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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 14 DE DEZEMBRO DE 1858

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. VISCONDE DE LABORIM, VICE-PRESIDENTE.

Secretarios, os Srs.

Conde de Mello

D. Pedro Brito do Rio.

As duas horas e meia, achando-se presente numero legal, declarou-se aberta a sessão. Leu-se a acta da precedente, que na conformidade do Regimento se julgou approvada, por não haver reclamação em contrario.

Deu-se conta da seguinte correspondencia:

Um officio do Ministerio do Reino, remettendo os esclarecimentos dados pela Camara municipal de Setubal, sobre o contracto da illuminação da mesma villa por meio de gaz.

Á commissão de fazenda.

— do Ministerio da Fazenda, remettendo 60 exemplares do relatorio do mesmo Ministerio. Mandaram-se distribuir. O Sr. Visconde d'Algés mandou para a mesa varias representações de Officiaes do Exercito, que pedem a esta Camara não approve o projecto de lei que veio da dos Srs. Deputados sobre promoções, porque elle fere os seus direitos. Estas representações são identicas a outras que tem sido presentes nesta Camara, e pede que sejam remettidas á commissão de guerra, como aquellas o foram.

O Sr. Barão de Porto de Mos tambem mandou para a mesa differentes representações de Officiaes do Exercito, que reclamam no mesmo sentido das que acabava de apresentar o Digno Par o Sr. Visconde d'Algés, e pede se lhes dê o destino conveniente.

O Sr. Presidente declara que todas estas representações vão para a commissão de guerra.

O Sr. Visconde de Castro toma a liberdade de enviar para a mesa o relatorio apresentado á Junta geral do districto do Porto pelo seu Governador civil o Sr. Barão do Vallado; e pede ao Ex.mo Sr. Presidente o obsequio de mandar distribuir pelos Dignos Pares os exemplares remettidos para tal fim.

Sabido é que os relatorios que este Governador civil costuma confeccionar são cheios de dados estatisticos, e de conhecimentos muito uteis para a agricultura, para o commercio, e para a industria, e muito proveitosos em geral: e por isto espera que a Camara os receba com especial agrado (apoiados).

O Sr. Presidente declara que os exemplares do relatorio serão distribuidos. Consulta a Camara se quer, que se declare na acta que o referido relatorio foi recebido com especial agrado.

(A Camara approvou.)

O Sr. Duque da Terceira expõe que a commissão de guerra deseja a presença do Sr. Ministro da Guerra para o ouvir sobre as providencias contidas no projecto de lei que veio da outra casa do Parlamento sobre promoções no Exercito, Roga pois se convide o Sr. Ministro a comparecer na commissão.

O Sr. Presidente declara que se dirigirá o competente convite ao Sr. Ministro da Guerra.

O Sr. Marquez do Pombal manda para a mesa differentes representações de Officiaes do Exercito, no mesmo sentido de outras muitas que já teem sido dirigidas a esta Camara, e pede sejam enviadas á commissão de guerra, aonde teem ido as outras.

O Sr. Presidente certificando ao Digno Par que se lhes dará esse destino, declara á Camara que se passa á ordem do dia, que é o parecer n.º 63, do theor seguinte:

Foi presente á commissão de guerra o projecto de lei n.º 57, que veio da Camara dos Srs. Deputados, estabelecendo que o artigo 1189 da Novissima Reforma Judiciaria seja applicavel aos réos militares, julgados militarmente em segunda instancia.

A commissão considerando os graves inconvenientes que resultam da execução do artigo 10 do Decreto com força de Lei de 9 de Dezembro de 1836, e que nenhuma desvantagem ou falta de garantias vem aos accusados militares da abrogação da alludida disposição, e da prescripção que em seu logar se estabelece; é de parecer que o referido projecto de lei n.º 57, que teve origem em proposta do Governo, deve ser approvado e submettido á Sancção Real para os devidos effeitos.

Sala da commissão, 3 de Dezembro de 1858. = Duque da Terceira = Conde de Santa Maria = Visconde da Luz = D. Carlos Mascarenhas = Visconde de Villa Nova d'Ourem.

Projecto de lei n.º 57.

Artigo 1.° O artigo 1189 da Novissima Reforma Judiciaria será applicavel aos réos militares, julgados militarmente em segunda instancia.

Art. 2.º Fica revogado o artigo 10 do Decreto de 9 de Dezembro de 1836, e a demais legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 13 de Agosto de 1858. = Manoel Antonio Vellez Caldeira Castello Branco, Deputado Presidente = Manoel Osorio Cabral, Deputado Secretario = Guilhermino Augusto de Barros, Deputado Secretario.

O Sr. Presidente expõe que este projecto é da iniciativa do Sr. Ministro da Guerra, mas como S. Ex.ª não está presente, não sabe se a Camara o quererá discutir.

O Sr. Presidente do Conselho participa que o Sr. Ministro da Guerra está doente: como porém o projecto é de pouca importancia, talvez a Camara não tenha duvida em o discutir.

O Sr. Conde de Thomar vê pelo que acaba de dizer o Sr. Presidente da Administração, que o seu collega da Pasta da Guerra está doente: deve comtudo observar, que no publico corre a voz de que S. Ex.ª não comparece nas Camaras porque pedíra a sua demissão, e lhe fóra acceita. Será. portanto conveniente que as Camaras fossem informadas do que ha a este respeito, se o Sr. Presidente do Conselho nisso não tiver duvida.

O Sr. Presidente do Conselho — Como é sabido o Sr. Ministro da Guerra tem a sua saude bastante deteriorada, e por essa causa tem instado pela sua demissão, tractando-se de o substituir.

O Sr. Presidente declara portanto em discussão o projecto que foi lido.

O Sr. Visconde d'Algés vê-se na necessidade de approvar este projecto, porque reconhece ser indispensavel o alterar a legislação actual, em virtude da qual o Ministerio publico fazia uma exigencia que dava grande trabalho, mas que era incompativel com a boa regularidade do serviço. Para que o Ministerio publico não esteja constantemente a pugnar, e com razão, por essa solemnidade em desempenho da sua obrigação, foi que o Governo entendeu que devia fazer a proposta tendente a alterar a lei nesta parte.

Não pedindo mais nenhum Digno Par a palavra, foi o projecto approvado na generalidade, e especialidade com a mesma redacção.

O Sr. Presidente põe em discussão o parecer n.º 64, cota o respectivo projecto, que é do theor seguinte:

Á commissão de guerra foi presente o projecto de lei n.º 76, que veio da Camara electiva, concedendo a quantia de 60$000 réis annuaes para falhas ao individuo que servir de Thesoureiro da Escóla Polytechnica, em quanto durarem os effeitos do emprestimo destinado á re-

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construcção do edificio, e da venda dos fóros e predios administrados pela mesma Escóla.

A commissão considerando -o maior trabalho de escripturação e grave responsabilidade que resultam ao emprego de que se tracta, da arrecadação das sommas emergentes do emprestimo de 100:000$000 réis, determinado pela Carta de Lei de 9 de Maio de 1857, e que é pratica geralmente seguida em todas as repartições abonar-se ao empregado encarregado do movimento dos fundos do respectivo cofre alguma quantia para falhas; achando regular áquella que se estabelece no projecto de lei em objecto, que teve origem em uma proposta do Governo; é de parecer que o dito projecto de lei deve ser approvado e submettido á Sancção Real. Sala da commissão, 3 de Dezembro de 1858. = Duque da Terceira —Conde de Santa Maria — Visconde da Luz—D. Carlos Mascarenhas— Visconde de Villa Nova d'Ourem.

Projecto de lei 76.

Artigo 1.° É concedida a quantia de 60$000 réis annuaes para falhas ao individuo que servir o logar de Thesoureiro da Escóla Polytechnica, em quanto durarem os effeitos do emprestimo destinado á reconstrucção do edificio, e da venda dos fóros e predios administrados pela mesma Escóla.

Art. 2.° Esta quantia será satisfeita pelo cofre do referido estabelecimento, e tirada da verba que fôr auctorisada para pagamento das despezas de administração do mencionado estabelecimento,

.Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, 18 de Novembro de 1858. = Manoel Antonio Vellez Caldeira Castello Branco, Deputado Presidente = Miguel Osorio Cabral, Deputado Secretario = Bernardino Joaquim da Silva Carneiro, Deputado Secretario.

O Sr. Conde de Thomar pede á illustre commissão lhe queira explicar, o que querem dizer as seguintes palavras — «em quanto durarem os effeitos do emprestimo destinado á reconstrucção do edificio.» Entendia que se devia dar uma gratificação em quanto durasse a obra, mas a obra póde concluir-se, e os effeitos deste projecto continuarem! Não acha isto regular, e até lhe parece ser isto mais do que quer a illustre commissão.

