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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO em 15 de JUNHO de 1864

PRESIDÊNCIA DO EX.MO SR. CONDE DE CASTRO

VICE PRESIDENTE

Secretarios, os dignos pares

Mello e Carvalho

Caula Leitão

As duas horas o tres quartos da tarde sendo presente numero legal, declarou o sr. presidente aberta a sessão. Lida a acta da antecedente, foi approvada na conformidade do regimento, não havendo reclamação em contrario.

Deu-se conta da seguinte correspondencia:

Quinze officios do presidente da camara dos senhores deputados acompanhando as seguintes proposições de lei:

-Sobre o augmento de 20 réis diarios no vencimento das praças de pret do exercito, e suppressão das verbas que se abonavam para auxilio do rancho.—As commissões de guerra e fazenda.

-Sobre a confirmação do decreto, em virtude do qual foi elevado o governo de Timor á cathegoria de governo independente de 2.ª classe. —A commissão do ultramar.

-Sobre o augmento dos ordenados dos aspirantes de 2.ª classe das repartições de fazenda dos districtos do reino. —A commissão de fazenda.

-Sobre a concessão do um credito de 7:000$000 réis ao ministerio das obras publicas para varias despezas extraordinarias. — A commissão de obras publicas.

-Sobre a concessão de varias auctorisações ao governo para a construcção de certas estradas districtaes o municipaes.—Ás commissões de obras publicas e fazenda.

-Sobre ser applicavel aos depositarios geraes das comarcas no continente e ilhas, a disposição do capitulo 5.° do alvará de 21 de maio de 1751, quanto á percentagem pela guarda e conservação de objectos depositados. — A commissão de legislação.

-Sobre a creação de um logar do preparador e conservador do museu de anatomia na escola medico-cirurgica do Lisboa e outro no Porto.—As commissões de instrucção publica e fazenda.

-Sobre a concessão de uma igreja á irmandade de Nossa Senhora do Carmo, da cidade de Braga, com varias pertenças para uso do culto divino. — As commissão de administração e fazenda.

-Sobre a approvação de diversas disposições que têem por fim a boa arrecadação dos bens dos orphãos da cidade de Loanda. — À commissão do ultramar.

-Sobro a approvação de uma nova tabella de emolumentos e salarios judiciaes.—A commissão de legislação.

-Sobre o modo de considerar os serviços militares para as informas de que trata o alvará de 16 de novembro de 1790 e a carta de lei de 8 de junho de 1863. — A commissão de guerra.

-Sobre o modo de contar a antiguidade de alferes e

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regular a dos postos subsequentes, ao major do regimento de infanteria n.º 4 Bernardo Antonio de Figueiredo. — A commissão de guerra.

-Sobre ser auctorisado o governo a aposentar com o ordenado por inteiro o guarda mor das escolas da universidade Bazilio José Ferreira.—As commissões de administração publica e fazenda.

-Sobre a approvação do codigo penal e disciplinar da marinha mercante. — À commissão de marinha.

-Sobre a transferencia do serviço de administração e inspecção dos pharoes do ministerio das obras publicas para o de marinha e ultramar.—As commissões de obras publicas e marinha.

O sr. S. J. de Carvalho: — Pediu explicações ao sr. presidente do conselho de ministros ácerca dos negocios de Villa Real; e indicou outras que desejava lho fossem dadas pelo sr. ministro da justiça ácerca de differente objecto.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Duque de Loulé): — Satisfez ao digno par nas pedidas explicações.

O sr. S. J. de Carvalho: —.......................

ORDEM DO DIA

Leu-se na mesa o parecer n.º 410, sobre o projecto de lei n.º 419, que são ão teor seguinte:

Senhores.—As commissões de fazenda e de administração publica examinaram o projecto de lei n.º 419, approvado pela camara dos senhores deputados, que tem por fim modificar a lei de 7 de julho de 1855 emquanto ao artigo 3.°, substituindo o imposto de 100 réis em pipa de vinho, produzido no concelho, por uma quota addicional ás contribuições industrial e predial, que deverá perfazer annualmente a quantia de 800$000 réis até completo pagamento do emprestimo auctorisado pela mesma lei.

Considerando que é necessaria a substituição proposta, visto achar-se muito reduzido o producto do imposto sobre a producção do vinho, e não ter a camara rendimentos que a habilitem a satisfazer os encargos que assumiu;

Considerando os fundamentos da representação da camara e de trezentos cidadãos de entre os maiores contribuintes d'aquelle concelho, e havendo o governo concordado a tal respeito com as commissões de fazenda e de administração publica da camara dos senhores deputados, são de parecer que o referido projecto de lei seja approvado, para subir á sancção real.

Sala das commissões, em 1 do junho de 1864. = José Maria Eugenio de Almeida = Francisco Simões Margiochi = Joaquim Larcher = José Augusto Braamcamp — Marquez de Ficalho = Barão de Villa Nova de Foscoa.

PROJECTO DE LEI N.° 419

Artigo 1.° O imposto que se acha estabelecido no artigo 3.° da lei de 7 do julho de 1855, é substituido por uma quota addicional ás contribuições industrial o predial do concelho do Cartaxo, devendo o quantum por cento d'essa quota ser calculado por fórma que possa produzir a quantia annual de 8000000 réis.

Art. 2.° A imposição que se acha estabelecida no artigo 1.° cessará no praso fixado pelo n.º 3.° do artigo 3.° da lei de 7 de julho de 1855.

Art. 3.° Fica modificada, sómente n'esta parte, a lei de 7 de julho de 1855, e revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 28 de maio de 1864. = Cesário Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente == Miguel Osorio Cabral, deputado secretario = José de Menezes Toste, deputado secretario.

O sr. Conde de Avila: — Eu desejava provocar da parte das commissões, a que este projecto foi remettido, uma explicação a respeito d'elle, porque o parecer não vem sufficientemente desenvolvido. Este objecto foi tratado na commissão de fazenda, naturalmente n'alguma sessão a que eu não assisti, e por isso não sei as rasões que levaram o seu auctor a apresenta-lo, assim como ignoro de quem é a sua iniciativa, -o quaes os motivos porque a commissão o approvou.

O sr. Braamcamp: — Este projecto tem por fim crear uma quota addiccional ás contribuições industrial e predial, para substituir o imposto de 100 réis em pipa de vinho, ordenado no artigo 3.° da lei de 7 de julho de 1855. Ora, como tem sido grande a escassez de vinho, e como era necessario continuar-se a cobrar este imposto, para pagamento do emprestimo auctorisado pela mesma lei de 7 de julho, lançou-se mão d'este meio como o mais efficaz; tanto assim que a camara municipal do Cartaxo considerou-o de grande vantagem para a localidade, como se vê pela sua representação, e pela de trezentos cidadãos dos maiores contribuintes do concelho.

Parece-me pois que estas rasões devem satisfazer á pergunta do digno par.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — O que eu desejo saber é quaes são as contribuições que paga a camara do Cartaxo, porque sem isso não podemos discutir este projecto. Supponhamos que a camara do Cartaxo já cobra tantas contribuições quantas está effectivamente auctorisada a cobrar, se por este projecto se pagar mais contribuição do que aquella que segundo a lei existente está auctorisada a lançar, o projecto não póde ser approvado. Mas, para se saber isto, é preciso sabermos quaes são as contribuições que pagam os habitantes do Cartaxo. Eu não sei, e portanto desejava que me informassem a este respeito, de quaes são as contribuições directas e indirectas que se pagam no Cartaxo.

Também era necessario saber-se quanto se tem recebido para este emprestimo; isto é uma das condições que o codigo exige, que as contribuições que se lançam para os emprestimos sejam lançadas separadamente, para que se possa conhecer a somma dellas, e qual a sua applicação; mas em todo o caso é necessario saber-se quaes são as contribuições que paga o concelho do Cartaxo.

O sr. Conde d'Avila: — Sr. presidente, o digno par, o sr. Braamcamp, tomou a seu cargo responder como relator sem o ser. S. ex.ª apresentou uma rasão, que para mim é a mais forte de todas, que é esta substituição de imposto ter sido requerida pela camara do Cartaxo e por trezentos contribuintes do mesmo concelho.

