeito no animo dos pares. S. exa. até chegou a asseverar que não resta a mais leve duvida em que os titulos foram destruidos, e que os documentos o provam á evidencia. Pois eu, sem entrar na discussão, posso desde já affiançar á camara que a asserção do sr. ministro é completamente falsa que, nem á face do projecto, nem dos documentos, se póde provar que os titulos foram queimados.

S. exa. quer aproveitar o tempo, e se o governo tem necessidade de que se entre na discussão de outros projectos, é melhor que não se discuta agora este, pois eu posso assegurar a v. exa. e á camara que julgo tão importante o assumpto d’este projecto, que não me bastará esta sessão só para o discutir e examinar como elle merece.

Alem d’este motivo, que é conducente e forte de sobejo, a camara, não discutindo agora o alludido projecto, presta homenagem aos bons principios, porque os documentos não vieram a tempo de serem examinados e a commissão não apresentou o seu parecer, como lhe cumpria. Alem d’isso, este projecto tinha sido adiado a requerimento meu, e sem mais nem menos o sr. ministro da fazenda vem apresental-o á discussão, sem dar as necessarias explicações que para isso teve, nem a commissão dar o seu parecer! Isto é caso novo e original.

Se este projecto estivesse dado para ordem do dia, eu teria trazido os documentos que aqui não tenho, para o poder discutir com perfeito conhecimento de causa.

Se a camara resolver a dispensa do regimento, discutirei tambem, mas sem documentos.

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O sr. Presidente: — Este projecto já teve uma larga discussão, e no meio della, por indicação do sr. Vaz Preto, voltou á commissão.

S. exa. está no seu direito de querer ver os documentos que foram enviados á camara, á qual pergunto se quer que fique adiada a discussão d’este projecto até serem examinados os documentos.

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): — Os documentos foram enviados immediatamente; logo que o digno par os pediu.

O sr. Vaz Preto: — É necessario esclarecer bem esta questão. Se eu soubesse que este projecto entrava hoje em discussão, viria preparado para tratar devidamente do assumpto. Este projecto foi adiado a requerimento meu e remettido á commissão a pedido do sr. Cortez. Ora, como eu pedi documentos que lhe haviam de ser presentes, esperava que sobre elles a commissão d’esse o seu parecer, a fim de seguir os tramites legaes. Os documentos estão aqui, mas não houve tempo de tomar conhecimento d’elles, pois foram remettidos tarde e á pressa á camara, e não á commissão, para se fazer esta surpreza, que tem um fim ccculto, mas, como eu estou de atalaia, espero que não vingará.

Sr. presidente, querer discutir um projecto sem terem sido vistos nem examinados os documentos necessarios para nos esclarecerem, revela que n’este projecto ha o que se vê e o que se não vê.

O sr. ministro da fazenda não tinha, noutro tempo, interesse que este projecto se discutisse, até concordou que voltasse á commissão para lá ficar; mas as cousas transformaram-se de tal modo, que hoje já tem outra opinião e quer que seja discutido, custe o que custar, e embora se sacrifiquem os principios e a dignidade da camara. Esta é que é a verdade.

Pôde, pois, s. exa. fazer os esforços que quizer para que a camara dispense o regimento a fim d’este projecto entrar em discussão, que nada conseguirá. Deus deu-me intelligencia bastante e voz assas clara e sufficiente para eu poder fulminar, durante esta, e mais algumas sessões, o abuso que este projecto vae sanccionar.

É um abuso que se tem praticado constantemente, e convem acabar com elle por uma vez. O sr. ministro quer fazel-o continuar, e eu, como quero que este negocio seja tratado madura e seriamente pela camara, n’uma outra sessão em que não haja pressa, e em que a camara esteja com toda a sua attenção para a gravidade do assumpto, encarrego-me hoje de continuar os desejos do sr. ministro, e impedir que elles se convertam em realidade.

Por hoje póde s. exa. perder as esperanças que nada conseguirá, pois o projecto não lhe será approvado sem discussão seria e grave.

O sr. Cortez: — Os documentos requeridos pelo digno par, o sr. Vaz Preto, estão sobre a mesa. Analysei esses documentos e reconheci em minha consciencia que não produziam cousa alguma que podesse alterar o voto da commissão que deu parecer sobre este assumpto.

O digno par diz que a commissão não estudou a questão.

Não sei se a commissão estudou ou não; o que sei é que fez o que costumam fazer todas as commissões. Se s. exa. não tomou conhecimento dos documentos que vieram, nada impede que os examine. O que posso assegurar é que o projecto de que se trata não e nada mais, nem nada menos do que a renovação da iniciativa que se tomou o anno passado. (Apoiados.)

Então a camara approvou uma proposta analoga, e, portanto o que o anno passado era justo, não o ha de ser este anno da mesma fórma?

O sr. Presidente: — Pareceu-me que alguns dignos pares suppõem que o projecto de lei de que se têem occupado não foi posto ainda em discussão, e para que não continue essa duvida, devo declarar que já o submetti á discussão.

A camara póde resolver adial-o; mas a verdade é que o eu acabo de affirmar.

O sr. Quaresma: — Requeiro que se consulte a camara se póde continuar a discussão do projecto, a, que se refere o parecer n.° 80.

(Havendo algum sussuro na sala, não se percebeu o que disseram em áparte alguns dignos pares.}

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): — Devo declarar que pela minha parte insisto na discussão do projecto, que não é senão a renovação da proposta apresentada pelo ministerio passado.

O sr. Quaresma: — Insisto pelo meu requerimento.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam o requerimento do sr. Quaresma para que continue a discussão do parecer n.° 80 tenham a bondade de se levantar.

Procedeu-se á contagem dos dignos pares que se levantaram e verificou-se ter sido approvado o requerimento.

O sr. Presidente: — Está evidentemente approvado que continue a discussão do parecer n.° 80. Tem a palavra o digno par, o sr. Vaz Preto.

O sr. Vaz Preto: — O sr. ministro da fazenda apesar dos meus avisos obrigou a camara a dispensar o regimento. Parece-me que fez mal.

Parecia-me que se o governo tivesse empenho em que se votassem outros projectos que julga importantes, não devia ter insistido pela discussão do parecer n.° 80. Demais bastava um membro d’esta camara declarar que se não achava habilitado a discutir o referido projecto para o governo dever concordar com o seu adiamento, e não o obrigar a votar ás cegas.

Não suppunha que esta questão fosse debatida hoje, e tinha fundadas rasões para isso, porquanto não havia a commissão respectiva apresentado parecer sobre elle, depois de se ter aqui votado com annuencia da mesma commissão e do governo que o projecto em discussão voltasse á commissão para o considerar de novo, depois de examinar os documentos que requeri. Qual foi o parecer da commissão? O que diz ella ácerca dos documentos que lhe deviam ter sido enviados? Cousa alguma.

Vejo agora que alguma causa poderosa sobreveiu, para que da parte do governo se insista tanto na discussão do mesmo projecto; mas esta resolução não póde trazer comsigo outra consequencia senão impedir que se votem outros projectos na actual sessão, porque o assumpto que se debate é mais importante do que talvez se imagina, e de certo se não póde discutir a correr; eu pela minha parte não o consentirei.

Parece-me que na altura em que vae a sessão pouco será o tempo para se apreciar a materia d’este projecto.

Sr. presidente, tudo o que se tem passado ácerca d’esta questão é curioso. N’uma das sessões passadas eu tinha feito comprehender ao sr. ministro da fazenda e a alguns membros da commissão de fazenda que este projecto tinha uma certa gravidade, e que era preciso acabar com esta continuada serie de abusos com relação aos factos de que trata o mesmo projecto.

A commissão pareceu convencer-se do que eu ponderava, e tambem o proprio sr. ministro da fazenda, e acceitaram com bastante applauso meu o adiamento da discussão do projecto, devendo voltar este á commissão com o intuito de lá não sair mais, tanto estava convencido o sr. ministro e alguns membros da commissão, que o estabelecer precedentes d’esta ordem poderia custar ao paiz centenares de contos.

Affirmo a camara que quando propuz o adiamento por indicação de um dos membros da commissão, que o fiz com a convicção de que este projecto não sairia mais de lá; e por isso me admiro agora muito vel-o voltar da commissão sem parecer, e o sr. ministro da fazenda instar para que elle entre na ordem do dia.

Sr. presidente, quando entrou ha mais de um mez este projecto na ordem do dia, o sr. ministro não insistiu na

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discussão d’elle; e com bastante admiração minha volta agora á téla do debate, sem que a commissão tenha feito declaração alguma, sem que haja um novo parecer onde se mencione quaes os documentos que foram apresentados, e qual o seu merecimento e valor!

Tudo isto prova que o sr. ministro mudou de opinião. Desejâmos, pois, saber quaes foram os motivos que determinaram essa mudança de opinião.

Note a camara que o sr. Mendonça Cortez pediu que se discutisse de novo este parecer, mas não disse qual a rasão em que a commissão se fundou para insistir na discussão de um projecto que foi adiado. Fez mais; mandou o projecto para a mesa sob sua responsabilidade, e sem accordo com a commissão! Isto é um abuso, de que não ha precedentes.

Quando se procede d’este modo, e porque atraz do projecto ha alguma cousa escondida 5 o que se vê claramente é que existe um motivo forte que actua no animo do sr. ministro, que o obriga a proceder hoje de uma fórma differente d’aquella por que tinha procedido ainda poucos dias, por uma fórma pouco regular e digna de um governo serio.

Acho tão inconveniente a situação e o modo como o sr. ministro se tem apresentado n’esta questão, que me tenho exaltado um pouco, quando é certo que queria tratar este assumpto com a maior serenidade.

O sr. Fontes Pereira de Mello: — Peço a palavra sobre a ordem.

O Orador: — Como estou cansado, e o sr. Fontes pediu a palavra sobre a ordem, interrompo o meu discurso por alguns minutos, pedindo a v. exa., sr. presidente, que conceda a palavra ao digno par, porque talvez a sua moção de ordem concorra para o bom andamento d’esta discussão.

O sr. Presidente: — Então tem a palavra sobre a ordem o digno par o sr. Fontes Pereira de Mello.

O sr. Fontes Pereira de Mello: — Não proponho o adiamento do parecer n.° 80, porque a camara já resolveu que não se adiasse, mas como estão sobre a mesa alguns projectos de interesse publico, que os srs. ministros declararam que lhes eram necessarios, e como a sessão só póde durar mais meia hora, proponho que sejam discutidos em primeiro logar esses projectos, reservando-se para depois a discussão do que occupa agora a attenção da camara.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que a p provam a proposta, que acaba do ser feita pelo sr. Fontes Pereira de Mello, tenham a bondade de levantar-se.

Foi approvada.

O sr. Presidente: — Passâmos ao parecer n.° 136.

Leu-se na mesa.

É do teor seguinte:

Parecer n.° 136

Senhores. — O banco ultramarino encontrou-se no decurso do anno de 1878, em circumstancias difficeis, a ponto de não poder continuar as operações do seu instituto sem auxilio do thesouro; e pareceu então ao governo que, em vista da natureza especial d’este estabelecimento tão estrictamente relacionado com a administração financeira das provincias ultramarinas, devia prestar-lhe todos os auxilios que, sem prejuizo da fazenda publica, pozessem fóra de risco a solidez e credito do banco.

D’aqui resultaram os contratos de 12 de junho e 3 de dezembro de 1878, cuja approvação legislativa agora se propõe.

As conveniencias da administração das provincias ultramarinas, e os principios da equidade, aconselham a adopção do projecto n.°130, vindo da camara dos senhores deputados, no qual se contêem providencias conducentes a regularisar este assumpto em todas as suas relações; são, pois, as commissões de fazenda e do ultramar de opinião que o mesmo projecto seja approvado.

Lisboa, 4 de junho de 1880. = Visconde de Soares Franco = José de Mello Gouveia = Conde de Castro = J. J. de Mendonça Cortez = Visconde de S. Januario = Mathias de Carvalho e Vasconcellos = Barros e Sá = Marino João Franzini = S. L. de Calheiros e Menezes.

Projecto de lei n.° 133

Artigo 1.° São approvados os contratos de 12 de junho e de 3 de dezembro de 1878, com o banco nacional ultramarino, ficando relevado o governo da responsabilidade em que tiver incorrido por haver effectuado os mesmos contratos.

Art. 2.° É auctorisado o governo a prorogar por dezoito mezes, a contar do dia o de junho de 1880, o praso para o reembolso das sommas de que o estado for credor ao banco ultramarino em virtude do contrato de 3 de dezembro de 1878 e nos termos da condição 6.ª do mesmo contrato, devendo porém o banco nacional ultramarino, no fim de um anno, contado da mesma data, ter embolsado o estado de metade das sommas de que n’essa epocha lhe for devedor, e receber do governo as obrigações prediaes que existirem na sua mão, correspondentes ao embolso que effectuar.

Art. 3.° Fica relevado o governo da responsabilidade em que possa ter incorrido, pelo pagamento que fez ao banco nacional ultramarino da quantia de 357:000$000 réis, que d’elle receberam as juntas de fazenda das provincias de Angola e Moçambique para despezas das mesmas provincias.

§ unico. O governo providenciará para que esta quantia dó entrada nos cofres do thesouro, por intermedio do ministerio da marinha e ultramar.

Art. 4.° Fica legalisado o pagamento effectuado pela thesouraria do ministerio da fazenda por ordem do ministerio da marinha e ultramar, em 11 de outubro de 1876, de réis 66:007$293, importancia dos saldos de quatro emprestimos feitos pelo banco nacional ultramarino ás provincias de Angola e Cabo Verde.