O Sr. Visconde de Ourem—Este projecto de lei tem origem n'uma proposta do Governo, que com muita justiça entendeu merecer a gratificação de que se tracta o empregado da Escóla Polytechnica que faz as vezes de Thesoureiro, o qual, além do vencimento de guarda, só tem a gratificação de um por cento do que rendem as matriculas e outros documentos que alli se passam, que é cousa insignificante.

A Carta de Lei de 29 de Maio de 1857, auctorisando um emprestimo de cem contos de réis para as obras da escóla, e a auctorisação que tambem se deu a esta para vender, e converter em titulos de dívida fundada os fóros e propriedades que possue, trouxeram um grande augmento de escripturação e responsabilidade ao empregado de que se tracta, que tem que receber e distribuir as quantias emergentes do já dito emprestimo, e dar o destino competente ás que resultarem das vendas dos fóros e propriedades!. Ora as obras da escóla podem acabar, e as recepções e transacções continuar, e por conseguinte continuar tambem o maior trabalho e responsabilidade do Thesoureiro, porque póde succeder que os fundos que se vão recebendo pelo emprestimo não sejam sufficientes para satisfazer ao desenvolvimento dos trabalhos, e as conversões determinadas não estejam concluidas quando aquelles acabarem.

Em quanto, pois, o empregado de que se tracta continuar com a responsabilidade que tem, entendo que deve receber a gratificação de réis 60$000 estabelecida no projecto, que me parece rasoavel, a qual ha de saír da verba que fôr auctorisada para despezas de administração. Digo que me parece rasoavel a gratificação em objecto, porque os fundos que deve gerir o empregado a quem elle se refere são consideraveis, e talvez não menores dos que estão a cargo dos Thesoureiros de outras repartições a quem se dá para falhas 100 e 120 mil réis.

O Sr. Visconde da Luz pedíra a palavra julgando que não se achava presente o Digno Par o Sr. Visconde de Ourem: mas visto que o estava, e pedíra a palavra e fallára, nada mais tinha a dizer.

Posto a votos o projecto, foi approvado na generalidade e especialidade, e a mesma redacção.

O Sr. Presidente declarou em discussão o parecer n.º 65, sobre o projecto de lei n.º 77, que são do theor seguinte:

Parecer n.º 65.

A commissão de guerra, sendo-lhe presente o projecto de lei n.º 77, que veiu da Camara dos Srs. Deputados, estabelecendo que ao Commandante do presidio do Castello de S. Jorge seja estabelecida uma gratificação annual de 240$000 réis, e aos Commandantes dos outros presidios do reino, actualmente existentes, a gratificação tambem annual de 120$000 réis, ficando os ditos Commandantes obrigados a satisfazer as despezas do respectivo expediente.

Considerando que a mencionada providencia regularisa despezas que por Lei não estão arbitradas, e tambem gratifica o maior trabalho e responsabilidade de Officiaes que fóra do serviço em objecto estariam em melhores condições a similhante respeito:

É de parecer que o dito projecto de lei n.° 77, que teve origem em proposta do Governo, deve ser approvado e submettido á Sancção Real para os devidos effeitos.

Sala da commissão, em 3 de Dezembro de 1858. = Duque da Terceira = Conde de Santa Maria = Visconde da Luz = Vis conde de Villa Nova de Ourem—D. Carlos de Mascarenhas.

projecto de lei N.° 77.

Artigo 1.º Ao Commandante do presidio do Castello de S. Jorge será abonada a gratificação annual de 240$000 réis, e aos Commandantes dos outros presidios do reino, actualmente existentes, se abonará uma gratificação tambem annual de 120$000 réis.

Art. 2.° Os Commandantes dos presidios ficam obrigados a satisfazer todas as despezas de expediente, como pela Regulação de 13 de Setembro de 1814 se acha determinado para os Commandantes dos corpos e companhias. - § unico. Estas disposições só terão logar quando taes commissões forem exercidas por Officiaes reformados.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 27 de Novembro de 1858. = Manoel Antonio Vellez Caldeira Castel-Branco. Deputado, Presidente = Miguel Osorio Cabral, Deputado, Secretario = Bernardino Joaquim da Silva Carneiro, Deputado, Secretario.

O Sr. Presidente declara ser este projecto de lei tambem da iniciativa do Ministerio da Guerra, e julga portanto estar nas mesmas circumstancias do outro.

O Sr. Conde de Thomar deseja saber a quanto montará a despeza resultante da approvação deste projecto? Faz esta pergunta por que vê que nelle se diz: — e aos Commandantes dos outros presidios do reino, actualmente existentes. — Por conseguinte, tracta-se de uma nova despeza, e deseja saber a quanto monta, por isso que se não diz qual o numero dos Commandantes dos presidios.

O Sr. Visconde de Ourem—Os presidios são quatro, e sendo a gratificação do Commandante de um 240$000 réis, e a dos outros tres 120&000 réis cada um, segue-se que a despeza total annual será de 600$000 réis. Posto á votação o projecto, foi approvado na generalidade e especialidade e a mesma redacção.

Seguiu-se o parecer n.º 66. e respectivo projecto n.º 80, que são do theor seguinte: Parecer n.º 66.

A commissão de guerra, sendo-lhe presente o projecto de lei n.º 80, que veio da Camara dos Senhores Deputados, estabelecendo que ao Official do Exercito, que se achar no exercicio de Commandante militar de Coimbra, pertence a gratificação que por Lei estiver designada para a sua patente, e que pelo importe da mesma gratificação satisfará as despezas do expediente do respectivo governo militar;

Considerando que, na hypothese de ser necessaria a conservação do logar de Commandante militar de Coimbra, como affirma o Governo, é de justiça que o Official que exercer a referida commissão tenha a gratificação de commando correspondente á sua patente:

É de parecer que o mencionado projecto de lei n.º 80 deve ser approvado, e submettido á sancção real para os effeitos competentes.

Sala da commissão, em 3 de Dezembro de 1858. —Duque da Terceira = Conde de Santa Maria — Visconde da Luz—D. Carlos Mascarenhas Visconde de Villa Nova de Ourem.

Projecto de lei N.° 80.

Artigo 1.° Ao Official do Exercito que se achar no exercicio do Commandante militar da cidade de Coimbra pertence a gratificação que por Lei estiver estabelecida para a sua patente, e pelo importe da mesma gratificação satisfará as despezas de expediente do respectivo governo militar.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 29 de Novembro de 1858. = Manoel Antonio Vellez Caldeira Castello Branco, Deputado, Presidente — Miguel Osorio Cabral, Deputado, Secretario Bernardino Joaquim da Silva Carneiro, Deputado, Secretario.

O Sr. Conde de Thomar quando vê que projectos desta ordem vão passando na outra Camara sem opposição, ou reflexão alguma, augmentando-se assim a despeza publica, e por conseguinte os encargos do Estado, não sabe se nesta Camara os Dignos Pares poderão pôr grandes duvidas á sua approvação, sem que por isto elle orador queira negar o direito que esta casa tem de usar de tal prerogativa; mas lamenta que a maior parte dos projectos apresentados durante esta sessão sejam para augmentar a despeza do Estado (Uma voz—Ouçam, ouçam).

Não quer elle orador se diga que pediu a palavra para fazer opposição a pertenções particulares, ou de quaesquer individuos; no entanto não póde deixar de dizer que, a respeito deste projecto, tem uma duvida, duvida que lhe suscitou o parecer da illustre commissão, porque lhe parece que os membros, signatarios do parecer, não querem tomar a responsabilidade de ser necessario o commando militar de Coimbra, porque dizem que—na hypothese de ser necessario o commando militar de Coimbra—se dê a gratificação! Elle orador não sabe quem é a pessoa que serve actualmente esse logar; mas. mesmo quando o conhecesse, entende que a pessoa nada póde influir para a approvação ou rejeição da medida. Parece-lhe que a justiça pede que se não julgue necessario o commando militar de Coimbra, onde apenas ha um destacamento commandado por um Official superior (O Sr. Visconde da Luz—Nada). Então razão de mais para não ser alli necessario Governador, tanto mais quando todos sabem que Coimbra é uma terra, onde não costuma haver força militar, sendo sómente occupada com essa força em occasião de crise ou de guerra. Ora, sendo assim, para que nomear para alli um Governador com uma gratificação correspondente á sua patente? De modo que se fôr um Tenente General, como ha de ter uma gratificação correspondente á sua patente, ahi fica uma grande despeza inutil (O Sr. Visconde da Luz—Nada.) Nada? (continua o orador) Pois o Governo por ventura está inhibido de nomear esse Tenente General? Julga que não; logo como elle ha de ter uma gratificação correspondente á sua patente, ahi fica essa grande despeza inutil, e que é na verdade uma bella sinecura, para a qual, porém, não concorrerá, pelas razões que deixa expostas, ás quaes espera que responda o Sr. Presidente do Conselho, ou qualquer dos membros da commissão de guerra.

