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as expressões, e accrescenta, que se estivessemos mais costumados aos usos inglezes, se não daria esta inconveniencia no nosso paiz. Parece-lhe que se allude neste artigo, se bem se recorda, á questão das irmãs da caridade e outras mais, em que alguns Dignos Pares, como os Srs. Marquez de Ficalho, Duque da Terceira, Conde da Ponte, e não sabe se tambem o Sr. Conde de Linhares tem manifestado a sua opinião em sentido contrario á do Ministerio. Por essa occasião surprehendeu-se mais elle orador, vendo que o cavalheiro que tinha assignado esse artigo, censurando altamente o procedimento dos empregados do Paço, fosse o mesmo que acceitasse um emprego rendoso e valioso, sendo como é conhecido geralmente que elle mesmo escreveu outros artigos, por que foi chamado aos Tribunaes no tempo do Ministerio do Sr. Conde de Thomar, por serem offensivos á sagrada Pessoa do Senhor D. Fernando, Augusto Esposo da nossa chorada Rainha a Senhora D. Maria Segunda, de saudosissima memoria. Não profere agora diante da Camara as expressões desses artigos, mas declara que quem os assignou não tem direito para pedir que seja demittido um dos primeiros servidores da Senhora D. Maria Segunda, como é o Sr. Duque da Terceira, nem os Srs. Marquez de Ficalho e Conde da Ponte, estes cavalheiros, constantes e fiéis á dinastia reinante, estes militares honrados, sempre valentes, sempre fidalgos distinctos e sempre nobres como são (apoiados). É a respeito destes que se pede que sejam demittidos, um do seu commando, e tambem juntamente comos outros do serviço dos nossos Reis. Isto é que elle orador acha muito inconveniente, e pergunta ao Sr. Ministro a sua opinião a tal respeito. S. Ex.ª sabe, como todas as pessoas instruidas sabem, que todo o homem para praticar um acto qualquer deve ter liberdade, e para a ter é preciso que tenha a consciencia do acto que pratica: ora se este homem não tem a consciencia do acto que pratica não póde de maneira nenhuma ter liberdade. É preciso, que os cavalheiros que se sentam nestas cadeiras tenham plena liberdade para emittir aqui o seu voto. Allude-se á Inglaterra, porque quando lá muda o ministerio costuma-se mudar os officiaes-móres do paço; mas nós que não imitamos muitas cousas boas daquelle paiz e dos seus bons usos, deviamos aproveitar-nos tambem da boa liberdade ingleza.

Continua expondo, que teve serias apprehensões quando leu este artigo, por vêr que foi escripto por um amigo do Governo, que tem defendido os seus actos com o maior ardor. Pede, pois, ao nobre Presidente do Conselho declare como o Governo entende este artigo? porque nos governos constitucionaes é preciso que se dê uma resposta conveniente, como é proprio de Ministros que se sentam nestas cadeiras, porque quaesquer que sejam as opiniões ninguem se deve arredar do campo da polidez e boa educação. Insta com o Sr. Ministro para que lhe diga se deve continuar a acreditar nas suas boas intenções, mas para isso deseja saber qual é a opinião do Governo em quanto á liberdade de voto dos Officiaes-móres da Casa Real e outros empregados do Paço; e deve prevenir desde já a S. Ex.ª, que qualquer que seja a sua resposta (que são sempre muito lacónicas, e nisso tem merecimento) ordene que ella appareça tal qual como a der nos extractos das sessões desta Camara, porque S. Ex.ª já uma vez illudiu tal publicação, e dahi o motivo porque elle orador lhe dirige esta rogativa. Permitta-lhe S. Ex.ª dizer em boa amisade, que tendo dirigido a S. Ex.ª uma interpellação, e parece-lhe que, nesse caso, procedido com todo o cavalheirismo, como o Digno Par reconheceu, mostrando-lhe na vespera as perguntas que lhe desejava dirigir, porque não queria fazer disso uma questão ministerial, e só obter um resposta, S. Ex.ª a deu de uma maneira que o não satisfez completamente.

Nessa occasião o digno Par o Sr. Marquez de Ficalho disse — que não approvava que elle orador se não desse por satisfeito com áquella resposta; mas os factos vieram confirmar os receios, porque não se publicou o discurso do Sr. Marquez de Loulé; e estimava que esteja presente o Sr. Marquez de Ficalho para repetir, que ainda se não dá por satisfeito com o que respondeu o Sr. Ministro. Portanto, pede ao Sr. Marquez de Loulé, que mande imprimir a resposta que agora der, e espera que não ha de acontecer o mesmo que da outra vez.