Quando este projecto foi aqui distribuido deixou-me uma impressão desfavoravel; primeiramente porque quando o emprestimo, a que se refere este projecto, foi auctorisado por uma lei de 1855, o oidium infestava este paiz; era possivel que não tivesse ainda chegado ao Cartaxo, mas era de suppor tambem, que essa calamidade que pesava sobre outros concelhos, tivesse já chegado aquelle, o o parecer não diz cousa alguma a este respeito; alem d'isto ignora-se tambem qual é a proporção em que estava o imposto que existia com aquelle que o vem substituir.

Eu sinto que o digno par, que é o verdadeiro relator deste projecto, e que devia ter todas as informações necessarias, não esteja presente para responder. Eu não podia exigir que o sr. Braamcamp fosse tão explicito, porque todos nós sabemos que o relator especial é o que se encarrega de responder a todas as observações que se apresentarem na discussão. Confesso que estas duvidas me fizeram peso; entretanto, como é a camara municipal que pede esta substituição e os contribuintes tambem, e o sobre elles que vae pesar o imposto; se a medida que votamos agora for severa, venham representar de novo para que ella seja revogada, da mesma fórma que pediram para que ella fosse estabelecida.

O sr. D. António José de Mello (sobre a ordem): — Mando para a mesa um parecer das commissões de guerra e fazenda.

O sr. Presidente: — Manda-se imprimir.

O sr. Pinto Basto (sobre a ordem): — Mando para a mesa um parecer das duas commissões reunidas, de fazenda e obras publicas.

O sr. Presidente: — Manda-se imprimir.

O sr. Visconde de Soares Franco (sobre a ordem): —Mando para a mesa um parecer das commissões de fazenda e marinha, e outro da commissão de marinha, relativamente á força naval.

O sr. Presidente: — Mandam-se imprimir.

O sr. Visconde de Fonte Arcada (sobre a ordem): — Sr. presidente, em additamento ao que disse, desejo que o illustre relator da commissão, ou outro qualquer membro d'ella, me diga se sobre este imposto, ou mudança de imposto que agora se quer estabelecer, o conselho municipal foi ouvido, assim como tambem o conselho de districto, o se instruido este objecto com todos estes documentos, foi á mão do governo?

Também desejava saber a quanto montam as contribuições pagas pelo concelho do Cartaxo, antes de se ter estabelecido este imposto sobre o vinho.

O sr. Braamcamp: — As exigencias que acaba de fazer o digno par são justificadas nos casos ordinarios em que se trata de votar um emprestimo novo, mas não é essa a questão: o emprestimo está decretado, os encargos existem, é preciso satisfaze-los; do que se trata unicamente é de substituir um imposto por outro, a requerimento e contento dos contribuintes, e é a vez primeira que eu vejo contestar a applicação de um imposto directo para satisfazer despezas municipaes. Portanto parece-me que a questão está simplificada o mais possivel. Ninguém ignora quaes são as disposições da lei para os emprestimos novos, mas essa não é a questão, o emprestimo existe, como já disse, e para não cansar mais a camara não repetirei as mesmas observações; do que se trata é de substituir um imposto que desappareceu. Na realidade maravilha que se impugne uma reclamação feita tão legalmente pelos povos d'aquella localidade.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Uma das minhas primeiras exigencias não satisfez s. ex.ª Eu desejava saber as contribuições que paga o concelho do Cartaxo, é a isto que ninguem me responde, e desejava tambem saber quanto se tem recebido por aquelles impostos antigos que hoje se querem mudar; por consequencia os principaes quesitos que eu propuz não foram respondidos.

Desejo saber isto tudo para poder votar conscienciosamente.

(Pequena pausa.)

Proposto o projecto á votação, por não haver quem sobre elle mais pedisse a palavra, foi approvado na generalidade, especialidade, e a mesma redacção.

O sr. Ministro da Marinha (Mendes Leal) (sobre a ordem): — Pediu que se pozesse em discussão o parecer sobre o orçamento do ultramar. Toda a camara sabe a importancia d'este parecer, por isso julga que se não opporá á sua immediata discussão.

O sr. Presidente: — Eu devo declarar ao illustre ministro que o parecer n.º 417, que agora ía entrar em discussão, é o que trata dos mandados de casamento em Goa; depois segue-se o da receita e despeza das provincias ultramarinas, que é o que V. ex.ª pede.

Leu-se na mesa o parecer n.º 417 sobre o projecto de lei n.° 418, que são do teor seguinte:

PARECER N.º 417

Senhores. — As commissões reunidas do ultramar e ecclesiastica foi presente o projecto de lei n.º 418, approvado pela camara dos senhores deputados, e ao qual serviu de base uma proposta do governo.

As vossas commissões, considerando que a carta de lei de 7 de julho de 1862 extinguiu no districto administrativo de Goa os mandados de casamento, cujo producto era applicado para a reedificação da torre da sé;

Considerando que aquella carta de lei se baseava sobre um principio que não era exacto, como se deprehende pelo relatorio que precede a proposta do governo;

Considerando que os mandados de casamento são uma medida de disciplina ecclesiastica anterior á ruina da torre da sé de Goa, porque os emolumentos são divididos, como acontece nas dioceses do reino, pelos empregados ecclesiasticos, como está regulado pela lei de 30 do abril de 1850;

Considerando finalmente que sendo os mandados de casamento onerosos ás partes, não devem ser exigidos fóra dos casos marcados nas constituições diocesanas:

São as commissões de parecer que a proposição de lei devo ser approvada, a fim de subir á sancção regia, e ser convertida em lei do estado.

Sala da commissão, em 2 de junho de 1864. = João da Costa Carvalho = D. Antonio José de Mello e Saldanha = José da Costa Sousa Pinto Basto — Visconde de Soares Franco = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão = José Ferreira Pestana = Marquez de Ficalho.

PROJECTO DE LEI N.° 418

Artigo 1.° E declarada sem effeito a carta de lei de 7 de julho de 1862, que extinguiu os mandados de casamento no districto administrativo de Goa.

Art. 2.° A pratica dos mandados do casamento continuará a subsistir sómente nos casos em que são expressamente exigidos pelas constituições diocesanas do arcebispado de Goa.

§ unico. Esta disposição é extensiva a todas as dioceses do real padroado.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 28 do maio de 1864. = Cesário Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = Miguel Osorio Cobrai, deputado secretario = José de Menezes Toste, deputado secretario.

Senhores.—A carta de lei de 7 de julho de 1862 extinguiu no districto administrativo de Goa os mandados de casamento, cujo producto devia ser applicado para a edificação da torre da sé cathedral. Como era do seu dever o governo cuidou logo em dar execução a esta lei.

Ulteriores e graves informações, de origem e procedencia diversa, vieram mostrar cabalmente que em verdade não existia nem existiu nunca imposto sobre estes mandados com o indicado fim.

São com effeito os referidos mandados disposição de disciplina ecclesiastica, segundo se vê nos mais authenticos documentos, não generica, mas restricta a casos especialíssimos, e datam de tempos muito anteriores a 1745, isto é, trinta e um annos antes que a torre da sé desabasse, o que só teve logar a 25 de julho do 1776. Acresce acharem-se confirmados e auctorisados pela carta de lei de 30 de abril de 1850, tendo o seu producto applicação a mui diversos destinos, e não apparecer nenhuma determinação legal que lhes attribua o supposto fim, base evidente da citada lei de 7 de julho de 1862.

Isto posto, falta manifestamente objecto sobre que a mesma lei recaia, visto não ter sido do seu intuito abolir os mandados de casamento como elles na verdade existem e para o que existem, mas sómente aquelles que se julgava acharem-se no caso positivamente expresso na respectiva disposição, o que bem se deprehende, assim da phrase restrictiva que na dita disposição se emprega, como da limitada area de territorio á qual circunscreve os seus effeitos.