No entanto não deixará de concordar em que se nomeie um Commandante militar, mas de patente com que se evite a tal sinecura que reprova.

O Sr. Visconde de Ourem—Sr. Presidente, o meu nobre amigo o Sr. Conde de Thomar, com áquella perspicácia que lhe é propria, e que todos lhe reconhecem, não deixou passar sem pedir explicação as palavras do parecer—na hypothese de ser necessaria a conservação do logar de Commandante militar de Coimbra. — Eu lhe darei a dita explicação.

Este projecto teve origem n'uma proposta do Governo, o qual declarou que, em quanto não houve Commandante militar em Coimbra, não existiu nunca regularidade na escripturação, nem o serviço alli se fez como devia, e convinha ser feito; e tambem que por Coimbra ha frequente passagem de tropa, e o Official que alli se acha commandando tem necessidade de manter uma correspondencia muito activa com o General da respectiva divisão militar, e outras auctoridades. A commissão de guerra, portanto, julgando o Governo competente juiz na materia, não duvidou approvar no seu parecer a exigencia; porém alguns dos seus membros, e eu sou um delles, não teem a convicção de ser indispensavel Commandante militar em Coimbra. Esta é a razão por que a commissão formulou o seu parecer pela fórma por que está concebido. Se ha necessidade de haver Commandante militar em Coimbra, é mister dar-lhe a gratificação correspondente ao seu posto.

O Sr. Visconde da Luz principia por onde o Sr. Conde de Thomar acabou o seu discurso, reconhecendo tambem a inconveniencia de mandar para commandante militar de Coimbra um Tenente-general; mas acredita que o Governo não ha de nomear um Official desta graduação para aquelle commando, e nunca alli esteve um Marechal de Campo senão em 1846, por estar o paiz em circumstancias extraordinarias. O costume é sempre um Major ou Tenente-coronel, porque estas commissões são desempenhadas por Officiaes dos corpos do Exercito, e não se tira um Coronel do seu regimento para ír exercer aquellas funcções.

Não se oppõe a que se declare no projecto a idéa do Digno Par, entretanto tem o inconveniente de voltar á outra Camara com essa emenda, e atrazar-se o negocio por algum tempo. Em quanto a S. Ex.ª dizer, que o destacamento era commandado por um Capitão, deve observar que havendo em Coimbra dois destacamentos, um de Infanteria e outro de Cavallaria, é necessario uma patente superior para os commandar, porque ou elles hão de tractar da disciplina do seu destacamento ou do governo militar de Coimbra, que tem muitas cousas a seu cargo, por ser um ponto principal por onde passam tropas todos os dias, e necessitar de um Commandante militar que seja alheio ao serviço dos destacamentos. Sabe elle orador, por experiencia, que não convem que este commando seja dado aos Commandantes dos destacamentos, principalmente quando elles são de differentes armas, porque o Commandante do destacamento de Infanteria não obedece ao Commandante do destacamento de Cavallaria e vice-versa. Entretanto o projecto não diz que este commando é permanente, e se o Governo vir que é desnecessario, como já succedeu, o Commandante militar é o Commandante do corpo que estiver em Coimbra, e neste caso prescinde do Governador militar. Mas quando alli estiverem dois destacamentos de armas diversas, é necessario uma patente que os commande, e portanto approva este parecer e o respectivo projecto.

O Sr. Presidente do Conselho — Sr. Presidente, o Digno Par que acabou de fallar, preveniu-me quasi completamente. Eu queria dizer ao Sr. Conde de Thomar que este commando não é permanente, e já por vezes se tem suspendido, mas as circumstancias a que alludiu o Digno Par exigem que haja um Commandante militar em Coimbra, e entretanto não vejo inconveniente em adoptar a emenda que propoz o Sr. Conde de Thomar.

O Sr. Marquez de Ficalho por um escrupulo igual ao que apresentou o Sr. Conde de Thomar, é que elle orador não tem pedido a palavra ha muito tempo nesta Camara, sobre estes projectos de despezas, que consecutivamente se apresentam desde o principio da sessão até ao fim. Quando se deve zelar as bolsas dos contribuintes, vê sempre da parte do Ministerio uma approvação para todas estas despezas. As suas observações não são mais do que um protesto contra este estado de cousas.

Não se refere agora intrinsecamente ao caso especial, mas servir-lhe-ha elle de thema para o que tem a dizer. Tracta-se de um Governador militar em Coimbra. Qual é a guarnição de Coimbra? É um Capitão com quarenta homens! Para que é preciso então esse Commandante militar? Elle orador, porém, vai ainda mais longe: entende que as finanças do paiz estão hoje n'uma situação tão grave, que é muito difficultoso saír das nossas necessidades absolutas, e então qualquer augmento de despeza que se faça, sem a verba de receita destinada para a sua applicação, é uma grande inconveniencia (apoiados). Os orçamentos trazem ordinariamente um mal terrivel comsigo, que é o pouco credito que apparece na verdade da receita e despeza publica. Esse mal vai-se aggravando todos os dias, e daqui a pouco não chegarão as sommas votadas no orçamento para as necessidades ordinarias do paiz, nem para estradas, canaes, aterros, desaterros e todas quantas obras ha de utilidade publica. Portanto entende em sua consciencia, que se o Governo não tiver a coragem de fazer dois orçamentos, um que apresente as necessidades ordinarias do paiz, e outro que diga quaes os meios extraordinarios que necessita para obras, em pouco tempo o paiz se encontrará n'uma situação a mais deploravel do mundo (apoiados). Não tencionava elle orador aproveitar-se desta occasião para fazer estas observações, mas estava-lhe fazendo mal votar constantemente, desde que se senta na sua cadeira de Par, uma e outra despeza sem se apresentar a receita que lhe ha de fazer face; e então, se bem que não sairá fóra da ordem da discussão, porque a ordem della é o bem do seu paiz (apoiados), seja-lhe permittido dizer, com» vê os negocios publicos. Vê que os rendimentos chegam apenas para as obrigações necessarias. Estas deviam ser primeiro creditadas, e depois o Governo dissesse: se quereis estradas pagai; quereis caminhos de ferro, augmentar a receita para satisfazer a estas despezas; apresentando porém em todo o caso, sempre, os respectivos orçamentos; mas orçamentos verdadeiros na sua applicação, e não que sirvam de pretexto, porque o Governo diz: dai dinheiro para estradas, todos pagam porque presuppõem que vai para estradas e outros melhoramentos publicos, mas ás vezes dá-se-lhe outra applicação. Isto tambem é preciso evitar, e aqui está para o que requer a verdade nos orçamentos, porque sendo elles verdadeiros, se o paiz quer (como entende que deve querer), todos os melhoramentos que precisa, e neste caso sómente se serve hoje da phrase: que póde e deve pagar mais; deve applicar-se o que elle pagar para o fim a que é destinado, (apoiados).

Não sabe quem está commandando em Coimbra; mas a sua consciencia lhe diz que se está um general deve estar um administrador. Desejava elle orador vêr os nossos generaes, que são muito habeis, n'um acampamento ou á testa dos corpos, porque assim é que póde haver exercito, e não fazendo o serviço de policia; porque do modo como isto está não ha exercito nem policia (apoiados). Queria vêr em Coimbra um administrador, e não sabe como os tribunaes lá estão, mas tendo bom administrador e tribunaes que castiguem a tempo e a horas não se precisa de um Governador militar. Deseja vêr as cousas nos seus logares, e pede perdão á Camara de ter saído fóra da ordem, mas tinha necessidade de fazer estas observações, e para isso aproveitou a occasião (apoiados).

O Sr. Visconde de Athoguia sentiu ouvir dizer ao Digno Par que orava fóra da ordem, porque elle orador entende que não o esteve, e por sua parte andará então fóra da ordem continuando nas observações que S. Ex.ª acabava de fazer. Nos paizes onde os orçamentos estão bem organisados não apparece uma despeza, que não venha logo a receita para a satisfazer. Que quer dizer dar sommas constantemente quando os orçamentos estão feitos? Quer dizer que estas despezas não são pagas, ou são applicadas para o seu pagamento outras sommas que teem um destino diverso.