Respondeu-se, mal ou bem naquella occasião, mas que aconteceu? Foi elle orador procurar depois no respectivo extracto do Diario do Governo a resposta de S. Ex.ª, e só deparou com pontinhos adiante do nome do Sr. Presidente do Conselho! Procurou depois elle orador indagar o motivo disto, e o Sr. Conde de Mello, que é"summamente benevolo, o informou de que se tinha officiado ao Sr. Presidente do Conselho de Ministros por umas poucas de vezes, pedindo-lhe o seu discurso, mas S. Ex.ª não respondeu; S. Ex.ª bem se sabe que não gosta muito de responder de prompto. Então não póde elle orador deixar de fazer o seu juizo, que póde ser falso, mas não lhe parece muito temerário, porque ás vezes a verosimilhança aproxima-se bastante da verdade. Pareceu-lhe que o Sr. Marquez de Loulé, depois da resposta que déra naquella occasião, se arrependera do que dissera, e julgando como habil politico, que as suas palavras não seriam bem comprehendidas e approvadas pelas pessoas que defendiam e defendem o Ministerio, achou melhor que se não publicasse o que havia dito. Foi este o conceito que fez. Diz francamente, e com a ingenuidade com que costuma fallar, foi este o juizo, e desde essa época ficou prevenido para que, quando houvesse de fazer mais alguma pergunta a S. Ex.ª, pedir-lhe não só que seja explicito, como igualmente que não impeça a publicação, porque de mais a mais um Presidente do Conselho de Ministros, chefe de uma situação, director de um partido, pelo menos até certo tempo, deve ter a consciencia das suas idéas, e daquillo que diz, não receiando ser aggredido por um ou outro escriptor de bas étage. E tanto maior foi a sua estranhesa, que áquella resposta ou discurso de S. Ex.ª, foi na Camara geralmente bem recebida, embora elle orador se não satisfizesse plenamente, por isso que é difficil em satisfazer. Dito pois isto de passagem, como uma especie de queixa em familia, espera que o nobre Ministro, respondendo-lhe agora, tome a seu cuidado o fazer que se publique depois a resposta que dér, fazendo tambem com que, se ainda fôr possivel, se publique o outro discurso a que se acaba de referir, e cuja falta tanto lamenta. Espera que S. Ex.ª procurará satisfazer, quando não seja como individuo e amigo, ao menos pela consideração de homem publico, e por áquella attenção que é propria do caracter de S. Ex.ª e lh'o exige a sua qualidade de Ministro e Chefe do gabinete.

Aguarda a resposta de S. Ex.ª, para fazer ainda uso da p lavra, no caso de o julgar conveniente.

O Sr. Presidente do Conselho — Eu principiarei por agradecer ao Digno Par o ter-me dado occasião de explicar o motivo porque não appareceu aquelle meu pequeno discurso a que S. Ex.ª alludiu. Eu estava persuadido, e creio que não me engano, de que havia uma resolução da Camara para que quando os oradores não mandassem os seus discursos emendados se publicassem conforme tivessem saído das notas tachygraphicas; esta resolução poderá de facto não estar em pratica, mas de direito está em vigor, e eu nesta supposição, como se passou muito tempo entre a sessão e a publicação, quando se me pediu esse discurso com urgencia, não tendo até alli tido occasião de o vêr para o corrigir, se fosse necessario, procurei-o e não me foi possivel encontral-o, posto esteja certo de que deve estar em minha casa confundido com outros papeis, mas realmente descansei sobre isso, certo como estava da resolução a que alludi, e então disse, que visto não encontrar o discurso que me tinha sido enviado, me parecia que o melhor era publical-o conforme as notas tachygraphicas. Eis-aqui toda a explicação desse facto, e póde o Digno Par contar, que se eu ainda encontrar o tal discurso S. Ex.ª ha de ter a satisfação que disso esperava resultar-lhe (Riso. — O Sr. Marquez de Vallada — muito obrigado), e eu nesse caso pedirei tambem a S: Ex.ª que ponha, ou consinta que se ponham ao lado as suas perguntas, que eu tambem lá hei de ter juntas ao discurso de que se falla. Creio que sobre isto tenho respondido.

