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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO DE 22 DE JUNHO DE 1867

PRESIDENCIA DO El.™ SR. CONDE DE LAVRADIO

Secretarios os dignos pares

Marquez de Vallada.

Visconde de Soares Franco.

(Assistem os srs. ministros da marinha e do reino.)

Pelas duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 26 dignos pares, declarou o ex.™ 0 sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O sr. Secretario Marquez de Vallada mencionou a seguinte

CORRESPONDENCIA

Sete officios da presidencia da camara doa senhores deputados acompanhando igual numero de proposições: 1.º Sobre a reforma penal e de prisões. 2.ª Sobre a fixação da força militar do exercito no anno de 1867-1868.

3.ª Sobre ser considerado habilitado com a carta geral do curso de engenheria militar da escola do exercito o visconde de Seisal (Pedro).

4.ª Sobre ser o governo auctorisado a prorogar os prasos estabelecidos para a troca e giro das moedas de oiro e prata mandadas retirar da circulação, bem como a mandar cunhar novas moedas de prata e de cobre, e a renovar o beneficio concedido aos particulares, bancos e associações pelo artigo 20.° da lei de 24 de abril de 1856.

5.ª Sobre a reducção dos direitos de entrada do ferro e aço em certas condições.

6.ª Sobre ser o governo auctorisado a tornar extensivas á Turquia quaesquer concessões feitas a outras nações em materia de commercio e navegação.

7.ª Sobre a approvação do tratado de amisade, commercio e navegação entre Portugal e a republica da Liberia.

Foram distribuidas a 1ª á commissão de legislação, 2.ª e 3.ª á de guerra, 4* e 5.ª á de fazenda, e 6.ª -e 7.ª á de negocios externos.

Um officio do ministerio do reino, enviando, para se depositarem no archivo d'esta camara, os autographos dos decretos das côrtes geraes n.™ 12, 22, 23, 26, 28, 29, 30, 31, 32,41, 56, 58 e 66.

Tiveram o competente destino.

O sr. Baldy: — Sr. presidente, o digno par, o sr. Vaz Preto, na Sessão de hontem, provocando os srs. ministros

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a fazer amplas reducções na despeza, diminuindo o numero dos empregados e os ordenados de muitos d'elles, que tinha por excessivos, para fundamentar seu conselho, seguindo o de Newton, tomou para exemplo dos largos vencimentos que, em seu conceito, deviam ser cerceados os do director geral dos telegraphos, que s. ex.ª elevou acima dos ordenados dos srs. ministros.

Disse s. ex.ª que este empregado, com o ordenado de engenheiro, recebia a gratificação de seu cargo, accumulando a de vogal do conselho das obras publicas, do conselho de minas, de director do instituto industrial, recebendo sobre tudo isto uma libra por dia quando mandado inspeccionar qualquer estrada =.

Sr. presidente, eu não levo a mal que um empregado receba os proventos por lei concedidos; quem trabalha é digno de recompensa (apoiados). E todavia, conhecendo o caracter altamente honrado e austero (apoiados) d'aquelle distincto servidor do estado, não acreditei na accumulação que se lhe attribuia, e hontem mesmo podéra ter adverti do o digno par, o sr. Vaz Preto, de equivoco em que a respeito d'elle estava: tive comtudo por melhor informar-me primeiro da verdade dos factos, e d'ella informado posso hoje asseverar a V. ex.ª que o director geral dos telegraphos, a que o digno par alludiu, recebeu, emquanto esteve no exercicio do cargo, apenas o seu ordenado como engenheiro de 1.ª classe, e a gratificação que por lei pertence a quem exerce aquelle emprego.

Não recebeu pois a gratificação de vogal do conselho das obras publicas, apesar de ser assiduo no desempenho dos deveres d'este emprego, nunca o de vogal do conselho de minas, não obstante pertencer a este, creio, desde a sua creação, partilhando assim dos onus não dos proventos, nem a de director do instituto industrial, que em nenhum caso podia receber por se haver exonerado do emprego ha talvez cinco ou seis annos. É verdade ter saído de Lisboa por umas oito vezes, pouco mais ou menos, para inspeccionar estradas e recebido durante este serviço uma libra por dia; mas attenta a promptidão com que elle se desempenha de suas obrigações, insignificante proveito, se algum houve, colheu por certo d'esta gratificação.

Resumindo: o director geral dos telegraphos recebeu emquanto exerceu aquelle emprego pelo ordenado de engenheiro de 1.ª classe 80$000 réis mensaes, pela gratificação de seu cargo 85$000 réis tambem mensaes, que sommam réis 165$000 por mez ou 1:980$000 reis por anno. Ora, tendo cada um dos srs. ministros 3:200$000 réis por anno, são os seus proventos mui superiores ao d'aquelle empregado.

O sr. Visconde de Soares Franco: — Sr. presidente, mando para a mesa um parecer da commissão de marinha; é o seguinte (leu).

Aproveito a occasião de estar com a palavra para repetir o mesmo que acaba de dizer o meu nobre amigo, o sr. Baldy, com referencia a outro individuo que tambem exerceu o cargo de director geral dos telegraphos. Eu não sei nem quero saber a quem o digno par, o sr. Vaz Preto, Se quiz referir, se era ao actual director dos telegraphos, se a outro que já o tivesse sido, mas o que posso affirmar é que emquanto aquelle logar foi exercido pelo sr. José Bernardo da Silva, official de marinha, nunca este senhor recebeu senão o seu soldo e a gratificação inherente ao logar de director geral dos telegraphos.

O sr. Rebello da Silva: — Sr. presidente, mando para a mesa, para ser discutida quando a camara entender conveniente, uma proposta que julgo urgente; a proposta é a seguinte:

«Proponho que a commissão administrativa d'esta casa fique auctorisada para no intervallo d'esta sessão da legislatura adoptar as providencias necessarias para que o serviço tachygraphico e de redacção, e a sala das sessões sejam collocados em circumstancias de corresponderem ao que a camara precisa para a realidade da publicação dos discursos.»

Faço isto, porque a camara não tem agora tempo de tratar d'este assumpto, e se d'elle se não tratar no intervallo da sessão legislativa, chegâmos a janeiro e achâmo-vos nas mesmas circumstancias em que nos vemos, e de que nos nos queixámos pelas más condições acusticas da sala. D'ahi procede que as sessões se publicam com grande difficuldade. Cumpre portanto dar remedio a este grande inconveniente, pois que a publicidade das sessões é uma condição indispensavel d'este systema de governo (apoiados).

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se julga esta proposta urgente, a fim de se votar desde já.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam a urgencia d'esta proposta, tenham a bondade de o manifestar.

Approvou-se a urgencia; e tendo-se lido novamente na mesa a proposta, foi approvada sem discussão.

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, estamos proximos do encerramento d'esta sessão legislativa, e ha medidas que cumpre adoptar, e que são de urgente necessidade que se adoptem por parte do governo, para bem da publica administração. E sabido que o regulamento para o registo das hypothecas tem suscitado duvidas entre os interessados e os empregados d'aquella repartição; a tabella é de tal sorte elevada, que póde considerar-se um tributo novo e desconhecido até aqui, lançado a esmo sobre a propriedade! Ha uma casa muito conhecida n'este paiz, que tem agora de registar as suas propriedades; sabe V. ex.ª em quanto esta calculado esse registo? Em 20:000$000 réis! Fallo da casa de Abrantes. Isto é um abuso intoleravel que deve immediatamente cessar (apoiados). E necessario que se removam todas as difficuldades, que se acabem quanto antes certos abusos e absurdos que se estão dando. (O sr. Conde de Fornos: — Apoiado.) Ha negocios, que indo para as secretarias ficam lá, porque quem não

tem padrinho morre mouro. A opinião publica é unisona em dizer que é necessario que o padrinho d'esta nação, da sociedade em geral, seja o governo, visto ser elle que preside a toda a marcha administrativa, respondendo por aquelles a quem confia a execução das leis e das suas ordens.

Eu sinto não ver presente o sr. ministro da justiça para dizer a s. ex.ª que é mais urgente que se tomem estas medidas e alvitres, do que outros com que nos querem presentear e que são talvez prejudiciaes. Eu estou formalmente resolvido a não apoiar, e a combater com todas as minhas forças medidas que precisem de longa discussão, e que se queiram levar de surpreza; porque eu, sr. presidente sempre tenho sido adversario das surprezas, e espero que não deixarei de se-lo por serem ellas oppostas aos principios que tenho seguido e continuarei a seguir.