Em taes circumstancias o governo, entendendo que, apesar da impossibilidade demonstrada de execução, não cabe na sua alçada derogar o que uma lei estatuíra, acatando o principio salutar da divisão dos poderes, vem propor-vos a revogação da designada lei de 7 do julho do 1862 por falta de objecto correspondente e de mais base do que uma tradição inexacta.

Como porém se reconheça que essa tradição póde ter-se originado em abusos furtivamente introduzidos como regra, exigindo-se geralmente os mandados de casamento que, só como excepção e em casos especiaes, como dito fica, foram determinados pelas constituições diocesanas, o mesmo governo, de accordo com a competente auctoridade ecclesiastica, vae prover no uso das suas attribuições ao modo efficaz de obstar a que tal excepção usurpe o logar da regra com vexame para os povos.

Consequentemente, senhores, tenho a honra de apresentar á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É declarada sem effeito a carta de lei de 7 de julho de 1862, que extinguiu no districto administrativo de Goa os mandados de casamento, cujo producto era applicado para a reedificação da torre da sé cathedral.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, 27 de fevereiro de 1864. = José da Silva Mendes Leal.

Não havendo quem pedisse a palavra, foi approvado na generalidade, especialidade e a mesma redacção.

Seguiu-se o parecer n.º 418 sobre o projecto de lei n.º 444, que são do teor seguinte:

PARECER N.° 418

Senhores.—Á vossa commissão do ultramar foi presente o projecto de lei n.º 444, approvado na camara dos senhores deputados, o qual tem por fim a apresentação do orçamento das provincias ultramarinas para o anno economico de 1864-1865.

Não póde a commissão deixar de manifestar a maior satisfação por ver cumprido um preceito constitucional, e nutre bem fundadas esperanças de que o governo continuará a empregar todos os meios para que este importantissimo ramo do serviço publico vá melhorando progressivamente, a fim de que dentro de um praso que não deve estar distante seja o orçamento das provincias ultramarinas submettido ao exame do parlamento, na mesma epocha em que costuma se-lo o da metropole, para poder ser discutido com a demora e minucioso exame que demanda assumpto de tanta magnitude e transcendencia: em vista do exposto»

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entende a vossa commissão que deve ser approvado este projecto de lei, a fim do ser convertido em lei do estado.

Sala da commissão, em 8 de junho de 1864. = João da Costa Carvalho = Marquez de Sá da Bandeira — José da Costa Sousa Pinto Basto — D. Antonio José de Mello e Saldanha = José Ferreira Pestana = Visconde de Soares Franco.

PROJECTO DE LEI N.° 444

[VER DIARIO ORIGINAL]

Art. 5.° A despeza de que trata o artigo antecedente será feita pelos meios que produzir a receita decretada para o exercicio de 1864-1865.

Art. 6.° A força effectiva dos corpos militares das provincias ultramarinas não poderá exceder a nove mil homens das diversas armas, alem dos corpos de segunda linha, e a do marinha a duzentas praças.

Art. 7.° O governo, ouvido o conselho ultramarino, poderá abrir creditos supplementares para pagamento de qualquer despeza legalmente auctorisada, ou para preencher a insufficiencia das quantias determinadas para cada capitulo da despeza, ficando igualmente auctorisado a levantar os fundos necessarios para esse effeito ou para supprir a differença entre a receita cobrada no anno economico de 1864-1865 e a despeza auctorisada para o mesmo anno por esta lei.

Art. 8.° Os creditos supplementares de que trata o artigo antecedente serão abertos por decretos, ouvidos previamente o conselho ultramarino e o conselho de ministros.

Estes decretos serão publicados na folha official, e d'elles dará o governo conta ás côrtes na primeira sessão.

Art. 9.° O governo remettêra ao conselho ultramarino copias authenticas dos decretos pelos quaes abrir creditos supplementares, para por elles regular a fiscalisação que lhe incumbe.

Art. 10.° As despezas com os navios da armada pagas no ultramar, e que não forem das descriptas nos orçamentos das mesmas provincias, e bem assim as novas construcções para a mesma armada, serão pagas pelas verbas votadas na lei das despezas para o ministerio da marinha, e as que forem feitas pelo estado para o serviço e no interesse immediato das mesmas provincias, serão pagas pelos seus respectivos cofres.

Art. 11.° O governo não poderá transferir para qualquer outra despeza as sommas votadas para cada um dos capitulos do orçamento de cada provincia ultramarina.

§ unico. Exceptua-se a transferencia das sommas votadas para empregos que não estiverem providos, a qual o governo poderá effectuar para desenvolvimento das obras publicas e da instrucção publica das mesmas provincias em que se derem as vacaturas, sem prejuizo dos outros pagamentos legalmente auctorisados, devendo o governo dar conta ás côrtes do uso que fizer d'esta auctorisação.

CAPITULO III

Disposições geraes

Art. 12.° Os orçamentos das provincias ultramarinas serão acompanhados da relação nominal dos pensionistas do estado de qualquer classe ou designação, com indicação da importancia de cada pensão, das leis geraes ou especiaes, e dos decretos ou outras peças officiaes que as tiverem concedido ou auctorisado.

Art. 13.° As receitas e despezas dos orçamentos das provincias ultramarinas serão classificadas em ordinarias e extraordinarias, como se acha estabelecido para o orçamento do reino e ilhas adjacentes.

Art. 14.° O governo e as auctoridades a quem competir a execução do orçamento ficam responsaveis por qualquer falta que houver no cumprimento d'esta lei, na parte que lhes competir.

Art. 15.° Os artigos 10.°, 11.°, 12.°, 13.° e 14.° d'esta lei são considerados de execução permanente.

Art. 16.° Fica revogada toda a legislação em contrario. Palacio das côrtes, em 4 de junho de 1864.= Cesário

Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = Miguel Osorio Cabral, deputado secretario = Antonio Cai-los da Maia, deputado vice-secretario.

O sr. Conde d'Avila: — Sr. presidente, eu fazia tenção de expor algumas considerações sobre o orçamento do ultramar, que está em discussão; mas como estas considerações não dariam em resultado senão approvar o mesmo orçamento, abstenho-me de as fazer agora, parece-me mesmo, que a camara não está muito disposta a ouvi-las. Temos objectos importantes a tratar, e apenas tres dias de sessão para os resolver. Entretanto direi sempre duas palavras sobre este importante assumpto.

Começo por louvar ao sr. ministro da marinha pela insistência de s. ex.ª em fazer votar todos os annos este orçamento. Estou persuadido de que se hão de vencer assim muitas difficuldades, que se não venceriam se o orçamento das provincias ultramarinas não tivesse obtido a approvação do corpo legislativo. Noto tambem comprazer, que o rendimento d'aquellas vastas possessões melhora consideravelmente: é verdade que a despeza tem augmentado tambem; mas isto o que prova é que o serviço publico não estava organisado ali como devia estar, e vae melhorando tambem todos os dias. Já em outra occasião fiz algumas observações a este respeito e portanto não as repetirei agora.

Aproveito este ensejo para dizer ao nobre ministro que ouvi com muita attenção as explicações que s. ex.ª deu na penultima sessão, com relação á fragata que s. ex.ª mandou construir. Oxalá que a experiencia venha dar rasão a s. ex.ª, e destruir completamente todas as objecções que se têem levantado contra esta construcção. Vejo com muito prazer o incremento que tem tido a nossa marinha de guerra; incremento que se deve em grande parte a s. ex.ª, e para o qual o meu honrado collega, o sr. marquez de Sá, deu tambem um grande contingente quando dirigia aquella pasta (apoiados); e eu, como ministro da fazenda, tive a satisfação de ter contribuido igualmente pela minha parte para auxiliar n'este sentido o meu nobre collega, pondo á disposição de s. ex.ª os meios necessarios para se poder conseguir aquelle fim. Com as vastas possessões que ainda temos na Africa, na Asia e na Oceania, não podemos deixar de ter uma grande marinha de guerra, e eu estou certo que todas as despezas para a obter hão de ser largamente compensadas pelos grandes auxilios que ainda havemos de receber das mesmas possessões, uma vez que se lhes dê o desenvolvimento de que ellas carecem. Acredito tambem que ainda poderemos representar como potencia colonial um bellissimo papel, digno do nome portuguez, e que não só alimente, mas até robusteça muito a grande consideração que lá por fóra ainda temos (apoiados), que é muito maior do que nós mesmos julgamos (apoiados). Eu tenho pois toda a esperança de que a nossa posição e influencia nos negocios geraes, hão de melhorar ainda consideravelmente, graças aos grandes recursos que poderemos tirar das importantes provincias que ainda possuimos no ultramar.