Agora em quanto ao artigo do Jornal do Commercio em que S. Ex.ª falla, e que diz ser escripto por um amigo meu, declaro que não sei quem seja; mas no que o proprio Digno Par ha de concordar comigo, e concorda de certo toda a Camara, é que o Jornal do Commercio não é um jornal do Governo. Pois um jornal onde a par de um artigo favoravel á politica do Governo vem dois Ou tres contra, póde-se dizer que é um jornal do Governo? Eu dou a minha palavra de honra de que sou estranho a tudo isso, e protesto contra toda a affinidade que o Digno Par diz que existe entre o Governo e o Jornal do Commercio. (O Sr. Marquez de Vallada-—Protesta?) Protesto de certo, e torno a asseverar que o Governo é inteiramente alheio a esse artigo que appareceu sobre medidas que parece dizia se deviam tomar contra os Officiaes-móres da Casa Real. O Digno Par é Official-mór... (O Sr. Marquez de Vallada — não estou tm serviço.) O Governo mesmo ainda não pensou em similhante cousa, não pensa em tomar medida alguma a tal respeito, e os actos do Governo devem dar aos Dignos Pares toda a garantia de qual será a futura conducta do Governo a este respeito. De mais: ha Dignos Pares que foram nomeados Officiaes-móres por Decretos que eu tive a honra de referendar, e entretanto esses cavalheiros não estão em perfeita harmonia com o Governo, nem estavam quando foram nomeados (apoiados); além disso acredito que os Dignos Pares Officiaes-móres votam aqui sempre com toda a liberdade, e não sentem pressão alguma (O Sr. Marquez de Vallada — Elles não me deram procuração). A verdade é esta, e creio que os proprios Dignos Pares assim o reconhecem (apoiados).

O Sr. Marquez de Ficalho (sobre a ordem): expôz que, se lhe fosse permittido, faria uma moção de ordem para esta interpellação ficar neste ponto. Quem é o juiz da sua liberdade? É o Digno Par interpellante? É o Governo quem por ventura lh'a póde tirar? É o Governo que lhe póde tirar o cargo que elle orador exerce na Côrte? Não. Unicamente Sua Magestade El-Rei.

Quando Sua Magestade entender que elle orador não convem ao seu real serviço, dir-lho-ha, e elle Marquez de Ficalho ha de respeitosamente responder e justificar-se, se fôr caso para isso. Nesta cadeira porém tem toda a liberdade, e o Digno Par não está auctorisado a interpellar ninguem por ella (O Sr. Marquez de Vallada — Pede a palavra). Quem se póde julgar com esse direito? Ninguem. O Governo póde, por exemplo, ter certas pertenções sobre a existencia de taes e taes homens no serviço do Paço, mas sobre a sua liberdade quem se atreveria a perguntar-lhe e pro-pôr-lhe como ha de votar? O orador suppõe que os inconvenientes desta interpellação podem ser muito grandes, e por consequencia pediu a palavra sobre a ordem para pedir que esta interpellação não continue, e para dizer que não julga pessoa alguma competente para ser juiz da sua liberdade de voto.

O Sr. Marquez de Vallada: expõe que se o Digno Par o Sr. Marquez de Ficalho não quer nem consente que alguem seja seu juiz, tambem elle orador não consente que algum Digno Par o obrigue a ficar callado quando entender que deve fallar; pedindo a palavra, e sendo-lhe concedida pela Presidencia, ha de sempre usar della como entender, reconhecendo apenas na Presidencia e na Camara o direito de o chamarem á ordem quando estiver fóra della.

Elle orador não tractou de homens, tractou dos principios de liberdade. Acaso levou a questão para o campo da methaphisica, ou tractou-a na larga esphera da philosophia politica?