Não póde de modo algum continuar o tributo que os proprietarios pagam, e o que é um trafico de nova invenção.

Quando foi da lei dos morgados eu combati-a com todas as minhas forças; hoje estou nos mesmos principios. Digo portanto que isto não póde continuar assim; e dizendo-o não exprimo apenas um queixume propriamente meu, mas o sentimento de todos que têem propriedades, e que se queixam com rasão de se estar exercendo um rigor tamanho na execução da lei a que me refiro, que chega muitas vezes, como já disse, ao absurdo. E provavel que o sr. ministro da marinha, ou o do reino, ambos os quaes vejo nas suas cadeiras, tomem na devida consideração as observações do digno par; e que desejoso sempre o governo de prover quanto em si couber por todos os meios os interesses do paiz e da justiça, não se demorará em adoptar as medidas que forem conducentes com a boa administração.

E esta a resposta que naturalmente ss. ex.ª darão, e que eu não duvido prevenir, como já uma vez me aconteceu com o digno par, o sr. José Maria Grande, hoje fallecido, pois fazendo uma pergunta a s. ex.ª, logo dei a resposta, prevenindo assim o que s. ex.ª me diria.

O que peço aos srs. ministros aqui presentes, com todas as veras do meu coração e com toda a força do meu espirito, é que ss. ex.ª dêem parte ao seu collega da justiça do que eu aqui disse, porque talvez o sr. ministro possa fazer ainda alguma cousa na presente sessão legislativa para afastar o mal de que me estou queixando. Não faço nem desejo fazer uma interpellação; o que faço é simplesmente um pedido a fim de s. ex.ª attender a elle por ser de justiça, e fazer com que ainda n'esta sessão, como acabei de dizer, se dê uma solução a negocios summamente importantes como estes pão; assim como agora peço a s. ex.ª que haja de dar uma resposta que satisfaça a todos, porque esta necessidade é geral.

Se porventura o sr. ministro da justiça ainda hoje comparecer n'esta camara, pedirei novamente a palavra para fazer na sua presença estas considerações.

Tenho ainda de fallar sobre outro objecto, mas como o sr. ministro do reino pediu a palavra, julgo do meu dever aguardar a resposta de s. ex.ª, e fallarei depois sobre o outro assumpto.

(O orador não reviu os seus discursos.)

O sr. Ministro do Reino: — O digno par e meu amigo, que me precedeu, encarregou-se de apresentar a resposta, que naturalmente se deveria esperar de qualquer membro do governo n'esta occasião. Mas dando-a, direi alguma cousa mais.

Sr. presidente, eu fui um dos ministros que tive occasião de apresentar uma lei de reforma hypothecaria, em que não estavam consignadas as disposições a que se refere o digno par; entretanto a lei de que s. ex.ª tratou, é hoje lei do paiz, e o dever do governo é respeita-la, acata-la e fazer com que seja cumprida. Por outro lado é tambem dever do governo, com relação a uma lei que pela primeira vez começa a executar-se entre nós e que estabelece um systema completamente novo, estudar as difficuldades praticas que se apresentam e procurar dar-lhes o remedio possivel.

A lei começou ha pouco a ser executada, o periodo para qualquer dos registos a que ella se refere, porque ha registo das propriedades e registo dos encargos d'essas propriedades, não esta ainda concluido, e falta ainda para que elle termine, um espaço de tempo bastante largo, e, até essa occasião, o governo ha de tomar conhecimento de todas as reclamações, e se for necessario pedir ou a prorogação do praso, ou a alteração da lei, é claro que ha de cumprir o seu dever apresentando ao parlamento as medidas convenientes. Com isto não quero dizer que as alterações são necessarias, ou que a lei não póde ser executada. As questões podem ser resolvidas por muitas e variadas fórmas, e o systema que esta na lei póde ser que satisfaça com uma facil alteração, mas a experiencia é que ha de elucidar o governo, e elle não póde deixar de seguir cuidadosamente uma questão que é de uma grande importancia para os interesses particulares. Ao mesmo tempo esta lei é uma lei de credito predial, e torna-se necessario que seja executada com todo o discernimento.

Repito, nenhum dos prasos para as prescripções legaes esta ainda concluido, nem o estará antes da proxima sessão legislativa, e portanto, se o governo, entender que a lei precisa ser esclarecida ou modificada, é claro que ha de cumprir o seu dever.

O meu collega, o sr. ministro da justiça, talvez podesse dar mais ampla resposta, mas eu não posso no momento actual ir mais longe, porque não sei quaes as diligencias que têem sido empregadas por s. ex.ª

Já na outra casa do parlamento se me fizeram perguntas analogas, e eu communiquei-as ao meu collega, e sei que elle se occupa d'este assumpto, e o resolverá naturalmente de um modo conveniente aos justos interesses do publico e do paiz, porque estas leis não são leis de fisco (apoiados), não são leis de receita, são leis economicas, que dão receita debaixo de um certo ponto de vista, mas porque dão certeza á propriedade e facilitam as transacções (apoiados).

É o que tenho dizer n'este momento.

(O orador não reviu os seus discursos.)

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, é verdade que eu, quando chamei a attenção do sr. ministro do reino para as observações que julguei util e necessario fazer, logo disse que previa qual havia de ser a resposta de s. ex.ª; mas tambem é certo que s. ex.ª foi um pouco mais adiante do que eu esperava. S. ex.ª proclamou uma grande verdade, repetiu um grande principio, quando disse que isto não era uma lei de fisco, mas sim uma lei economica, por isso mesmo que dava segurança e estabilidade á propriedade. Isto em theoria é exactissimo; mas tambem é preciso ver que não aconteça que essa lei em logar de dar protecção á propriedade, não venha, por assim dizer, destruir a propriedade (apoiados).

Todos se hão de lembrar da grande batalha que eu pelejei quando se tratou da lei da reforma dos vinculos e da lei do registo. Se então tivessemos sido mais cautelosos, se não andássemos tão depressa, talvez não tivessem tido logar certas demandas em consequencia da confusão que d'essa precipitação resultou, e da fórma como se estabeleceram as prescripções d'essas leis (apoiados). As questões sobre as epochas do registo podiam-se evitar, sa não fosse a pressa com que tratámos d'essa materia (apoiados). As leis, sr. presidente, diz muito bem um grande publicista italiano, primeiro que tudo devem ser justas e depois claras. Para que sejam justas e para que sejam claras é necessario que sejam feitas com reflexão e madureza; é necessario que sejam discutidas com socego e não com precipitação, porque a precipitação dá sempre mau resultado.

Sr. presidente, eu já aqui fallei n'uma casa bem conhecida, á qual se pede pelo registo de suas propriedades nada menos do que 20:000$000 réis! Ainda contarei mais: ha tambem um cavalheiro muito conhecido e meu amigo, o qual tem fóros no valor de 400$000 réis, elle apresenta o tombo para se lhe fazer o registo, e é este avaliado em 6:000$000 réis, quando os fóros todos, como acabei de dizer, lhe rendem apenas 400$000 réis.

O sr. Silva Cabral: — Isso não póde ser.

O Orador; — O digno par dizia melhor se dissesse que não deve ser.

O sr. Silva Cabral: — Não póde ser, nem deve ser, á vista da lei.

O Orador: — Muito bem; não póde ser, nem deve ser, á vista da lei, mas esta acontecendo isto que digo.

O sr. Silva Cabral: — Ha de haver exageração.

O Orador: — Sabe s. ex.ª o que succede? É que nas repartições publicas a resposta que se dá é dizer: pague e depois requeira; recorra competentemente! É o mesmo que dizer: pague a ver se empobrece, e depois recorra, se tiver com que, porque se não tiver, escusa de ter mais esse incommodo! Isto não póde ser; nenhuma exageração é boa, nenhuma exageração se póde sustentar (apoiados).

Querem-se extinctos todos os privilegios, mas sustentam-se ao mesmo tempo e estabelecem-se de novo outros privilegios; temos tambem privilegios para certas repartições publicas.

O que é necessario é attender aos interesses de todos em beneficio de todos e em desaggravo de todos. Tenho dito bastante a este respeito, reservando-me comtudo para tornar a fallar a este respeito e empregar sem descanso todos os meios de que possa dispor, a fim de que esta questão se resolva, que vá sendo cada vez mais esclarecida, e chegue a tal ponto que, quando mais não seja, triumphe por si á força da rasão, da justiça e da verdade, triumpho que sempre tem de se dar ou mais tarde ou mais cedo.