Quando elle orador deixou a administração de que fez parte tinha levado as economias em todas as repartições dos dois ministerios a seu cargo, ao ponto possivel a que se podiam levar. Saiu com muita esperança, de que os cavalheiros que o substituíssem fizessem ainda mais, pois que, o partido que hoje apoia o Governo não deixava passar então um só dia que não dissesse que queria economias. Agora, porém, esse partido está constantemente na outra casa do Parlamento votando novas despezas (apoiados), e até pedindo algumas semanas, não para principios, mas para individuos (apoiados).

Está persuadido que o nobre Presidente do Conselho ha de trazer ás Camaras uma ingerencia directa e activa no exame dos orçamentos em todas as verbas de receita e despeza publica. Espera que este anno se começará a fazer o exame minucioso de todas as despezas, e não como até agora tractar-se unicamente de votar como até agora ignorando-se o que se vota. (O Sr. Marquez de Vallada—Muito bem). Desde já previne o Sr. Presidente do Conselho (e não é opposição que lhe faz, porque a quaesquer que sejão os cavalheiros que se sentem nas cadeiras dos Srs. Ministros ha de elle orador fallar a mesma linguagem) que é necessario que os Srs. Ministros compareçam nas commissões para se saber quaes foram as alterações que a mais ou menos fizeram no respectivo orçamento. Pelo rapido exame que tem feito nos ultimos orçamentos vê augmento de despezas. Entende que deve, primeiro que tudo, haver um orçamento verdadeiro em que se saiba com exactidão qual a receita que ha e a despeza que se faz, e não estarem a apparecer todos os dias propostas de augmentos e despezas novas, muitas vezes sem se saber qual a receita que lhes ha de fazer face. O orçamen te deve em tudo ser uma verdade.

Sobre o projecto em discussão, convidaria comtudo o Sr. Conde de Thomar, a que não insistisse na sua proposta, porque pelo menos deve-se contar com a moralidade do Governo, qualquer que seja, e esperar que não mandará para Governador militar de Coimbra em tempo de paz, um Official General, e se tal acontecer o Governo fica com a responsabilidade do acto. Até espera que o Sr. Presidente do Conselho informará o seu collega do que se passou nesta discussão. Reserva-se finalmente, votado que seja o projecto, para pedir contas ao Governo da sua execução, e na occasião da discussão do orçamento, perguntar ao Sr. Ministro da Fazenda quaes são os meios que conta obter para occorrer a todas estas despezas novas e accrescentamento de outras que todos os dias, por assim dizer, se estão propondo sem se estabelecer a correspondente receita.

O Sr. Conde de Bomfim—Em parte daquillo que eu me propunha dizer fui prevenido pelo Digno Par que acabou de fallar, mas farei ainda algumas declarações á Camara, para de algum modo se removerem escrupulos que eu vejo que existem.

Em quanto á verba para fazer face a esta despeza, ella existe no orçamente do Ministerio da Guerra, este Ministerio é obrigado a despezas tão extraordinarias e incalculaveis, que ha nelle uma verba bastante avultada para despezas eventuaes, ora, é dessa verba que o Ministerio da

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Guerra ha de applicar os fundos que deverem ser dados para gratificações e outras despezas extraordinarias quando se apresentam circumstancias, em que seja indispensavel fazer essa despeza, e uma dessas é certamente esta de ter um Governador militar em Coimbra; mas accresce que essa despeza não póde ser tão avultada como se inculcou porque o Governo não póde de maneira alguma empregar um Official General em Governador militar de Coimbra, porque o regulamento do exercito designa os logares em que podem ser empregados os Officiaes Generaes, salvo se se infringirem os regulamentos militares, por tanto já se vê, que ha de ser um official de patente menor, aquelle a quem se ha de confiar semelhante encargo, concedo que seria melhor e mais conveniente dizer-se a patente, uma vez que se podesse calcular o serviço que alli haveria, mas isso é incalculavel, pela razão que deu o meu collega e amigo o Sr. Visconde da Luz, porque certamente ha sempre por alli um tal ou qual movimento de tropas, e dão-se outras circumstancias extraordinarias que fazem necessaria a presença de um Official de patente maior do que a do Commandante do destacamento, que quasi sempre alli se acha, por consequencia existindo, como disse, uma verba para despezas extraordinarias, e vendo-se que o nomeado nunca póde ser de uma patente tão superior como parecia recear-se que podesse acontecer, é claro que tem cessado, ou devem pelo menos cessar todos os escrupulos, pela approvação desta medida.

O Sr. Conde de Thomar expôz que esta discussão mostra que não deixou de ser proveitoso o expender elle orador algumas considerações por occasião deste projecto. Pede ao Governo que não deixe de se lembrar das observações que apresentou o Sr. Marquez de Ficalho, sobre o nosso estado. Em verdade, quando as finanças se acham no ponto que todos sabem, e que elle orador não deseja aggravar mais, apresentando considerações que poderiam retratar mais ao vivo esse estado, deve o Governo fazer da sua parte quanto possivel para não augmentar as despezas publicas sem motivo justificado. Neste caso concorda com o Digno Par, que não se tem mostrado nem da parte do Governo nem da commissão, a necessidade deste logar, antes pelo contrario, se se attender bem ao que se tem dito, ha de-se concluir que o serviço publico não perigava, nem tinha prejuizo algum, se pôr ventura deixasse de existir esse Ioga; mas visto que o Governo o não entende assim, forçoso é que a Camara, como acaba de dizer o Sr. Visconde de Athoguia, vote ao official que alli se acha a gratificação correspondente á sua patente. Não concorda porém com o que disse o Digno Par o Sr. Conde de Bomfim (apoiados), que achando-se no orçamento uma verba para despezas extraordinarias, é dessa verba que ha de saír a gratificação. Entende pelo contrario que as despezas extraordinarias a que o orçamento manda attender não são as de um commando militar (apoiados), e que desde que a Lei tiver creado um Governador militar em Coimbra, ha de ser, não dessa verba mas do orçamento, que deve saír a gratificação (apoiados). Já se vê assim que nesta parte mesmo os dignos membros da commissão não estão de accôrdo, porque em quanto uns entendem que a despeza deve saír das despezas extraordinarias, outros julgam pelo contrario. Elle orador não é militar, e por consequencia não lhe póde ser estranhado que não esteja bem presente no que dispõem as Leis e Regulamentos militares a respeito dos logares que podem ser exercidos pelos Officiaes Generaes, mas affigura-se-lhe que (passando este projecto como está, o Governo não fica inhibido de nomear um Brigadeiro ou Marechal para Commandante militar de Coimbra; e se é exacto o que tem ouvido a pessoas competentes, deve entender que o Governo fica em ampla liberdade de o fazer. Disse o Digno Par o Sr.s Visconde da Luz, que não era de esperar que o. Governo tal fizesse, e S. Ex.ª que é muito versado nas Leis e Regulamentos militares, se entendesse que existia expressamente a prohibição, de certo se teria referido a isso; mas como diz só que não é de esperar que o Governo o faça, deverá tambem entender-se pelo que S. Ex.ª disse, que nem os Regulamento nem as Leis militares prohibem neste caso que o Governo nomeie para tal commissão um Official General.

Tambem são exactas as asserções do Sr. Visconde d'Athoguia, de que essa bandeira das economias, que serviu n'outras épocas para combater outro Ministerio por homens que hoje não se podem deixar de julgar da situação, essa bandeira anda hoje de rojo pelo pó, porque se vão votando diariamente despezas novas, e augmentando as que existem; e sabem se considerar o que é o orçamento de hoje e o que era n'outros tempos, ha de-se vêr que as despezas teem augmentado consideravelmente. Elle orador não sabe se a Camara terá tempo para discutir o orçamento como convem; mas não é da opinião do Digno Par de que se deve reservar pára essa occasião pedir contas ao Governo, pois que se, por exemplo, se entende que esta medida não é necessaria, é agora a occasião de se opporem os Dignos Pares a que tal se faça. Que hão de fazer as Camaras depois de votado este projecto? Desde que se vota a medida não se podem negar os meios, e portanto é esta a occasião opportuna de lhe fazer opposição, e não depois, quando vier o orçamento (apoiados). Foi por entendel-o assim que apresentou as suas considerações a tal respeito; mas desde que os Dignos Pares que são militares dizem que não se hão de verificar os receios de haver nisto uma sinecura, ou nomeação de algum Official General para tal logar, contentar-se-ha com uma emenda na Lei, marcando-se até que patente póde ter logar esta nomeação em tempo de paz, pois que em tempo de guerra poderá considerar-se aquelle um ponto estrategico em taes circumstancias que se torne então necessario nomear um Official de patente muito mais superior. Qualquer que seja pois a sorte da emenda passa a escrevel-a para a mandar para a Mesa, pois deseja sempre concorrer quanto possa para a moralidade na execução das Leis, não deixando nellas uma porta aberta para que um dia o Governo, qualquer que seja, possa abusar.

