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SESSÃO DE 5 DE JULHO DE 1848.

Presidiu — O Sr. D. de Palmella.

Secretarios — Os Srs. M. de Ponte de Lima.

Margiochi.

Aberta a Sessão pela uma hora e meia da tarde, estando presentes 34 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão. — Concorreu o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.

Mencionou-se a seguinte

CORRESPONDENCIA.

Um Officio da Camara dos Srs. Deputados, remettendo as representações exigidas pelo D. Par Duarte Leitão, pag. 951 col. 4.ª

Passou á Secretaria.

O Sr. Presidente — Pede alguem a palavra antes da ordem do dia? (O Sr. Sousa Azevedo — Peço eu.) Tem a palavra.

O Sr. Sousa Azevedo — Sr. Presidente, são hoje 5 de Julho, está a Sessão das Côrtes prorogada até ao dia 31 deste mez e faltam apenas dezoito ou vinte Sessões para se concluirem os nossos trabalhos, os quaes estão bastante atrazados: quero dizer não por falta de applicação dos Membros desta Camara, nem das respectivas Commissões, mas porque effectivamente ha muitos objectos importantes, que precisam de ser estudados e examinados para sobre elles se poder dar o respectivo parecer; e além disto ha um grande numero de Projectos na Camara electiva, dos quaes uns já estão discutidos, e outros ainda não; porém muitos hão de vir para esta Camara, a qual será impossivel, que até ao fim da Sessão possa dar conta dos trabalhos que lhe incumbem, se alguma providencia se não adoptar. Nestas circumstancias eu pedia á Camara, que as Sessões durassem mais uma hora, e em logar de acabarem ás quatro horas acabassem ás cinco (Apoiados). A experiencia tem mostrado, que não podemos começar as Sessões antes das duas horas, e acho esta hora conveniente para conciliar os trabalhos da Camara com os das Commissões, e por isso proporia que as nossas Sessões durassem até ás cinco horas, porque assim podemos concluir os nossos trabalhos, e de outro modo é impossivel vence-los até ao fim da Sessão prorogada, e todos sabemos, que não é facil prorogar a Sessão por mais tempo, n'uma estação tão incommoda como a do alto verão (Apoiados).

O Sr. Presidente — Propõe o D. Par, o Sr. Sousa Azevedo, que se estabeleça nas nossas Sessões mais uma hora, isto é, que durem até ás cinco horas em logar de acabarem ás quatro (Apoiados): eu vou consultar a Camara. Supponho que não será necessario perguntar se ella admitte esta proposta á discussão: entretanto os D. Pares que a admittem queiram levantar-se.

Admittida.

O Sr. Presidente — Está admittida: quer algum D. Par a palavra sobre esta proposta? Ella consiste em que a Sessão se feche ás cinco horas em logar de ser ás quatro: os D. Pares que approvam a proposta queiram levantar-se.

Approvada a proposta do Sr. Sousa Azevedo.

O Sr. Presidente — Pede alguem a palavra antes da ordem do dia, ou algum Relator das Commissões? (Pausa.) Ninguem pede a palavra, vamos a entrar na ordem do dia, que é a continuação da discussão do Parecer da Commissão de Fazenda n.º 42, e tem a palavra o D. Par, o Sr. Sousa Azevedo.

ORDEM DO DIA.

Pareceres n.º 42 da maioria da Commissão de Fazenda, e n.º 42. A da minoria, sobre a Proposição de Lei, estabelecendo a fórma do pagamento e recebimento em Notas do Banco de Lisboa, cuja discussão começou a pag. 942, col. 1.ª, e pag. 950. col. 2.ª

O Sr. Sousa Azevedo — Sr. Presidente, agita se nesta Camara uma das questões mais importantes em relação aos interesses vitaes do Paiz, e ainda bem que este objecto não é politico; e ainda bem que tal asserção sahiu da bocca a de um digno Ministro da Corôa, o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, que na Sessão de hontem assim começou o seu discurso, declarando que este objecto não era politico; ainda bem, repito, para que se affaste da discussão a idéa, de que preconceitos e vistas de qualquer natureza podem por ventura influir naquillo que se disser, nas considerações e motivos que se adduzirem sobre a materia que se discute.

