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834 DIARIO DO GOVERNO.

considerações que depois de expôr, passarei a desenvolver, sem comtudo tomar muito tempo á camara, de cuja paciencia não quero abusar.

A l.ª destas considerações é, que me fiz uma lei um dever consciencioso de não votar por imposto algum, em tanto que a grande questão financeira não for decidida de uma maneira satisfatoria para a regularisação methodica das nossas finanças em attencão á despeza ordinaria e extraordinaria do Estado, e a receita necessaria para lhe fazer face, assim como a questão muito mais ponderosa da divida publica.

A 2.ª que no meu conceito é absurdo considerar esta uma lei de meios, pois nada e menos provado, que dado mesmo o caso de ser possivel apparecerem de subito as estradas feitas, houvesse no paiz objectos de producção taes a transportar por ellas, que augmentassem d'uma maneira sensivel a prosperidade nacional.

A 3.ª que não podia encarar este projecto, d'outra maneira senão como um voto de confiança dado ao geverno, sobre um projecto ainda mal estudado, e de cuja execução ainda não parecia que elle tivesse uma opinião bem defenida, e que então o que me parecia poderia resultar, era em certo prazo poder-se ter fasto muito, mas não com aproveitamento real para o paiz.

A 4.ª finalmente, é para mim de muito peso, que tendo-se desorganisado muitas das nossas antigas e excellentes instituições militares, que não tem sido substituidas por outras efficazes, e sendo forçoso reconhecer a pouca força governativa que os governos ultimos tem patenteado, seria da mais alta imprudencia conceder este voto de confiança, que abria o reino aos inimigos quando os houvesse, não existindo entre nós uma organisacão militar adoptada á defeza do paiz, e achando-se as praças em estado de exigirem previamente reparos da ultima necessidade; antes de se pôr em execução um projecto tão gigantesco, como se me ante-olhava o presente.

Agora, sr. presidente, vou passar a fazer algumas reflexões geraes sobre estas quatro condicções, e direi pelo que respeita á parte financeira que não se havendo ainda regulado a despeza ordinaria da nação, debaixo de um systema regular, e economico, que provendo ao necessario, cortasse o inutil, é impossivel pensar em extraordinarias, d'uma tal magnitude como as que requer este projecto. Embora se façam estas despesas, quando fór provada a sua possibilidade, mas esta possibilidade não se poderá provar se não quando a primeira o fór, e com ella se tenha tambem provido á despeza que exige a divida publica, o que d'outra sorte tenderia a acabronhar a nação com impostos com que as fortunas dos particulares não poderiam, e d'alli longe de provir a prosperidade, proviria uma miseria incalculavel. Acabava de ouvir a s. exa. o sr. ministro do reino que se fosse possivel restabelecer a taxação anterior ao estabelecimento do systema constitucional, que com ella se julgaria o governo melhor habilitado a occorrer a todas as despezas e necessidades publicas. Eu responderia que não via motivo ou obstaculo para estabelecer qualquer systema que fosse, logo que se provasse a sua conveniencia, e utilidade publica, tanto mais em um seculo que se dizia liberal e isento de prejuizos, e que se havia obstaculo só era em, não se demonstrar o porque se lhe daria a preferencia.

Que o paiz tinha uma despeza publica a que necessariamente devia attender por meio de impostos; que á nação importava pouco quaes elles fossem, com tanto que não fossem vexativos, e que se conservassem em justa porporção com os teres e haveres dos particulares, e que portanto se o governo reconhecia que uma certa fórma de taxação convinha á prosperidade do reino, devia corajosamente apresenta-la ao exame do corpo legislativo.

Ora, sr. presidente, creio que não escapará a perspicacia de ninguem que o estado actual da nossa despeza publica é susceptivel de grandes modificações ou reformas, pois com muito menos despeza se poderia attingir a resultados iguaes, e talvez muito maiores, faltando-se agora a muitas cousas urgentes, e dispendendo-se em outras inteiramente inuteis (apoiados). Por consequencia julgo que é urgente reconsiderar o nosso systema actual, e modificar os quadros da despeza; que além disso convém restringir d'uma maneira permanente, estabelecendo a despeza ordinaria do Estado debaixo d'um systema regular e inalteravel, excepto quando razões mui fortes exigirem alguma alteração. Então é claro que ao governo toca demonstrar quaes são os meios mais productivos e naturaes para obter uma receita apropriada.