Leu-se o additamento, que é do theor seguinte, e foi admittido á discussão:

«Não poderá ser nomeado Governador militar de Coimbra, em tempo de paz, Official de patente superior á de Tenente-coronel. Camara dos Pares, 14 de Dezembro de 1858. = Conde de Thomar.»

O Sr. Visconde de Ourem — Acerca do que disse o Digno Par o Sr. Conde do Bomfim, e sobre as observações do Digno Par o Sr. Conde de Thomar, devo dizer que em quanto não passar este projecto de lei, o Governo póde da verba para as despezas eventuaes pagar a despeza que fizer com o Commandante militar de Coimbra; mas desde o momento em que passar este projecto de lei, deve haver no orçamento uma verba especial para tal despeza. Sou porém informado de que até agora não se tem pago a gratificação de que se tracta.

Quanto á conveniencia e necessidade de haver Commandante militar em Coimbra, é minha opinião, como já disse, que não ha similhante necessidade. Posso porém estar em engano; e é certo que o Governo é de differente sentir, affirmando que quando não tem havido Commandante militar em Coimbra o serviço tem marchado muito mal, e tem havido desordens e conflictos.

Em vista destes motivos, Sr. Presidente, acceitando as razões que o Governo dá, a consequencia é que se deve dar a gratificação competente ao Official que exercer o Commando em questão. Pelo que respeita á patente que ha de ter esse Official, entendo que ella não póde deixar de ser inferior á patente do Commandante da respectiva Divisão militar, mas que esta é a só condição. Disse porém o Digno Par o Sr. Conde do Bnmfim, que o Governo não póde nomear um Official General para Commandante militar de Coimbra, porque a isso se oppõe o plano da organisação do Exercito, que designa os serviços em que devem ser empregados os Officiaes Generaes. Permitta-me o meu digno collega que lhe observe que a prescripção a que allude nunca foi observada: lá está em Coimbra servindo de Governador civil um Official General, não obstante ser contra o Plano, e tem feito muito bom serviço; os Capitães tambem segundo o Plano são para commandarem companhias, e muitos estão servindo de administradores de concelhos; os subalternos tambem teem obrigações determinadas nos corpos e oitenta e tantos estão empregados nas obras publicas, e na commissão de pesos e medidas, etc... O melhor é não tractar desta materia. Concluo dizendo por parte da commissão de guerra, que não posso acceitar a emenda do Digno Par o Sr. Conde de Thomar, sem que o projecto volte á commissão.

O Sr. Conde do Bomfim—Na presença do que acabou de dizer o Digno Par o Sr. Visconde de Ourem, acha-se comprovada a asserção que eu fiz, isto é, que pelo regulamento militar, se acham designados tanto as patentes, como o vencimento que hão de ter os militares em certos e dados serviços, e então é evidente que o Governo não póde nomear um Official General para o Commando militar de Coimbra, pois que estão designados, no Regulamento do Exercito, quaes os Commandos, Governos, e serviços em que devem ser empregados os Officiaes Generaes, e as gratificações que devem receber, e não entra nesse numero o Governo de Coimbra. Apesar disso confesso que seria bom introduzir tal qual no projecto a emenda do Digno Par o Sr. Conde de Thomar, mas occorre-me que as circumstancias podem variar muito, e em vista dellas ser necessario nomear para aquelle commando um Official de maior ou menor patente; sendo Official superior pouca differença faz a differença da patente. Mas o que o Governo não podia, em rigor, era abonar gratificação a um Commando ou Governo, para o qual não está designado que linha gratificação.

Agora direi pelo que respeita á gratificação, que me parece, que não fui entendido no que disse, e por isso o vou esclarecer. É minha opinião, que em quanto não passar esta Lei, como já disse, o Governo não póde em circumstancias normaes dar a gratificação de commando ao Official a quem der aquelle Governo, mas desde que fôr approvado o projecto póde tirar da verba — despezas eventuaes — a somma precisa para pagar esta gratificação, independentemente! de votar-se uma verba especial pára esse pagamento, pois que feito deste modo não augmenta a despeza do orçamento do Ministerio da Guerra. Finalmente pelo que respeita á emenda que foi mandada para a Mesa, sou da mesma opinião do meu collega o Sr. Visconde de Ourem, vá ella á commissão, e lá se tractará de a examinar.

O Sr. Presidente declara que á indicação que o Digno Par o Sr. Conde de Thomar mandou para a Mesa, chama additamento, e não emenda.

O Sr. Visconde d'Athoguia pede a palavra por lhe parecer que o Digno Par o Sr. Conde do Bomfim combateu o que elle orador dissera, e que repete, a saber: que da verba de despezas eventuaes não é que se deve tirar a somma precisa para pagar a gratificação ao Commandante militar de Coimbra; para essa despeza deve forçosamente votar-se uma verba especial, verba que vai augmentar a despeza publica. No orçamento estão indicadas todas as despezas que se hão de fazer, uma por uma, e as que lá não estiverem não se podem pagar. Lá estão tambem votados quarenta contos de réis para despezas eventuaes do Ministerio da Guerra, mas dessa somma não póde o Governo dispor senão para aquellas que pertencem a essa cathegoria: logo o que avançou o Digno Par o Sr. Conde do Bomfim não é exacto.

Elle orador devia contentar-se com a resposta que deu o Digno Par o Sr. Conde de Thomar ao Digno Par o Sr. Conde do Bomfim, mas como vê que S. Ex.ª não adopta esses bons principios, não póde deixar de lhe dizer que não está pela seu theoria, por que se ella passasse em julgado, a consequencia seria contraria aos bons principios. Não usaria agora da palavra, se não visse a insistencia que fez o Digno Par o Sr. Conde do Bomfim, contra as observações que adduziu. Pelo que respeita ao additamento offerecido pelo Digno Par o Sr. Conde de Thomar, entende que deve ser remettido á commissão de guerra.

O Sr. Visconde de Ourem — Parece-me que tudo se podia conciliar, fazendo-se uma pequena alteração no artigo 1.º do projecto. Estou seguro de que o Governo não mandará um official general para o commando militar de Coimbra; todavia, apesar disso, entendo que a alteração que proponho acabará todas as duvidas.

O Sr. Visconde d'Algés, sobre a ordem, parece-lhe que o mais regular seria esta Camara enviar á commissão tanto a emenda, como o projecto de lei (apoiados), a fim de que alli a mesma emenda seja adoptada, ou modificada, e depois se apresente novo parecer, que será discutido, podendo o projecto dentro de pouco tempo voltar á outra Camara. É o que lhe parece mais conforme á pratica, e mesmo mais regular (apoiados).

O Sr. Presidente fez lêr na mesa a emenda do Digno Par o Sr. Conde de Thomar. e o seguinte requerimento do Sr. Visconde de Ovar:

«Proponho que o additamento do Digno Par Conde de Thomar ao artigo 1.º do projecto n.º 80 vá com o dito projecto á commissão de guerra para dar sobre elle o seu parecer. = Visconde de Ourem.»

Posto este á votação foi approvado.

O Sr. Conde do Bomfim — Eu tinha pedido a palavra para me explicar.

O Sr. Presidente expõe que a discussão está acabada.

O Sr. Conde do Bomfim — Pois V. Ex.ª não me ha de dar a palavra para eu me explicar?

O Sr. Presidente expõe que houve um requerimento do Digno Par o Sr. Visconde de Ourem para que a emenda do Digno Par o Sr. Conde de Thomar fosse á commissão, e logo o Digno Par o Sr. Visconde d'Algés propoz que, em vista daquelle requerimento, lhe parecia mais regular que a emenda e o projecto fossem enviados á commissão; a Camara annuiu; e por conseguinte acabou a questão em quanto não vier novamente á discussão.

O Sr. Conde do Bomfim — Mas eu peço a palavra para uma explicação pessoal.

O Sr. Presidente neste caso concede a palavra ao Digno Par.

