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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

SESSÃO DE 14 DE DEZEMBRO DE 1865

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. CONDE DE LAVRADIO, PRESIDENTE

Secretarios, os dignos pares

Marquez de Vallada

Visconde de Algés

Pelas duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 22 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O sr. Secretario (Marquez de Vallada): — Mencionou a seguinte correspondencia;

Um officio do ministerio do reino, em satisfação ao requerimento do digno par Mello e Carvalho, e officio de 28 de novembro ultimo, remettendo as informações pedidas quanto aos empregados demittidos ou transferidos nos districtos de Castello Branco e da Guarda. — Para a secretaria.

Outro do ministerio das obras publicas, commercio e industria, enviando para serem distribuidos pelos dignos pares do reino sessenta exemplares da convenção telegraphica internacional, celebrada em París no mez de maio do corrente anno. — Mandaram-se distribuir.

O sr. Presidente: — Devo participar á camara que Sua Magestade El Rei, Regente, dignou-se receber hontem as duas grandes deputações d'esta camara: a primeira, para lhe apresentar a resposta aos discurso da corôa; e a segunda, para exprimir os sentimentos da camara pelo fallecimento de Sua Magestade Leopoldo I, Rei da Belgica. Sua Magestade o Senhor D. Fernando recebeu-as com a sua bem reconhecida benevolencia, e mostrou-se summamente penhorado pela respeitosa e dedicada attenção que esta camara teve, de o cumprimentar por occasião do fallecimento de seu augusto tio. Não posso repetir agora todas as expressões de Sua Magestade, mas asseguro que ellas indicavam o quanto apreciava a resolução que unanimemente havia tomado esta camara.

O sr. Marquez de Vallada: — Em virtude da resolução tomada na ultima sessão, desanojei, na qualidade de secretario, o sr. visconde de Benagazil, que se achava anojado pela morte de uma de suas filhas.

CORRESPONDENCIA

O sr. Marquez de Sabugosa: — Pedi a palavra para mandar para a mesa os seguintes requerimentos, em que peço diversas informações:

1.° Requeiro que se peça ao governo, pelo ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça, que remetta a esta camara as informações que no dito ministerio dessem entrada no anno de 1859, ácerca do estado em que se achava o registo parochial.

2.° Requeiro que se peça ao governo, pelo ministerio dos negocios da justiça, que informe esta camara da execução que tem tido os decretos de 19 de agosto de 1839 e de 2 de abril de 1862, principalmente a respeito das inspecções annuaes, e da remessa dos livros para as camaras ecclesiasticas.

3.° Requeiro que se peça ao governo, pelo ministerio do reino, copia do regulamento ou instrucções porque se executa o registo civil em vigor nos Açores.

Camara dos pares, 14 de dezembro de 1865. = Marquez de Sabugosa.

Depois de lidos na mesa, mandaram-se expedir.

O sr. Presidente: — Vou chamar a attenção da camara sobre um negocio que me parece se deve resolver antes de terminar esta sessão annual. Peço licença de fazer uma breve exposição do mesmo negocio para que a camara tome inteiro conhecimento d'elle, e decida como lhe parecer de justiça, segundo as circumstancias que se dão.

Ha já bastantes annos que a camara dos senhores deputados resolveu conceder ajudas de custo aos seus empregados quando as sessões legislativas se prolongam alem do praso marcado na carta constitucional. Em vista d'essa resolução da camara electiva, os empregados d'esta casa fizeram em tempo uma representação pedindo que, pelo principio da equiparação estabelecido por esta camara, lhes fosse extensivo o mesmo beneficio; com effeito a camara dos dignos pares assim o determinou. Nos annos subsequentes foi a camara dos senhores deputados seguindo a mesma pratica, e n'essa conformidade esta camara foi seguindo o mesmo exemplo, até que nos ultimos annos as mesas, segundo as informações que tenho, achando-se devidamente auctorisadas para fazer a similhante respeito a applicação do principio em casos identicos, sem ser necessario consultar de novo a camara, resolviam em conformidade com as resoluções já tomadas uniformemente a este respeito.