Agora lembro que esta para ter segunda leitura uma proposta, hontem apresentada pelo digno par o sr. marquez de Sousa, que não esta presente porque entrou hoje de semana no paço. A proposito igualmente noto que esta já approvado pelas camaras um projecto que teve aqui origem, e que é para se pagar a alguns empregados extraordinarios d'esta casa o serviço que elles têem prestado desde janeiro do corrente anno; observo porém que vem annexo a esta proposta ou projecto de lei uma tabella, da qual resulta que não sei se V. ex.ª entra em alguma duvida, se precisa de consultar de novo a camara, ou pedir alguma auctorisação sobre a fórma de se fazer effectivo este pagamento, que me parece que fica auctorisado até ao fim do presente anno civil; mas n'este caso convirá que se declare na acta isso mesmo, isto é, que depois de sanccionada a lei por Sua Magestade, entende se que a execução deve ser n'esta mesma conformidade.

E tudo quanto tenho a dizer, e para o que sai do logar que estou occupando na mesa.

O sr. Presidente: — A mesa não tem que pedir auctorisação alguma mais, depois de approvado o projecto por ambas as camaras (apoiados).

O sr. Marquez de Vallada: - O que eu digo é que me parece que esta tabella faz tambem parte da lei, e eu queria que se mes dissesse que sem escrupulo se podia entender que isto era uma auctorisação annual...

O sr. Presidente: Desde que a lei for sanccionada.

O Orador: — Se a camara toda esta de accordo, e é claro que o pagamento se ha de fazer effectivo e completo, não tenho mais que dizer (apoiados),

O sr. Presidente:>— Vae entrar-se na ordem do dia...

O sr. Braamcamp: — Peço a palavra antes, da ordem do dia..

O sr. Presidente: — Tem a palavra.

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O sr. Braamcamp: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda. – Leu-se na mesa.

O sr. D. Antonio José de Mello: — Tenho a honra de mandar para a mesa um parecer da commissão de guerra.

Leu-se na mesa.

O sr. Presidente: —Todos estes pareceres mandam-se imprimir para serem distribuidos, e entrarem em discussão. (Pausa.)

O sr. Presidente: — Vae fazer-se a segunda leitura da proposta do sr. marquez de Sousa Holstein. ¦ Leu-se na mesa, e foi a imprimir.

O sr. Marquez de Ficalho (sobre a ordem): — Mando tambem para a mesa dois pareceres da commissão de fazenda.

Leram se na mesa, e mandaram se imprimir. O sr. Presidente: — Passâmos á ordem do dia. Vae ler-se o parecer n.° 186, sobre o projecto de lei n.° 176.

ORDEM DO DIA

DISCUSSÃO DO PARECES N.° 186

Senhores. — Foi presente á vossa commissão de marinha o projecto de lei n.° 176, approvado na camara dos senhores deputados, e a que serviu de base uma proposta do governe.

Parece á commissão que a força pedida não será sufficiente para poder satisfazer ao serviço que deve desempenhar a nossa marinha de guerra n'um paiz maritimo e colonial, o qual tem importantes provincias ultramarinas, grande extensão de litoral e muitos outros interesses nas differentes partes do globo, que é preciso vigiar e fiscalisar; mas como o governo é o juiz competente, entende a commissão que o projecto deve ser approvado por esta camara para obter a sancção regia.

Sala da commissão, 19 de junho de 1867. = Marquez de Sá da Bandeira = Luiz Augusto Rebello da Silva = Marquez de Ficalho = Conde de Fornos de Algodres = Visconde de Soares Franco.

PROJECTO DE LEI N.° 176

Artigo 1.° A força de mar, para o anno economico de 1867-1868, é fixada em 3:293 praças, distribuidas por 1 fragata, como escola de artilheria; 9 corvetas, sendo 7 a vapor; 1 brigue; 4 canhoneiras a vapor; 1 escuna; 3 hiates; 1 cuter; 1 cahique; 3 vapores e 1 barca-transporte.

Art. 2.° O numero e qualidade dos navios armados póde variar segundo o exigir a conveniencia do serviço, comtanto que a despeza total não exceda a que foi votada para a força que se auctorisa.

Art. 3.° As sommas votadas para o armamento naval não poderão ser distrahidas para outro qualquer serviço.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 18 de junho de 1867. = Cesario Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = José Maria Sieuve de Menezes, deputado secretario = Fernando Affonso Giraldes Caldeira, deputado secretario.

O sr. Presidente: — Está em discussão na sua generalidade o projecto de lei n.° 176, e tem o sr. visconde de Soares Franco a palavra.

O sr. Visconde de Soares Franco: — Sr. presidente, não desejo tomar tempo á camara, discutindo este projecto; mas preciso que o sr. ministro da marinha declare se tenciona dar andamento aos projectos apresentados na outra casa do parlamento, que já têem a approvação da commissão de marinha, pois os considero necessarios para que os nossos navios não fiquem no Tejo por falta de um pessoal proprio e adequado.

O sr. Ministro da Marinha (Visconde da Praia Grande): — Em resposta á pergunta que me acaba de fazer o digno par e meu amigo, o sr. visconde de Soares Franco, tenho a responder que o facto de ter apresentado algumas propostas na outra casa do parlamento sobre os differentes quadros do serviço de marinha prova a necessidade de fazer alguma cousa n'este sentido. (O sr. Visconde de Soares Franco: — Apoiado.) Mas a circumstancia de se não ter dado andamento a estes projectos na outra casa, deve mostrar ao digno par que houve um motivo forte, o qual é obvio a todos; é o estado da fazenda publica e a idéa de não augmentar despeza nenhuma sem que seja altamente reclamada pelo serviço publico. O governo espera na proxima sessão apresentar ao parlamento a reforma de differentes ramos do serviço de marinha, e hei de n'essa occasião occupar-me d'este objecto, como for possivel, combinando a economia com as necessidades dos diversos ramos de serviço do ministerio a meu cargo.

O sr. Visconde de Soares Franco: — Agradeço ao nobre ministro o que acaba de dizer, e peço que se consigne na acta a sua declaração. Eu não entro agora no desenvolvimento d'esta materia, porque não desejo tomar o tempo á camara, mas peço que se lance na acta o que acabou de dizer o illustre ministro, para que se não julgue que aquelles projectos caducaram, e que os nossos navios de guerra têem de apodrecer nas aguas do Tejo.

O sr. Marquez de Vallada: — Eu vejo-me obrigado a dizer algumas palavras sobre este projecto, em consequencia de um requerimento que fiz n'esta camara para ser remettido ao ministerio da marinha e ultramar.

Eu tenho-me occupado em varias occasiões das nossas colonias; trata-se aqui das nossas colonias e da força armada de marinha, para que as nossas colonias prosperem e sejam vigiadas e protegidas. Nós temos um conselho ultramarino, que é composto de homens que possuem conhecimentos muito especiaes d'aquellas paragens; é necessario portanto que na proxima sessão o nobre ministro da marinha, que disse muito bem que devemos ter attenção com as circumstancias do nosso thesouro, e não fazer despezas que vão carregar o orçamento; entendo que é muito necessario, digo,

que procure desenvolver a industria nas nossas colonias, porque (eu entendo cada vez mais que é preciso dizer a verdade toda) se ellas não nos servem de nada, façamos o mesmo que fez a Russia, e vendam-se as nossas provincias do ultramar, porque não sei para que as havemos de ter, se for só para possui-las como quem tem uma casa de campo, ou alguns objectos de recreio. Como particulares podemos fazer essas despezas, muitas vezes inuteis; mas como homens publicos devemos por todos os meios ao nosso alcance conservar aquelles monumentos da nossa gloria passada, e fazer com que não sejam padrões da nossa incuria e ignominia presentes. Portanto é necessario tratar do seu desenvolvimento e da sua prosperidade. Estou persuadido de que o conselho ultramarino já terá dirigido consultas ao governo sobre este ponto tão importante; e alem d'isso nomeou-se uma commissão externa, creio que para consultar sobre o que mais convinha para se chegar a esse fim; por isso na sessão proxima hei de occupar-me muito especialmente das nossas provincias do ultramar, e muito principalmente da nossa Africa portugueza; e então direi verdades, que não sei se serão amargas, mas que é necessario dizerem-se.