Tratando d'este assumpto não posso esquecer a questão do padroado do oriente, sobre a qual eu tinha annunciado uma interpellação ao nobre ministro. Estimaria muito que s. ex.ª conviesse em que eu tratasse agora essa questão.

O sr. Ministro da Marinha: — Apoiado.

O Orador: — O que poderei fazer é resumir-me, cingir-me o mais possivel ao ponto sujeito.

Sr. presidente, todos sabem, que pelo breve multa praeclare, foi suspenso o direito da corôa portugueza ao padroado do oriente, o todos sabemos tambem que, depois de muitas tentativas e complicadas negociações, se assignou no dia 21 do fevereiro de 1857 uma concordata com a santa sé, por virtude da qual foi reconhecido e continuado o exercicio do padroado da corôa portugueza; quanto á índia, nas dioceses de Goa, Cranganor, Meliapor, Cochim e Malaca; e quanto á China, na diocese de Macau. N'essa concordata se estabelecia que se procederia, á circumscripção das dioceses, que se erigiria uma diocese suffraganea no arcebispado de Goa, e logo que estivesse terminada a circumscripção das dioceses; que devia ser proposta por dois commissarios, um nomeado pela santa sé, e outro nomeado pelo governo portuguez, e dotadas com os meios convenientes as respectivas sés, a corôa portugueza usaria do direito de apresentação para os mesmos bispados, restabelecendo-se sobre elles logo que fossem confirmados bispos, a auctoridade metropolitica do arcebispo de Goa.

Quando essa concordata teve de ser apresentada ao corpo legislativo, eu tinha a honra de ser ministro juntamente com o nobre presidente do conselho e o sr. marquez de Sá da Bandeira; affigurou-se-nos que havia na concordata algumas lacunas, sem o preenchimento das quaes seria muito difficil, para não dizer, impossivel, que o corpo legislativo auctorisasse o governo a ratifica-la. Entre essas lacunas a principal era a suspensão da auctoridade metropolitica do arcebispo de Goa, porque estando as dioceses suffraganeas regidas por auctoridades ecclesiasticas, nomeadas ou pelo ultimo arcebispo, ou pelo cabido sede vacante, não tendo o arcebispo de Goa a faculdade necessaria para prover ao regimen d'essas dioceses, ellas caíam naturalmente no poder dos vigários apostolicos á medida que fallecessem aquellas auctoridades, e a nossa situação ficaria assim ainda mais complicada do que estava antes da concordata.

Entendemos pois dever propor ao corpo legislativo, que a ratificação ficasse dependente de algumas explicações da santa sé, e designadamente quanto á concessão ao arcebispo de Goa, de uma delegação apostolica extraordinaria, delegação que passaria ao cabido sede vacante, pela qual se poderia prover ao regimen das referidas dioceses, emquanto não estivesse ultimada a circumscripção. As outras declarações referiam-se aos meios convenientes para a dotação das sés dos bispados suffraganeos á definição da índia ingleza, sujeita ao padroado e aos bens dos bispados de Nankim e Pckin, a fim de que estes bens continuassem sem questão a pertencer á corôa portugueza para os continuar tambem a applicar em beneficio das igrejas do padroado.

Mas a primeira declaração era inquestionavelmente a principal, e é a respeito d'ella que eu limitarei as observações que tenho ainda a fazer.

A santa sé conveio com effeito na concessão da delegação apostolica, não nos termos em que tinha sido pedida para o arcebispo do Goa, sendo transmissível ao cabido sede vacante, e durando até que estivesse ultimada a circumscripção das dioceses, mas na concessão de uma delegação extraordinaria ao arcebispo, por seis annos, a qual nos seus impedimentos seria exercida por um ecclesiastico escolhido pela santa sé, sobre uma lista proposta pelo governo portuguez. E quando se verificasse esta ultima hypothese o governo portuguez teria o direito de propor outra lista, na qual a santa sé escolheria ainda um ecclesiastico que podesse exercer tambem a delegação nos impedimentos d'aquelle, para que a mesma delegação não caducasse durante os seis annos. E dado o caso que este praso não tivesse sido sufficiente para terminar a circumscripção de todas as dioceses suffraganeas, então promettia a santa sé que se daria uma nova delegação especial ao arcebispo de Goa, em relação ás dioceses, cuja não circumscripção não estivesse ainda feita.

Com estas declarações, todas as difficuldades relativas ao ponto de que me occupo, estavam vencidas. Foi apresentado para arcebispo um respeitavel prelado, que tem desempenhado de uma maneira muito digna as elevadas funcções que lhe foram commettidas. Ao meu ex-collega, o sr. Carlos Bento, cabe a honra de ter proposto a Sua Magestade esta nomeação, e ao seu antecessor de ter proposto aquelle virtuoso ecclesiastico para bispo de Cabo Verde, de que foi transferido para arcebispo de Goa; com a chegada do venerando prelado a esta diocese começaram os trabalhos da circumscripção, tendo nós tido a fortuna de que fosse nomeado pela santa sé para seu commissario tambem um virtuoso prelado, o sr. arcebispo de Carthago, que manifestou na verdade o maior zêlo e a melhor vontade pelo andamento d'estes negocios, estando sempre no melhor accordo com o nosso commissario, o sr. conselheiro Rivara.

Quando porém os trabalhos da circumscripção estavam tão adiantados, que se suppunha que no fim do anno em que tinham começado, isto é, o anno de 1863 estariam terminados, falleceu infelizmente o sr. arcebispo de Carthago, o que foi uma verdadeira calamidade para nós, e não me consta que até agora tenha sido nomeado pela santa sé novo commissario. Eu sei o que disse a este respeito, na outra casa do parlamento, o illustre ministro da marinha, por isso não cansarei a s. ex.ª, fazendo-lho aqui a mesma pergunta que lhe foi feita n'aquella casa: observarei só que se não póde progredir na circumscripção sem que a santa sé nomeie outro commissario, o que é indispensavel que s. ex.ª não cesse de instar para que se faça esta nomeação.

Ha porém outro ponto que eu reputo mais grave ainda, se é possivel, o vem a ser o que diz respeito á nomeação do ecclesiastico, em quem tem de recaír a delegação nos impedimentos do sr. arcebispo de Goa, isto é, quando por qualquer circumstancia, este digno prelado fique inhibido de exercer as elevadas funcções que lhe estão conferidas. Basta isto para fazer ver que é de toda a urgencia que essa nomeação, para a qual concorrera o governo portuguez e a santa sé, se faça quanto antes, e eu peço portanto ao nobre ministro que tenha a "bondade de dar algumas explicações a este respeito, designadamente sobre se já está feita a proposta do governo, portuguez para aquella nomeação. Não sei se haverá imprudencia da minha parte em me aventurar muito n'estas observações, mas eu tenho o costume de dizer no parlamento quando se tratam questões governamentaes, o que eu faria estando no logar dos srs. ministros, no que dou uma prova da minha sinceridade e dos meus desejos de concorrer sempre, quanto em mim couber, para o bom andamento dos negocios publicos, que é na minha opinião o nosso primeiro dever, qualquer que seja a nossa posição em relação á politica dos srs. ministros (muitos apoiados).

Acredito que o sr. ministro ha de ter muita difficuldade na composição da lista dos ecclesiasticos em quem deva recaír a delegação apostolica; pois alem da garantia das qualidades dos propostos, o governo não póde fazer a proposta sem esta condição, para que a santa sé não possa ter nem a menor apparencia do pretexto para não fazer a escolha n'essa lista; ha a necessidade de que os propostos aceitem a delegação, quando nelles possa recaír por virtude da escolha da santa sé, e parece-me que será muito difficil encontrar ecclesiasticos que se prestem a ir ao oriente exercer essa delegação para voltarem para Portugal quando ella termine.