Succedeu porém que a ultima mesa anterior á actual, depois de ter tomado a mesma resolução em principio, julgou comtudo conveniente mandar suspender na execução até que este negocio tornasse a ser presente á camara. N'este estado o achei eu quando tomei posse da presidencia, e partilhando dos mesmos escrupulos, entendi que me cumpria fazer esta exposição para que a mesa em caso algum assuma maior responsabilidade do que aquella que justamente lhe possa caber.

Tenho presente o officio da secretaria da camara dos senhores deputados, datado de 7 de setembro ultimo, o qual serviu de base á proposição deste negocio ainda pendente.

O officio é do teor seguinte, (leu-o).

Eis aqui o estado da questão que apresento á consideração da camara, parecendo-me porém que ella será de opinião que se levante a suspensão da resolução ultimamente tomada pela mesa, e que se satisfaça na conformidade do que se tem praticado nos annos preteritos (apoiados), salvo porém o accordo que se possa tomar de regular para o futuro este negocio de uma maneira mais conforme com a lei e os bons principios. Mas repito que a mesa é de opinião que attento o estado do negocio no anno presente, se siga o precedente estabelecido pela copiara, e por ella mesmo confirmado todas as vezes que se tem tratado de similhante objecto (apoiados)... Este é o parecer da mesa actual mas sem uma resolução solemne da camara para o confirmar não se póde dar-lhe, execução.

O sr. Silva Cabral: — Nós devemos ser o mais escrupulosos que se possa na fiscalisação da legal distribuição dos dinheiros publicos. A especie que se apresentou é grave, não pela importancia do objecto em si, considerada a sua quantidade relativa, mas porque vae de encontro a um grande principio constitucional e ás disposiçoes claras e terminantes da carta, contra as quaes não póde nem deve prevallecer nenhum precedente, que a bate-lo, como ha, nunca passará de uma corruptela, ou arbitrio condemnavel. Desde que, se tratar de despezas publicas a sua legitimidade não poderá existir, menos que não intervenha a lei, para cuja confecção é essencial o accordo dos poderes constitucionaes. Quando membro da camara electiva conservei e tive sempre, esta firme opinião. Aqui sou da mesma opinião; repito, que o negocio é grave, e que a querer-se attender, deve definitivamente regular-se, não pelos precedentes, que na hypothese, sujeita não são mais que excessos de jurisdicção pelo impulso de uma má entendida condescendencia ou benevolencia; mas por aquillo que é justo, e não póde ser justo em tal caso, senão o que for regulado pela constituição do estado, em virtude da qual temos o mandato nacional.

Portanto, requeiro que a exposição que a mesa acaba de fazer seja remettida a uma commissão qualquer, que dê o seu parecer, e que se tome uma deliberação permanente sobre este objecto. Não é de uma ajuda de custo que se trata, é da infracção de um grande principio, que a camara dos pares deve evitar a todo o custo, porque, pela sua indole, deve ser muito escrupulosa em guardar a pureza das instituições, e a camara dos pares de per si só não póde auctorisar a despeza a que se fez allusão, porque não tem competencia constitucional.

Portanto, repito, que este negocio deve ser mandado a uma commissão, e sobre o parecer que ella der, deliberaremos o que for justo e constitucional.

O sr. Presidente: — Peço ao digno par que mande para a mesa o seu requerimento.

O sr. Silva Cabral: — Mando para a mesa o seguinte requerimento.

«Requeiro que a reclamação dos empregados da camara, para lhes ser concedida uma gratificação, seja remettida a uma commissão para dar o seu parecer. = Silva Cabral.»

Leu se na mesa.