Confio muito na honra e patriotismo do sr. ministro dos negocios da marinha e no seu amor ao bem publico, para que juntamente com os seus collegas, e especialmente com o sr. Fontes, que é membro do conselho ultramarino e conhece o ultramar, haja de empregar todos os seus esforços n'esta grande tarefa, para que as nossas colonias, que são gloriosos padrões do passado, sejam fontes de riqueza no futuro. '

Feitas estas considerações, nada mais tenho a dizer senão que voto pelo projecto.

O sr. Presidente: — Como ninguem pede a palavra, vou pôr o projecto á votação na generalidade. Os dignos pares que o approvam, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

Passou-se á especialidade, e foram approvados todos os artigos sem discussão, e bem assim a mesma redacção.

O sr. Conde de Thomar (sobre a ordem): — Acha-se distribuido o parecer n.° 196, que diz respeito ao orçamento da despeza e receita do estado. Todos sabem que o governo necessita promulgar esta lei no 1.° de julho proximo, e que antes tem de ouvir o conselho d'estado; portanto peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se consente que se inverta a ordem em que estão inscriptos os pareceres dados para ordem do dia, para este entrar já, pois é urgentissimo (apoiados).

O sr. Presidente: — Não póde haver duvida nenhuma no que o digno par requer, pois eu tinha dado para ordem do dia todos os pareceres que estivessem impressos. Portanto vae ter se o parecer n.° 196.

Leu-se na mesa e é o seguinte:

PARECER N.° 196

Senhores. — Os projectos de lei, tanto da receita como da despeza publica, para o anno economico de 1867-1868, e bem assim os respectivos desenvolvimentos constantes dos mappas que os acompanham, remettidos a esta camara pela dos senhores deputados, foram examinados e apreciados pela vossa commissão de fazenda com a attenção que merece um assumpto tão importante como é o orçamento do estado.

Sendo calculada a receita em 16.884:420$552 réis, e a despeza ordinaria e extraordinaria em 22.695:979$970 réis, e o deficit de 5.811:559$418 réis, que será attenuado pelos resultados de varias providencias já votadas pelas côrtes, e pelas que se propõem nos referidos projectos de lei, e por outros que estão pendentes, tendendo todos a -augmentar a receita, a diminuir a despeza e a melhorar os serviços publicos, unicos meios que, executados com vigor e perseverança, dão em resultado a progressiva diminuição do deficit, e por fim o equilibrio da receita e despeza publica.

A commissão de fazenda, intimamente convencida por factos incontestaveis e bem sabidos, de que o governo tem todas as qualidades desejáveis para empenhar todos os seus recursos intellectuaes e o seu vigor em fazer desapparecer o deficit, é de parecer que sejam approvados os projectos de lei da receita e despeza do estado do futuro anno economico, para serem submettidos á sancção real e convertidos em lei, como é de manifesta urgencia.

Sala da commissão, em 21 de junho de 1867. = José Bernardo da Silva Cabral, presidente = José Augusto Braamcamp = Visconde de Algés = Visconde de Chancelleiros — Marquez de Ficalho — José Lourenço da Luz = Felix Pereira de Magalhães.

O sr. Presidente: — Não sei como a camara quererá discutir o projecto de lei sobre que recáe o projecto que acaba de ser lido? Não havendo objecção, porei em discussão o parecer (apoiados). Esta pois em discussão o parecer n.º 196.

(Pausa.)

O sr. Presidente: — Como ninguem pede a palavra vou pôr o parecer á votação. Os dignos pares que approvam o parecer n.° 196, sobre o projecto de lei relativo ao orçamento do estado, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Agora vou pôr em discussão os pareceres que aqui tenho, pela sua ordem numerica. Vae ler-se primeiramente o parecer n.° 189, sobre o projecto n.° 165.

PARECER N.° 189

Senhores. —A commissão de administração publica foi presente o projecto de lei n.° 175, vindo da camara dos senhores deputados, pelo qual é auctorisado o governo a adquirir para o estado o palacio que outr'ora pertenceu aos marquezes de Niza, a fim d'ali se estabelecer um novo asylo de mendicidade.

Constando do relatorio, que precede a proposta do governo, que o actual asylo não é sufficiente para recolher o numero de individuos, quer adultos, quer menores, a quem, em vista da lei e respectivos regulamentos, cumpre dar domicilio;

Attendendo outrosim á informação prestada pelo governo sobre as boas condições do indicado edificio para o fim de que se trata; e

Considerando que a fundação de estabelecimentos d'esta ordem muito concorre, combinada com as demais instituições de beneficencia, para combater o flagello da mendicidade:

E de parecer a vossa commissão que o referido projecto de lei n.° 175 seja approvado por esta camara.

Sala da commissão, em 21 de junho de 1867. = Conde de Thomar —José Bernardo da Silva Cabral —Luiz Augusto Rebello da Silva = José Augusto Braamcamp = José Joaquim dos Reis e Vasconcellos.

Senhores. — A commissão de fazenda examinou o projecto de lei n.° 175, pelo qual a camara dos senhores deputados approvou a proposta do governo, tendente a auctorisar a acquisição para o estado, pelo preço de 20:000$000 réis, do palacio que foi dos marquezes de Niza, no sitio denominado da Madre de Deus, e a legalisar a verba de 1:200$000 réis despendida com o aluguer do mesmo palacio durante o anno corrente.

Não sendo da competencia da vossa commissão, nem comportando os limites do projecto, apreciar a influencia que os asylos exercem, conforma-se com o parecer da illustre commissão de administração publica, e limita-se a ponderar que a compra do edificio de que se trata, pelo referido preço, é, não obstante a escassez dos recursos do thesouro, de vantagem para o estado; e por este fundamento não hesita em propor a approvação do projecto, a fim de subir á sancção real.

Sala da commissão, em 21 de junho de 1867. = José Bernardo da Silva Cabral — Marquez de Ficalho — Visconde de Algés — Felix Pereira de Magalhães = José Augusto Braamcamp.

PROJECTO DE LEI N.° 175

Artigo 1.° E o governo auctorisado a adquirir para o estado o palacio á Madre de Deus, conforme a escriptura de promessa de venda celebrada entre o mesmo governo e o actual possuidor José Luiz Soares.

Art. 2.° E igualmente auctorisado o governo a pagar ao sobredito José Luiz Soares a quantia de 20:000$000 réis, preço da compra do mencionado palacio, e bem assim a legalisar a importancia de 1:200$000 réis, que despendeu na occasião de se assignar a referida escriptura, aluguer do anno corrente.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 17 de junho de 1867. = Cesario Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = José Maria Sieuve de Menezes, deputado secretario = Fernando Affonso Giraldes Caldeira, deputado secretario.

O sr. Presidente: — Esta em discussão.

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, o meu fim, tomando a palavra, é unicamente pedir alguns esclarecimentos ao sr. ministro dos negocios do reino sobre um ponto, que nem o projecto que esta em discussão, nem o relatorio que o precede, me explicam. Sabe V. ex.ª muito bem que eu tenho estudado muito a questão de beneficencia, e que tive até a honra de ser nomeado membro do congresso que se reuniu na Belgica para tratar d'este assumpto. Portanto não se deve estranhar que eu tome a palavra, ainda que á ultima hora, n'uma materia d'estas. Desejava que o sr. ministro me explicasse se o asylo de mendicidade, de que trata este projecto, é para recolher unicamente pobres, velhos e indigentes, ou é simultaneamente para recolher pobres e invalidos, e tambem para casa de correcção. Tenho algumas duvidas sobre este ponto, e por isso peço a s. ex.ª que me esclareça.

Esta questão liga-se com a questão da beneficencia geral, e com a questão das penitenciarias. S. ex.ª sabe o que o progresso social tem feito a este respeito, e os melhoramentos que nos paizes mais cultos da Europa se hão effectuado para aperfeiçoar este ramo da administração publica. O illustre ministro, com quem tenho por varias vezes e desde muitos annos conversado em particular sobre este assumpto, conhece as opiniões que professo quanto á questão de beneficencia. Eu entendo que aos governos cumpre exercer a beneficencia publica, mas que não devem tolher a acção á caridade particular, e sim dar-lhe toda a liberdade e favor possivel. E assim que se acatam os principios verdadeiramente liberaes. Eu não quero, como queria Treillard, no tempo da revolução franceza, que o estado faça tudo. Não quero, que se consagre esta doutrina verdadeiramente nefasta. E bom que o estado exerça a beneficencia; mas deve deixar livre, como disse, a acção particular para poder exerce-la desassombradamente: o estado só lhe deve servir de escudo e ajuda.