§ unico. A mencionada quantia será levada a debito do banco ultramarino e addicionada á conta do contrato de 3 de dezembro de 1878, se aquelles emprestimos ainda não tiverem sido distratados; e ficará a cargo das provincias de Angola e Cabo Verde, para ser restituido ao ministerio da fazenda por intermedio do da marinha e ultramar, se se tiver effectuado o respectivo distrate.

Art. 5.° A legalisação dos pagamentos, a que se referem os artigos 3.° e 4.° da presente lei, far-se-ha por meio de creditos de igual importancia abertos a favor do ministerio dos negocios da marinha e ultramar para encontro das sommas abonadas pelo ministerio da fazenda; escripturando-se como reposição as quantias que as provincias deverão restituir, em virtude do disposto nos mesmos artigos.

Art. 6.° O governo dará conta ás côrtes do andamento e liquidação das operações realisadas em virtude dos contratos de que trata esta lei.

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 1 de junho de 188O. = Antonio José da Rocha, deputado vice-presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = Antonio José d’Avila, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 245-E

Senhores. — Na sessão legislativa de 1879 foi apresentado ao parlamento, pelo ministro e secretario d’estado que então geria os negocios da fazenda, a seguinte proposta de lei:

«Senhores, a creação do banco ultramarino trouxe importantes e reconhecidas vantagens ao desenvolvimento do commercio das nossas provincias africanas, e por mais do uma vez este estabelecimento tem prestado valiosos serviços á gerencia financeira dos governos d’aquellas provincias. Não sómente as transferencias de fundos da metropole se têem feito de ordinario por intermedio do mesmo

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banco, mas é elle que continuadamente presta ás juntas de fazenda e até ás camaras municipaes do ultramar o auxilio dos adiantamentos necessarios para a regular administração da fazenda n’aquellas afastadas provincias, sendo quasi sempre credor do estado e das juntas por quantias de alguma importancia.

«Nas transferencias do fundos para o ultramar, umas vezes o banco desembolsava primeiro os fundos que entregava ás juntas de fazenda e mais tarde era aqui embolsado dos seus creditos, outras vezes recebia aqui primeiro as sommas a transferir, que mais tarde entregava no ultramar, conforme as conveniencias do governo na occasião de se effectuarem estas operações de thesouraria.

«Chegou, porém, um momento em que as difficuldades do banco na sua sede em Lisboa, provenientes das irregularidades e subtracções que foram descobertas, pela infidelidade de alguns do seus empregados, impossibilitaram o banco do prestar nas provincias ultramarinas os serviços que eram necessarios, se não se lhe adiantassem aqui as soturnas que conviria transferir para o ultramar e que em parte correspondiam a adiantamentos que elle tinha feito ás juntas de fazenda.

«Ao mesmo tempo que os abusos commettidos pelos empregados do banco eram sujeitos á acção competente do poder judicial, e a gerencia superior do estabelecimento durante a epocha em que os abusos se haviam praticado era submettida ao exame dos accionistas, entendeu o governo, no interesse que tinha o estado em não pôr em risco eventual a solidez e credito do banco, que podia auxilial-o sem prejuizo dos interesses da fazenda. Este auxilio, sufficiente para livrar o banco de embaraços no momento em que a desconfiança causada pela revelação dos abusos e desvios dos fundos podia esgotar momentaneamente os seus recursos, consistiria nas operações, cujos contratos foram effectuados, e que o governo hoje submette ao vosso exame, e legalisação.

Representam estes contratos, como vereis, duas operações para transferencia de fundos, como outras anteriormente tinham sido feitas em diversas epochas.

«Como, porém, se tratava de quantias mais avultadas e de um praso mais longo, como o fim era não sómente o interesse directo do estado, mas o do proprio banco, embora sem onus para a fazenda publica, e como pareceu conveniente exigir do banco, no interesse do mesmo estado, garantias excepcionaes, e que não era costume exigir quando se tratava do operações de thesouraria d’esta natureza por quantias menos importantes, entende o governo que deve submetter estes contratos ao exame e approvação do poder legislativo.

«Do adiantamento de 200:000$000 réis, em virtude do primeiro contrato, já o governo está embolsado, e não foi este adiantamento superior a outros que haviam sido feitos em diversas epochas por meras operações de transferencias de fundos sem contrato especial.

«No momento em que se effectuava o segundo contrato pela importancia de 500:000$000 réis, era o banco credor no ultramar das juntas de fazenda e das camaras municipaes da somma de 367:000$000 réis, e tinha alem d’isso o mesmo banco aberto creditos em favor das juntas de fazenda e governadores geraes do ultramar, para o caso de guerra, sedição, e para precauções de segurança publica na importancia de 230:000$000 réis.

«Por esta rapida exposição vereis que dos contratos feitos com o banco nacional ultramarino, com as condições e garantias ali estabelecidas, nunca poderia resultar prejuizo á fazenda, mesmo no caso em que o banco não estivesse nas condições de solidez em que está effectivamente, pois que os desfalques e subtracções de que foi victima, apenas terão em resultado o prejuizo dos accionistas nos seus dividendos durante alguns semestres, mas não abalarão profundamente a solidez do banco, e muito menos a sua solvabilidade para com o governo ou para com terceiros.

«Com este relatorio vão alguns esclarecimentos que vos habilitarão a examinar o assumpto de que se trata, e irão todos aquelles que julgardes conveniente requisitar das estações officiaes.

«Tenho, pois, a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei.

«Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 19 de maio de 1879. = Antonio de Serpa Pimentel.

Proposta de lei

«Artigo l.° São approvados os contratos de 12 de junho e de 3 de dezembro de 1878 com o banco nacional ultramarino, ficando relevado o governo da responsabilidade em que tiver incorrido por haver effectuado os mesmos contratos.

«Art. 2.° Emquanto durarem os mencionados contratos, mandará o governo, se o julgar conveniente, procedera quaesquer investigações ou inqueritos sobre a gerencia e contas do banco, tanto na sua sede em Lisboa, como nas suas succursaes ou agencias no ultramar.

«Art. 3.° O governo dará conta ás côrtes do andamento e liquidação das operações realisadas em virtude dos contratos de que trata esta lei.

«Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

«Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 19 de maio de 1879. = Antonio de Serpa Pimentel.»

Esta proposta não chegou a ser convertida em lei.

Os contratos a que ella se referia não poderam ser sanccionados. Cumprindo, pois, um preceito constitucional, temos a honra de os submetter novamente á apreciação do poder legislativo. Tal é o intuito do artigo 1.° da proposta que hoje formulâmos.

O artigo 2.° funda-se na necessidade e no desejo que o governo tem de exigir o cumprimento das obrigações que o banco ultramarino contrahiu para com o estado, sem prejudicar a economia d’este estabelecimento de credito.

A condição 6.ª do contrato de 3 de dezembro de 1878 diz que esse contrato vigorará por espaço de dezoito mezes, a contar da sua data, findo o qual praso, ou antes, se assim concordarem as duas partes contratantes, o banco embolsará o estado das sommas de que lhe for devedor.

Ora o praso mencionado termina no dia 3 do proximo mez de junho, e o banco é devedor da totalidade do adiantamento que lhe foi feito, isto é, da quantia de réis 500:000$000.

Já declarou, porém, em officio dirigido pelo seu governador ao ministerio da fazenda; que por motivos de força maior, que desenvolvidamente expõe, não lhe é possivel entrar immediatamente nos cofres publicos com a mencionada quantia, achando-se a mesma declaração confirmada pelos resultados já conhecidos do exame a que está procedendo a commissão nomeada pelos ministerios da marinha e das obras publicas por decreto de 20 de novembro de 1879, e encarregada de exercer, com fundamento no artigo 6.° da carta de lei de 16 de maio de 1864, a necessaria vigilancia e fiscalisação nas operações do banco, nos termos das instrucções expedidas em 29 do citado mez de novembro.

Ora, a indole do referido estabelecimento e as suas intimas ligações com a vida economica e financeira das provincias ultramarinas, obrigam o estado a usar para com elle, como seu credor, de todas as contemplações que o interesse publico não prohiba e a equidade recommende. Propomos, pois, que se lhe conceda um praso maximo de dezoito mezes para satisfazer o seu debito na totalidade, obrigando-se elle a solver metade d’esse debito no espaço de um anno. D’esta sorte o cumprimento da sua obrigação ser-lhe-ha mais suave, e portanto mais seguro para o

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estado. A concessão não deve significar, porém, que fique subsistindo o alludido contrato de 3 de dezembro senão na parte relativa á garantia do adiantamento que o banco recebeu e aos encargos de juro que d’elle lhe resultam nos termos da condição 4.ª Na parte restante não convem nem é preciso revigoral-o, porque da sua execução resultaram já e poderiam continuar a resultar irregularidades na administração financeira do ultramar.

O artigo 5.° da proposta diz respeito a operações que procederam do modo como foi interpretado o contrato de 3 de dezembro, e que vamos relatar miudamente.

Celebrado esse contrato, o banco ultramarino recebeu da thesouraria do ministerio da fazenda até 14 de março de 1879, em diversas prestações, a quantia de 500:000$000 réis. Logo depois apresentou na mesma thesouraria recibos de diversas sommas que as suas agencias haviam entregado ás juntas de fazenda das provincias de Angola e Moçambique para despezas geraes d’essas provincias ou para custeio das suas obras publicas. E foi embolsado d’essas quantias por se entender que o contrato lhe dava direito emquanto vigorasse ao adiantamento permanente de 500:000$000 réis, e que portanto deviam ser reintegradas as sommas que transferisse para o ultramar logo que provasse a transferencia, sendo essas sommas levadas á conta dos creditos destinados ás despezas a que com ellas se houvesse occorrido.

Em 5 de julho de 1879, achando-se desembolsada por este modo uma verba importante, tratou o ministerio da fazenda de regularisar esse desembolso. Officiou para esse fim ao ministerio da marinha e ultramar enviando-lhe, como dinheiro, os recibos pagos ao banco. Mas este ministerio respondeu na mesma data, que não havia credito a seu favor em que a importancia d’esses recibos podesse ou devesse ser encontrada, e suscitando duvidas ácerca do modo como o contrato estava sendo interpretado.

Consultada então a procuradoria geral da corôa 8 fazenda sobre o ponto duvidoso, esta, em seu parecer, declarou, em substancia:

1.° Que concordava com a interpretação que pelo ministerio da fazenda se tinha dado ao contrato, porque a reputava em harmonia com as disposições do mesmo contrato;

2.° Que considerava o adiantamento feito ao banco como uma operação de conta do ministerio da fazenda, por onde fôra feito, e que por isso em nada prendia os recursos destinados para o ultramar, devendo por este ultimo ministerio ser pagos ao banco os supprimentos que este do sua conta fizesse, mas não sendo por este ministerio, como não tinha sido, que o adiantamento dos 500:000$000 réis em moeda corrente, havia de ser supprido, mas pelo ministerio da fazenda.

Em vista d’este parecer da procuradoria fiscal, continuaram a ser pagos na thesouraria do ministerio da fazenda os recibos das juntas que o banco lhe apresentava.

Como porém a somma d’estes pagamentos fosse avultando consideravelmente, o ministerio da fazenda, em 27 de dezembro de 1879, tornava a officiar ao do ultramar, relativamente a este assumpto, e com a resposta que obteve em 14 de fevereiro de 1880, consultou pela segunda vez a procuradoria geral da corôa e fazenda, a qual foi de parecer, em vista dos novos esclarecimentos que lhe eram fornecidos:

l.° Que o credito tinha a natureza de um adiantamento a embolsar pelo banco dentro do praso de treze mezes;

2.° Que as sommas mandadas abonar pelo ministerio da marinha ás juntas do ultramar por intervenção do banco, deviam ser reintegradas a este pelo mesmo ministerio;

3.° Que quaesquer sommas entregues pelas agencias do banco ás juntas de fazenda sem ordem do governo eram meras operações da thesouraria da responsabilidade das mesmas juntas.

N’estas conclusões da consulta alludida se firma o artigo 3.° da proposta que temos a honra de apresentar á vossa apreciação, porque, embora as quantias successivamente reintegradas ao banco ultramarino, na importancia de 357:000$000 réis, lhe tenham sido entregues em harmonia com a interpretação dada ao contrato, é certo que constituem realmente um adiantamento feito ás juntas de fazenda das provincias de Angola e Moçambique para despezas que são de exclusiva responsabilidade das mesmas juntas. E, comquanto a procuradoria considere tal adiantamento como mera operação de thesouraria, sendo certo que as juntas devedoras o não poderão repor immediatamente, o governo julga dever informar o parlamento do seu proceder n’este assumpto e pedir-lhe que legalise, nos termos do artigo 3.° e seu § da presente proposta de lei, o pagamento de 357:000$000 réis realmente não auctorisado, mas com que se acudiu a necessidades imperiosas que não poderiam deixar de ser attendidas de qualquer modo.

A legalisação não exonerará porém as juntas de fazenda das provincias de Angola e Moçambique da divida que contrahiram para com a metropole, e o governo providenciará para que ella seja solvida, assim como providenciou desde muito para que essas juntas, ou quaesquer outras, não continuassem a levantar fundos nas agencias do banco per conta dos cofres da metropole sem a devida auctorisação. A portaria do ministerio aos negocios do ultramar de 13 de janeiro de 1880 já produziu o devido resultado, e não haverá de futuro a fazer mais reintegração ao banco ultramarino, cumprindo unicamente a este estabelecimento, para a completa execução do contrato de 3 de dezembro, entrar nos cofres publicos com o adiantamento de réis 500:000$000 que recebeu.