Aproveito a occasião para dizer, como tambem disse o meu nobre e antigo amigo o D. Par o Sr. José da Silva Carvalho, que na opinião que vou emittir não tenho em vista fazer a menor opposição ao Ministerio, mas sim prestar homenagem aos principios, que entendo serem verdadeiros, e proceder como tenho sempre procedido na minha vida; e Deos queira que posa continuar, dizendo as minhas opiniões francamente a todos, e em toda a occasião, entendendo quanto ás funcções que exerço no Parlamento, que só assim satisfaço o meu dever, e cumpro o juramento que prestei nesta Camara de ser fiel á Carta e ao Rei.

Sr. Presidente, dous Pareceres de Commissão se discutem nesta Camara — o da maioria da Commissão de Fazenda, e o da minoria da mesma Commissão. Para que eu bem possa explicar-me, para que eu facilmente possa ser entendido por esta Camara, parece-me que convirá seguir um methodo facil, mencionando as differentes provisões que se contêm em cada um destes Pareceres, confrontando umas com outras, e demonstrando as diversas consequencias e resultados que dellas se devem seguir. Mas antes de examinar estas provisões dos dous Projectos ou Pareceres que se discutem, parece-me a proposito suscintamente mencionar qual é o mal que existe, e o fim a que nos propomos para o remediar, pois que só assim poderemos bem avaliar a efficacia dos meios, e das differentes bases que se offerecem a esta Camara, para por meio de analyse exercer a sua opção.

O mal, Sr. Presidente, é desgraçadamente bem conhecido: consiste na forte emissão de moeda fraca, e consideravelmente depreciada por um concurso de circumstancias, que são por todos conhecidas, e que é por isso superfluo mencionar, cada uma das quaes, e todas juntas teem concorrido para que o mal successivamente se tenha aggravado em prejuizo da Sociedade, e de cada um dos Membros que a compõe. Sendo este o mal que procuramos remediar na sua totalidade ou diminuir com a maior brevidade possivel, é evidente que a diligencia na escolha dos meio, deve consistir em achar os mais proprios e efficazes para se conseguir tão importante fim; e como estes meios, quaesquer que elles sejam, hão de necessariamente resultar de sacrificios da Sociedade, é tambem necessario que sobre-madura reflexão se escolham aquelles, que menos pesados forem a cada uma das classes, ou individuos, que em elles hajam de contribuir, e sobre tudo que sejam repartidos com perfeita igualdade por todos os que compõem a Nação (Apoiados). Possuidos pois da gravidade do mal, qual será a idéa que de prompto nos accommette para o evitar? O mal é uma emissão de moeda fraca, o remedio seria tira la da circulação; mas quaes serão os meios proprios e convenientes para obter este fim?

Sr. Presidente, para retirar immediatamente da circulação esta moeda depreciada, reduzindo a metal sómente a moeda corrente do Paiz, seria necessaria uma somma de dinheiro effectivo, que as circumstancias não permittem obter dentro, nem fóra do Reino; e sem este meio decretar a annullação das Notas do Banco, seria além de impolitico, eminentemente immoral pelo grave damno que assim se causaria aos actuaes possuidores das mesmas Notas, que as guardam esperando o seu pagamento, confiados na palavra do Governo, quer dizer, da Nação, que lhes affiançou serem moeda verdadeira, e que por ella haviam de haver nominalmente aquillo que ella representa. Não é por tanto possivel, Sr. Presidente, retirar as Notas da circulação, sem que o Governo tenha meios para satisfazer aos possuidores dellas o que de direito lhes compete na conformidade do promettido (Apoiados).