O Sr. Conde do Bomfim — Sr. Presidente, a explicação que eu tenho a dar é para corroborar o que já disse, e mostrar ao mesmo tempo que a doutrina por mim estabelecida não é anti-parlamentar, como pertendeu mostrar o Digno Par o Sr. Visconde d'Athoguia. Eu disse, e repito, que os commandos militares são dados segundo a ordem e graduação que estão marcadas; que se o Governo não estava auctorisado a dar essa gratificação ao official nomeado commandante militar de Coimbra, se lha tivesse dado havia ter necessariamente tirado essa quantia daquella verba das despezas eventuaes, que se acha no orçamento do Ministerio da Guerra, porque o Governo póde fazer qualquer despeza quando mesmo não tenha sido especialmente votada, visto que lá vai a verba das despezas eventuaes, e é desta verba que ha de saír a somma que agora se propõe, de modo que se o projecto de lei passar, e a somma fôr votada, quando aqui vier o respectivo orçamento, nessa verba das despezas eventuaes ha de se abater a quantia que nós votarmos por este projecto, visto que o Governo fica auctorisado a dar uma gratificação de commando em governo para o qual a lei não marcára gratificação, e que por isso que se deve propôr que não é permanente, póde muito bem ser paga pela verba das despezas eventuaes, e sem que consequentemente seja necessario augmentar-se a somma do orçamento do Ministerio da Guerra. Esta doutrina não me parece que seja anti-parlamentar, nem julgo que possa cahir na presença dos principios constitucionaes, pois que é impossivel em um Ministerio, em que ha tão repetidas vezes necessidade de se fazerem despezas eventuaes, estar designada em verba especial cada uma dellas.

O Sr. Presidente do Conselho—Sr. Presidente, pedi a palavra para dizer ao D. Par o Sr. Marquez de Vallada que, pela segunda vez, me declaro prompto para responder ás duas interpellações que S. Ex.ª annunciou desejar fazer-me; previnindo a V. Ex.ª e a Camara, que a discussão de resposta ao Discurso da Corôa vai começar ámanhã ou depois na outra Camara, e que durante essa discussão não me será talvez possivel vir aqui responder ao Digno Par.

O Sr. Marquez de Vallada declara não estar previnido nesta occasião para fazer as suas interpellações, porque segundo as formulas e as boas praticas dever-se-ia ter marcado o dia em que ellas teriam logar, o que se não fez, mas espera que se faça, porque deseja estar previnido, para então podér lêr em pleno parlamento documentos importantissimos. Não está acostumado a recuar; e póde dar a todos a certeza de que embora se continue com os mesmos meios até agora empregados de ameaças torpes e vis, elle orador não tem medo; está previnido para dentro e fóra desta Casa mostrar que nenhum cuidado lhe dão essas ameaças.

Como o Sr. Presidente do Conselho declarou que não poderá vir ámanhã, nem depois a esta Camara, pede o orador ao Sr. Presidente que, segundo os estylos desta Casa, designe, quando entender conveniente, o dia em que devem ter logar as suas interpellações ácerca das sociedades secretas, e dos Officiaes-móres da Casa Real, previnindo igualmente o Sr. Presidente do Conselho de Ministros.

O Sr. Presidente do Conselho—Se os documentos que faltam ao Digno Par são unicamente relativos a uma das interpellações, parecia-me que poderia verificar-se a outra.

O Sr. Conde de Thomar expôz ter feito havia tempo dois requerimentos, que haviam sido approvados pela Camara, e remettidos ao Governo; ambos elles importantes. Era um relativo á publicação dos relatorios do Conselho superior de instrucção publica, dos lyceos, e dos Commissarios de estudos, porque sendo a instrucção publica um ponto importante, do qual o Corpo legislativo brevemente se ha de occupar, é necessario que esteja habilitado para entrar na materia com perfeito conhecimento de causa. No entanto sendo já ha tempo remettido o seu requerimento ao Governo, não lhe consta que até agora tenha no Diario do Governo apparecido publicação alguma a tal respeito, e neste caso deseja saber se o Sr. Ministro do Reino, põe alguma difficuldade á publicidade desses relatorios.

O outro requerimento era sobre estatisticas relativas á emigração, porque a respectiva commissão declarou que carecia destes documentos, para avista delles emittir a sua opinião sobre o projecto apresentado pelo Digno Par o Sr. Silva Sanches. E o Sr. Ministro dirá se a respeito destes tambem ha alguma duvida.

O Sr. Presidente do Conselho—-.Sr. Presidente, pelo que diz respeito aos relatorios do Conselho superior de instrucção publica, dos Conselhos dos lycêos, e do Commissarios dos estudos, direi que eu já ordenei a sua publicação; mas não posso neste momento informar o Digno Par dos motivos pelos quaes já se não teem publicado.

Em quanto aos dados estatisticos, estão-se colligindo para serem remettidos a esta Camara.

O Sr. Conde de Thomar agradece ao Sr. Presidente do Conselho o ter dado andamento aos alludidos requerimentos.

Quanto ao primeiro é da maior urgencia, porque os relatorios a que se refere, feitos pelas pessoas mais competentes, podem dar grandes esclarecimentos sobre as necessidades que ha a satisfazer na instrucção publica.

Agora, em quanto ao segundo, como S. Ex.ª diz que se estão colligindo os dados estatisticos, espera que se collijam todos para serem remettidos.

O Sr. Visconde d'Algés como o Sr. Presidente do Conselho acaba de prometter que, com a maior brevidade, serão remettidos á Camara os dados estatisticos, e esclarecimentos relativos á emigração, pede a S. Ex.ª que tenha tambem em consideração o requerimento feito pela commissão de legislação sobre o projecto apresentado pelo Digno Par o Sr. Silva Sanches, ácerca da moeda falsa, porque os esclarecimentos pedidos não dependem só da Secretaria da Justiça, mas tambem da do Reino, e a ambas foi remettido o requerimento da commissão de legislação.

O objecto é grave e importante, e não deseja a commissão que sobre a Camara dos Dignos Pares pese a responsabilidade de não tractar quanto antes desse assumpto.

O Sr. Presidente expõe que o Digno Par o Sr. Marquez de Vallada tem a fazer duas interpellações; sobre uma não está agora prompto, que é ácerca das sociedades secretas; mas para a outra creio que está prompto? ¡0 Sr. Marquez de Vallada— Sim, Sr.)

Por conseguinte se a Camara convem dá a palavra ao Digno Par.

(Signaes de assentimento.)

O Sr. Marquez de Vallada principia expondo, que o Digno Par o Sr. Marquez de Loulé não desconhece, nem póde seguramente desconhecer, a importancia que tem as opiniões de certos cavalheiros de todos os paizes em que ha governo representativo, quando esses cavalheiros são homens influentes nas differentes opiniões politicas. Já quando annunciou esta interpellação, relativamente á liberdade de voto que elle orador entende que devem ter os Officiaes-móres da Casa Real e os empregados do Paço, fez conhecer á Camara que não tinha o previlegio de invenção neste assumpto. Já na Belgica fóra interpellado o Ministerio Lebeau Rogier, por occasião decerto artigo publicado na Revista Nacional de Bruxellas, redigida por um homem eminente daquelle paiz, mr. Deveaux, ligado com um dos ministros, ainda que não fosse por parentesco; parece-lhe que foi mr. Decamps, que chamára a attenção do governo sobre as doutrinas defendidas, e com ardor sustentadas no Jornal a que se refere. O ministerio subiu á tribuna, não estranhou o procedimento do representante da nação, e respondeu como sabia e podia á interpellação que se lhe fez. Mr. Leclerk, ministro dos negocios da justiça, declarou que de modo nenhum partilhava as doutrinas defendidas por aquelle Jornal, um dos sustentaculos daquella administração; cousa rara, que um ministro, fazendo parte de um ministerio solidario, fizesse tal declaração; e depois della procurou attenuar as impressões que o dito artigo fizera nos homens do partido conservador. Sirvam estas observações portanto de preambulo ao que passa a enunciar, e sirvam tambem, por assim dizer, de defeza de antemão preparada contra a defeza que o nobre Ministro do Reino queira tomar neste negocio, desejando arredar de si a responsabilidade que por ventura lhe caiba no artigo a que allude, sendo elle, como é, da penna de um cavalheiro influente na politica, e sustentaculo do Ministerio actual; e de mais tendo esse artigo sido publicado n'um Jornal, do qual nessa occasião era seu redactor principal um empregado de confiança do Governo, que depois, por falta de equilibrio, como disse o Jornal official, fóra demittido do logar de Secretario geral do Governo civil de Lisboa—allude ao Sr. Luiz de Almeida e Albuquerque, com quem está nas melhores relações, apezar de não partilhar das suas opiniões politicas.