Ainda chamaremos a vossa attenção, senhores, para uma outra operação com o banco ultramarino que carece ser regularisada. Em 11 de outubro de 1876 a thesouraria do ministerio da fazenda, a requisição do ministerio do ultramar, pagou ao banco a quantia de 66:007$293 réis, importancia dos saldos de quatro emprestimos contrahidos pelas provincias de Angola e Cabo Verde, que se accordou distratar.

Se o distrate, pois, se ultimou, o que ainda não consta das informações recebidas, precisa ser sanccionado pelo poder legislativo, ficando o desembolso do governo a cargo das provincias devedoras, e addicionando-se aquella importancia, na hypothese contraria, ao debito do banco, resultante do contrato de o de dezembro de 1878, conforme as disposições que introduzimos na economia da proposta pelo artigo 4.° e seu §.

A proposta de lei, cujos artigos explicámos e fundamentámos, destina-se portanto a regularisar a situação do banco nacional ultramarino perante o estado, e a destrinçar as diversas responsabilidades que se têem ligado ás operações financeiras effectuadas com esse estabelecimento. Alem dos documentos que a acompanham, o governo fornecerá quaesquer outros que o parlamente julgar necessarios para sua completa elucidação; e, firmando-se em todas estas considerações, tem a honra de vos propor a seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° São approvados os contratos de 12 de junho e de 3 de dezembro de 1878, com o banco nacional ultramarino, ficando relevado o governo da responsabilidade em que tiver incorrido por haver effectuado os mesmos contratos.

Art. 2.° É auctorisado o governo a prorogar por dezoito mezes, a contar do dia 3 de junho de 1880, o praso para o reembolso das sommas por que o estado for n’essa data credor ao banco ultramarino em virtude do contrato de o de dezembro de 1878 e nos termos da condição 6.ª do mesmo contrato; devendo, porém, o banco nacional ultramarino, no fim de um anno contado d’aquella data, embolsar o estado da metade das sommas de que n’essa epocha lhe for devedor, e receber do governo as obrigações pre-

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diaes que existirem na sua mão, correspondentes ao embolso que effectuar.

Art. 3.° Fica relevado o governo da responsabilidade em que possa ter incorrido pelo pagamento que fez ao banco nacional ultramarino, da quantia de 357:000$000 réis, que d’elle receberam as juntas de fazenda das provincias de Angola e Moçambique, para despezas das mesmas provincias.

§ unico. O governo providenciará para que esta quantia de entrada nos cofres do thesouro por intermedio do ministerio da marinha e ultramar.

Art. 4.° Fica legalisado o pagamento effectuado pela thesouraria do ministerio da fazenda por ordem do ministerio da marinha e ultramar em 11 de outubro de 1876 de réis 66:007$293, importancia dos saldos de quatro emprestimos feitos pelo banco nacional ultramarino ás provincias de Angola e Cabo Verde.

§ unico. A mencionada quantia será levada a debito do banco ultramarino e addicionada á conta do contrato de 3 de dezembro de 1878, se aquelles emprestimos ainda não tiverem sido distratados, e ficará a cargo das provincias de Angola e Cabo Verde, para ser restituido ao ministerio da fazenda, por intermedio do da marinha e ultramar, se só effectuar o respectivo distrate.

Art. 5.° A legalisação dos pagamentos a que se referem os artigos 3.° e 4.° da presente lei, far-se-ha por meio de creditos de igual importancia, abertos a favor do ministerio dos negocios da marinha o ultramar, para encontro das sommas abonadas pelo ministerio da fazenda; escripturando-se como reposição as quantias que as provincias deverão restituir em virtude do disposto nos mesmos artigos.

Art. 6.° O governo dará conta ás côrtes do andamento e liquidação das operações realisadas em virtude dos contratos de que trata esta lei.

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, 22 de maio de 1880. = Henrique de Barros Gomes = Marquez de Sabugosa.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Presidente: — Segue-se agora o parecer n.° 117.

Leu-se na mesa.

É do teor seguinte:

Parecer n.° 117

Senhores. — Á vossa, commissão de fazenda foi presente o projecto de lei n.° 88, vindo da camara dos senhores deputados, e tendo por fim alterar os direitos estabelecidos nos artigos 5.°, 124.°, 154.°, 172.° e 184.º da pauta geral das alfandegas, de 25 de janeiro de 1871, e substituil-os por outros.

A vossa commissão, considerando que as palavras meios de sola, da classe 2.ª, artigo 5.°, da mesma pauta, se prestam na pratica á sophismação das prescripções pautaes, com prejuizo do thesouro e não menor da industria nacional dos cortumes:

Considerando que a modificação proposta na pauta pela camara dos senhores deputados, elevando a 100 réis por kilo os direitos do papel estampado ou pintado para casas é excessiva e prejudica outras industrias nacionaes respectivas;

Considerando que da elevação a 50 réis por kilo nos direitos pagos pelo sabão estrangeiro advirá vantagem ao publico e á industria nacional pela protecção que esse aggravamento de direitos lhes dará contra a concorrencia estrangeira, não raro fraudulenta;

Considerando que o alargamento proposto ao artigo 172.° da pauta satisfaz as necessidades de ha muito sentidas na industria dos chapéus de chuva;

Considerando que a fixação dos direitos sobre cabos, amarras, cordas e enxarcias, feitos de substancias vegetaes, fio de carreta e de véla, meilim, linho, sondarezas e cordel, alem de aconselhada pelos interesses do thesouro, é tambem reclamada pelas industrias respectivas nacionaes;

Considerando que, sobrenada um d’estes pontos, o governo e a respectiva commissão da camara dos senhores deputados ouviram as estações competentes e colheram minuciosas e extensas informações:

É de parecer que merece a vossa approvação o seguinte projecto de lei, com a indicada modificação de accordo com o governo.

Sala das sessões da commissão de fazenda,, em 21 de maio de 1880. = Antonio de Serpa Pimentel, com declarações = Thomás de Carvalho = Mathias de Carvalho e Vasconcellos = Conde de Samodães, com declarações = Barros e Sá, com declarações = J. J. de Mendonça Cortez = Carlos Bento da Silva, com declarações.

Projecto de lei n.° 88

Artigo 1.° Os direitos estabelecidos nos artigos 5.°, 124.°, 154.°, 172.° e 184.° da pauta geral das alfandegas, de 25 de janeiro de 1871, são substituidos pelos seguintes: Eliminadas as palavras, meios de sola, da classe 2.ª artigo 5.°

Unidade Taxa

[ver valores da tabela na imagem]

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968 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Art. 2.° Se os tecidos de lã e algodão, de que trata o artigo 1.°, forem apresentados a despacho em peça, gosarão tambem do beneficio d’esta lei, quando o importador ou despachante, á sua custa e dentro da alfandega, cortar os mesmos tecidos em pedaços que só possam ter applicação de cobrir guardas-chuva ou guardas-sol.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 17 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = D. Miguel de Noronha, deputado vice-secretario.

Projecto de lei n.° 70-C

Senhores. — Acaba de inaugurar-se no paiz uma industria completamente neva entre nós, qual é a de estamparia de papel proprio para forrar casas.

Esta industria, embora fosse estabelecida em condições taes de perfeição, que póde sem exagero competir com o melhor papel de industria estrangeira, soffre comtudo muitissimo com a sua concorrencia, visto o diminutissimo direito de importação que paga nas alfandegas.

Attendendo, pois, a um dos principaes fins do imposto aduaneiro, qual e a protecção ás industrias nacionaes;

Attendendo a que, esta industria, embora nascente, produz já o necessario para o consumo do paiz;

Attendendo a que se ha alguma rasão que justifique o imposto, é de certo sobre os objectos de luxo, no meio dos quaes se póde comprehender o de papel estampado;

Attendendo a que o thesouro lucrará com o desenvolvimento d’esta industria, que, alem de pagar as contribuições inherentes a ella, paga igualmente direitos de importação das materias primas que entram na fabricação do papel estampado;

E attendendo, finalmente, ao pequeno imposto que se paga actualmente, que é de 50 réis por kilogramma, o que equivale a 12 réis por peça de papel:

Tenho a honra de sujeitar á vossa illustrada apreciação o seguinte:

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° Os direitos consignados no artigo 124.° da classe 16.ª da pauta geral das alfandegas para o papel estampado são substituidos pelos seguintes:

Papel estampado, em kilogramma, 120 réis.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 27 de janeiro de 1880. = O deputado, Augusto Victor aos Santos.

Projecto de lei n.° 119-C

Artigo 1.° Os direitos estabelecidos pela lei de 27 de dezembro de 1870, para o cordame, e os consignados no artigo n.° 172 da pauta geral das alfandegas, para os chapéus de chuva ou sol, são substituidos pelos seguintes:

Cabos, amarras, cordas e enxarcias de qualquer especie, fio de carreta e de vela, merlim, linha, sondarezas e cordel — 1 kilogramma............ $065

Umbellas e chapéus de chuva ou sol:

De seda — cada um......................... $800

De outros estofos — cada um............... $400

Em pecas separadas — 1 kilogramma......... 1$500

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Antonio Augusto Pereira de Miranda = Antonio de Sousa Pinto de Magalhães = Antonio Maria Barreiros Arrobas.

O sr. Corvo: — Sr. presidente, pedi a palavra para pôr de accordo esta tabella com as considerações do parecer.

Julgo indispensavel que na tabella se corrija este engano que está no primeiro artigo da tabella, 100 réis por kilogramma; e pelo menos é preciso que fique bem fixado na nossa idéa.

Não é uma emenda, é uma eliminação.

O sr. Conde de Castro: — É para declarar a v. exa. e á camara que a commissão de fazenda está de accordo com a observação feita pelo digno par, o sr. Corvo, e acceita a eliminação, que por lapso escapou na tabella com referencia ao papel pintado.

O sr. Presidente: — A camara ouviu a declaração que fez o digno par, o sr. conde de Castro, por parte da commissão, de que a verba de 100 réis sobre o papel pintado se deve julgar eliminada, porque foi por lapso que veiu no projecto; vou pois, visto estar extincta a inscripção, consultar a camara se approva o projecto na generalidade.

Consultada a camara, foi approvado.

O sr. Presidente: — Passa-se á especialidade. Está em discussão conjunctamente a alteração feita na tabella, da eliminação de 100 réis por kilogramma no papel pintado.

Consultada a camara, foi o projecto approvado sem discussão.

O sr. Presidente: — Passa-se ao parecer n.° 107.

Leu se na mesa.

É o seguinte:

Parecer n.° 107

As commissões de administração publica e fazenda examinaram com a devida attenção o projecto de lei n.° 208, vindo da camara dos senhores deputados, pelo qual é auctorisado o governo a conceder a D. João Pedro da Camara a aposentação no logar de governador civil de Lisboa, que ultimamente serviu, applicando-lhe as disposições do artigo 353.° do codigo administrativo: e entendem as commissões que deve ser approvado o mesmo projecto de lei, para ser submettido á sanccão real.

Sala da commissão, em 21 de maio de 1880. = V. Ferrer = Luiz de Carvalho Daun e Lorena = Antonio Egypcio Quaresma Lopes de Vasconcellos — José Augusto Braamcamp = Augusto Cesar Xavier da Silva = Carlos Bento da Silva = Joaquim Gonçalves Mamede = Conde de Castro = Thomás de Carvalho = Barros e Sá = Conde de Samodães = José Joaquim dos Reis e Vasconcellos, relator.

Projecto de lei n.° 97

Artigo 1.° É o governo auctorisado a conceder a D. João Pedro da Camara a aposentação no logar de governador civil de Lisboa, que ultimamente serviu, applicando-lhe as disposições do artigo 353.° do codigo administrativo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 18 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario — Antonio José d’Avila, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 125-F

Senhores. — Um antigo magistrado administrativo, que ha prestado longos e bons serviços ao paiz, do que dão testemunho os decretos de nomeação e de transferencia para os differentes cargos que serviu, prostrado pela doença, acha-se na impossibilidade de voltar ao serviço activo do estado, em que consumiu a melhor parte da sua vida. Este magistrado é D. João Pedro da Camara. Serviu elle os cargos de administrador dos concelhos de Oeiras e do Belem, de secretario geral dos districtos de Aveiro e de Lisboa, de governador civil de Coimbra, de Santarem e de Lisboa, excedendo a vinte annos o tempo que, com manifesto zêlo e competencia, empregou no serviço publico.

O codigo administrativo auctorisa o governo para aposentar os governadores civis que tiverem servido por quinze, vinte ou trinta annos; mas o codigo (artigo 353.°) refere-se claramente aos empregados que, ao tempo em que requererem a aposentação, se acharem em effectivo serviço; não pôde, pois, o governo fazer uso d’essa faculdade em relação ao antigo funccionario de que se trata. Não sendo, porém, justo que os seus serviços deixem de ser attendidos, porque, por desventura sua, não póde ser de novo chamado a servir o estado, tenho por isso a honra de apresentar-vos a seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado para conceder a

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D.º João Pedro da Camara a aposentação no logar de governador civil de Lisboa, que ultimamente serviu, applicando-lhe as disposições do artigo 353.° do codigo administrativo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d’estado dos negocios do reino, em 12 de março de 1880. = José Luciano de Castro.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Presidente: — Passa-se á discussão do parecer n.° 106.