Occorre-me porém uma idéa, que talvez vencesse esta difficuldade, e esta idéa seria, que a lista fosse composta com os nomes dos ecclesiasticos que o governo tem intenção de propor para bispos das dioceses suffraganeas. Affigura-se-me que por este modo o governo se livraria dos embaraços com que tem de lutar necessariamente a este respeito, e não tenho duvida em submetter esta idéa a s. ex.ª, para que o nobre ministro a tome na consideração que ella lhe merecer.

O meu fim não é porém indicar a s. ex.ª como deve compor a lista, é perguntar-lhe se effectivamente esta proposta já está feita, e no caso de não estar, insistir muito e muito com s. ex.ª para que a faça quanto antes.

S. ex.ª não carece de que eu lhe lembre que ha já dois annos que o sr. arcebispo exerce a delegação apostolica; por consequencia que faltam quatro annos para se completarem os seis. E verdade que o governo tem um grande argumento a fazer á santa sé, o é que a circumscripção está suspensa pela morto do sr. arcebispo de Carthago, e por

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consequencia que não nos sendo devida essa falta, a delegação em vigor já não póde durar quatro annos, deve durar seis annos, descontados os mezes ou annos em que a circumscripção ficou suspensa pela falta do commissario pontifício.

Mas ninguem póde prever se ámanhã o sr. arcebispo de Goa, por qualquer circumstancia, que Deus não permitta, não estará impedido de exercer essas funcções; por consequencia é urgente que esteja feita a escolha do ecclesiastico em que ha de recaír o seu exercicio, e para que essa escolha seja devidamente feita, é necessario que o governo tenha feito uma proposta conveniente e com a certeza de que os propostos hão de aceitar a alta dignidade para que são indicados, quando essa dignidade venha a recaír nelles.

Em relação ao orçamento do ultramar, torno a repetir, não tenho senão louvores a dar ao sr. ministro, por insistir todos os annos em que este orçamento seja votado pelo parlamento. É esta mais uma prova do modo como s. ex.ª dirije o ministerio a seu cargo, e por consequencia quando pedi a palavra não foi para criar difficuldades ao sr. ministro, pois terei sempre muito gosto em concorrer com o meu voto para auxiliar a s. ex.ª nas medidas uteis que tem apresentado e espero que continuará a apresentar.

O sr. Ministro da Marinha: — Expoz achar-se toda a camara felizmente compenetrada dà utilidade que ha em discutir os orçamentos do ultramar, e especialmente em fixar annualmente a respectiva lei, e portanto desnecessario seria insistir na enumeração d'estas vantagens.

Não tem portanto, elle orador, senão muito para agradecer ao digno par a benevolencia especial das suas palavras, e são ellas um estimulo para se empenhar de todas as formas em merecer a confiança do parlamento e corresponder á opinião de um homem da categoria, da importancia e elevação de idéas de s. ex.ª, o que é já por si suffragio bastante para que elle, orador, se possa inspirar da mais completa gratidão.

Restringir-se-ha pois ás questões mais particularmente tratadas por s. ex.ª, a circumscripção das dioceses do padroado portuguez no oriente, a delegação do vigario apostólico.

Quanto á primeira questão dirá que, em 7 de março de 1863 começaram os trabalhos. Pouco tempo depois, infelizmente, falleceu o digno commissario pontifício. Dizia, infelizmente, porque a sua falta foi uma grande perda, não só pelas suas qualidades como pela sua illustração e benevolencia que sempre nos manifestou...

O sr. Conde d'Avila: —Apoiado.

O Orador: — São por certo merecidos os louvores prestados ao digno prelado que hoje rege a christandade do Oriente; e elle, orador, folga de juntar a sua voz á voz auctorisadissima do digno par, porque reconhece o talento, o tacto (O sr. Conde d'Avila: — Apoiado.), as virtudes e a perfeita dedicação com que s. ex.ª rev.ma se tem portado nos negocios de que está encarregado, prestando assim grandes serviços (apoiados). Esses serviços são da primeira importancia (muitos apoiados), o paiz já os começa a conhecer, e presume que mais tarde, ainda mais terá de que se congratular, porque, repete, são serviços da primeira importancia (apoiados repetidos). Entre outros ha o da visita que s. ex.ª fez, a expensas suas, ás dioceses, e da qual se tem colhido o maior proveito para o prestigio do padroado e interesse d'aquellas possessões (apoiados).

Falleceu porem, como disse, o digno commissario pontifício, pouco tempo depois do começados os trabalhos da circumscripção, deixando-os todavia bastante adiantados, pois se reconhece já a necessidade do augmentar o numero das dioceses.

Tendo recolhido o commissario portuguez, em 15 de julho renovaram-se as competentes instancias para que fosse nomeado um commissario pontifício.

Em 18 do agosto repetiram-se as mesmas instancias; e em 28 de novembro, o embaixador do Portugal em Roma communicou que brevemente se procederia á nomeação de novo commissario.

Taes eram os factos o as datas relativamente á primeira questão, o que para uma pessoa, como s. ex.ª, tão experimentada e tão competente para tratar d'estes negocios, é prova sufficiente de que o governo pela sua parte não tem descurado este assumpto.

A segunda questão é tambem importantissima. É evidente que ha uma grande difficuldade a superar, mas tambem é certo que o intervallo que houve póde ser descontado; e elle orador julga mesmo que isto está previsto, e senão o está expressamente, deve estar pela força da boa rasão (apoiados).

Quanto á delegação, o governo entendeu que, em presença dos actos do prelado do oriente, a sua posição, as suas virtudes, a sua pessoa, tudo isto, se devia ter em muita attenção; queria dizer, que pelos antecedentes de s. ex.ª ninguem era mais competente para indicar o ecclesiastico que parecesse mais digno. Para este effeito expediu-se uma portaria em 3 de fevereiro d'este anno, e em officio de 2 ou 3 de abril s. ex.ª respondeu propondo cinco ecclesiasticos. Está n'este estado a questão, e o governo empenha-se em a resolver o mais promptamente possivel.

A idéa apresentada pelo digno par, o sr. conde d'Avila, é summamente apreciável, como são todas as suas idéas, e o governo não póde deixar de a tomar na mais seria consideração, sobretudo quando esse ecclesiastico está exercendo as mais altas dignidades.

Se estas difficuldades forem resolvidas, o governo tratará, pela sua parte, de maneira que se consiga nomear um ecclesiastico illustrado para bem poder desempenhar aquelle importantissimo serviço.

Dando estas explicações julga ter satisfeito o digno par, e conclue agradecendo novamente as palavras benevolas de s. ex.ª, que são tanto mais de agradecer por partirem de um homem tão eminente para outro que só tem boa vontade.

Emquanto á administração do ultramar, é da maior importancia que os homens notaveis do paiz lancem para ella os olhos, concorrendo assim para o seu desenvolvimento; porque effectivamente é da marinha e das colonias que o paiz tem a esperar o seu engrandecimento futuro.

O nobre marquez de Sá, principiando a regeneração da nossa marinha de guerra, deu um grandíssimo impulso a todos os assumptos relativos ás possessões ultramarinas, e a elle orador só cabe, com o seu fraco préstimo, continuar os trabalhos encetados, porque, como o sr. conde d'Avila e muitos homens illustres d'esta terra, acredita que só dellas poderão resultar os melhoramentos e a prosperidade d'este paiz.

O sr. Presidente: — Tem a palavra sobre a ordem o sr. Vellez Caldeira.

O sr. Vellez Caldeira: — Mando para a mesa um parecer da commissão de legislação.

Mandou-se imprimir.