É certo que em algumas cabeças, e cabeças muito respeitaveis, tem entrado a idéa de uma operação que facilmente offerecia este resultado, e vem a ser — o Governo é responsavel ao Banco de Lisboa, em virtude de um emprestimo contraido com o mesmo Banco em 1835, por uma somma aproximada á cifra das Notas emittidas na circulação, e então alguem entende, que o Governo poderia tomar a divida das Notas do Banco, resgatar ao par o seu penhor, que consiste em inscripções de juro de 5 por cento, e com estas pagar aos possuidores das Notas do Banco. Eis aqui o que tenho ouvido, e a algumas pessoas muito respeitaveis; mas como seria possivel esta transacção? Em que valor se haviam de dar as inscripções para pagamento das Notas? Se fossem dadas para amortisar as Notas pelo seu valor nominal, o penhor não chegaria para metade; se fossem dadas pelo valor das Notas no mercado... Sr. Presidente, fallecem-me as forças, não sei como possa conceber a immoralidade de tirar-se partido de factos, os acontecimentos, que com quanto o Governo não seja por elles responsavel, tambem não podem ser lançados em culpa aos portadores das Notas para perderem a grande differença, que vai do valor nominal das Notas ao do mercado, e receberem por ellas inscripções. (Apoiados.) Era portanto impraticavel a operação de resgatar os penhores do Banco, e com elles satisfazer aos portadores das Notas aquillo que se lhes deve.

Sr. Presidente, excluido este meio de providenciar sobre o objecto de que tractâmos, seria admissivel o do restabelecimento do curso forçado das Notas do Banco no todo, ou na maxima parte do seu nominal? Parece-me escusado cançar a Camara com a demonstração da impossibilidade desta medida, que em outro tempo se pertendeu levar a effeito, mas que muitas circumstancias, e acontecimentos impediram de realisar-se, e que seria hoje, além de inconveniente, impossivel de levar á execução. E por esta occasião terei de referir-me a uma proposição, que o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros avançou nesta Casa, quando, pertendendo defender o parecer da maioria da Commissão, disse, que todas as Nações forcejavam por manter o curso forçado d’um papel, que circumstancias ou conveniencias publicas tinham feita admittir como metal, dando-se-lhe por conseguinte o valor de moeda corrente. Sr. Presidente para que os argumentos sobre exemplos possam colher, é necessario que se apresente a identidade de circumstancias, do contrario cahem inteiramente, e nada provam. Pois haverá algum Paiz, em que dando-se circumstancias iguaes as nossas, aonde tendo havido curso forçado de moeda fraca, e havendo-se depreciado successivamente por muitas razões ainda existentes, se pertendesse, e obtivesse restabelecer o curso forçado da moeda fraca? Não ha, Sr. Presidente, não ha exemplo de tal providencia, e por isso parece-me que não procede o argumento de S. Ex.ª,

Na exclusão portanto dos meios que tenho mencionado, porque são inadmissiveis e inefficazes para se obter o fim que desejâmos alcançar, visto que não é possivel retirar as Notas do Banco, reduzindo só a metal officio circulante, e moeda corrente do Paiz, nem restabelecer o curso forçado das Notas; parece que a unica providencia a adoptar, e aproveitando mesmo da experiencia de terem sido fataes todas as alterações sobre o curso das Notas, é acceitar o que actualmente se acha estabelecido, addicionando unicamente algum meio efficaz de sua amortisação, e lançando-se o imposto que fôr menos vexatorio; isto é, que seja o mais suave, e geral a todos, porque se o mal é de toda a Nação, justo é que todos partilhem os mesmos sacrificios para o remediar, e extinguir. A amortisação das Notas, convenientemente estabelecida, ha de ir melhorando o valor desta moeda depreciada, e é este o fim principal a que se dirigem os dois projectos, tanto o da maioria, como o da minoria da Commissão. Vou portanto descer á analyse de um e outro projecto, para vêr se posso bem entender, e demonstrar quaes são as medidas e provisões mais adequadas ao fim, que se pertende alcançar.