No artigo a que allude do Jornal do Commercio se nota o grande Inconveniente que se dá em que os empregados da Casa Real sejam os primeiros a vir á Camara combater o Ministerio, declarando-se contra as suas opiniões. São estas

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as expressões, e accrescenta, que se estivessemos mais costumados aos usos inglezes, se não daria esta inconveniencia no nosso paiz. Parece-lhe que se allude neste artigo, se bem se recorda, á questão das irmãs da caridade e outras mais, em que alguns Dignos Pares, como os Srs. Marquez de Ficalho, Duque da Terceira, Conde da Ponte, e não sabe se tambem o Sr. Conde de Linhares tem manifestado a sua opinião em sentido contrario á do Ministerio. Por essa occasião surprehendeu-se mais elle orador, vendo que o cavalheiro que tinha assignado esse artigo, censurando altamente o procedimento dos empregados do Paço, fosse o mesmo que acceitasse um emprego rendoso e valioso, sendo como é conhecido geralmente que elle mesmo escreveu outros artigos, por que foi chamado aos Tribunaes no tempo do Ministerio do Sr. Conde de Thomar, por serem offensivos á sagrada Pessoa do Senhor D. Fernando, Augusto Esposo da nossa chorada Rainha a Senhora D. Maria Segunda, de saudosissima memoria. Não profere agora diante da Camara as expressões desses artigos, mas declara que quem os assignou não tem direito para pedir que seja demittido um dos primeiros servidores da Senhora D. Maria Segunda, como é o Sr. Duque da Terceira, nem os Srs. Marquez de Ficalho e Conde da Ponte, estes cavalheiros, constantes e fiéis á dinastia reinante, estes militares honrados, sempre valentes, sempre fidalgos distinctos e sempre nobres como são (apoiados). É a respeito destes que se pede que sejam demittidos, um do seu commando, e tambem juntamente comos outros do serviço dos nossos Reis. Isto é que elle orador acha muito inconveniente, e pergunta ao Sr. Ministro a sua opinião a tal respeito. S. Ex.ª sabe, como todas as pessoas instruidas sabem, que todo o homem para praticar um acto qualquer deve ter liberdade, e para a ter é preciso que tenha a consciencia do acto que pratica: ora se este homem não tem a consciencia do acto que pratica não póde de maneira nenhuma ter liberdade. É preciso, que os cavalheiros que se sentam nestas cadeiras tenham plena liberdade para emittir aqui o seu voto. Allude-se á Inglaterra, porque quando lá muda o ministerio costuma-se mudar os officiaes-móres do paço; mas nós que não imitamos muitas cousas boas daquelle paiz e dos seus bons usos, deviamos aproveitar-nos tambem da boa liberdade ingleza.

Continua expondo, que teve serias apprehensões quando leu este artigo, por vêr que foi escripto por um amigo do Governo, que tem defendido os seus actos com o maior ardor. Pede, pois, ao nobre Presidente do Conselho declare como o Governo entende este artigo? porque nos governos constitucionaes é preciso que se dê uma resposta conveniente, como é proprio de Ministros que se sentam nestas cadeiras, porque quaesquer que sejam as opiniões ninguem se deve arredar do campo da polidez e boa educação. Insta com o Sr. Ministro para que lhe diga se deve continuar a acreditar nas suas boas intenções, mas para isso deseja saber qual é a opinião do Governo em quanto á liberdade de voto dos Officiaes-móres da Casa Real e outros empregados do Paço; e deve prevenir desde já a S. Ex.ª, que qualquer que seja a sua resposta (que são sempre muito lacónicas, e nisso tem merecimento) ordene que ella appareça tal qual como a der nos extractos das sessões desta Camara, porque S. Ex.ª já uma vez illudiu tal publicação, e dahi o motivo porque elle orador lhe dirige esta rogativa. Permitta-lhe S. Ex.ª dizer em boa amisade, que tendo dirigido a S. Ex.ª uma interpellação, e parece-lhe que, nesse caso, procedido com todo o cavalheirismo, como o Digno Par reconheceu, mostrando-lhe na vespera as perguntas que lhe desejava dirigir, porque não queria fazer disso uma questão ministerial, e só obter um resposta, S. Ex.ª a deu de uma maneira que o não satisfez completamente.

Nessa occasião o digno Par o Sr. Marquez de Ficalho disse — que não approvava que elle orador se não desse por satisfeito com áquella resposta; mas os factos vieram confirmar os receios, porque não se publicou o discurso do Sr. Marquez de Loulé; e estimava que esteja presente o Sr. Marquez de Ficalho para repetir, que ainda se não dá por satisfeito com o que respondeu o Sr. Ministro. Portanto, pede ao Sr. Marquez de Loulé, que mande imprimir a resposta que agora der, e espera que não ha de acontecer o mesmo que da outra vez.

Respondeu-se, mal ou bem naquella occasião, mas que aconteceu? Foi elle orador procurar depois no respectivo extracto do Diario do Governo a resposta de S. Ex.ª, e só deparou com pontinhos adiante do nome do Sr. Presidente do Conselho! Procurou depois elle orador indagar o motivo disto, e o Sr. Conde de Mello, que é"summamente benevolo, o informou de que se tinha officiado ao Sr. Presidente do Conselho de Ministros por umas poucas de vezes, pedindo-lhe o seu discurso, mas S. Ex.ª não respondeu; S. Ex.ª bem se sabe que não gosta muito de responder de prompto. Então não póde elle orador deixar de fazer o seu juizo, que póde ser falso, mas não lhe parece muito temerário, porque ás vezes a verosimilhança aproxima-se bastante da verdade. Pareceu-lhe que o Sr. Marquez de Loulé, depois da resposta que déra naquella occasião, se arrependera do que dissera, e julgando como habil politico, que as suas palavras não seriam bem comprehendidas e approvadas pelas pessoas que defendiam e defendem o Ministerio, achou melhor que se não publicasse o que havia dito. Foi este o conceito que fez. Diz francamente, e com a ingenuidade com que costuma fallar, foi este o juizo, e desde essa época ficou prevenido para que, quando houvesse de fazer mais alguma pergunta a S. Ex.ª, pedir-lhe não só que seja explicito, como igualmente que não impeça a publicação, porque de mais a mais um Presidente do Conselho de Ministros, chefe de uma situação, director de um partido, pelo menos até certo tempo, deve ter a consciencia das suas idéas, e daquillo que diz, não receiando ser aggredido por um ou outro escriptor de bas étage. E tanto maior foi a sua estranhesa, que áquella resposta ou discurso de S. Ex.ª, foi na Camara geralmente bem recebida, embora elle orador se não satisfizesse plenamente, por isso que é difficil em satisfazer. Dito pois isto de passagem, como uma especie de queixa em familia, espera que o nobre Ministro, respondendo-lhe agora, tome a seu cuidado o fazer que se publique depois a resposta que dér, fazendo tambem com que, se ainda fôr possivel, se publique o outro discurso a que se acaba de referir, e cuja falta tanto lamenta. Espera que S. Ex.ª procurará satisfazer, quando não seja como individuo e amigo, ao menos pela consideração de homem publico, e por áquella attenção que é propria do caracter de S. Ex.ª e lh'o exige a sua qualidade de Ministro e Chefe do gabinete.

Aguarda a resposta de S. Ex.ª, para fazer ainda uso da p lavra, no caso de o julgar conveniente.

O Sr. Presidente do Conselho — Eu principiarei por agradecer ao Digno Par o ter-me dado occasião de explicar o motivo porque não appareceu aquelle meu pequeno discurso a que S. Ex.ª alludiu. Eu estava persuadido, e creio que não me engano, de que havia uma resolução da Camara para que quando os oradores não mandassem os seus discursos emendados se publicassem conforme tivessem saído das notas tachygraphicas; esta resolução poderá de facto não estar em pratica, mas de direito está em vigor, e eu nesta supposição, como se passou muito tempo entre a sessão e a publicação, quando se me pediu esse discurso com urgencia, não tendo até alli tido occasião de o vêr para o corrigir, se fosse necessario, procurei-o e não me foi possivel encontral-o, posto esteja certo de que deve estar em minha casa confundido com outros papeis, mas realmente descansei sobre isso, certo como estava da resolução a que alludi, e então disse, que visto não encontrar o discurso que me tinha sido enviado, me parecia que o melhor era publical-o conforme as notas tachygraphicas. Eis-aqui toda a explicação desse facto, e póde o Digno Par contar, que se eu ainda encontrar o tal discurso S. Ex.ª ha de ter a satisfação que disso esperava resultar-lhe (Riso. — O Sr. Marquez de Vallada — muito obrigado), e eu nesse caso pedirei tambem a S: Ex.ª que ponha, ou consinta que se ponham ao lado as suas perguntas, que eu tambem lá hei de ter juntas ao discurso de que se falla. Creio que sobre isto tenho respondido.