Leu-se na mesa.

É o seguinte:

Parecer n.° 106

Senhores. — Ás commissões reunidas de obras publicas e fazenda foi presente o projecto de lei n.° 73; approvado pela camara dos senhores deputados, o qual tem por fim auctorisar o governo a contratar com a camara municipal do Porto a expropriação das lojas existentes no pavimento terreo do edificio da academia polytechnica, e applicar, da verba votada no orçamento de 1879-1880 para as obras do referido edificio, até á somma de 1:000$000 réis para melhorar as condições do laboratorio de chimica d’aquelle estabelecimento de instrucção, fornecendo-o de apparelhos modernos, absolutamente indispensaveis para o proficuo ensino d’aquella sciencia.

Considerando que é de grande conveniencia que a parte do edificio distrahida da sua regular applicação, seja aproveitada para ali se estabelecerem dependencias dos estabelecimentos scientificos do Porto, e ponderando tambem que o referido projecto de lei não augmenta os encargos do thesouro, limitando-se unicamente a dar melhor applicação á verba votada no orçamento, com manifesta, vantagem para a academia, e mui especialmente para o ensino de uma sciencia que tantos serviços presta a quasi todos os ramos da actividade humana: são as vossas commissões de parecer, e de accordo com o governo, que o projecto de lei n.° 73 seja approvado para subir á regia sancção.

Sala das commissões, 21 de maio de 4880. = Marquez de Ficalho = Placido de Abreu = Visconde de S. Januario = Thomás de Carvalho = Antonio de Serpa Pimentel = João José de Mendonça Cortez = Conde de Castro = Carlos Bento da Silva = Sebastião Lopes de Calheiros e Menezes = Luiz de Campos = Conde de Samodães — Diogo Antonio C. de Sequeira Pinto = Joaquim Gonçalves Mamede = Barros e Sá = Marino João Franzini.

Projecto de lei n.° 73

Artigo 1.° Fica o governo auctorisado a contratar com a camara municipal do Porto a expropriação das lojas existentes nos baixos do edificio da academia polytechnica.

§ 1.° As expropriações serão pagassem inscripções da divida publica de 3 por cento do rendimento equivalente ao das lojas expropriadas.

§ 2.° As inscripções serão compradas pela verba votada annualmente para as obras da academia polytechnica.

Art. 2.° Da verba votada para as obras, da academia polytechnica do Porto no exercicio de 1879-1880 será applicada até á quantia de 1:000$000 réis para a compra e collocação de apparelhos e utensilios destinados ao laboratorio de chimica da dita academia.

§ unico. A importação dos alludidos apparelhos e utensilios será livre de direitos e emolumentos na alfandega do Porto.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 8 de maio de 188O. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = Antonio José d’Avila, deputado secretario.

Proposta n.° 163-D

Renovo a iniciativa do projecto de lei, apresentado em l5 de março de 1879 pelo deputado por um dos circulos do Porto, Adriano Machado, em relação á verba de réis 4:000$000, votada no orçamento para as obras da academia polytechnica.

Lisboa, 13 de abril de l880. = Antonio Pinto Magalhães Aguiar.

Projecto de lei n.° 84-V

Senhores. — O projecto das obras dos paços dos estudos do Porto exige a expropriação das lojas situadas nos baixos do antigo edificio da academia da marinha e commercio da cidade do Porto, que andam arrendadas em proveito dos orphãos do collegio de Nossa Senhora da Graça, das quaes a camara municipal da mesma cidade é administradora.

O projecto de lei que tenho a honra de submetter á vossa approvação tem por fim principal habilitar o governo a realisar a expropriação d’aquellas lojas, conforme lhe permittir a verba auctorisada para aquellas obras, emquanto se não promulga uma lei com bases mais largas para a conclusão do edificio.

A dotação da academia para premios de estudantes, despezas de expediente, bibliotheca, jardim botanico, museus de mineralogia e zoologia, laboratorio chimico, compras de instrumentos de astronomia, e de modelos para o ensino da geometria descriptiva o mechanica applicada, não passa de 1:730$000 reis!

Tendo, como tenho, por angustiosa a situação da fazenda publica, não ouso propor o augmento d’esta verba até á cifra que seria rasoavel para o provimento de tantos o tão importantes estabelecimentos. Mas peço, visto que não vae n’isso augmento algum de despeza, que da verba de 4:000$000 réis, votada para as obras da academia polytechnica no exercicio corrente, seja destinada a quantia de 1:000$000 réis para a compra de apparelhos e utensilios do laboratorio chimico.

Uma relação, annexa a este projecto de lei, dos objectos indispensaveis áquelle estabelecimento, justifica esta providencia.

Parece-me, pois, que será digno da vossa approvação o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado para contratar com a camara municipal do Porto a expropriação das lojas existentes nos baixos do edificio da academia polytechnica.

§ 1.° As expropriações serão pagas em inscripções da divida publica de 3 por cento, de rendimento igual ao das lojas que forem expropriadas.

§ 2.° As inscripções serão compradas com o dinheiro votado annualmente para as obras da academia polytechnica.

Art. 2.° Da verba votada para as obras da academia polytechnica do Porto, no exercicio de 1878-1879, será applicada até á quantia de 1:000$000 réis para a compra e collocação de apparelhos e utensilios destinados ao laboratorio de chimica da dita academia.

§ unico. A importação dos alludidos apparelhos e utensilios será livre de direitos e emolumentos na alfandega do Porto.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 15 de março de 1879. = Adriano Machado.

Apparelhos e utensilios de chimica a que se refere o presente projecto de lei

Objectos devendo ser comprados na Allemanha

Mk. Pf.

1456 Balança de analyse podendo pesar 1 kilogramma, sensivel a 0g,001 370-00

1456 Balança podendo pesar 500 grammas, sensivel a 0g,0005. .......... 315-00

552 Collecção de areometros do dr. Geissler, dando os pesos especificos de 0g,700 a lg,850....................................................... 75-00

77***

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Mk. Pf.
363 Apparelho para a decomposição electrolytica do acido
hlorhydrico, da agua e do ammoniaco................... 12-50

364 Apparelho para determinar a quantidade de hydrogenio contido
N’um volume de acido chlorhydrico....................... 15-00

365 Apparelho para provar que um volume de chloro e um volume de hydrogenio dão dois volumes de acido chlorhydrico .................... 17-50

367 Apparelho para provar que a agua se compõe de dois volumes de hydrogenio e um de oxygenio............................................. 32-50

368 Apparelho para demonstrar que dois volumes de agua gazosa se formam de dois volumes de hydrogenio e um de oxygenio medidos a 100°... 852-00

369 Apparelho para demonstrar que o ammoniaco se compõe de tres volumes de hydrogenio e um de azote..................................... 16-50

370 parelho para demonstrar que da combinação de tres volumes de
hydrogenio com um de azoto resultam dois volumes de ammoniaco. 33-00

371 Apparelho para a decomposição electrolytica simultanea da agua, do acido chlorhydrico e do ammoniaco.................................. 15-00

372 Apparelho para provar que a composição do acido chlorhydrico não soffre mudança...................................................... 22-50

373 Apparelho para provar que o oxygenio e o hydrogenio se combinam na proporção dada pela agua..................................... 22-50

374 Apparelho para provar que um volume de gaz dos pantanos contém dois volumes de hydrogenio........................................ 17-00

377 Apparelho para demonstrar as bases phy-Asydptcs oe hesiea dha vogrado e Ampere ...................................................... 230-00

378 Apparelho para provar que a combustão dos solidos no ar produz augmento de peso.........„............................................... 35-00

382 Apparelho para mostrar os phenomenos da combustão...... 20-00

384 Apparelho para medir a densidade dos vapores........... 171-00

381 Apparelho para demonstrar a igualdade de volume do oxygenio e do anhydido carbonico e sulfuroso formados por elle...................... 24-00

383 Apparelho para as experiencias com o acido sulfuroso liquido....................................................... 15-00

375 Apparelho para decompor o acido azotico pelo calor...... 15-55

330 Apparelho de Bunzen para determinar as leis da absorpção dos gazes nos liquidos
331
332 Aparelho para medir a densidade dos vapores produzidos pela combustão no eudiometro...................................... 28-00
333 Apparelho para a diffusão.............................. 12-00
349 Gazometro de mercurio.................................. 5-50
352 Cuva de mercurio com supporte para eudiometro.......... 17-00
353 Apparelho para medir a densidade dos gazes pela velocidade do seu escoamento................................................... 45-00
355
e
357 Aparelho para medir o volume dos gazes................. 14-00
358 (2) Apparelho para produzir o gaz oxhydrogenio........... 16-00
344 (1) Apparelho para limpar os tubos de vidro .............. 1-25

115 Cinco apparelhos de Fresenius para doseamento do chloro... 12-00

113 Apparelho para conservar o chloro......................... 22-00

657 Uma collecção de modelos de madeira para o estudo da crystalographia chimica
658 (dr. Kekulé).............................................. 150-00

75 Uma collecção de alcaloides............................... 120-00

(a) Um apparelho de distillação...............................

Somma (excepto o artigo (a)......................... 2:315-30

II

Objectos devendo vir de França
Francos

Um calorimetro de Berthelct completo...................... 470

Um apparelho de Berthelot para determinar os pontos de ebulição. 18

Apparelho de Berthelot para medir o calor especifico dos liquides 12

Idem para medir o calor de vaporisação dos liquidos .............. 5

Idem para a decomposição do acido formico ........................ 2

Apparelho de Berthelot para produzir ozono

Idem para a synthese da benzina ............................. 2

326 Apparelho de Sainte Claire Deville e Proost para determinar a densidade dos vapores ................................................. 30

343 Idem de Sainte Claire Devillo para o estudo da chamma .. 15

599 Idem para a producção de hydrogenio ................. 70

340b is Quatro tubos para repetir as experiencias de dissociação
da agua ................................................... 10

341 Apparelho para a dissociação do oxydo de carbono........ 10

424 Idem para purificar o mercurio ........................... 10

311 bis Apparelho de Dumas para a synthese da agua.......... . 00

311 Apparelho de Dumas e Boussingault para a analyse do ar.. 60

347 Apparelho de Mohr para doseamento do gaz carbonico nas aguas mineraes. 55

Pipeta de Mohr para tirar a agua das fontes mineraes ................... 8

5 Apparelho de Laurent para o tratamento dos silicatos pelo acido fluorhydrico................................................... 18

594 Apparelho para a producção do oxygenio pelo chlorato de potassio 70

320 Tubo de Houzeau para produzir ozono............................ 5

Forno de cupellação, de gaz ......................................... 50

Apparelho de Schilling para determinar o peso especifico dos gazes..... 72

Somma............................................................... 1:074

Os preços dos objectos vindos da Allemanha são os indicados no catalogo da casa C. Gerhardt, de Bonn. Os dos objectos vindos de França são os da casa Alverguiat.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Presidente: — Vae passar-se ao parecer n.° lll.

Leu se na mesa.

É o seguinte:

Parecer n.° 111

Senhores. — As vossas commissões de administração publica e de fazenda examinaram o projecto de lei n.° 85 enviado pela camara dos senhores deputados, e que é da iniciativa do governo, o qual tem por fim melhorar o serviço sanitario e administrativo do lazareto de Lisboa.

Considerando que é de suprema conveniencia publica collocar nas melhores condições, que ser possa, o unico estabelecimento sanitario, que temos para preservar a capital

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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 971

e o paiz de muitas molestias sempre perigosas, e em grande parte mortiferas;

Considerando que são indispensaveis soccorros promptos, e ministrados por individuos em condições de os poder e saber prestar;

Considerando que, ainda que fosse mais avultado o excesso de despeza, seria esta justamente empregada, porque nada ha superior á vida da humanidade, quanto mais sendo minimo o excesso da referida despeza produzido pela execução das disposições contidas no projecto;

Considerando finalmente que n’um estabelecimento d’esta ordem é difficil e laboriosa a sua administração, e que se algum reparo houvesse de fazer-se, seria o de se não dar maior desenvolvimento tanto na parte material como pessoal d’elle;

São as vossas commissões de parecer que deve ser approvado para poder subir á real sancção.

Sala das commissões - em 22 de maio de 1880.= Luiz de Carvalho Daun e Lorena = Augusto Cesar Xavier da Silva = Conde de Castro = Conch de Rio Maior = F. Ferrer = Reis e Vasconcellos = José Augusto Braamcamp — Barros e Sá = Conde de Samodães = J. J. de Mendonça Cortez — Mathias de Carvalho e Vasconcellos = Thomás de Carvalho = José de Mello Gouveia = Joaquim Gonçalves Mamede = Antonio Egypcio Quaresma Lopes e Vasconcellos, relator.

Projecto de lei n.° 85

Artigo 1.° São creados no lazareto de Lisboa mais dois logares de facultativos, com o ordenado de 1:000$000 réis cada um, e encargos iguaes aos do actual facultativo dos impedimentos.

Art. 2.° São creados tambem cinco logares de enfermeiros e dois de enfermeiras, para o serviço do hospital do lazareto, tendo aquelles vencimentos iguaes aos dos guardas de l.ª classe, e a correspondente gratificação quando impedidos; estas, o vencimento de 400 réis diarios, e a gratificação de 320 réis no caso de impedimento.