O sr. Conde de Thomar: — Sr. presidente eu não sei se o digno par pediu a urgencia do seu requerimento ou se elle tem de ficar para a sessão seguinte. (O sr. Silva Cabral: — Peço a urgencia.) Eu não me opponho a que esse negocio vá a uma commissão, mas não posso deixar de fazer algumas observações a respeito d'elle.

Não ha duvida nenhuma que em principio as ajudas de custo, sendo uma despeza publica, não podem nem devem ser concedidas senão em virtude fie uma lei, mas esse principio não tem sido observado desde que ha governo representativo em Portugal (apoiados).

Não admira que esta camara tenha concedido ajudas de custo aos seus empregados, quando entende que se lhe devem conceder, pois que a camara popular, que é a que se julga dever ter a seu cuidado a bolsa do povo, é aquella que tem dado o exemplo d'isso (apoiados).

Ora se é justo que os empregados da outra casa do parlamento tenham sido remunerados pelos serviços que se podem julgar extraordinarios, esta camara não póde deixar do seguir a mesma pratica, remunerando os seus empregados pelo mesmo motivo, tanto mais estando, como esta, estabelecido o principio da equiparação (apoiados).

Dei estes esclarecimentos para se ver que esta camara póde ter infringido os principios, mas não tem feito mais do que seguir os exemplos da camara dos senhores deputados (apoiados).

Eu estimaria muito que este negocio fosse regulado por uma lei, porque convem tirar o arbitrio ás camaras n'estes assumptos, tanto a respeito das ajudas de custo, como dos ordenados dos empregados que pertencem ás duas casas do parlamento.

Esta questão veiu agora a esta camara, e ainda bem, porque póde ser que sáia d'aqui o remedio para o inconveniente que deixei assignalado. A minha opinião n'este ponto é conhecida, e quando vier á discussão a resolução do negocio que esta pendente, hei de votar que se siga o mesmo que se praticou na camara electiva (apoiados), embora para o futuro haja de tomar-se qualquer accordo a este respeito.

Julguei dever fazer estas observações, não obstante desejar muito, como disse, que para o futuro se faça uma lei que regule este negocio em ambas as casas do parlamento (apoiados).

Sobre a questão que esta proposta pela mesa, com a sua approvação, voto affirmativamente, sem que comtudo me possa oppor ao pedido para que haja um parecer de commissão.

O Sr. Presidente — Eu não sei a que commissão, deva ir este negocio.

Vozes – Á comissão de Fazenda.

Consultada a camara, resolveu-se que fosse à comissão de fazenda.

O Sr. Presidente – Creio que a camara deve tratar de um ponto que é importante, isto é, se o parecer da comissão deve referir-se só ao futuro, ou se abrange o caso presente; porque devo observar que na camara dos senhores deputados, não só já foi votada a ajuda de custo, mas até já foi paga. Esta circumstancia é muito importante (apoiados).

O Sr. Silva Cabral – O espirito com que fiz o meu requerimento foi para reflectir com madureza sobre este assumpto, porque creio que a camara não deve dar um passo que não seja legal e constitucional. O meu requerimento não abrange só o futuro, referia-se tambem ao presente. Quanto ao futuro pode ser decretado por uma lei; e quanto ao presente não se pode regular depois de ser apresentado o parecer da comissão.

O meu fim foi este, mas no entanto a camara fará o que julgar conveniente.

(Entrou o sr. ministro da marinha)

O sr. Marquez de Niza: — Não tendo querido tomar sobre si a responsabilidade de guarda e remoção da grande quantidade de livros que pertencem á bibliotheca das côrtes, propoz, em tempo, que se nomeasse um bibliothecario por conta, e á guarda do qual se fizesse a remoção e a collocação e arranjo dos livros; essa proposta porém não chegou a realisar se, posto saiba que se fizeram, algumas reuniões das duas mesas. Acresce a isto parecer lho que as obras para a nova sala e de mais officinas da camara não terão a extensão, nem se lhes dará a actividade que estava proposta ao começarem se, o que importa continuarem acumulados, sem ordem, e expostos a deterioração muitos livros e, alguns importantes, alem do periga a que estão expostos de extravio ou incendio, visto não haver casa propria, nem local accommodado em que possam estar devidamente collocados, ou ao menos resguardados convenientemente, parece-lhe que se mandem os melhores d'elles em deposito para a bibliotheca publica, prescindindo se por isso do logar de bibliothecario, pois se torna um logar inutil. E concluiu lendo e mandando para a mesa a seguinte proposta:

« Proponho a suppressão do logar de bibliothecario. = Marquez de Niza.»