O sr. Ferrer: — Sr. presidente, ouvi com toda a attenção o que acabou de dizer o digno par o sr. conde d'Avila, e a resposta que deu o sr. ministro da marinha. V. ex.ª sabe e sabe a camara, que eu tomei uma parto tão activa quanto cabia em minhas forças, nas questões por occasião da concordata, ácerca do nosso padroado do oriente. Segui esta questão por todo o tempo que foi do dominio do parlamento, tanto nas sessões publicas como nas secretas, fiz por muitas vezes a prophecia de um fim desastroso para o nosso padroado, se se approvasse a concordata. Desgraçadamente ainda hoje estou n'essa idéa, mas estimarei vir a ser falso propheta, porque na verdade desejava muito que se conservasse o nosso padroado, pois que estou convencido de que sem elle o nosso dominio no oriente ha de vir a perder-se.

Ha dois annos que me tenho abstido de tratar d'esta materia, e aproveitei esta occasião para fazer uma declaração pela qual a camara e os povos do oriente saibam qual é a rasão d'este meu procedimento.

Principio por declarar, que confio muito na illustração e actividade do sr. ministro da marinha, e na habilidade diplomatica do sr. presidente do conselho, e por isso Deus queira que possam encaminhar a nau de modo que chegue a porto de salvamento.

Não quero embaraçar as negociações e arranjos com a cúria romana para a execução da famosa concordata. É ella uma lei entre as altas partes contratantes. Importa que ambas as partes a cumpram lealmente e de boa fé. Faço votos para que assim aconteça, e que salvemos e conservemos em paz os restos do nosso padroado que nos deixa a concordata. Quando soar a hora do desengano, que será brevemente, não quero que os defensores da concordata tenham desculpa. O digno par, o sr. conde d'Avila, faz bem em instar pela execução d'ella, porque sobre os seus hombros peza uma terrivel responsabilidade.

Tenho-me explicado.

O sr. Conde d'Avila: — Sr. presidente, serei breve.

Eu peço desculpa ao sr. Ferrer de não ter incluido o nome de s. ex.ª no dos membros do gabinete, que fazem parte d'esta camara, e apresentaram a concordata ao parlamento; mas o motivo foi o não ser s. ex.ª já ministro quando essa apresentação teve logar. Todo o paiz conhece as idéas e os receios do digno par a respeito da concordata, porém a verdade é, que até agora ainda não temos motivos para dizer que as prophecias do digno par se realisaram. A santa sé nomeou para seu commissario um prelado virtuoso e conciliador, cuja morte, como disso já, foi uma verdadeira calamidade para nós. A santa sé concedeu ao sr. arcebispo do Goa a delegação apostolica nos termos em que se havia concordado; não temos pois rasão de queixa até agora, e ou espero em Deus que o mesmo acontecerá d'aqui em diante, e que pela nossa parte nós não deixaremos de empregar tambem todos os meios para que as obrigações que nos impoz a concordata, sejam cumpridas.

Também não se deve perder do vista, que na occasião em que esse tratado de 21 de fevereiro de 1857 foi assignado, e mais tardo ratificado, a nossa situação em relação ao padroado era muito peior do que é hoje, e que se esse tratado não tivesse sido celebrado, teria peiorado ainda mais, e o padroado acabaria por desapparecer. Não teriamos no oriente nem um prelado, e só teriamos a nosso favor as sympathias dos christãos, as quaes se enfraqueceriam comtudo pouco a pouco se á frente d'aquellas christandades não tivessemos um prelado que provesse ás suas necessidades espirituaes e obstasse aos progressos que faziam todos os dias os bispos da propaganda. O digno par sabe perfeitamente que n'esta questão eu estou muito mais perto do que longe de s. ex.ª; mas a verdade é, que a situação em que estavamos em 1857 é que era impossivel, e que esta tem melhorado muito comparativamente depois da concordata, ou para melhor dizer, depois da chegada do sr. arcebispo de Goa. Isto deve-nos ser muito agradavel, e estou convencido do que o digno par é o primeiro que a aprecia, pelo valor que s. ex.ª dá ao nosso padroado do oriente, como acaba de dizer.

Estou satisfeito com a resposta do sr. ministro da marinha em relação á nomeação do commissario pontifício, porque vejo que o governo tem feito da sua parte quanto é possivel para que esta nomeação tenha logar quanto antes; mas permitta-me o nobre ministro que lhe lembre, que estão muito adiantados os trabalhos da circumscripção das dioceses suffraganeas, é possivel que estivesse já terminada, quando falleceu o sr. arcebispo de Carthago, a circumscripção da diocese suffraganea do arcebispado de Goa, até porque os trabalhos da circumscripção começassem por esta

diocese. Se isto assim fosse poderia o governo apresentar já o bispo d'aquella diocese, o que facilitaria tambem a formação da lista dos ecclesiasticos em que deve recaír a escolha da santa sé para o exercicio da delegação apostolica nos impedimentos do sr. arcebispo de Goa. -

Póde-se dizer que a circumscripção do bispado de Malaca tambem está feita na concordata, o que nos habilitaria tambem, havendo accordo com a santa sé, a apresentar desde já o respectivo bispo.

Sr. presidente, eu peço desculpa de me alargar um pouco mais, mas parece-me que nenhum assumpto poderia agora merecer mais a attenção da camara do que este. V. ex.ª sabe como membro de um alto tribunal, e creio que o sabe tambem o illustre ministro, e sabe-o por certo o sr. presidente do conselho, que eu fui sempre de opinião que deixássemos os trabalhos da circumscripção á santa sé. Com isto davamos-lhe uma prova da nossa boa fé; e se d'aqui resultasse termos de prover oito ou dez dioceses, em logar das cinco que ha na índia, não nos devia assustar essa despeza, que havia de ser largamente compensada pelas vantagens que resultariam da creação d'essas novas dioceses.

Eu estimo muito que o nobre ministro seja d'esta mesma opinião, e n'este caso o que ha a fazer da nossa parte é facilitar por todos os modos a conclusão dos trabalhos da circumscripção, não lhes pondo obstaculo algum, e estou certo que s. ex.ª terá expedido as suas instrucções n'este sentido ao nosso commissario. E logo que se ultimar e approvar a circumscripção de qualquer diocese proponha o governo o respectivo bispo. O governo está auctorisado para o fazer pelo artigo 15.° da concordata. Não se entenda que a apresentação dos bispos das dioceses suffraganeas depende de estar ultimada a circumscripção de todas essas dioceses. Não é assim. A concordata diz o contrario. Di-lo a concessão da delegação por seis annos, e a sua continuação passados esses seis annos, mas só em relação ás dioceses cuja circumscripção não estiver ultimada, porque em relação ás outras suppõem-se que já estão nomeados e confirmados os respectivos bispos, o restabelecida a auctoridade metropolitica do arcebispo de Goa.

Parece-me que se já estivesse feita a apresentação e a confirmação de um só dos bispos d'estas dioceses, a questão da delegação apostolica estaria já resolvida. Perdoe o nobre ministro se vou mais longe do que pretendia; mas são idéas que eu lanço na discussão, e de que s. ex.ª fará o uso que quizer.

Emquanto ao que s. ex.ª disse quanto ao prelado de Moçambique, acho que este pensamento está de accordo com as idéas que exprimi, assim não houvesse as difficuldades a que o nobre ministro se referiu, e que podem demorar a solução d'este negocio; e por isso, se s. ex.ª vir que não póde remover essas difficuldades tão depressa quanto urge para ficar habilitado para nomear para aquella prelasiaum prelado, deve recorrer a outros meios para que se não demore a formação da lista, que o governo tem de apresentar á santa sé, para que esta faça a escolha do ecclesiastico, que tem de substituir o arcebispo quanto ao exercicio da delegação apostolica. E sobre o modo de formar essa lista tenho dito francamente a minha opinião.

Nada mais direi. Todos nós interessamos em que a concordata seja uma realidade, e se não verifiquem as prophecias do digno par, o sr. Ferrer, que estou certo que s. ex.ª é o primeiro que não quer que se realisem (O sr. Ferrer: — Apoiado); o que temos pois a fazer é insistir com o nobre ministro para que empregue todos os seus esforços, segundo a declaração que fez, a fim de que este negocio chegue quanto antes á sua conclusão (apoiados).