Art. 3.° Alem do fiscal que actualmente existe no lazareto, haverá mais um outro e dois ajudantes, aos quaes serão incumbidos os diversos serviços de fiscalisação e de policia que nos respectivos regulamentos lhes forem designados.

§ unico. O ordenado do novo fiscal será igual ao do antigo. O dos ajudantes será de 360$000 réis.

Art. 4.° São creados dois logares, um de amanuense e outro de servente, para o serviço do lazareto.

§ 1.° O ordenado do amanuense é de 360$000 réis, o vencimento do servente de 300 réis diarios.

§ 2.° No logar de amanuense só poderão ser providos os individuos que se mostrarem competentemente habilitados para fallar as linguas franceza e ingleza.

Art. 5.° Todos os funccionarios empregados no serviço do lazareto têem residencia obrigada n’elle.

Art. 6.° Aos empregados do lazareto é applicavel a lei de 6 de maio de 1878.

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 15 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, - deputado secretario = Antonio José d’Avila, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 139-H

Senhores. — A experiencia tem mostrado a necessidade de reformar em alguns pontos o serviço do lazareto de Lisboa, para que esta repartição satisfaça ao fim a que é destinada, e seja proveitosa a despeza que com ella se faz.

Ha no lazareto um facultativo permanente, cujas funcções consistem no tratamento dos quarentenarios enfermos. Succede, porém, repetidas vezes, que em quarentenas diversas ha doentes para tratar, e como o facultativo dos impedimentos, o que reside permanentemente no lazareto, não poderia passar de umas para outras quarentenas sem aggravar o tempo de detenção dos quarentenarios, torna-se indispensavel chamar para o serviço do lazareto facultativos extraordinarios, e retribuir o seu serviço.

No anno passado os facultativos extraordinarios serviram no lazareto 249 dias, o que custou ao thesouro réis 2:248$000.

Parece mais conveniente substituir este serviço extraordinario, por outro permanente, creando mais dois logares de facultativos para servirem e terem residencia permanente no lazareto, com os mesmos vencimentos e obrigações do actual facultativo, denominado dos impedimentos. Com esta providencia haverá, em todo o anno, por 2:000$000 réis, um serviço mais regular e mais prompto do que aquelle que em pouco mais de oito mezes custou 2:248$000 réis.

No lazareto ha, como não podia deixar de haver, um hospital para o tratamento, não só dos doentes de molestias contagiosas, mas tambem d’aquelles que, soffrendo molestias de outra natureza, não podem ser tratados nas respectivas quarentenas.

Não ha hospital sem enfermeiros; e foi já mister prover a esta necessidade indeclinavel por meio de nomeações? provisorias. Proponho pois a creação de cinco enfermeiros e de duas enfermeiras, aquelles com os vencimentos dos guardas de saude de l.ª classe; estas com o vencimento diario de 400 réis, e a gratificação de 320 réis pelos dias em que estiverem impedidas nas respectivas quarentenas ou nas enfermarias; legalisando-se assim o que, existe provisoriamente.

É tambem indispensavel tornar regular o serviço de fiscalisação, para garantia da saude publica e dos interesses da fazenda.

O serviço da hospedaria, que é um dos mais importantes do lazareto, demanda uma fiscalisação constante e severa; e essa fiscalisação não póde ser convenientemente exercida pelo inspector, que tem a superintender os differentes serviços do lazareto, em uma area extensa, e a attender a muitos e variados assumptos. Sem essa fiscalisação permanente a substituição dos alimentos approvados, por outros de má qualidade, é não só possivel mas facil; e reconhecendo-se isto, estabeleceu-se na condição 12.ª do contrato de adjudicação da empreza da hospedaria, que o governo poderia nomear um fiscal para cada quarentena, que seria sustentado, sem retribuição, pelo emprezario.

Estes empregados não estão ainda creados, e em vez d’elles parece melhor encarregar a fiscalisação da hospedaria a um fiscal com um ajudante, que superintendam-o serviço fóra das quarentenas, superintendencia que será mais efficaz, porque evitará que aos quarentenarios se forneçam alimentos maus ou mal preparados, emquanto que com os fiscaes internos apenas poderia ter logar a rejeição d’esses alimentos fornecidos, que na maior parte dos casos não poderiam ser logo substituidos.

Não podendo dar-se a estes fiscaes um vencimento inferior aos guardas de saude de l.ª classe, a substituição d’elles por um fiscal e um ajudante trará para a fazenda alguma economia.

Os seis fiscaes a nomear por virtude do referido contrato produziriam uma despeza, por um calculo minimo, de 1:434$400 réis. O fiscal e o ajudante custarão apenas 760$000 réis. Ter-se ha, pois, melhor serviço e mais barato.

Existe no lazareto um fiscal, a cujo cargo está a fiscalisação de policia do estabelecimento, o serviço dos armazens, caes, embarque e desembarque de passageiros, beneficiação de bagagens e mercadorias, serviço do hospital, lavanderia, cemiterio, capellas, arrecadação de espolios, guarda e fiscalisação da mobilia, etc.

É facil de ver que um só empregado não poderá desempenhar-se convenientemente de tantos e tão variados serviços: e com effeito sente-se no lazareto a deficiencia do pessoal preciso para a sua administração. Proponho, pois, a creação de um ajudante para o fiscal que existe e a creação de um amanuense, ficando a cargo do fiscal a

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escripturação e contabilidade, correspondencia com as auctoridades e funccionarios, a matricula dos passageiros, boletim sanitario, mappas diarios, etc.

Finalmente, proponho mais a creação de um servente, porque o unico que ha no lazareto e a cargo de quem está a limpeza do edificio não póde só satisfazer a este serviço.

A lei de 5 de maio de 1878 concedeu aos empregados das estações de saude maritimas o direito de aposentação. É justo applicar as suas disposições aos empregados do lazareto, que estão nas mesmas circumstancias, pelo menos, que os empregados contemplados pela citada lei.

Resulta d’estas propostas um pequeno augmento de despezas; mas o rendimento só do bonus da hospedaria do lazareto, que no anno passado, um dos menos productivos, rendeu 10:403$153 réis

não me parece que estes Ioga -es sejam necessarios, de mais a mais não tenho os verdadeiros dados para o apreciar, porque este projecto vem, como quasi todos os que este governo tem apresentado, desacompanhado de esclarecimentos, e ao mesmo tempo co.rtra lei; e um augmento de dcspez?, que não tem creada a correspondente receita, e eu entendo que é um principio de boa administração não crear despezas. sem ter creado a respectiva verba de receita; de outro modo o déficit em vez de diminuir augrnenta todos os dias, e ainda ha poucos dias se votou um projecto de lei de contabilidade que no anno passado, um dos menos productivos
rendeu 10:403$153 réis, cobre esse augmento de e justifica-a; porque se a necessidade de pôr o paiz o coberto de epidemias aconselha o estabelecimento das quarentenas, é tambem dever do governo tornar estas, pelos melhoramentos do serviço, efficazes sim, mas o menos incommodas que possivel seja.

Por estes motivos tenho a honra de apresentar-vos a seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° São creados no lazareto de Lisboa mais dois logares de facultativos com o ordenado de 1:000$000 réis cada um, e encargos iguaes aos do actual facultativo dos impedimentos.

Art. 2.° São creados tambem cinco logares de enfermeiros e dois de enfermeiras, para o serviço do hospital do lazareto, tendo aquelles, vencimentos iguaee aos da guardas de l.ª classe, e a correspondente gratificação quando impedidos; estas, o vencimento de 400 réis diarios, e gratificação de 320 réis no caso de impedimento.

Art. 3.° Alem do fiscal que actualmente existe [...] haverá mais um outro e dois ajudantes, aos quaes serão incumbidos es diversos serviços de fiscalisação e de policia, que nos respectivos regulamentos lhes forem designados,

§ unico. O ordenado do novo fiscal será igual ao do antigo. O dos ajudantes será do 360$000 réis.

Art. 4.° São creados dois logares, um de amanuense e outro de servente, para o serviço do lazareto.

§ 1.° O ordenado do amanuense é de 380$000 réis, o vencimento de servente de 300 réis diarios.

§ 2.° No logar de amanuense só poderão ser providos os individuos que se mostrarem com potentemente habilitados para fallar as linguas franceza e ingleza.

Art. 5.° Todos os funccionarios empregados no serviço
do lazareto têem residencia obrigada n’elle.

Art. 6.° Aos empregados do lazareto é applicavel de 6 de maio de 1878.

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d’estado dos negocios do reino, em 29 março de 1880. = José Luciano de Castro.

Foi posto á discussão.

O sr. Vaz Preto: — Eu peço ao menos a v. exa. que me conceda alguns minutos para ler este projecto; eu pedi a palavra para acabar com a impaciencia de alguns dignos pares, que é tal para que se votem estes projectos, que nem tempo nos querem dar para os ler.

Peço a v. exa. me conceda um instante, que eu desejo ler o projecto e fallar sobre elle.

O sr. Presidente: — O digno par está no seu direito em querer ler o projecto com algum descanso, e por isso não tenho a menor duvida em lhe conceder alguns instantes, e depois o digno par fará uso da palavra.

(Pequena pausa.)

O sr. Vaz Preto: — Agradeço a v. exa. o ter-me concedido algum tempo para eu poder ler este projecto que tem mais importancia do que parece; é um augmento de de despeza, porque se vão crear novos logares.

A camara póde votar como entender, eu é que voto contra o augmento de despezas, não me parece que estes logares sejam necessarios, de mais a mais não tenho de verdadeiros dados para o apreciar, porque este projecto vem, como quasi todos os que este governo tem apresentado como quasi todos os que este governo tem apresentado, desacompanhado de esclarecimentos, e ao mesmo tempo contra lei, é um augmento de despeza que não tem creada a correspondente receita, e eu entendo que é um principio de boa administração não crear despezas, sem ter creado a respectiva verba de receita; de outro modo o deficit em vez de diminuir augmenta todos os dias, e ainda ha poucos dias se votou um projecto de lei de contabilidade que tem esta determinação bem clara.

Mas o actual governo é assim, só respeita os principios e as doutrinas no papel, fazendo na pratica o contrario do que consigna nos projectos.

Sr. Presidente, nunca vi o governo mais contradictorio e mais incoherente votando hoje em sentido contrario do que votou hontem.

Que o governo seja contradictorio, incoherente e tudo o mais que quizerem pouco me importa; o que não desejo é que a camara seja solidaria nas suas incoherencias e contradicções.

Este systema desacredita os governos e prejudica a nação, que é sempre a victo«ima dos erros dos governos.

Eu voto contra mais este augmento de despeza que traz o projecto em discussão.

O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro) – Sr. presidente, pedi a palavra para declarar que d’este projecto resulta não augmento de despeza, mas economia; porque por meio d’elle se evita a necessidade de chamar facultativos extraordinarios, como se faz actualmente; e esses facultativos não se prestam áquelle serviço por menos de duas libras por dia. A estreiteza do tempo não permitte que eu me alargue mais em considerações.

O sr. Camara Leme: - Sr. presidente, eu não posso deixar de confirmar tudo quanto disse o sr. ministro do reino; porque tive occasião de o observar durante o tempo em que tive a honra de ser governador civil de Lisboa.

Foi approvado na generalidade o projecto de lei n.º 85, e approvado sem discussão na especialidade.

Entrou em discussão o parecer n.º 137.

É do teor seguinte:

Parecer n.º 137

Senhores. – As commissões de fazenda e marinha examinaram devidamente a materia do projecto n.º 98, vindo da camara dos senhores deputados, pelo qual se estabelece que os actuaes escrivães dos departamentos do centro e norte continuarão a receber o ordenado, gratificação e complemento do ordenado, que lhes foram abonados durante o exercicio de 1879-1880.

As commissões são de parecer que o projecto seja approvado.

Lisboa, 3 de junho de 1880. = Visconde de S. Januario = Marino João Franzini = José de Mello Gouveia = Conde de Castro = Barros e Sá = Visconde de Soares Franco.

Projecto de lei n.º 98

Artigo 1.º Os actuaes escrivães dos departamentos do centro e norte continuarão a receber os ordenados, gratificação e complemento do ordenado, que lhes foram abonados no exercicio de 1879-1880.

Art. 2.º As disposições do artigo 1.º só são applicaveis aos individuos que actualmente exercem as funções dos logares de que se trata.

Art. 3.º Quando qualquer d’estes dois empregados se impossibilitar, o ordenado do logar de secretario de cada um dos departamentos será o de 400$000 réis annuaes e 60$000 réis annuaes de gratificação.

Art. 4.º fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 18 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pe-

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reira Bastos, deputado secretario = Antonio José d’Avila, deputado secretario.

Projecto, de lei n.° 222

Senhores. — Á vossa commissão de fazenda foi presente a recommendação feita pela commissão do orçamento sobre os ordenados que até hoje se têem abonado aos dois escrivães dos departamentos maritimos do centro e do norte, e, attendendo a que estes dois empregados, pela sua avançada idade e serviços á liberdade, são dignos de que se tenha para com elles contemplação especial;

Considerando que seria violento prival os da parte dos ordenados, quando mais carecem d’elles no ultimo periodo da sua laboriosa carreira;

Considerando que lhes foram tirados os emolumentos que cada um d’elles recebia e que constituem receita do estado na importancia de perto de 4:000$000 réis annuaes:

É de parecer que em favor d’elles se faça uma excepção que vos propõe no seguinte:

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° Os actuaes escrivães dos departamentos do centro e norte-continuarão a receber os ordenados, gratificação e complemento de ordenado, que lhes foram abonados no exercicio de 1879-1880.