Estes é que são os verdadeiros principios liberaes, e são os do ministerio, pois que foram proclamados na tribuna pelos srs. Casal Ribeiro, Fontes e Mártens Ferrão, e são tambem os que tenho seguido e espero continuar a seguir; e estou persuadido que aquelles srs. ministros e eu havemos sempre de pugnar por elles.

Sr. presidente, a questão geral de beneficencia não se póde tratar á ultima hora, agora só se póde tratar d'esta do asylo. Deve porém, quando houver tempo, ser tratada aqui largamente como o tem sido em quasi todos os paizes da Europa, especialmente na Belgica, no congresso de Melines, onde os homens mais eminentes apresentaram muitos trabalhos sobre a beneficencia publica e reforma das prisões, e onde se apresentou mr. de Gerlache, presidente do tribunal de justiça, o conde de Montalembert, e outros ho-

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mens de muitos conhecimentos da materia e de grande nomeada, que se occuparam largamente do assumpto, dando-nos uteis lições de liberdade e de sãos principios de boa moral.

Portanto, sr. presidente, desejava eu saber quaes são as bases d'este projecto, para não votar ás escuras; se elle é apenas para se estabelecer um asylo, passe; mas se é para se crear uma casa de correcção, então não passe, pelo menos já, para que possa ser amplamente discutido, depois do sr. ministro nos dar todos os esclarecimentos e explicações de que necessitamos.

Aguardo a resposta do sr. ministro.

O sr. Ministro do Reino: — Sr. presidente, disse muito bem o digno par, que esta questão deve ser tratada largamente, e eu espero que ella o seja, porque tenciono na proxima sessão apresentar ao parlamento um trabalho sobre a beneficencia publicarem geral.

Sr. presidente, a natureza do asylo, a que se refere o digno par, esta especificada n'um regulamento que se acha publicado no Diario de Lisboa, e com o qual se acham tambem publicadas as bases para o estabelecimento de uma associação livre, auxiliadora das casas de beneficencia, debaixo da protecção de Sua Magestade a Rainha, sendo presidente o Senhor Infante D. Augusto, e vice-presidente o sr. cardeal patriarcha. Não sei se o digno par tem noticia d'esta publicação mas se a não tem, eu dou a s. ex.ª as explicações convenientes.

O fim d'este estabelecimento é fazer com que os mendigos que não podem trabalhar, e que se demorem no districto de Lisboa por mais de dois annos, mendigando pelas ruas, tenham ali um asylo onde se recolham, occupando para isso uma parte do edificio de que trata este projecto; e a outra parte será então destinada para recolher a infancia vadia, para a qual se estabelecerá uma organisação de trabalho, havendo escolas onde ella seja educada, segundo os principios da sã moral e doutrina christã, seguindo se em tudo o systema que a respeito do estabelecimentos de tal ordem se tem adoptado nos paizes civilisados da Europa.

Um o edificio de que se trata é completamente adequado para um estabelecimento com as largas bases a que se refere a organisação publicada na folha official do governo, e portanto creio que a camara não terá duvida alguma em approvar esta acquisição.

Na verdade, sr. presidente, um estabelecimento d'esta ordem era uma necessidade, já ha muito por todos reconhecida, para a capital de um paiz civilisado, onde a mendicidade se encontra constantemente pelas ruas, e onde igualmente se veem mancebos, por todos os lados, que a policia julga em estado de vadiagem e de abandono, aos quaes a sociedade deve instrucção e educação para se tornarem um dia bons cidadãos.

Sr. presidente, eu sou partidario da liberdade da caridade particular, e entendo até que ella ha de produzir, e já tem produzido, melhores resultados do que a caridade official; mas é tambem opinião minha que a caridade official não deve deixar assumptos d'esta ordem entregues unicamente á caridade particular. É por isso que o governo apresenta as bases para o estabelecimento da associação auxiliadora das casas de beneficencia; associação completamente livre, ligada entre si, tendo commissões filiaes nos differentes districtos do reino, e estabelecida no sentido em que o foram as dos paizes estrangeiros.

Sr. presidente, limito-me a estas poucas considerações, porque tudo que a respeito d'este assumpto se possa dizer já se acha escripto, como disse, no regulamento publicado no Diario de Lisboa; mas se o digno par exigir de mim mais algumas explicações, eu estou prompto para lh'as dar.

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, eu ouvi com toda a attenção as explicações do nobre ministro do reino. S. ex.ª declarou que o regulamento estava publicado no Diario; mas parece-me que n'um projecto d'esta ordem, o regulamento devia vir annexo, para nós podermos decidir com mais conhecimento de causa. Agora, o que me parece é que nós divergimos um pouco no modo de apreciar esta questão da caridade livre ou da caridade official. Creio que a caridade a que s. ex.ª se referiu é official. Entretanto, seja como for, o sr. ministro proclamou bem alto os seus principios da liberdade da caridade, o que não quer dizer que o governo não tenha a fiscalisação, porque é um direito e um dever seu; e o reconhece-lo é uma idéa conservadora. Os governos, por isso que são governos, têem a fiscalisação sobre tudo o que tem relação com a sociedade a que presidem. Mas pelo facto de terem a fiscalisação, não se segue que tenham o direito de absorver. Eu não quero a absorpção das forças sociaes pela entidade governo, como lhe chamou Ducpetiaux; mas quero que o governo tenha a fiscalisação de maneira tal, que os estabelecimentos de caridade, quer sejam officiaes, quer pertençam á caridade particular, não possam abusar, e desempenhem cabalmente a sua missão. Esta idéa é conservadora, como disse, e pesava-me na consciencia que o Sr. ministro levasse tão longe a idéa de que eu não queria esta fiscalisação; isso seria querer a anarchia, e eu não a quero, posto queira a liberdade da caridade. Quero porém que a acção do governo seja exercida só para fiscalisar que os principios de justiça sejam respeitados, e as leis cumpridas em relação a esses estabelecimentos de caridade.

Eu dou os meus emboras ao sr. ministro, e os meus elogios, se bem que s. ex.ª não precisa d'elles, pela creação d'estes estabelecimentos, e como s. ex.ª disse que eram completamente separados, estou satisfeito, porque era sobre esse ponto que eu tinha duvidas. Nem podia ser de outro modo.

Eu tenho lamentado o estado das nossas prisões, e uma das cousas que mais me punge e confrange o coração, e me perturba o espirito, é ver os menores confundidos nas prisões com os grandes facínoras, sem terem ninguem que os doutrine ou os vigie, emquanto cumprem uma pena de quinze ou vinte dias, pois que assim, em logar d'ella lhes servir de correcção, apenas é meio de corrompe-los completamente, como se estivessem n'um seminario do crime. Isto é que é necessario acabar de uma vez para sempre; é necessario que se comprehenda este grande principio, que é o verdadeiro principio progressista, porque o progresso não é senão a expansão do bem. Deus nos "livre da do mal, que é o progresso em todas as manifestações do crime.

Eu sou conservador progressista, e, como em uma occasião disse o sr. conde d'Avila, póde-se ser conservador e ser progressista, porque o conservador quer que se conserve a ordem, e se não conserve o que é mau, e por isso é conservador; e é tambem progressista, porque quer que se respeitem os bons principios e se progrida no bom caminho. Isto é que é ser progressista e conservador.