O projecto da maioria consiste em duas bazes: primeira — que o Governo receba e pague pela maneira seguinte: tres quartas partes em metal, e uma quarta parte em Notas pelo seu valor nominal; segunda — que se estabeleça um imposto de 10 por cento em Notas pelo seu valor nominal, para amortisação das mesmas Notas, o qual será addicionado durante o anno economico de 1848 a 1849 a todos os direitos que se cobram nas Alfandegas, assim como a todas as rendas e contribuições publicas no continente do Reino. Vamos a vêr agora as bazes correspondentes a estas, exaradas no parecer da minoria da Commissão. Primeira — conservam-se as disposições actualmente em vigor do Decreto de 9 de Dezembro de 1847, quero dizer, o Governo recebe e paga metade em moeda de metal, e metade em Notas pelo seu valor no mercado. Segunda — estabelece-se um imposto de 5 por cento, pago em Notas pelo seu valor no mercado, sobre todos os direitos que se pagarem nas Alfandegas, bem como sobre todos as rendas e contribuições publicas no continente do Reino.

Examinando-se a primeira baze do projecto da maioria da Commissão, em que se estabelece que os pagamentos sejam feitos tres quartas partes em metal, e uma em Notas pelo seu valor nominal, ver-se-ha facilmente quanto se ha de restringir a área da circulação das Notas, hoje empregadas em gyro, que calculando-se sobre uma cifra que não será exaggerada, póde dizer-se que andará por 600:000$000 réis, os quaes, digamo-lo assim, não pertencem a ninguem, mas são uma quantia em Notas, que entra nos cofres publicos, e sabe nos respectivos pagamentos, e sempre na mesma rotação. O resto das Notas está na mão e nas gavetas dos seus possuidores, que ainda não poderam transigir com as circumstancias, perdendo 40 ou 50 porcento, nem perderam a esperança de melhor futuro, e bem hajam elles, porque não vem longe o tempo de reconhecerem que não se enganam, e que bem sabem avaliar as garantias dessa moeda fraca. A quantia pois, como disse, actualmente em gyro será de 600:000$000 réis, que entram na Junta do Credito Publico, sabem desta para os juristas, entram nas Alfandegas, e mais casas fiscaes, sahem para pagamento aos credores e servidores do Estado, e destes passam para os cambistas. Além deste gyro só podem vir ao mercado poucas Notas, que a extrema necessidade de meios força seus portadores a grande perda do seu valor numerico, e isto importará em pequenas quantias, que não podem influir no mercado. Adoptando se porém a baze do projecto da maioria, restringe-se a área da circulação das Notas, e sobre a cifra dada de 600:000$000 réis limita-se o gyro, o emprego a 150, ficando réis 450:000$000 sem circulação, que hão de ir ao mercado, e desta aflluição resultará a offerta immediata em desproporção com a procura, e a sua necessaria consequencia apparecerá logo na depreciação das Notas. Esta theoria sobre a concorrencia de qualquer genero, ou objecto em commercio, produzindo o seu maior ou menor valor, segundo a desproporção entre a offerta e a procura, é um principio, que já hoje passa por axioma, e para o sustentar não são precisos debates, nem questões, nem mesmo recorrer aos livros da sciencia, e a authoridades; mas se disto carecessemos, eu diria a S. Ex.ª, o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, em resposta ás suas observações ácerca do que expendêra a tal respeito o D. Par, Sr. Fonseca Magalhães, que foi S. Ex.ª mesmo quem reconheceu a procedencia deste principio na Consulta do Tribunal do Thesouro, publicada no Diario do Governo sobre a annullação do Decreto de 15 de Junho de 1847, que reduziu a um terço a admissão das Notas do Banco nos respectivos pagamentos; consulta a que tambem já aqui se referiu o D. Par, o Sr. Margiochi.

As duas diversas bazes de cada projecto operam, ora separada, ora conjunctamente, e é necessario ter isto em consideração para bem avaliar a preferencia entre os dois que se discutem.

Sendo pois necessario, que o effeito da amortisação não seja inutilisado pela primeira baze, isto é, pelo cabimento das Notas nas differentes transacções, é este o mais grave Inconveniente, que resulta do projecto da maioria; por quanto não se conhecerá no mercado o effeito sensivel da amortisação, porque os 450:000$000 réis, que eu mostrei ficarem sem emprego, absorvem a quantia que fôr amortisada, e ainda a offerta será mui-