O sr. Ministro da Marinha: — Fez notar o ser geralmente conhecido o interesse com que o digno par o sr. Ferrer tem sempre tratado as questões do padroado do oriente (apoiados.) Para um homem da importancia de s. ex.ª, assim como para todos os homens importantes d'este paiz, a questão do padroado do oriente é a que reclama a maior attenção, pela força que nós temos n'aquella região, e quando elle, orador, diz força, refere-se á força moral, porque nenhuma força deixa de produzir os melhores resultados (apoiados.)

Não discutirá as opiniões do digno par n'esta occasião, porque ninguem póde prever as eventualidades que podem provir; mas pelo que respeita ao poder, tem os successos mostrado que os negocios do padroado têem melhorado, e por ora apresentam um aspecto lisongeiro. Elle, orador, cooperou tambem, com as suas pequenas forças, para a concordata, quando era então presidente da commissão diplomatica da outra casa do parlamento, e igualmente tomou uma parte na discussão d'este objecto (apoiados.) Portanto as suas opiniões a tal respeito são bem conhecidas, e tem tido muitas occasiões de as expender na tribuna e na imprensa (apoiados.) Também elle, orador, com o sr. conde d'A vila, não está muito distante das opiniões do sr. Ferrer, e presume que todos os homens, que se têem saturado das mesmas doutrinas sobre este assumpto, não estão igualmente distantes das opiniões de s. ex.ª Apenas porém elle, orador, teve a honra do entrar no ministerio recebeu logo reclamações e instancias taes, que se não estivesse convencido da utilidade e conveniencia que as circumstancias tinham determinado para se effectuar a concordata, estas reclamações e instancias que recebeu eram de tal ordem que se podia dizer que todas as christandades do oriente estavam do joelhos diante do governo pedindo na maxima angustia o remedio amargo para as cousas do oriente; e este maximo remedio era mandar o governo para ali um prelado que correspondesse ás esperanças d'aquellas christandades.

Não sabe se a concordata foi mais ou menos vantajosa, mas o que sabe é que para o estado em que se achavam as christandades do oriente não se podia fazer outra cousa me-

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lhor (apoiados), e julga que o padroado portuguez já estaria perdido para sempre se tal concordata se não fizesse (apoiados). Qual é pois o meio de remediar este estado de cousas? E a observancia estricta da concordata, por parte do governo portuguez, para que termine quanto antes tal estado de cousas.. É isto que já tem feito o governo, e espera tambem que assim se mostre que quaesquer apprehensões que haja a este respeito são todas infundadas.

A diplomacia n'este caso, a melhor diplomacia, a unica diplomacia, é provar o governo que toma a peito este negocio para melhorar o estado das cousas ecclesiasticas no oriente (apoiados). Deste modo, por mais ardilosas que sejam as observações a respeito do padroado portuguez no oriente, todos hão querer pelo menos a organisação das cousas ecclesiasticas no oriente, porque logo que esteja concluido este negocio cessam as difficuldades e acaba o triste estado em que se acham aquellas christandades (apoiados). Este, portanto, deve ser o mais ardente desejo do governo para pôr termo aquelle mal; e n'este ponto affirma que já o illustre prelado, que preside ao destino d'aquella christandade, tem cooperado muito da sua parto para que se estabelecesse o cabido e restabelecesse o seminario da sua diocese, a portanto tem melhorado muito as cousas ecclesiasticas. È assim, pelo menos, que entende que o padroado portuguez no oriente nos poderá ser util e vantajoso (apoiados).

O governo não se assusta com o excesso de uma despeza das mais productivas que póde fazer (apoiados), porque o augmento das dioceses dá os melhores resultados; portanto entende o governo que ha utilidade em augmentar o numero das dioceses, pois dá logar a muitas difficuldades tão extensos territórios que estejam incluidos n'uma só circumscripção, e tanto assim entendeu o governo que mandou immediatamente colher as informações precisas para o augmento das dioceses, augmento de que a santa só está igualmente convencida ser indispensavel; mas este augmento não se póde fazer sem que augmento a despeza.

Notou as observações feitas pelo digno par, e tenha s. ex.ª a certeza de que hão de ser tomadas na mais profunda consideração.

O sr. Marquez de Sá: — A hora está muito adiantada, por isso poucas reflexões terei a fazer.

Sr. presidente, é sempre util que nas camaras se tratem dos negocios ultramarinos, não só no intuito de melhorar as nossas colonias, mas tambem para chamar a attenção do paiz para essas provincias e para os recursos que dellas se podem tirar, tanto em beneficio da metropole como d'essas mesmas provincias.

Pedi a palavra especialmente para chamar a attenção do sr. ministro da marinha sobre o trafico da escravatura, o qual, apesar da nossa legislação e das convenções com a Gran-Bretanha, tem continuado, mais ou menos, na costa de Moçambique.

A exploração de negros com o nome de trabalhadores livres, não foi outra cousa senão o trafico da escravatura. Sem a abolição effectiva do trafico as colonias de Africa não poderão prosperar, porque os capitães vão empregar-se n'este commercio que produz enormes lucros. Emquanto houver o mercado de Cuba ha, de haver o trafico, e hão do os negreiros procurar obter os escravos por todos os meios ao seu alcance.

Na Africa Occidental os principaes mercados existem actualmente na Costa da Mina, e no Rio Zaire. Na Costa oriental tem continuado o trafico, mas ahi é mais difficultosa a sua extincção, porque não é só para as Antilhas que se remettem escravos, mas tambem para a Arábia, Pérsia o outros paizes da Asia. Esse trafico e tambem feito pelos árabes, nos territórios do Sultão de Zanzibar. Uma das cousas essenciaes para que na Africa portugueza se consiga a abolição do trafico da escravatura, e o desenvolvimento da agricultura o das artes, é a fundação de colonias de gente europea, é o estabelecimento do focos de civilisação no interior do paiz, como já começámos a fazer em Mossamedes, como se tem feito n'outras partes. Assim, por exemplo, na terra do Natal onde ha um quarto de seculo, os inglezes não tinham estabelecimento algum, e hoje ha uma bella colonia. N'aquelle paiz haviam feito assento os colonos hollandezes ou Boers (fazendeiros ou lavradores) do Cabo da Boa Esperança, que emigraram em 1836 e 1837, por não quererem viver debaixo do dominio britannico. Expulsos os Boers d'ali pelas tropas inglezas, que os perseguiram, elles internaram-se, e a final tornaram-se independentes, constituindo uma republica. Os inglezes fizeram então um forte no Porto Natal, e depois fundaram uma colonia com alguns milhares do familias mandadas da Europa. Esta colonia está hoje muito florescente, produz muito assucar, café e outros generos; e na agricultura são empregados os negros livres indígenas das tribus dos Zulus, chamados Vatuas, em Lourenço Marques. Elles trabalham sob a direcção dos homens brancos, recebendo os seus salarios. Ha temporadas que não trabalham, por isso que se retiram para o interior; outros porém os substituem.

As administrações de que eu fiz parto empenharam-se durante alguns annos para que se fizesse uma lei que, por meios indirectos, derivasse uma parte da emigração que se dirige ao Brazil para as nossas colonias; mas este desideratum não se poude conseguir, pois que tendo o governo apresentado na camara dos senhores deputados durante duas ou tres sessões legislativas um projecto de lei sobre este as-, sumpto, nunca elle teve solução apesar de ter sido discutido e emendado. Chamo a attenção do sr. ministro da marinha sobre este ponto, e chamo-a tambem sobre a questão do trafico da escravatura.

O sr. Visconde de Soares Franco: — Peço que se prorogue a sessão até se votar este projecto.

Aproveito esta occasião para mandar para a mesa um parecer da commissão de marinha o ultramar.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam a proposta do sr. visconde de Soares Franco para que se prorogue a sessão até se votar este projecto tenham a bondade de se levantar. — Foi approvada.

O sr. Ministro da Marinha: — Depois da auctoridade do digno par, o sr. marquez de Sá, chamar a attenção do governo sobre dois pontos de tanta importancia como são a escravatura e a colonisação, a camara comprehenderia ser obrigação do governo dar algumas explicações, as quaes succintamente exporia em consequencia de estar a hora muito adiantada.