O sr. ministro do reino conhece perfeitamente as regras que regem os estabelecimentos de beneficencia em Inglaterra; e s. ex.ª, que é muito conhecedor da historia contemporanea, assim como o é da antiga, sabe que homens da primeira ordem, como mr. Gladstone, que ninguem deixará de reconhecer como um espirito liberal, Roussell e outros homens eminentes da Inglaterra professam estes mesmos principios na materia sujeita. S. ex.ª conhece as questões que se têem agitado no parlamento inglez sobre a beneficencia, e conhece as opiniões d'estes homens eminentes. Ali a questão de beneficencia reputa-se uma questão do paiz, e não uma questão do governo. O illustre ministro sabe as gravissimas difficuldades que muitas vezes têem encontrado os governos quando querem resolver esta questão n'um sentido centralisador, n'um sentido por assim dizer mais governamental, contra que tem reagido constantemente o espirito liberal d'aquelle paiz, zelando os seus fóros e os seus privilegios em beneficio publico e da sociedade. S. ex.ª sabe que em Inglaterra, paiz protestante, onde ha muitos catholicos, o governo dá um estipendio á casa de correcção que pertence á communhão protestante, e dá* ao mesmo tempo um estipendio á casa de correcção que pertence á communhão catholica. E colhido, por exemplo, na rua um vadio, indaga-se a que religião pertence, e manda-se para a casa de correcção da religião do estado, se elle pertence a ella; se pertence á religião catholica, manda-se para o convento dos padres Basilios, que é um vasto estabelecimento, onde se ensina a agricultura e a arte de marinhagem, e aonde são ao mesmo tempo doutrinados na sua religião. Isto é o que se pratica em Inglaterra, paiz altamente liberal, por consequencia quem esta a liberal Inglaterra e a liberal Belgica creio que póde caminhar a par dos maiores progressistas e dos mais abalisados liberaes. O sr. ministro disse que desejava caminhar n'esta estrada, e eu acompanho a s. ex.ª n'este caminho. Perdôe-me a camara de lhe ter tomado tanto tempo, mas entendi que devia pedir algumas explicações ao sr. ministro. Se tivesse conversado com s. ex.ª em particular a este respeito, não lhe tinha de certo pedido estas explicações; mas estando s. ex.ª sempre tão occupado com os negocios do estado, de certo que não tem tempo para se occupar dos meus negocios, porque eu considero isto como um negocio das minhas convicções. Foi por isso que vim pedir explicações ao sr. ministro, que s. ex.ª teve a benevolencia de me dar, e com as quaes em parte me satisfez, e faço votos para que o governo continue a trilhar a senda dos verdadeiros principios liberaes e do verdadeiro progresso, para que possa ser acompanhado por todos os homens que desejam a regeneração politica d'esta terra.

O sr. Presidente: — Vae pôr-se á votação o projecto de lei n.° 165 na sua generalidade. Os dignos pares que o approvam, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o artigo 1.°

O sr. Secretario leu.

Posto á votação foi approvado, bem como os artigos 2.º e 3.º e a mesma redacção.

O sr. Conde de Fonte Nova: — Peço a palavra sobre a ordem.

O sr. Presidente: — Tem a palavra.

O sr. Conde de Fonte Nova: — Peço a V. ex.ª que proponha á camara se concorda em que na terça e quarta feira da semana proxima haja sessões nocturnas. A rasão da minha proposta é obvia. Acabam-se sobre a mesa projectos importantes, e ainda hão de vir outros da camara dos senhores deputados, os quaes, havendo só sessões de dia, por certo não poderão ser discutidos por falta de tempo.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam a proposta do sr. conde de Fonte Nova, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvada.

O sr. Presidente: — Vae ler-se uma proposição de lei vinda da outra camara, para Sua Magestade poder sair do reino.

O sr. Secretario leu

Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados acompanhando uma proposição sobre ser Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Luiz I auctorisado para poder saír do reino sendo regente durante a ausencia do mesmo augusto senhor Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Fernando II.

O sr. Conde de Castro: — Sr. presidente, esta camara, n'uma occasião similhante, deu auctorisação á mesa para nomear uma commissão especial para dar o seu parecer sobre uma proposta identica. Agora pedia eu que se seguisse o mesmo precedente.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Pareceu-me ouvir dizer que se tinha recebido um projecto de lei para Sua Magestade saír fóra do reino. Não sei se isto está em discussão, porque não se ouve nada d'este logar.

O sr. Presidente: — Eu defino o estado da questão. É um projecto de lei vindo da camara dos senhores deputados, concedendo auctorisação para Sua Magestade saír temporariamente do reino; mas não é este projecto' que esta em discussão. Agora o que se trata de resolver é se este projecto ha de ir a uma commissão especial ou a alguma das ordinarias.

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, sendo este negocio tão simples, e ao mesmo tempo tratando-se de uma pessoa de tanto respeito para nós, como é o augusto chefe do estado, entendo que se deve dispensar o regimento para este projecto poder já entrar em discussão. Peço a V. ex.ª que proponha á camara n'este sentido.

O sr. Presidente: — Ainda não esta decidido se o projecto ha de ir ou não a uma commissão especial. É isto que tem de se resolver primeiro.

O sr. Rebello da Silva: — Da outra vez o que se fez foi conciliar a observancia das disposições do regimento d'esta casa com o respeito e consideração que se deve a uma proposta d'esta ordem. A mesa foi encarregada de nomear uma commissão especial, que immediamente saíu da sala e deu o seu parecer em acto continuo. Eu lembraria que se seguisse agora este precedente.

O sr. Silva Cabral: — Pedi a palavra para dizer o mesmo que acaba de propôr o digno par. Estão-se a gastar palavras sem necessidade. Ha já um precedente, e portanto não resta senão segui-lo, como propõe o sr. Rebello da Silva.

O sr. Marquez de Vallada: — E exactamente esta proposta que desejava fazer. Vozes: — Votos, votos.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam a proposta do sr. conde de Castro, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvada.

O sr. Presidente: — Nomeio os srs. conde de Castro, Rebello da Silva e visconde de Fonte Arcada, para comporem a commissão especial.

Em acto continuo saiu a commissão especial da sala.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o parecer n.° 193, sobre o projecto de lei n.° 177.

PARECER N.° 193

Senhores. — A commissão de fazenda examinou o projecto de lei n.° 177, vindo da camara dos senhores deputados, que tem por fim fazer desapparecer a desigualdade consentida pela carta de lei de 11 de agosto de 1860, quanto ás diversas fórmas de pagamento dos direitos devidos pelas mercês honorificas ou lucrativas.

Revoga outrosim o projecto o artigo 6.° da carta de lei de 18 de agosto de 1848, e contém diversas disposições tendentes a assegurar, a proporcionalidade do imposto, e a augmentar o seu rendimento.

Esta succinta exposição assás demonstra a conveniencia do mesmo prejecto, em vista do que a vossa commissão é de parecer que seja approvado, a fim de subir á sancção real.

Sala da commissão, 21 de junho de 1867. = José Bernardo da Silva Cabral = Marquez de Ficalho = Felix Pereira de Magalhães — Visconde d'Algés =José Augusto Braamcamp.

PROJECTO DE LEI N.° 177

Artigo 1.° Os direitos das mercês honorificas ou lucrativas que forem concedidas da data da publicação da presente lei em diante, e o correspondente imposto de viação, serão pagos em moeda corrente por uma só vez, dentro do praso de dois mezes, a contar da data da mercê, se os agraciados assim o pretenderem, ou por meio de prestações mensaes, que nunca excederão o numero de quarenta e oito.

Art. 2.° Aos agraciados, que se aproveitarem da primeira fórma de pagamento estabelecida no artigo antecedente, será concedido o abatimento de 10 por cento dos respectivos direitos.

Art. 3.° O minimo de cada prestação é fixado na quantia de 1$000 réis.

§ unico. Se a somma dos direitos e imposto não chegar a 48$000 réis, far-se-ha o pagamento em tantas prestações quantas bastem para que nenhuma d'ellas seja inferior a 1$000 réis.

Art. 4.° Os juizes de direito de 1.ª instancia, que da data da publicação d'esta lei em diante forem promovidos de uma para outra classe, pagarão os direitos de mercê e mais contribuições correspondentes á melhoria que tiverem de vencimento.

Art. 5.° São isentos de direitos de mercê as gratificações e bem assim os abonos feitos para despezas de representação.

Art. 6.° Quando o empregado ou o individuo agraciado com mercê pecuniaria não chegar a exercer o emprego para que foi nomeado ou a fruir a mercê que lhe foi concedida, ser-lhe-hão restituidos os direitos pagos.

§ unico. Se o empregado fallecer dentro do um anno da data da posse, ou a mercê for fruida por menos d'esse praso, os direitos serão pagos pro rata do tempo do serviço ou goso, devendo restituir se os que excederem essa proporção, se já estiverem integralmente satisfeitos.

Art. 7.° E o governo auctorisado a fazer o necessario regulamento, encorporando n'elle toda a legislação que a esta lei se não oppozer relativamente a direitos de mercê.

Art. 8.° Fica revogado o artigo 6.° da carta de lei de 18 de agosto de 1848, e qualquer outra legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 18 de junho de 1867. = Cesario Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = José Maria Sieuve de Menezes, deputado secretario = Fernando Affonso Giraldes Caldeira, deputado secretario.