Art. 2.° As disposições do artigo 1.° só são applicaveis aos individuos que actualmente exercem as funcções dos logares de que se trata.

Art. 3.° Quando qualquer d’estes dois empregados se impossibilitar, o ordenado do logar de secretario de cada um dos departamentos será o de 400$000 réis annuaes e 60$000 réis annuaes de gratificação.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão de fazenda, 15 de maio de 1880. = M. P. Dias = Antonio Candido = F. de Castro Monteiro = H. de Macedo = F. Beirão = J. V. Gusmão = Mariano de Carvalho, relator = Tem voto do sr. Pedro Franco.

O sr. Vaz Preto: — Eu desejava que o sr. ministro da marinha désse algumas explicações á camara sobre este projecto.

O sr. Ministro da Marinha (Marquez do Sabugosa): — Em consequencia da reforma do sr. Latino Coelho não ficaram bem harmonisados em relação a outros os vencimentos d’estes dois funccionarios.

Foi o que levou a commissão de fazenda a approvar este projecto de lei.

Foi approvado o projecto.

Leu-se o parecer n.° 118.

É o seguinte:

Parecer n.° 118

Senhores. — Á vossa commissão de instrucçao publica foi presente o projecto de lei pelo qual é auctorisado o governo a reorganisar o ensino das bellas artes nas academias de Lisboa e do Porto;

E considerando quanto importa aos interesses industriaes e á civilisação moral do paiz, que não permaneçamos no estado rudimentar e lamentavel em que se encontra a instrucção artistica entre nós, com prejuizo do nosso bom nome, e com detrimento de tradições, que não deixam de ser gloriosas, assistindo impassiveis ao desapparecimento dos ultimos vestigios da arte em Portugal;

Ponderando ao mesmo tempo que a reorganisação proposta não virá comprometter nem aggravar as angustiosas circumstancias do thesouro: a vossa commissão entende que o mencionado projecto deve ser approvado, e submettido á real sanccão.

Sala da commissão, em 24 de maio de 1880. = V. Ferrer = Thomás de Carvalho = A. E. Quaresma Lopes de Vasconcellos = José Pereira da Costa Cardoso = Ayres de Gouveia.

Projecto de lei n.° 106

Artigo 1.° É o governo auctorisado a reorganisar o ensino da academia real de bellas artes de Lisboa e da academia das bellas artes do Porto, sem augmento da despeza actualmente, votada no orçamento geral do estado para o pessoal e material d’estes estabelecimentos.

Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes do uso que houver, feito da presente auctorisação.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 20 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = Antonio José d’Avila, deputado secretario.

Proposta de lei n.° 163-A

Senhores. — Renovo a iniciativa da proposta de lei n.° 131-C, apresentada pelo meu illustre antecessor em sessão de 23 de maio de 1879, auctorisando o governo a reorganisar o ensino da academia real de bellas artes de Lisboa, sem augmento da despeza actualmente votada no orçamento geral do estado para o pessoal e material d’este estabelecimento.

Secretaria d’estado dos negocios do reino, em 14 de abril de 1880. = José Luciano de Castro.

Proposta de lei n.° 131-C

Senhores. — A situação em que se encontra o ensino na academia real de bellas artes de Lisboa reclama promptas providencias. O quadro dos professores é deficiente, e a organisação dos estudos está longe de corresponder aos fins de tão importante instituto.

Actualmente existe na academia apenas um professor proprietario e outro substituto: todos os mais são interinos. Segundo a lei geral o professor interino vence metade do ordenado marcado para o logar substituido; e porque o ordenado por inteiro já de si é diminuto e pouco convidativo, difficilmente se encontra quem, recebendo só metade, queira reger as aulas com o zêlo e a assiduidade que exige a educação dos alumnos. Os artistas de merecimento não se
prestam a exercer ali o magisterio, e alguns houve que o abandonaram pouco depois de acceitarem a nomeação, por terem reconhecido que o trabalho no seu atelier lhes era mais rendoso. Procurou-se evitar este mal, auctorisando a
accumulação de duas ou mais aulas no mesmo professor; mas o remedio não foi efficaz. O serviço era prejudicado, porque o professor, distrahindo a sua attenção por diversas aulas, não podia applicar-se a nenhuma com a precisa actividade e dedicação.

D’aqui resulta a necessidade de augmentar o quadro do pessoal docente da academia dotando-o ao mesmo tempo de modo que possam ser aproveitadas as vocações, e chamados ao magisterio artistas devidamente habilitados.

Pelo que respeita á organisação dos estudos a necessidade da reforma não é menos urgente. Faltam na academia algumas aulas sem as quaes a educação artistica não póde dar-se com o indispensavel desenvolvimento. Taes são as aulas de gravura era madeira, a de anatomia, a de historia da arte e esthetiea, a de composição de ornato applicado á architectura, a de elementos de archeologia geral e patria, e a de modelação de ornato applicado á industria. D’estas disciplinas algumas já foram provisoriamente estabelecidas na academia, com auctorisação do governo, pelas portarias de 22 de setembro de 1863, 15 de setembro de 1868, e 22 de dezembro de 1872. É porém necessario legalisar a sua existencia, e dar aos professores uma justa remuneração.

Ha na academia aulas em que sob uma denominação geral estão reunidos varios ramos do ensino que muito convem separar. É uma d’ellas a aula de architectura civil que deve ser dividida em duas, pelo menos: uma de desenho geometrico, perspectiva e theoria das sombras, e outra de desenho de architectura e architectura civil. É tambem conveniente, em certas aulas, ampliarias obrigações dos professores. Assim, na de pintura de paizagem, o professor deve ensinar o desenho e a pintura de paizagem, como,

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por necessidade e sem disposição legal, se estava praticando ultimamente.

N’outros pontos secundarios carece ainda o ensino da academia de ser regulado, avultando entre elles o que respeita aos exames e premios annuaes, sobre que os estatutos em vigor são omissos, com manifesta desvantagem para a frequencia e adiantamento dos alumnos, na opinião do conselho academico.

Attendendo, pois, á urgente necessidade de acudir ao estado anormal em que se acha a academia, e, considerando que se a falta de recursos do thesouro não consente por emquanto uma reforma completa dos estudos das bellas artes no paiz, é comtudo possivel realisar desde já importantes melhoramentos na organisação do ensino, na remuneração dos professores e no aproveitamento dos discipulos, distribuindo-se mais utilmente as verbas votadas no actual orçamento geral do estado, na importancia de 14:803$600 réis, tenho a honra de submetter á vossa illustrada apreciação a seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a reorganisar o ensino da academia real de bellas artes de Lisboa sem augmento da despeza actualmente votada no orçamento geral do estado para o pessoal e material d’este estabelecimento.

Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes do uso que houver feito da presente auctorisação.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d’estado dos negocios do reino, em 23 de maio de 1879. = Antonio Rodrigues Sampaio.

O sr. Vaz Preto: — Sr. presidente, este governo pede para tudo auctorisações! Na realidade são auctorisações de mais; este governo tem um prurido de reformar tudo e pedir auctorisações para tudo, sem ao menos apimentar as bases. Eu estou admirado de tanta sciencia e de tanta audacia! Na verdade é muita audacia da parte dos srs. ministros substituirem-se ao parlamento e não temerem a responsabilidade.

Pois não seria mais liberal discutir primeiro nas côrtes as bases das reformas e o uso que se ha de fazer das diversas auctorisações e estão depois conceder auctorisações limitadissimas? Eu não gosto d’este systema de auctorisações, porque isso póde revestir o governo de dictactura.

Se nas auctorisações se determina que e governo dará conta ao parlamento do uso que fizer, porque não se ha de obrigar o governo a apresentar o trabalho feito á camara? O governo quer auctorisações para reformar tudo, mas ainda não vi que apresentasse uma unica reforma capaz e completa. Eu confesso, sr. presidente, que já estou cansado de ouvir pedir tantas auctorisações, e por isso não posso deixar de erguer a minha, voz contra este systema.

Ainda ha pouco foi adiada a discussão do projecto para a reforma do exercito. Propoz este adiamento o sr. Fontes; eu achei que s. exa. prestou d’esse modo um grande serviço, porquanto a auctorisação que se concedia era nos termos os mais latos, e reformas de tão grande importancia não convinha que se fizessem senão em presença, dos trabalhos e estudos que o sr. ministro da guerra devia apresentar á camara. Reformas d’essa ordem devem ter sempre a cooperação do parlamento.

Pede-se tambem uma auctorisação para reformar as academias de bellas artes de Lisboa e Porto, sem augmento de despeza. Mas qual é a reforma de que precisam estas academias? Que inconvenientes existem hoje que determinem o pedido da auctorisação? Quaes são as bases da reforma? Nada d’isso se diz no projecto, e é forçoso que se diga.

Concluindo, declaro que voto contra este systema do governo, de pedir auctorisações umas após outras para fazer reformas sem apresentar as bases nem a necessidade da reforma; o que eu desejaria era que essas reformas, tendo de effectuar-se, fossem primeiro discutidas no parlamento para se reconhecer a necessidade.

Sr. presidente, o melhor systema é apresentar as reformas feitas e discutil-as nos parlamentos. Pois para que servem os parlamentos? É necessario que os governos os respeitem, e não os considerem como chancellas para lhes sanccionarem os caprichos e desvarios.

O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro): — Devo declarar que este projecto é renovação de iniciativa do que foi apresentado pelo meu antecessor, o sr. Rodrigues Sampaio; é textualmente copiado d’esse.

N’esta altura da sessão não posso expor á camara as rasões que determinaram o governo a pedir esta auctorisação; o que posso é dizer que, em virtude dos estudos que fiz, me convenci de que as duas academias precisavam de reforma e raie este projecto não absolve o governo de dar conta ás côrtes do uso que fizer da auctorisação que se lhe concede.

O sr. Presidente: — Está extincta a inscripção.

Os dignos pares que approvam o parecer n.° 118, na sua generalidade, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado e bem assim o projecto na especialidade.

Leu-se na mesa o parecer n.° 139,

É o seguinte:

Parecer n.° 139

Senhores. — As vossas commissões de administração publica, legislação e fazenda examinaram com a devida attenção o projecto de lei n.° 121, vindo da camara dos senhores deputados, e que tem por fim auctorisar o governo a crear uma escola agricola, destinada a educar e a tornar aptos para os trabalhos agricolas e industrias correlativas: 1.°, os menores que por vadios e mendigos são postos, na conformidade do codigo penal, á disposição do governo: 2.°, os expostos, abandonado;; e desvalidos, a cargo dos diversos corpos administrativos; 3.°, os menores desobedientes e incorrigiveis, cuja admissão for requerida por seus paes ou tutores, e auctorisada pela auctoridade judicial; e mediante a retribuição que for fixada nos respectivos regulamentos para os menores do segundo e terceiro grupo.

E as vossas commissões:

Considerando que o pensamento do governe, como se deixa ver do relatorio que precedeu, a proposta de lei, é o de crear uma colonia agricola, em que mais prepondero a feição escolar do que a de uma casa de correcção propriamente dita;

Considerando que a creação d’esta escola satisfaz a uma urgente necessidade publica, sendo altamente moralisadores os seus intuitos, pois tendem a evitar a vagabundagem, origem de muitos vicios e até de crimes;

Considerando que, em virtude de tão benefica instituição, e em especial do disposto no artigo 3.° do projecto, se vae obstar a que esses infelizes, victimas a maior parte das vezes do abandono em que os deixaram, dêem entrada nas cadeias publicas e ahi sejam pervertidos pela companhia dos grandes criminosos:

Considerando que um estabelecimento d’esta ordem é tambem util sob o ponto de vista agricola, porquanto n’elle podem esses menores adquirir e conhecimento dos processos mais aperfeiçoados, com grande vantagem para e desenvolvimento da nossa primeira industria, e conseguintemente para a prosperidade do paiz; e

Considerando, por ultimo, que nos artigos 5.º e 6.° se determina quaes os recursos de que o governo deverá dispor, sem exceder as verbas do orçamento, não só para a compra de terreno necessario e sua apropriação ao fim a que é destinado, como para a dotação da mesma escola:

São por todos estes fundamentos as vossas commissões de parecer que approveis o presente projecto de lei, a fim de ser submettido á real sancção.

Sala das commissões, em 5 de junho de 1880. = V. Ferrer = Reis e Vasconcellos =. Augusto Cesar Xavier da Silva = Barros e Sá = A. E. Quaresma Lopes de Vasconcellos = Visconde de Alves de Sá = Vicente Ferreira Novaes =

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J. M. Gouveia = A. M. Couto Monteiro = J. Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens = Thomás de Carvalho = Diogo Antonio de Sequeira Pinto = Antonio de Serpa Pimentel = Conde de Rio Maior = Conde de Castro, relator.

Projecto de lei n.º 121

Artigo 1.° É auctorisada a creação de uma escola agricola, destinada a educar e a tornar aptos para os trabalhos agricolas e industrias correlativas:

1.° Os menores, que por vadios e mendigos forem postos á disposição do governo, na conformidade dos artigos 256.° e 260.° do codigo penal;

2.° Os menores expostos, abandonados e desvalidos a cargo das juntas geraes de districto ou de outros corpos administrativos, cuja admissão for por estes solicitada, mediante a retribuição fixada nos regulamentos;

3.° Os menores desobedientes e incorrigiveis, cuja admissão for requerida por seus, pães ou tutores, e auctorisada pela auctoridade judicial, conforme o artigo 143.° do codigo civil, tambem mediante a devida retribuição.