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, eu pedi a palavra na occasião em que o digno par o sr. marquez de Niza fallava, porque entendi conveniente dar alguns eslarecimentos sobre o assumpto de que se trata. O sr. marquez de Niza parece me que tinha dito que não sabia se seria necessario uma lei especial sobre este negocio; a lei existe, e eu peço licença á camara para ler o titulo 17.° do nosso regimento interno, que sobre o objecto em questão diz o seguinte: artigo III." (leu). Peço igualmente licença para ler o artigo transitorio (leu).

Pareceu me não dever dispensar-me de dar este esclarecimento porque a lei existe. Ora pois isto é emquanto ao direito constituido; mas se a lei não existisse, e tivessemos de constituir direito, eu, que tenho pugnado n'esta camara pelo espaço de treze annos, que é este o tempo em que n'ella tenho assento, eu, repito, que tenho pugnado pelas economias, não acompanharia o digno par na idéa de se fazer esta. Eu entendo que se deve pugnar pelas economias, que a boa razão determina, e o bem publico aconselha, mas nunca aconselharei uma medida tendente a supprimir ou a eliminar uma despeza, quando d’ella resulte um progresso para o serviço publico, porque essas economias podem julgar se plausiveis, mas nunca são convenientes, e eu ponho de parte n'este caso a plausibilidade para seguir a conveniencia. Perguntarei eu agora: seria conveniente e mesmo proprio de. uma camara como esta, deixar de ter uma bibliotheca? Não.

Esta resposta, creio que esta na mente de muitos dignos pares. Não sei se estará na de todos, mas esta na minha, e darei a rasão d'ella. Poderia porventura uma camara, aonde se tratam as questões mais importantes do paiz; poderia, repito, prescindir de ter á mão uma bibliotheca? Não; porque necessitam muitas e repetidas vezes os dignos pares consultar livros, e isto em relação a factos que se citam, a leis a que se referem os oradores etc.. e isto ás vezes de momento; ha factos e pontos historicos, que muitas vezes são indispensaveis de se apontarem para esclarecer uma questão ou desfazer qualquer duvida. Citarei um exemplo que se deu n'esta casa entre mim e o sr. general Baldy: discutindo eu com s. ex.ª sobre uma questão, que não preciso citar, referi-me ao Diccionario de Blutteau, e o digno par divergia de mim. Ora supponhamos que a questão progredia, e que se mandava pedir o livro; como se havia resolver este negocio se o livro não existisse no edificio? O mesmo que succedeu com este facto, podia dar-se com. qualquer lei que fosse necessario consultar, o que seria muito mais serio ainda. Eu entendo portanto, sr. presidente, que se não deve extinguir, mas augmentar a nossa bibliotheca, pela necessidade que d'ella temos.

Sr. presidente, eu tenho muitas vezes erguido aqui a minha voz contra esse espirito, não direi de progresso, porque não o encaro como tal, que pretende o predominio da materia sobre o espirito; eu desejo os progressos materiaes, e desejo-os de todo o coração; desejo contribuir para os progressos da minha terra, e brevemente terei occasião de me pronunciar sobre uma grande questão de progresso, e hei de provar que muitos homens, a quem se não quer conceder o titulo de progressistas, o são de coração; mas o que não acho conveniente é que se attenda unicamente aos progressos materiaes, esquecendo ou pondo de parte os moraes.