Agora em quanto ao artigo do Jornal do Commercio em que S. Ex.ª falla, e que diz ser escripto por um amigo meu, declaro que não sei quem seja; mas no que o proprio Digno Par ha de concordar comigo, e concorda de certo toda a Camara, é que o Jornal do Commercio não é um jornal do Governo. Pois um jornal onde a par de um artigo favoravel á politica do Governo vem dois Ou tres contra, póde-se dizer que é um jornal do Governo? Eu dou a minha palavra de honra de que sou estranho a tudo isso, e protesto contra toda a affinidade que o Digno Par diz que existe entre o Governo e o Jornal do Commercio. (O Sr. Marquez de Vallada-—Protesta?) Protesto de certo, e torno a asseverar que o Governo é inteiramente alheio a esse artigo que appareceu sobre medidas que parece dizia se deviam tomar contra os Officiaes-móres da Casa Real. O Digno Par é Official-mór... (O Sr. Marquez de Vallada — não estou tm serviço.) O Governo mesmo ainda não pensou em similhante cousa, não pensa em tomar medida alguma a tal respeito, e os actos do Governo devem dar aos Dignos Pares toda a garantia de qual será a futura conducta do Governo a este respeito. De mais: ha Dignos Pares que foram nomeados Officiaes-móres por Decretos que eu tive a honra de referendar, e entretanto esses cavalheiros não estão em perfeita harmonia com o Governo, nem estavam quando foram nomeados (apoiados); além disso acredito que os Dignos Pares Officiaes-móres votam aqui sempre com toda a liberdade, e não sentem pressão alguma (O Sr. Marquez de Vallada — Elles não me deram procuração). A verdade é esta, e creio que os proprios Dignos Pares assim o reconhecem (apoiados).

O Sr. Marquez de Ficalho (sobre a ordem): expôz que, se lhe fosse permittido, faria uma moção de ordem para esta interpellação ficar neste ponto. Quem é o juiz da sua liberdade? É o Digno Par interpellante? É o Governo quem por ventura lh'a póde tirar? É o Governo que lhe póde tirar o cargo que elle orador exerce na Côrte? Não. Unicamente Sua Magestade El-Rei.

Quando Sua Magestade entender que elle orador não convem ao seu real serviço, dir-lho-ha, e elle Marquez de Ficalho ha de respeitosamente responder e justificar-se, se fôr caso para isso. Nesta cadeira porém tem toda a liberdade, e o Digno Par não está auctorisado a interpellar ninguem por ella (O Sr. Marquez de Vallada — Pede a palavra). Quem se póde julgar com esse direito? Ninguem. O Governo póde, por exemplo, ter certas pertenções sobre a existencia de taes e taes homens no serviço do Paço, mas sobre a sua liberdade quem se atreveria a perguntar-lhe e pro-pôr-lhe como ha de votar? O orador suppõe que os inconvenientes desta interpellação podem ser muito grandes, e por consequencia pediu a palavra sobre a ordem para pedir que esta interpellação não continue, e para dizer que não julga pessoa alguma competente para ser juiz da sua liberdade de voto.

O Sr. Marquez de Vallada: expõe que se o Digno Par o Sr. Marquez de Ficalho não quer nem consente que alguem seja seu juiz, tambem elle orador não consente que algum Digno Par o obrigue a ficar callado quando entender que deve fallar; pedindo a palavra, e sendo-lhe concedida pela Presidencia, ha de sempre usar della como entender, reconhecendo apenas na Presidencia e na Camara o direito de o chamarem á ordem quando estiver fóra della.

Elle orador não tractou de homens, tractou dos principios de liberdade. Acaso levou a questão para o campo da methaphisica, ou tractou-a na larga esphera da philosophia politica?

Pois não se referiu ao artigo do jornal, e não o fez alludindo mesmo especialmente aos Srs. Duque da Terceira, Conde de Linhares, e D. Carlos Mascarenhas? Está pois elle orador no seu direito, e ha de mantel-o com toda a energia, sem consentir que venham dar-lhe lições as quaes só recebe do Sr. Presidente e da Camara, quando assim o pedir o procedimento delle Par; portanto, como disse, tractou a questão no campo da philosophia politica. Perguntou ao Governo qual a sua opinião sobre a liberdade de certos individuos, o Sr. Marquez de Ficalho levantou-se e disse — que tal questão não era para aqui, que não era conveniente no modo dever de S. Ex.ª

Mas que diz a Carta? Como exerce o Rei o podér moderador? Não é por meio dos seus Ministros? Quando se dá, por exemplo, uma condecoração a um estrangeiro, quando se fazem certos despachos, não é por intervenção dos Ministros? O podér do Rei todos sabem que é exercido pelos Ministros, e portanto foi neste sentido que fallou e é como se póde fallar nesta Camara. Ninguem trouxe o nome do Rei para a discussão, póde-se trazer quando é para elogiar a sua pessoa, mas nunca é possivel tractar da pessoa do Rei, fallando em seu desabono, lançando-se-lhe qualquer culpa de que nunca é responsavel, por isso mesmo que os responsaveis são os Ministros. Seria elle orador o ultimo a praticar essa inconveniencia, porque respeita como qualquer membro desta Camara a Sua Magestade El-Rei, e ha de sempre mostrar que o sabe respeitar e defender. Fallou do Sr. Duque da Terceira, do Sr. Conde de Linhares, e do Sr. D. Carlos Mascarenhas, que estão ao serviço immediato do Governo; mas estes Dignos Pares não lhe deram procuração, pois elles tem voz, e tem mostrado que sabem usar della, e que presam devidamente a sua dignidade. Por consequencia não fez, como Par do Reino que é, mais do que usar de um direito, e o Sr. Presidente do Conselho não contestou esse direito, e deu a sua explicação. Deve porém dizer a S. Ex.ª que elle orador não pronunciou o nome do auctor do artigo publicado no Jornal do Commercio, porque entendeu que isso lhe não ficava airoso: lêa S. Ex.ª esse artigo que está assignado, e então conhecerá quem é tal individuo. Folgou comtudo em ouvir dizer ao Sr. Presidente do Conselho que não approva a doutrina daquelle artigo, e isto mostra que está nos bons principios...

O Sr. Presidente do Conselho — Permitta o Digno Par que o interrompa para rectificar o que disse, e foi, que não tinha conhecimento do artigo alludido, nem o Governo tinha nenhuma especie de affinidade com esse jornal, nem mesmo tinha o Governo pensado em tal; e accrescentei, que appellava para os Dignos Pares que são Officiaes-móres da Casa, para dizerem se não votavam livremente sobre os assumptos que se tractavam nesta Camara.

O Sr. Marquez de Vallada: observa a S. Ex.ª que não póde confiar em qual será a sua conducta no futuro, e muito menos depois de vêr que quer que a Camara fique satisfeita com as suas palavras.

O Sr. Presidente do Conselho — Quero que se fique entendendo bem qual é a minha opinião sobre o assumpto sujeito, é ella, que o Governo não tem nada com o artigo do Jornal do Commercio; pelo que respeitava á questão, que o Governo não tinha ainda tractado della, nem a tinha discutido: finalmente, que não havia ainda uma opinião formada do Governo a lai respeito.

O Sr. Presidente: dá por terminada esta interpellação. Antes de fechar a sessão recommenda ás commissões que organisem trabalhos que possam ser presentes, e deu para primeiro dia de sessão a proxima sexta-feira, sendo a ordem do dia leitura de pareceres.

Eram quatro horas e tres quartos da tarde.

Relação dos Dignos Pares que estiveram presentes na sessão de 14 de Dezembro de 1858.

Os Srs.: Visconde de Laborim; Duque da Terceira; Marquezes: de Ficalho, de Fronteira, de Loulé, das Minas, de Pombal, da Ribeira, e de Vallada; Condes: das Alcaçovas, da Azinhaga, do Bomfim, de Linhares, de Mello, de Penamacôr, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, do Sobral, e de Thomar; Viscondes: d’Algés, d'Athoguia, de Balsemão, de Benagazil, de Campanhã, de Castellões, de Castro, de Fornos de Algodres, da Luz, de Ovar, e de Ourem; Barões: de Pernes, de Porto de Moz, e da Vargem da Ordem; Mello e Saldanha, D. Carlos Mascarenhas, Sequeira Pinto, Pereira de Magalhães, Margiochi, Proença, Aguiar, Larcher, Brito do Rio, e Aquino de Carvalho.

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