§ l.° A admissão dos menores comprehendidos na l.ª classe preferirá sempre á dos pertencentes ás outras duas classes.

§ 2.° Os menores comprehendidos na 3.ª classe poderão permanecer no estabelecimento, alem do tempo marcado no citado artigo do codigo civil, pelo mais que for fixado nos regulamentos.

Art. 2.° Os rapazes admittidos na escola agricola, em quanto n’ella permanecerem, estarão sujeitos á tutela do estado; depois da saída, e emquanto não attingirem a maioridade legal ou não forem havidos por maiores, a tutela pertencerá ao estado quanto aos da l.ª classe, aos respectivos corpos administrativos quanto aos da 2.ª classe, e aos paes e tutores quanto aos da 3.ª

Art. 3.° Os juizes de direito, no julgamento dos menores vadios ou mendigos, poderão, em attenção a circumstancias attenuantes, deixar de condemnal-os em prisão correccional, pondo-os desde logo á disposição do governo.

Art. 4.° É auctorisado o governo a fazer os regulamentos e a tomar as providencias convenientes para a organisação e regimen da escola agricola, tomando por modelo os estabelecimentos dos paizes onde existem similhantes instituições.

Art. 5.° É o governo auctorisado a despender, para compra de terreno e sua apropriação á escola agricola, as sommas necessarias tiradas das sobras das despezas do ministerio do reino no anno economico de 1879-1880.

Art. 6.° Constituirá dotação da escola agricola 2 por cento sobre os premios das loterias, deduzidos dos 15 por cento do respectivo imposto do sêllo, ficando d’ora em diante reduzida sómente a 1 l/2 por cento a quota que a santa casa da misericordia de Lisboa recebe do dito imposto.

Art. 7.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer das auctorisações concedidas n’esta lei.

Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 31 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Antonio José d’Avila, deputado secretario = D. Miguel de Noronha, deputado vice-secretario.

Proposta de lei n.° 207-A

Senhores. — As difficuldades, em que se encontra o governo, todas as vezes que tem de dar destino aos muitos rapazes vadios, que frequentemente são postos á sua disposição pelo poder judicial, tem feito lembrar a necessidade de crear um estabelecimento onde aquelles infelizes alcancem a educação, que lhes falta, e adquiram a moralidade e os habitos de trabalho, cuja ausencia os encaminha á vagabundagem, e não poucas vezes ao crime.

Instado por esta urgente necessidade, e convencido de que nenhuma instituição poderá melhor satisfazer aos fins moralisadores, que devem ter-se em vista nas providencias reclamadas por este estado de cousas, do que uma colonia agricola em que prepondere mais a feição escolar do que a de instrumento de penalidade, tratei de dar os primeiros passos para a realisação d’este pensamento, dirigindo aos governadores civis da provincia do Alemtejo a circular, que se le no Diario do governo de 30 de setembro do anno findo, na qual incumbi aquelles funccionarios de me informarem da existencia de terrenos, que podessem com proveito servir á fundação do projectado estabelecimento, a fim de me habilitar a propor com segurança os meios precisos para a levar a effeito.

Ha já muitos terrenos indicados, mas ainda nenhum foi reconhecido como apto ao fim proposto, por não ter sido ainda possivel fazer a todos a inspecção, que é indispensavel para fixar uma escolha acertada.

Esta demora, porém, entendo eu, não deve obstar a que desde já se tomem as necessarias providencias legislativas para que o governo fique auctorisado a emprehender o desejado melhoramento, logo que esteja habilitado com os elementos de estudo precisos para a sua realisação.

Essas providencias consistem nos meios necessarios á fundação e á manutenção do estabelecimento.

Quanto ás despezas da fundação parece-me que, sem alterar as previsões orçamentaes, as poderemos tirar das sobras das despezas do ministerio do reino no corrente anno economico, que creio serão sufficientes para este fim.

Não posso, pelas rasões que apontei, fixar a somma precisa para esta applicação. Posso, porém, assegurar-vos que o governo, se lhe concederdes as auctorisações que solicita, porá o maior empenho em limitar os gastos ao indispensavel, que me persuado não ascenderá a uma quantia mui avultada, attendendo a que os terrenos, que se indicam, são quasi desaproveitados, e por isso pouco custosos relativamente, e a que as edificações devem ser ligeiras e modestas, como é proprio da indole do estabelecimento.

Agora pelo que diz respeito á dotação da colonia parece-me que, exceptuada uma quantia relativamente pequena, que virá a acrescer á despeza actual, poderemos occorrer á manutenção do estabelecimento por meios não excedentes aos limites do orçamento do estado.

Com a quota de 1 por cento tirada dos 15 por cento, que se pagam do imposto do sêllo sobre os premios das loterias (e é esta a parte que acrescerá em despeza), e com outra igual quota deduzida dos 2 1/2 por cento que a santa casa da misericordia de Lisboa tem recebido n’estes ultimos annos pelo rendimento do mesmo imposto, teremos constituido uma dotação annual não inferior a 12:000$000 réis, quantia talvez insufficiente, só de per si, para custear os encargos de um estabelecimento, que terá de manter uma população numerosa e de satisfazer ás exigencias do ensino e educação dos colonos, mas que, por ora, poderá bastar á sua manutenção pela consideração de que nos primeiros annos não se attingirá o maximo da população admissivel, e nos annos subsequentes deverá acrescer em receita o producto da cultura do terreno e do trabalho dos colonos.

A santa casa da misericordia não soffrerá com esta diminuição, porquanto os recursos de que dispõe, graças á boa administração que lhe, tem presidido, e ao augmento de receita dos ultimos annos, são sufficientes para decorrer, sem quebra alguma, ás necessidades do instituto.

Se, como espero, pois, achardes conveniente levar desde já a effeito o melhoramento que proponho, tenho a honra de solicitar a vossa approvação á proposta de lei, que abaixo segue, na qual, alem das auctorisações necessarias para se effectuar a despeza, se contêem algumas providencias, que me parecem convenientes para que o projectado estabelecimento possa corresponder aos seus fins.

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É auctorisada a creação de uma escola agricola destinada a educar e a tornar aptos para os trabalhos agricolas e industrias, correlativas:

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976 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

1.° Os menores que, por vadios e mendigos, forem postos á disposição do governo, na conformidade dos artigos 256.° e 260.º do codigo penal:

2.° Os menores expostos, abandonados e desvalidos a cargo das juntas geraes de districto, ou de outros corpos administrativos, cuja admissão for por estes solicitada, mediante a retribuição fixada nos regulamentos;

3.° Os menores desobedientes e incorrigiveis, cuja admissão for requerida por seus paes ou tutores, e auctorisada pela auctoridade judicial, conforme o artigo l43.º do codigo civil, tambem mediante a devida retribuição.

§ 1.° A admissão dos menores comprehendidos na 1.º classe preferirá sempre á dos pertencentes ás outras duas classes.

§ 2.º Os menores comprehendidos na 3.ª classe poderão permanecer no estabelecimento alem ao tempo marcado no citado artigo do codigo civil, pelo mais que for fixado nos regulamentos.

Art. 2.° Os. rapazes admittidos na escola agricola, emquanto n’ella permanecerem, estarão sujeitos á tutela do estado, depois da saída, e emquanto hão attingirem a maioridade legal ou não forem havidos por maiores, a tutela pertencerá ao estado quanto aos da l.ª classe, aos respectivos corpos administrativos quanto aos da 2.ª classe, e aos paes e tutores quanto aos da 3.ª

Art. 3.° Os juizes de direito, no julgamento de menores vadios ou, mendigos, poderão, em attenção a circumstancias attenuantes, deixar de condemnal-os em prisão correccional, pondo-os desde logo á disposição do governo.

Art. 4.° É o governo auctorisado a fazer os regulamentos e a tomar as providencias convenientes para a organisação e regimen da escola agricola, tomando por modelo os estabelecimentos dos paizes, onde existem similhantes instituições.

Art. 5.° É o governo auctorisado a despender, para compra de terreno e sua apropriação á escola agricola, as sommas necessarias tiradas das sobras das despezas do ministerio do reino no anno economico de 1879-l880.

Art. 6.° Constituirá dotação da escola agricola 2 por cento sobre os premios das deterias, deduzido dos l5 por cento do respectivo imposto de sêllo, ficando d’ora em diante reduzida somente, a l 1/2 por cento a quota, que a santa casa da misericordia de Lisboa recebe do dito imposto.

Art. 7.º O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer das auctorisações concedidas n’esta lei.

Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d’estado dos negocios do reino, em 30 de abril de 1830. = Luciano de Castro = Adriano de Abreu Cardoso Machado

Foi approvado na generalidade e especialidade sem discussão

0 sr. Ministro da Marinha (Marquez de Sabugosa): - Eu tinha requerido que se discutisse o parecer n.° 138, que, diz respeito á creacão de uma medalha de oiro.;

Vozes: — Deu a hora.

Leu-se na mesa o parecer n.° 138.

É do teor seguinte:

Parecer n.° 138

Senhores. — As vossas commissões reunidas de fazenda e de marinha e ultramar, examinaram com a devida attenção o projecto de lei n.° 133, vindo da camara dos senhores deputados, e que tem por fim crear uma medalha de oiro e pensão, para se conferir unicamente aos individuos que tenham prestado ou vierem a prestar assignalados serviços na exploração do continente africano, e principalmente na parte d’esse continente cujo conhecimento mais directamente possa interessar a Portugal.

Senhores. São altamente meritorios os trabalhos d’aquelles que, luctando corajosamente com innumeras difficuldades, em imminente e continuo risco de vida, põem ao serviço da sciencia, da humanidade e da patria as suas faculdades
n’esse vasto continente africano, ainda hoje tão cheio de mysterios e de promessas.

É pela perseverança e audacia de exploradores dedicados e instruidos que se vão levantando no solo de Africa os primeiros marcos miliarios da estrada que ha de levar áquelles povos barbaros a civilisação e a liberdade, e por onde hão de refluir, para o mundo culto novos elementos de commercio, de actividade industrial e scientifica, de adiantamento e de prosperidade.

Portugal, possuindo extensas colonias ao oriente e ao occidente d’essa espaçosa região tropical, é o paiz que maior empenho deve ter em ampliar descobertas e conhecimentos que interessam ao alargamento e á actividade economica das suas possessões.

Em Portugal não tem faltado, nem faltarão benemeritos e corajosos cidadãos que, cheios de abnegação e por sincero amor da sciencia e da patria, emprehendam taes commettimentos, mas são sempre bem vindos todos os estimulos ao trabalho n’esse campo generoso, e todos os premios que sejam justo galardão de grandes serviços.

As, vossas commissões, possuidas d’estes principios, congratulam-se com o governo pelo judicioso pensamento exarado no seu relatorio, de promover a continuação das explorações no sertão africano, e concordando com o projecto, por interessar ás explorações já feitas, assim como áquellas que vierem a emprehender-se, são de parecer que o mesmo projecto deve ser approvado para ser convertido em lei do estado.

Sala das sessões da commissão, 5 de junho de 1880. = Antonio de Serpa Pimentel = Visconde de Soares Franco = Diogo Antonio de Sequeira Pinto = Conde de Castro = João Baptista da Silva = Ferrão de Carvalho Mártens = Sebastião Lopes de Calheiros e Menezes = Mathias de Carvalho e Vasconcellos = Marino João = Franzini = Carlos Bento da Silva = Visconde de S. Januario, relator.

Projecto de lei n.° 133

Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar cunhar uma medalha de oiro, que será conferida unicamente aos individuos que tenham prestado ou vierem a prestar assignalados serviços na exploração do continente africano, e principalmente na exploração da parte d’esse continente cujo conhecimento mais directamente possa interessar a Portugal.

Art. 2.° O governo poderá conceder aos individuos agraciados com esta medalha uma pensão cujo decretamento definitivo ficará dependente da approvação das côrtes.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 2 de junho de 1880. = José Joaquim Fernandes Vaz, presidente = Thomás Frederico - Pereira Bastos, deputado secretario = Antonio José d’Avila, deputado secretario.

Projecto de lei n.º 267

Senhores. — A vossa commissão de fazenda examinou com muita satisfação a proposta de lei n.° 261—A, e, inteiramente de accordo com o seu pensamento, solicita para o respectivo projecto de lei a vossa approvação.

Resultará d’elle, por sem duvida, augmento de despeza; mias a vossa commissão de fazenda, apesar do escrupulo com que se tem havido em todos os pareceres, que importem augmento de encargos, não hesita um momento em se associar á proposta do governo porque a despeza que nos termos d’ella tenha de effectuar-se, terá uma correspondencia muito acima de qualquer compensação, nos resultados das explorações realisadas, a um tempo abundantes de gloria para o nome portugues, e de beneficios para a grande causa da civilisação dos povos.

As explorações realisadas ha pouco por tres officiaes portuguezes com uma coragem e um patriotismo superiores a todo o elogio, darão, por certo, ao governo prompto ensejo, para pôr em execução o pensamento da sua proposta, se

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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 977

ella merecer a approvação das duas casas do parlamento, com elle identificadas no proposito de testemunhar officialmente, embora modestamente, áquelles benemeritos officiaes os applausos e a gratidão do paiz.