Mas outra mui urgente necessidade financeira reclama tambem primazia nas considerações do corpo legislativo, isto é, a divida publica, cancro roedor, que consome em grande parte as receitas publicas, - divida pela maior parte contraída com usura inadmissivel, e que da maneira actualmente com que está estabelecida, ficará in perpctuum, uma herança de sacrificios a transmitir de geração em geração. Esta divida é já exorbitante, e fóra de toda a proporção, e como tal a causa principal dos nossos embaraços. Perguntarei eu agora: não será mais urgente dar-lhe a preferencia ainda sobre este projecto, e em todo o caso regular alguma cousa para a tractar de extinguir o mais depressa possivel, e fazer um esforço qualquer para este um. Permitta-se-me o apresentar, como prova da usura e urgencia, o facto - que não se tendo pago ha mais de um anno ás classes inactivas, se acham estes recibos comprados por um sexto do seu valôr, na mão dos agiotas, prestes a converter-se na primeira occasião em titulos de divida publica; e portanto, quando só aproveitaram aos verdadeiros credores em um sexto do seu valór, a sobrecarregar integralmente a divida publica, como uma divida fantastica, que realmente fica sendo.

Remediados estes males então embora conhecendo-se qual a despeza, qual a receita, se houver convicção que esta despeza extraordinaria é possivel, faça-se então. Mas sem se decidir esta questão vital seria imprudencia, pois que segurança temos que as despezas ordinarias não exijam novos sacrificios; e como seriam elles possiveis com o augmento que agora se propõe de um quinto sobre a decima, e de uma capitação?

Passando a considerar esta uma lei de meios, tomarei por prova negativa a opinião d'alguns generaes, que tendo commandado exercitos em guerras recentes no nosso paiz, estiveram a mesmo de conhecer os recursos da producção, que o paiz offerecia. Será a primeira a do marechal conde Lippe, que em uma carta ao marquez de Pombal, datada de 25 de maio de 1776, diz assim: «O mais perigoso fraco, o maior defeito que ha no armamento e defeza de Portugal é, que o reino não produz em seu proprio terreno quanto baste para nutrir seus habitantes, mesmo em tempo de paz.» A segunda a de lord Vellington, que na investigação que fez por causa da convenção de Cintra, em Londres, respondeu que de pão não poderá fazer subsistir as suas tropas no paiz, que tiraia este de herdo dos seus transportes, não offerecendo sobrecellentes para o exercito; que de carne tambem fóra escasso o fornecimento do paiz, ainda que esta vinha em parte de fóra; e até de vinho; que logo que se demorava em qualquer ponto dous dias, já experimentava falta. Então, sr. presidente, fazendo a parte ao progresso que o paiz tem feito desde a guerra da peninsula, em que sempre se experimentou grandes difficuldades de subsistencia para os exercitos, direi que nem julgo que ainda possam haver grandes empates de generos, queixa de que nunca ouvir fallar, excepto no Alemtejo, nem mesmo que as taes e quaes estradas que temos, não dêem vasão a esse pouco sobrecellente, principalmente no verão, em que o paiz é facilmente accessivel por toda a parte. Motivo por que a falla de estradas aperfeiçoadas é menos sensivel. Eu tive occasião ultimamente, indo a Mafra, de reconhecer o progresso que em muitas localidades o paiz tem feito na sua cultura, e alli notei como um signal deste progresso o haver já um mercado de trigos, que não existia antes, o que me convence ainda mais que este melhoramento geral não póde existir sem dar signaes manifestos, que então reclamariam melhores estradas; mas estes signaes ainda estão muito na infancia por agora. Por tanto não é de uma medida geral ainda que se carece, mas de medidas locaes e progressivas, que acompanhem o desenvolvimento da industria.