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Posto á votação o projecto, foi approvado na sua generalidade e especialidade, sem discussão, e a mesma redacção.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o parecer n.° 190, sobre o projecto n.° 173.

PARECER N.° 190

Senhores. — Foi presente á commissão de legislação o projecto de lei n.° 173, vindo da camara dos senhores deputados, que tem por objecto a creação de mais um logar de escrivão de direito na comarca de Angra do Heroismo.. A vossa commissão, considerando a rasão do serviço publico que assim o reclama;

Considerando que o governo reconheceu essa necessidade, indo de accordo com o pensamento do projecto:

E de parecer que o mesmo seja approvado, para subir á sancção real e ser convertido em lei do estado.

Sala da commissão, em 19 de junho de 1867. = José Bernardo da Silva Cabral = Visconde de Seabra — Francisco Antonia Fernandes da Silva Ferrão = Alberto Antonio de Moraes Carvalho Felix Pereira de Magalhães = Rodrigo de Castro Menezes Pita = Conde de Fornos de Algodres, relator,

PROJECTO DE LEI N.° 173

Artigo 1.° E o governo auctorisado a crear mais um logar de escrivão de direito na comarca de Angra do Heroismo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 7 de junho de 1867. = Cesario Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = José Maria Sieuve de Menezes, deputado secretario = Fernando Affonso Giraldes Caldeira, deputado secretario.

Posto á votação o projecto, foi approvado sem discussão tanto na sua generalidade como especialidade, e a mesma redacção.

O sr. Presidente: —Vae ler-se o parecer n.° 191, sobre o projecto de lei n,° 169.

PARECER N.° 191 Senhores. — A vossa commissão de legislação examinou e discutiu com a devida attenção o projecto de lei n.° 169, enviado da outra casa do parlamento, ácerca da reformação do jury.

A commissão é de parecer que o projecto deve ser approvado.

Da sua adopção resultará um grande melhoramento.

Este melhoramento consiste por um lado na economia e reducção do encargo d'este penoso serviço, e por outro lado na maior garantia de capacidade dos juizes que devem decidir do facto.

O projecto vem alem d'isso pôr em harmonia os circulos do jury com a recente suppressão dos julgados ordinarios.

O projecto poderia talvez ser melhorado; mas attendendo a que esse aperfeiçoamento importaria o adiamento indefinido d'esta reforma, attenta a impossibilidade de poder-se obter no curtissimo tempo que resta da sessão actual, a solução das questões que poderiam levantar-se em ambas as casas do parlamento, julga preferivel a aceitação do projecto nos termos em que se acha.

Sala da commissão, 21 de junho de 1867. = José Bernardo da Silva Cabral = Felix Pereira de Magalhães = Alberto Antonio de Moraes Carvalho = Visconde de Seabra (com declaração) = Conde de Fornos de Algodres = Tem voto do digno par Rodrigo de Castro Menezes Pita.

Posto á discussão o projecto, foi approvado sem discussão tanto na sua generalidade como na especialidade, e a mesma redacção..

O sr. Rebello da Silva (sobre a ordem): — E para mandar para a mesa o parecer da commissão especial que V. ex.ª nomeou, relativamente á viagem de El Rei. Segundo os precedentes d'esta camara em negocios d'esta ordem tem-se dispensado o regimento para entrarem logo em discussão (apoiados).

O sr. Presidente: — Os dignos pares que entendem que se deve dispensar o regimento para poder entrar já em discussão o parecer que mandou para a mesa o sr. Rebello da Silva, tenham a bondade de se levantar. Foi approvado.

O sr. Presidente: — Vae ler se o parecer.

PARECER N.° 203

Senhores. — Á commissão especial nomeada pela presidencia d'esta camara, foi presente o projecto enviado da casa electiva, que auctorisa Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Luiz I para poder saír do reino, ficando a regencia a Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Fernando II, em conformidade da carta de lei de 7 de abril de 1846.

Parece á commissão quo não se oppondo n'esta occasião á saída de Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Luiz nenhum obstaculo ou impedimento, que devesse politicamente obstar a ella, e sendo hoje vulgar e aceito por todas as nações o facto das viagens dos soberanos, de que actualmente são frequentes e notaveis os exemplos, o projecto de que se trata esta no caso de ser approvado pela camara para subir á sancção real e ser convertido era lei.

Sala da commissão, em 22 de junho de 1867. = Conde de Castro = Visconde de Fonte Arcada (vencido) = Luiz Augusto Rebello da Silva.

PROJECTO DE LEI N.° 196

Artigo 1.° Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Luiz I é auctorisado, na conformidade do artigo 77;° da carta constitucional da monarchia, para poder saír do reino.

Art. 2.° Emquanto Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Luiz I estiver ausente do reino, será Regente Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Fernando II, conforme o disposto na carta de lei de 7 de abril de 1846.

Palacio das côrtes, em 22 de junho de 1867. = Cesario Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = José

Maria Sieuve de Menezes, deputado secretario = Fernando Affonso Giraldes Caldeira, deputado secretario.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. marquez de Vallada.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Eu sou membro da commissão, assignei vencido, pareceme que devo fallar em primeiro logar.

O sr. Marquez de Vallada: — Eu cedo com muito gosto ao sr. visconde de Fonte Arcada.

O sr. Presidente: — O digno par desiste da palavra?

O sr. Marquez de Vallada: — Não, senhor; eu não desisto, mas não me opponho a que o sr. visconde de Fonte Arcada falle primeiro.

O sr. Rebello da Silva: — Eu peço tambem a palavra por parte da commissão.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Sr. presidente, eu sinto muito não poder seguir a opinião dos meus illustres collegas da commissão, approvando o projecto de lei vindo da outra camara, que concede licença a Sua Magestade para que possa saír do reino. Eu desejava poder seguir a opinião da maioria da commissão. Já em outra occasião em que se pedia auctorisação para Sua Magestade saír do reino eu declarei que, se tivesse estado presente á votação da auctorisação, votaria contra a concessão da licença; e agora que estou presente, quando se trata do mesmo objecto, tambem não posso approvar a concessão da licença. A cholera tem-se desenvolvido em diversos pontos de Italia, como Milão, Napoles e Roma, e talvez que a esta hora tenha já invadido outras cidades e povoações d'aquelle reino. Eu vi uma carta de Florença de pessoa muito auctorisada, que assim o dizia, e n'estas circumstancias não se deve arriscar a vida de Sua Magestade, só pelo gosto de satisfazer o desejo de ir viajar, certamente muito desculpavel, mas que não deve satisfazer arriscando a sua pessoa.

Eu antes quero ser muito cauteloso, do que approvar o que póde dar maus resultados; voto como entendo, e não faço comprimentos a ninguem. Alem d'estas rasões, vejo que o paiz esta em circumstancias apuradissimas; este é um facto que todos nós sabemos, posto se não peça subsidio para a viagem de Sua Magestade. Nas circumstancias apuradissimas do paiz, e quando o seu estado financeiro inspira serios receios, é necessario que todos façam os maiores sacrificios; Sua Magestade, gastando em cousas que não são indispensaveis, vae-se inhabilitar de poder, querendo, empregar a importancia que vae gastar em beneficio do paiz, o que aliás poderia fazer senão saísse do reino.

Eu nego pois a licença a Sua Magestade em consequencia d'estes fundamentos; posto que Sua Magestade o Senhor D. Fernando, a quem devolve a regencia, seja uma pessoa competentissima, isto não basta.

Eu, sr. presidente, não só pela minha parte nego a licença a Sua Magestade, mas até lhe aconselharia que escrevesse a Sua Magestade a Rainha pedindo-lhe que voltasse sem demora para Portugal, para se não expor por mais tempo á epidemia que tem invadido a Italia.

Dizia um historiador da vida de Napoleão I, que uma das cousas que apressaram a sua quéda fôra o não ouvir á roda de si senão o echo das suas palavras; assim quando elle dizia que dentro em tantos dias e em tal localidade estaria um exercito numeroso e bem fornecido de tudo o que era necessario para entrar em operações, as pessoas que o rodeavam, posto que soubessem com toda a certeza que o que elle dizia era impossivel, nenhuma d'aquellas pessoas se atrevia a contradize-lo.

Sr. presidente, o que acontecia a Napoleão acontece a todo o poder, quer seja o popular ou o real, ou qualquer outro poder que só encontre á roda de si o echo das suas opiniões; quando isto acontece, a sua ruina não tarda.