Por isso, a vossa commissão de fazenda sujeita aos vossos votos o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar cunhar uma medalha de oiro, que será, conferida unicamente aos individuos que tenham prestado ou vierem a prestar assignalados serviços na exploração do continente africano, e principalmente na exploração da parte d'esse continente cujo conhecimento mais directamente possa interessar a Portugal.

Art. 2.° O governo poderá conceder aos individuos agraciados com esta medalha uma pensão cujo decretamento definitivo ficará dependente da approvação das côrtes.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 1 de junho de 1880. = Mariano de Carvalho = H. de Macedo = A. Fonseca = M. Pereira Dias = Pedro Franco = Antonio Candido = Antonio Ennes - Emygdio Navarro, relator = Tem voto do sr. Castro Monteiro.

Senhores. - A vossa commissão do ultramar examinou com a merecida attenção o projecto de iniciativa do governo que tem por fim a instituição de uma medalha de oiro para premio dos trabalhos de exploração scientifica realisados nas nossas possessões africanas. Não póde a vossa commissão deixar de se congratular com o governo pelo seu levantado pensamento e de o approvar inteiramente, considerando que só um signal claro e distincto da admiração e estima publica póde ser premio condigno dos serviços assignalados que estão prestando ao paiz as explorações scientificas em Africa.

Qualquer das mercês que a outros casos são applicaveis, hão poderia, por mais louvadoura que fosse, substituir a menção singular, symbolisada em um distinctivo especial, de serviços que por sua natureza occupam um logar áparte e elevadissimo entre os que o patriotismo e o amor da sciencia podem prestar a um paiz.

Todas as nações têem instituido mercês honorificas a que andam annexas pensões pecuniarias, para premio de feitos assignalados e merecedores da mais alta consideração publica.

Das mais dignas de similhantes premios são as explorações scientificas na Africa, realisadas contra numerosos perigos com a antiga heroicidade portugueza, levada a cabo á custa da propria saude dos exploradores, com largo dispendio de suas, com sacrificio de todas as communidades, com abnegação e desprendimento dos mais caros affectos, na solidão do deserto, vendo apenas num horisonte ideal e annuviado de saudades, a imagem querida da patria. É divida nacional um quasi nada de bem estar a velhice antecipada e gloriosa dos heroicos exploradores de Africa.

A vossa commissão do ultramar é de parecer que está nos casos de ser convertida em projecto de lei a proposta dó governo, e que ella merece a vossa approvação.

Sala da commissão, em 31 de maio de 1880. = José Maria da Ponte e Horta = Elvino de Brito = Antonio Ennes = Emygdio Navarro = José Barbosa Leão = Angelo de Sarrea Prado = J. E. Scarnichia = F. Beirão - Alfredo Ribeiro, relator;.

Proposta de lei n.° 261-A

Senhores. - Converge actualmente para o continente africano a attenção das nações mais civilisadas. Exploradores ousados percorrem em todas as direcções as regiões d'esse continente, grande parte dos quaes nós os portuguezes fomos os primeiros a devassar, e onde tambem, os primeiros, fixámos os marcos que serviram depois a apontar o caminho aos modernos descobridores.

Se com rasão nos devemos ufanar de havermos iniciado essa cruzada gloriosa, tambem podemos ter a satisfação de não ter desacompanhado o movimento actual, á frente do qual se encontram as sociedades scientificas, as associações e as emprezas particulares e os governos das nações mais civilisadas. As explorações ultimamente realisadas por Serpa Pinto, Capello e Ivens são documento incontestavel de que desejâmos proseguir nobremente na senda que ha seculos tão brilhantemente, traçámos.

Não nos é, porém, licito parar. A exploração do continente africano a nenhum a nação importa talvez mais do que a Portugal, e ousamos dizel-o a nenhuma outra se impõe como tão imperioso dever.

Portugal possue nas costas africanas extensas fachas de territorio, domina a foz dos dois rios mais importantes d'aquelle continente; e, portanto, mais do que nenhuma outra nação possue os elementos de abrir ao commercio do mundo essa vasta região que, pelas suas riquezas naturaes, está destinada, porventura, a resolver alguns dos serios problemas que hoje preoccupam a attenção dos sabios e dos governos.

É, pois, dever nosso promover por todos os modos a continuação d'essas explorações que são de certo um dos titulos mais honrosos para o seculo XIX.

Não tem. faltado, n'este nobre empenho, nem a abnegação, nem o patriotismo, nem a coragem heroica; mas se é grato que assim succeda, não é menor por isso a obrigação dos poderes publicos de demonstrarem que sabem recompensar dignamente os esforços dos que não duvidam arriscar a vida em proveito da sciencia ou em gloria da patria.

Galardoar os que na exploração do continente africano se tenham empregado com dedicação singular, e especialmente os que a Portugal houverem prestado serviços relevantes, parece-nos que é um louvavel incitamento, senão o desempenho de rigoroso dever.

Não julgâmos necessario alongar-nos em mais considerações para justificar a seguinte proposta de lei, confiando que o vosso patriotismo e illustração hão de reconhecer desde logo o alcance d'ella, e que, portanto, lhe dareis a vossa approvação.

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar cunhar uma medalha de oiro, que será conferida unicamente aos individuos que tenham prestado ou vierem a prestar assignalados serviços na exploração do continente africano, e principalmente na exploração da parte d'esse continente cujo conhecimento mais directamente possa interessar a Portugal.

Art. 2.° O governo poderá conceder aos individuos agraciados com esta medalha uma pensão, cujo decretamento definitivo ficará dependente da approvação das côrtes.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 31 de maio de 1880. = Marques de Sabugosa.

O sr. Vaz Preto: - Parece me que a primeira cousa a fazer, depois de ter dado a hora, é v. exa. consultar a camara sobre se quer que a sessão se prorogue. Emquanto isto se não fizer, não se póde discutir este projecto.

O sr. Presidente: - A minha intenção era fazer o que acaba de indicar o digno par. Portanto, pergunto á camara, se quer que a sessão se prorogue por mais alguns minutos para se votar este projecto. Os dignos pares que são d'esta opinião tenham a bondade de se levantar.

Verificada a votação.

O sr. Presidente: - Parece-me estar, approvado que se prorogue a sessão para se votar este projecto.

Vozes: - Não está approvado.

O sr. Presidente: - Visto que ha duvidas, procede-se á contraprova.

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Os dignos pares que se levantaram tenham a bondade de se sentar, levantando-se os que ficaram sentados.

Verificada a votação.

O sr. Presidente: - Não está approvado; portanto está levantada a sessão.

Eram seis horas e cinco minutos.

Dignos pares presentes na sessão de 7 de maio de 1880

Exmos. srs.: Duques, d'Avila e de Bolama e de Loulé; Marquezes, de Ficalho, de Fronteira, de Monfalim, de Angeja, de Sabugosa, de Vallada; Arcebispo de Evora; Condes, de Avilez, de Bomfim, de Cabral, de Castro, de Fonte Nova, de Gouveia, de Podentes, de Rio Maior, da Torre, de Paraty, de Valbom, da Louzã; Bispo eleito do Algarve; Viscondes, de Almeidinha, de Alves de Sá, da Asseca, de Bivar, de Borges de Castro, de S. Januario, de Ovar, da Praia Grande, do Seisal, de Soares Franco, da Praia, de Valmor; Barão de Ancede; Ornellas, Quaresma, Sousa Pinto, Barros e Sá, D. Antonio de Mello, Couto Monteiro, Fontes Pereira de Mello, Rodrigues Sampaio, Serpa Pimentel, Coutinho de Macedo, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Xavier da Silva, Palmeirim, Carlos Bento, Sequeira Pinto, Montufar Barreiros, Fortunato Barreiros, Margiochi, Andrade Corvo, Mendonça Cortez, Mamede, Braamcamp, Baptista de Andrade, Pinto Bastos, Castro, Reis e Vasconcellos, Manços de Faria, Mello e Gouveia, Costa Cardoso, Mexia Salema, Luiz de Campos, Camara Leme, Costa Lobo, Seixas, Vaz Preto, Franzini, Mathias de Carvalho, Canto e Castro, Calheiros, Thomás de Carvalho, Ferreira Novaes, Vicente Ferrer, Seiça e Almeida.

Discurso do exmo. sr. conde de Valbom, que devia ler-se a pag. 955, col. 2.ª

O sr. Conde de Valbom: - A sessão está a findar, e por isso não serei longo nas reflexões que vou apresentar á camara ácerca do assumpto que se debate.

A primeira questão a attender é ao ponto por onda convem seguir esta linha, porque da foz Io Tua para diante póde seguir duas direcções - ou para Salamanca ou para Zamora.

Para isto é indispensavel que haja accordo cem o governo do paiz vizinho, pois que segundo o accordo que existir entre o governo portuguez e o governo hespanhol, a respeito do ponto do juncção, assim conviria seguir o traçado mais para o norte ou mais para leste.

Não sei o que o governo tem tenção de fazer com a directriz que deve seguir este caminho até entroncar com a linha hespanhola; mas, o que é facto é que isto é uma questão de alta conveniencia a que carece de ser resolvida.

Quanto ao prolongamento do caminho de ferro da Douro, todos sabem que elle tem sido preterido por outras obras. E bom é que o governo acordasse agora, e que a construcção d'este caminho se vote, pois elle é de grande importancia e deve ser classificado como de primeira classe. (Apoiados.)

Este caminho não importa só aos nossos distritos do norte e ao Porto, aos quaes devemos maior attenção, porque, sem querer desconsiderar de modo algum os outros districtos, estes são na verdade mais populosos, activos e industriaes.

Esta linha, que tem grande importancia como linha internacional, ligada com a linha hespanhola, ha de trazer um valioso movimento sobre Portugal.

Voto com regosijo o prolongamento d'esta linha, o qual não póde ser, por emquanto, senão até á foz do Tua, porque até á fronteira tem de ser precedido de accordo com o governo hespanhol.

Sinto que para o prolongamento d'esta linha se arbitrem os recursos, cuja realisação é problematica, como acaba de dizer o sr. Serpa Pimentel, porque só o prolongamento até á foz de Tua deve orçar por 400:000$000 rei s a 450:000$000 réis. Alem d'isso ha a despeza a fazer com o ramal desde a estação do Pinheiro até ao Douro. Com os recursos de que se dispôs não se póde contar, porque parte d'elles já têem applicacão, como disse o sr. Serpa, para obras e estudos; e a venda dos carris que estão em deposito não se sabe tambem até que ponto se poderá effectuar, pois podem ser precisos para algumas vias de resguardo e cruzamento, ou para alguns outros serviços importantes da linha, e para isso tinham sido adquiridos; se, porém, agora forem vendidos, depois ter-se-hão de comprar de novo.

Alem de outras obras, ha que fazer a ponte sobre a fronteira e o acabamento do caminho de ferro do Minho que vae em direcção a Caminha; se este caminho tiver que atravessar o rio Minho, e suppondo que a ponte para esse fim seja feita em commum com o reino vizinho, que as despezas sejam divididas entre as duas nações, ainda assim o nosso governo tem de despender uma somma consideravel, que de certo não andará longe da verba que se arbitra no § unico do artigo 2.°

Esta verba já tem muitas applicações, e não deixa disponivel o necessario para occorrer a esta despeza com a construcção d'este ramal.

Portanto, creio que o governo ha de recorrer a meios extraordinarios, que não estão previstos no orçamento se quizer fazer estas despezas todas de que trata este projecto, ou então terão de soffrer as obras em seu andamento, e que será mais uma desillusão para o Porto.

N'estas circumstancias, e não desejando que se prive a segunda cidade do reino d'estes melhoramentos, por isso não proponho alteração alguma para não deixar pendente este negocio por falta de tempo; mas não posso deixar de dizer que se deviam ter proposto meios mais serios, positivos e efficazes para se occorrer ás despezas das construcções que se propõem n'este projecto. (Apoiados.)

[Discurso ao exmo. sr. conde de Valbom, que devia ler-se a pag. 950, col. 1.ª

O sr. Conde de Valbom: - Parece-me que o sr. ministro das obras publicas não respondeu satisfatoriamente a algumas ponderações que tive a honra de apresentar a respeito da efficacia dos meios para occorrer ás despezas que propõe.

S. exa. referiu-se em geral a esses meios e não indicou quaes os resultados que d'elles se podem obter. Por conseguinte não sabemos que somma se póde realisar dos recursos que designa no projecto em discussão.

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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 979

Extracto do discurso proferido pelo digno par o exmo. sr. Visconde de S. Januario na sessão de 7 de junho de 1880, que devia ser publicado a pag. 938, col. l.ª depois da linha 31.

O sr. Visconde de S. Januario: - Disse que as commissões reunidas de obras publicas e de fazenda tinham-se occupado da proposta de lei apresentada pelo governo, relativa a um porto artificial com que se desejava dotar a cidade do Porto, e á construcção de docas na margem direita do Tejo junto a Lisboa, encarregando-o essas commissões de formular o respectivo parecer. Que este se achava prompto, mas que fóra impossivel por circumstancias diversas, reunir ultimamente ambas as commissões para obter a approvação e assignatura do parecer; por isso mandava este para a mesa assignado sómente por elle como relator.

Pedia que se consignasse na acta a declaração que acabava de fazer e tambem que o parecer que formulou, ao qual adheriam alguns membros das commissões, como o digno par Conde de Castro e outros, a quem acabava de consultar, não só era favoravel á proposta do governo, mas considerava essenciaes e instantes os importantes melhoramentos propostos e ha tanto tempo reclamados para os portos das cidades de Lisboa e Porto.

Assim se resolveu.

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