Pois não se referiu ao artigo do jornal, e não o fez alludindo mesmo especialmente aos Srs. Duque da Terceira, Conde de Linhares, e D. Carlos Mascarenhas? Está pois elle orador no seu direito, e ha de mantel-o com toda a energia, sem consentir que venham dar-lhe lições as quaes só recebe do Sr. Presidente e da Camara, quando assim o pedir o procedimento delle Par; portanto, como disse, tractou a questão no campo da philosophia politica. Perguntou ao Governo qual a sua opinião sobre a liberdade de certos individuos, o Sr. Marquez de Ficalho levantou-se e disse — que tal questão não era para aqui, que não era conveniente no modo dever de S. Ex.ª

Mas que diz a Carta? Como exerce o Rei o podér moderador? Não é por meio dos seus Ministros? Quando se dá, por exemplo, uma condecoração a um estrangeiro, quando se fazem certos despachos, não é por intervenção dos Ministros? O podér do Rei todos sabem que é exercido pelos Ministros, e portanto foi neste sentido que fallou e é como se póde fallar nesta Camara. Ninguem trouxe o nome do Rei para a discussão, póde-se trazer quando é para elogiar a sua pessoa, mas nunca é possivel tractar da pessoa do Rei, fallando em seu desabono, lançando-se-lhe qualquer culpa de que nunca é responsavel, por isso mesmo que os responsaveis são os Ministros. Seria elle orador o ultimo a praticar essa inconveniencia, porque respeita como qualquer membro desta Camara a Sua Magestade El-Rei, e ha de sempre mostrar que o sabe respeitar e defender. Fallou do Sr. Duque da Terceira, do Sr. Conde de Linhares, e do Sr. D. Carlos Mascarenhas, que estão ao serviço immediato do Governo; mas estes Dignos Pares não lhe deram procuração, pois elles tem voz, e tem mostrado que sabem usar della, e que presam devidamente a sua dignidade. Por consequencia não fez, como Par do Reino que é, mais do que usar de um direito, e o Sr. Presidente do Conselho não contestou esse direito, e deu a sua explicação. Deve porém dizer a S. Ex.ª que elle orador não pronunciou o nome do auctor do artigo publicado no Jornal do Commercio, porque entendeu que isso lhe não ficava airoso: lêa S. Ex.ª esse artigo que está assignado, e então conhecerá quem é tal individuo. Folgou comtudo em ouvir dizer ao Sr. Presidente do Conselho que não approva a doutrina daquelle artigo, e isto mostra que está nos bons principios...

O Sr. Presidente do Conselho — Permitta o Digno Par que o interrompa para rectificar o que disse, e foi, que não tinha conhecimento do artigo alludido, nem o Governo tinha nenhuma especie de affinidade com esse jornal, nem mesmo tinha o Governo pensado em tal; e accrescentei, que appellava para os Dignos Pares que são Officiaes-móres da Casa, para dizerem se não votavam livremente sobre os assumptos que se tractavam nesta Camara.

O Sr. Marquez de Vallada: observa a S. Ex.ª que não póde confiar em qual será a sua conducta no futuro, e muito menos depois de vêr que quer que a Camara fique satisfeita com as suas palavras.

O Sr. Presidente do Conselho — Quero que se fique entendendo bem qual é a minha opinião sobre o assumpto sujeito, é ella, que o Governo não tem nada com o artigo do Jornal do Commercio; pelo que respeitava á questão, que o Governo não tinha ainda tractado della, nem a tinha discutido: finalmente, que não havia ainda uma opinião formada do Governo a lai respeito.

O Sr. Presidente: dá por terminada esta interpellação. Antes de fechar a sessão recommenda ás commissões que organisem trabalhos que possam ser presentes, e deu para primeiro dia de sessão a proxima sexta-feira, sendo a ordem do dia leitura de pareceres.

Eram quatro horas e tres quartos da tarde.

Relação dos Dignos Pares que estiveram presentes na sessão de 14 de Dezembro de 1858.

Os Srs.: Visconde de Laborim; Duque da Terceira; Marquezes: de Ficalho, de Fronteira, de Loulé, das Minas, de Pombal, da Ribeira, e de Vallada; Condes: das Alcaçovas, da Azinhaga, do Bomfim, de Linhares, de Mello, de Penamacôr, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, do Sobral, e de Thomar; Viscondes: d’Algés, d'Athoguia, de Balsemão, de Benagazil, de Campanhã, de Castellões, de Castro, de Fornos de Algodres, da Luz, de Ovar, e de Ourem; Barões: de Pernes, de Porto de Moz, e da Vargem da Ordem; Mello e Saldanha, D. Carlos Mascarenhas, Sequeira Pinto, Pereira de Magalhães, Margiochi, Proença, Aguiar, Larcher, Brito do Rio, e Aquino de Carvalho.