A questão da escravatura tem merecido muito séria attenção do governo, e tão séria attenção que lhe tem grangeado não poucos inimigos. Como disse s. ex.ª, a escravatura disfarça-se debaixo de differentes formas; e uma das mais perigosas é justamente a exportação de negros com o nome de libertos. Ha muita gente que entende que a condição de libertos é como a dos homens livres, mas não é tanto assim. O que se chama liberto é como um meio termo entre o homem livre e'o escravo. Um dos meios para acabar com o trafico é offerecer aos capitães outra ordem de interesses; e para isso é de muita utilidade a fundação de bancos, que tenham por fim auxiliar o desenvolvimento das colonias. Com este intuito já foi fundado o banco ultramarino. Outro meio de tornar effectiva a abolição do trafico da escravatura é espalhar a civilisação.

O governo tem empregado todos os meios para cohibir o trafico da escravatura, mas infelizmente não lhe tem podido obstar como desejava. Ainda ultimamente houve um aprisionamento de um navio com muitos negros. Este serviço foi feito por um navio cruzador na costa occidental, de que resultou muito louvor ao sou commandante. Hoje se ha alguma duvida é só onde não chega o dominio portuguez, sustentado pela força em que se póde apoiar o nosso direito. Mas em geral, posto que com innumeraveis sacrificios, tem-se sustentado esse direito, e elle orador está corto de que sempre ha de ser mantido (apoiados). Na costa oriental é que effectivamente é maior o trafico, nem póde deixar de ser assim, porque são regiões mais vastas e menos defensivas. Ahi, os árabes, occupam-se muito d'esse trafico, effeito da nossa falta de vigilancia, o que prova bem a necessidade de augmentar as forças d'essas estações com os competentes cruzeiros (apoiados), o que redunda muito em proveito do commercio.

Emquanto á colonia de que se falla depende o seu desenvolvimento das condições de salubridade, para que seja mais favoravel aos europeus; mas assim mesmo o concurso do trafico não se póde dizer que é tanto que se abandonem as plantações. È conhecida a grande propensão que ha para o roubo em certos pontos d'aquelle territorio, o tanto assim que nos vemos obrigados muitas vezes a exercer uma fortíssima repressão; e as nossas forças entrando em muitos combates, têem sempre tirado a vantagem. E ainda que não seja costumo vigiar-se muito o que se passa n'aquellas regiões, julga todavia que bastantes serviços ha, merecedores do reconhecimento do paiz; serviços prestados pelas nossas forças, o por homens que se têem distinguido com grande risco de vida, para destruírem todos os obstaculos ao commercio e á civilisação, de maneira que os povos mais proximos ás nossas povoações começam a propender de dia para dia para a civilisação, mostrando-se cada vez mais dispostos a dar-se á cultura de differentes ramos de producção, como por exemplo, á cultura do algodão, que tem augmentado admiravelmente. Ainda ultimamente teve logar uma exportação importante d'esta materia, que serviu de compensar a grande falta d'este genero que em geral tem havido por causa da guerra da America.

A colonisação branca é util, mas util onde é possivel (apoiados). Nos paizes insalubres, quando não seja absolutamente impossivel, é pelo menos muito despendiosa; facto que os colonos são os primeiros a reconhecer. Perdoe a camara o explicar-se com tanta franqueza; porém esta é a exposição da verdade.

Quanto á emigração citará um facto, e é que o governo tem facilitado o transporte aos nossos irmãos que desejam estabelecer-se em qualquer parte; mas pelas informações que elle orador tem obtido, são poucos os que fazem fortuna. Continuando porém a florescer a colonia que se apontou, o governo tem dado muito auxilio aos colonos portuguezes do oriente, sobretudo no districto de Moçambique, onde as industrias agricolas se têem desenvolvido muito; e com muita satisfação póde dizer á camara que, segundo participações officiaes recebidas do governador geral de Angola, homem, cuja sisudez, prudencia e circumspecção não são postas em duvida, segundo essas participações, o commercio e agricultura ali offerecem duplicados productos, especialmente o algodão; pois pelos ultimos navios d'ali saídos haviam embarcado 4:000 arrobas d'este genero no valor do 60:000$000 réis proximamente.

E bem que a camara tenha conhecimento d'estes factos para ver o futuro que nos espera.

Quanto á questão dos industriaes, diria que effectivamente do que se necessita é de um regulamento para o ultramar. E no âmago d'esta questão, no fundo d'ella, parece-lhe que se tem de começar por dizer que os primeiros elementos d'este regulamento é preparar a condição do homem que se apresenta em virtude da circumscripção temporaria ou obrigatoria, e que se lhe póde impor certas condições. O que é certo é que por meio d'estas circumscripções e condições, não será o perigo outro senão o que resulta da abolição do trafico da escravatura, como acontece na ilha de S. Julião, derivada pela propria escravidão no estado selvagem. A colonisação branca é indispensavel, como direcção para os trabalhos agricolas, que só os negros podem fazer; mas para que elles tenham amor ao trabalho é preciso que recebam certa educação que ainda não têem. I

Se houvesse tempo seria mais extenso; citaria a opinião de uma homem eminente que ha pouco veiu d'aquellas regiões, ácerca da emancipação dos negros, e sobre as causas que obstam á civilisação d'aquelles paizes, etc...; a hora estava porém muito adiantada e por isso nada mais acrescentaria; concluindo por agradecer á camara a attenção e benevolencia com que o escutou.

O sr. Silva Cabral: — Eu desejava pedir a V. ex.ª que houvesse de dar para a ordem do dia de ámanhã tres projectos que já foram distribuidos, e que se acham sobre a mesa, os quaes são condição essencial para se pôr em execução a lei hypothecaria. Cada um d'elles tem um artigo, e por isso julgo não terão muita discussão (muitos apoiados).

O sr. Marquez de Sá: — Direi ainda duas palavras. Quanto a regulamentar o trabalho dos pretos, é facil faze-lo, pelo que respeita aos escravos, e aos que são libertos; mas quanto aos pretos livres é isso uma questão muito delicada e que offerece grandes difficuldades.

Não faço agora mais observações, porque a hora já deu. Para a proxima sessão legislativa teremos tempo de tratar d'este objecto.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. ministro da malinha.

O sr. Ministro da Marinha: — Declara á camara que na sessão proxima espera apresentar a solução de todo este negocio.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Peço a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: — Tem V. ex.ª a palavra.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Estão pendentes n'esta camara algumas propostas da iniciativa do governo, que se tornam muito urgentes, e portanto pedia a V. ex.ª que tivesse a bondade de as dar para ordem do dia, visto que me consta que já têem parecer.

O sr. Presidente: — Não ha mais ninguem inscripto, e portanto vou pôr o projecto á votação na sua generalidade.

Foi approvado na generalidade, especialidade e mesma redacção.

O sr. Presidente: — A primeira sessão terá logar ámanhã, e a ordem do dia será a discussão dos seguintes pareceres, alem dos que vinham para a ordem do dia de hoje, n.°s 429, 430, 431, 434, 435, 436 e 439.

Está levantada a sessão. 1

Eram cinco horas e um quarto da tarde.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão do dia 15 de junho de 1864

Ex.mos srs. Conde de Castro; Duque de Loulé; Marquezes, de Niza, de Ponte de Lima, de Vianna e de Sá da Bandeira; Condes, das Alcaçovas, de Alva, d'A vila, de Campanhã, de Peniche e da Ponte; Viscondes, de Santo Antonio, de Benagazil, de Condeixa, de Fonte Arcada, de Fornos de Algodres o de Soares Franco; Barão de Foscoa; Mello e Saldanha, Caula Leitão, Custodio Rebello de Carvalho, Sequeira Pinto, Felix Pereira de Magalhães, João da Costa Carvalho, Aguiar, Pestana, Larcher, Braamcamp, Silva Cabral, Pinto Basto, Silva Costa, Passos, José Lourenço da Luz, Baldy, Silva Sanches, Luiz de Castro Guimarães, Vellez Caldeira, Sebastião José de Carvalho e Ferrer.

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