Quanto á terceira consideração, sr. presidente, vejo muito explicitamente no projecto que se tracta de estabelecer um imposto que deve durar dez annos, mas não vejo um projecto de estradas de tal maneira calculado, e provado por trabalhos previos, e notas estatisticas, que me convençam que o governo tem uma idéa determinada sobre o que se deve fazer, então, sr. presidente, considero este projecto um voto de confiança para que o governo venha a tractar desta materia como melhor lhe parecer, e isto é que repugno conceder-lhe sem lhe fazer offensa, não só como altamente indecoroso ao corpo legislativo, tractando-se de um projecto tão vasto, e que tanto interessa as fortunas particulares pela gravidade do imposto; como pelo muito pouco progresso que entre nós tem o systema de apropriadas investigações a respeito das medidas que se querem que reduzindo então os projectos a quando deverão ser factos provados, para mim toda a confiança, que aliás possivel não ter no que fosse competntemente examinado; e em um governo que caminhando verdadeiramente no que se chama o progresso social, não aspirasse a outra confiança senão o que é demonstrada pela evidencia omnipotente dos factos. Finalmente, sr. presidente, senjdo a independencia nacional o primeira dever, não posso deixar de notar quanto esta se acha compromettida pelo abandono em que estão as fortificações do reino, e a falta de uma nova organisação militar que regule o levantamento e em massa da nação, quando, circumstancias, que Deos remova de nós, exigirem uma defeza nacional energica. A bella organisaçao antiga caducou, mas por certo o que temos se póde chamar substituição. O meu amigo, o sr. ministro da guerra, não póde ignorar o que eu quereria dizer, se a descrição em taes materias não fôra um dever: mas sempre accrescentarei que a situação actual das nossas cousas militares me fazem encurar este projecto como perigoso, até certo ponto, mas em todo o caso elle deverá ser concebido attendendo as considerações militares. Eu estou de accordo para rematar, que as estradas chegaram a ponto de quasi se poder dizer que não existem mas por isso que uma estrada está descalçada, não se segue que se não possa concertar, hevenro nella ainda a maior parte dos materiaes fazer. Além de que noto que neste paiz a maior parte das propriedades rusticas não estão circumscriptas por valados, de sorte que no verão o paiz é perfeitamente vadiavel em toda a parte; época em que os generos se transportam geralmente, de donde concluo que medidas parciaes e reclamadas pelo estado crescente de prosperidade local, serão melhor adoptadas do que um vasto projecto como o que se submette, a nossa consideração. Voto pois pelo adiamento

CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS.

Sessão em 16 de maio de 1843.

(Presidencia do sr. Gorjão Henriques.)

FEITA a chamada, estavam presentes 72 sr. deputados; e abriu-se a sessão á uma hora da tarde.

A acta foi approvada.

(Achava-se presente o sr. ministro da marinha.)

ORDEM DO DIA.

Continuação da discussão da questão previa offerecida pelo sr. Fonseca Magalhães, sobre o projecto n.º 88.

(Entrou o sr. ministro da justiça.)

O sr. Beirão começou notando a celebridade desta questão, a respeito da qual o governo tinha tido a habilidade de tornar os deputados, ora ministeriaes, ora da opposição, porque aquelles que votassem pelo principio do projecto da commissão ecclesiastica, estavam em opposição em relação ao sr. ministro do reino; e aquelles que votassem pelo principio do projecto da commissão de instrucção publica estavam em opposição em relação ao sr. ministro dos negocios ecclesiasticos; existindo por consequencia uma antinomia entre os dous projectos. Disse que nesta parte da ministerial pelo lado do sr. ministro dos negocios ecclesiasticos, porque a sua opinião era que a instrucção do clero, formasse uma secção separada, como acontece em outros paizes, podendo-se estabelecer como these que em todos elles ha uma divisão entre a instrucção do clero, e a commum dos outros cidadãos. Que se tinha dito que o clero precisava de instrucção: convinha neste principio; mas entendia comtudo que do que elle mais carecia [..] de educação: e que os sentimentos affectivos que por habito devem assistir ao clero, não, se aprendem nas escolas.

Observou que receiando-se tanto o ultramontanismo, o meio de o prevenir era eslabelecendo os seminarios, porque espargindo-se as luzes desapparecia essa visão em que o ultramontanismo se funda.

Fez algumas reflexões sobre a reacção religiosa do seculo 19.°, reacção que elle não attribuia á civilisação dos povos, mas sim ás suas crenças, e que se tem desenvolvido porquer os governos modernos não teem marchado em har-