Eu não quero alongar esta discussão, pareceme que tenho feito sentir quanto basta as rasões que me movem a votar contra a licença que se pede para a saída de Sua Magestade do reino; não preciso dizer mais nada.

Repito, sr. presidente, que sinto muito não poder approvar o parecer da commissão especial, mas eu antes quero estar mal com os homens do que com a minha consciencia.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Casal Ribeiro): — Sr. presidente, uma disposição excepcionalissima da nossa constituição, é a causa d'este projecto ser submettido á deliberação das duas casas do parlamento. E digo disposição excepcionalissima, porque a camara sabe perfeitamente que, por uma excepção que se encontra consignada em a nossa constituição, é necessaria a licença parlamentar para que o Soberano possa temporariamente ausentar-se do reino. Em outros paizes onde tambem regem instituições representativas, constitucionaes e similhantes ás nossas, tal licença não se exige, porque ali se entendeu dever deixar ao livre arbitrio do Soberano usar da liberdade, que a todos compete, de temporariamente poderem ausentar-se do seu paiz, comtanto que fique providenciado o que for necessario para regular a administração do estado durante a sua ausencia. Se esta disposição é como excepcional, só quero eu que se acredite que o governo, que tomou a responsabilidade do projecto, apresentando-o ao parlamento, entende que só quando circumstancias verdadeiramente graves fizessem recear um perigo imminente, ou pelo menos, todos nutrissem os qualquer receio; só então, digo, entenderia o governo que com fundamento se poderia negar a concessão de um tal pedido. Ora, eu creio que é facil de demonstrar que o caso não é este.

O digno par, e meu amigo, o sr. visconde de Fonte Arcada, a cujo voto consciencioso eu presto sempre a devida homenagem, mas do qual sinto n'esta como em outras occasiões dissentir, estabeleceu duas ordens de considerações: a primeira foi em relação ao estado sanitario de Italia. Emquanto a esse ponto, para não demorar mais, devo dizer ao digno par, que ao governo não consta cousa alguma sobre molestia epidemica, a não ser na Sicilia, mas esta consideração não basta para que se negue a auctorisação pedida.

Agora emquanto ás circumstancias do paiz, que é o segundo ponto, o governo acredita, e tem todo o motivo para acreditar, que as circumstancias do paiz são perfeitamente normaes, assim como que não ha motivo algum para se receiar que possa haver qualquer occorrencia extraordinaria. O que se dá antes para fundamentar este pedido, é a circumstancia conhecida de que todos os Soberanos, geralmente fallando, têem ultimamente viajado; e sobretudo, e geralmente fallando tambem, ou já têem concorrido ou tratam de concorrer á capital da França para tomarem parte na grande festa universal; de maneira que eu não sei que bem fizessemos em negar esta licença, o que seria em tal caso uma circumstancia excepcionalissima a notar-se, parecendo assim pela Europa como pelo mundo inteiro, que era para assim dizer cousa provada que o nosso estado politico tinha alguma cousa de perigoso, e que a cada momento se receiava algum cataclysmo. E a verdade é que nem remotamente se póde descobrir, felizmente, nem a duvida sequer de que houvesse motivo para que o governo deixasse de vir nas actuaes circumstancias apresentar uma similhante proposta, que effectivamente não achou recusa na outra casa do parlamento, como espero que não a achará n'esta, por isso mesmo que não se apresenta motivo algum sufficiente para que a votação possa aqui dar um resultado em sentido diverso (apoiados).

(O orador não reviu o seu discurso.)

O sr. Rebello da Silva: — Direi apenas duas palavras, porque sobre a questão esta tudo dito; e a primeira cousa que havia a observar era aquillo mesmo que notou o nobre ministro, isto é, que em toda a Europa constitucional não ha outro reino onde se dê igual caso de ser necessario fazer estes pedidos e conceder estas auctorisações.

Emquanto ás rasões apresentadas pelo digno par, o sr. visconde de Fonte Arcada, que diz que assignou vencido o parecer, porque a sua consciencia assim lh'o dictou, é claro que são tambem as rasões de consciencia aquellas que de» terminaram os outros membros da commissão a votar de differente modo, e nunca como s. ex.ª agora, e n'outras occasiões mais, tem entendido esta questão (apoiados). Não foi acto algum de lisonja que determinou o nosso voto (apoiados). N'estas questões, sr. presidente, concedo que haja duas especies de agrado, e que haja ou possa haver quem procure o agrado aulico, e similhantemente o agrado do povo. Ora eu creio que é sabido que não sou grande frequentador das salas regias; não sigo nenhuma das exagerações, vou pelo caminho mais recto, e confesso que se porventura esta proposta tivesse sido apresentada aqui tres mezes antes, não seria eu que lhe daria o meu voto, pois acompanharia o digno par na sua opposição; mas hoje, felizmente, são muito differentes as circumstancias. E o que eu noto é que todos os Soberanos da Europa concorrem á grande capital da França para tomarem parte, como disse o nobre ministro, n'essa grande festa universal. Se isto pois é um facto, e não se vê que haja perigo algum em se ausentar por algum tempo o Soberano de Portugal, que nada mais pede do que esta concessão, que unicamente o exigida pela nossa constituição, não sei, não concebo mesmo, como é que politicamente se podesse justificar esta camara tomando uma resolução negativa.

O digno par notou que as circumstancias dó thesouro eram apuradas, mas s. ex.ª não vê que no projecto se lhe peça nenhum auxilio para esta viagem.

Referiu-se tambem o digno par ao emprego que poderiam ter as sommas que se vão gastar na viagem, mas pareceme que s. ex.ª deve deixar a El-Rei a liberdade de applicar os seus rendimentos como quizer, e tanto mais que ninguem ignora que todos os annos costuma Sua Magestade mostrar a sua generosidade, e o quanto se interessa pelas cousas publicas.

Quanto ao flagello que póde ameaçar a vida preciosa de El-Rei, não tem elle a gravidade que o digno par lhe quiz achar, porque se em um outro ponto se tem apresentado alguns casos de cholera, se até mesmo alguns appareceram em París, isso não inhibiu nenhum Soberano nem nenhum Principe de viajar, e todos sabem que as pessoas que acompanham El-Rei se apressarão em mostrar a conveniencia, e a necessidade mesmo, de mudar de itinerario apenas haja o menor motivo de receio.

Estas são as rasões que levaram a commissão a dar um parecer favoravel ao projecto que se discuto, alem de não achar na actualidade nenhum motivo politico que podesse obstar á saída de Sua Magestade (apoiados).

(O orador não reviu o seu discurso.)

O sr. Marquez de Vallada: — O digno par, o sr. Rebello da Silva, disse tudo quanto se poderia dizer a favor do projecto, e por isso usarei unicamente da palavra para dizer que, procedendo como procedi, quando pedi a dispensa do regimento, não fiz mais do que s. ex.ª fez, isto é, entendi que por um acto de deferencia e de respeito devia propor essa dispensa.

Não se dão actualmente no paiz circumstancias que possam oppor-se á saída de El-Rei. Não estamos no tempo do governo absoluto, porque temos ministros responsaveis, e emquanto estes têem a confiança da corôa conservam-se n'aquellas cadeiras e são elles que respondem por todos os actos publicos; e quando perdem a confiança do Soberano demittem-se. Hoje não se póde dizer como no tempo do governo absoluto assim o quiz ou assim o não quiz Sua Magestade», e por isso os srs. ministros não se pódem desculpar com El-Rei. Elles têem toda a responsabilidade, e creio que a tomam. Ella tambem não é grave, porque Sua Magestade não vae fazer mais do que têem feito os outros soberanos da Europa, que vão assistir á exposição de París,

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áquelle grande acto que marca Uma epocha notavel na historia da industria universal.

Convencido pois pelas rasões que acabou de expender o sr. Rebello da Silva, com aquella proficiencia que lhe é propria, voto pelo projecto.

O sr. Conde da Ponte: — Pela posição especial que occupo na casa real, não podia deixar de pedir a palavra para declarar que nenhuns meios se hão de pedir para a viagem de Sua Magestade, como não se pediram anteriormente para as viagens que fez tanto o Senhor D. Luiz I como o Senhor D. Pedro V. A casa real tem a sua dotação e não pede mais nada.

Vozes: — Votos, votos.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. visconde de Fonte Arcada.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Cedo da palavra. O sr. Presidente: — Então vae votar-se o projecto. Foi approvado. Entrou em discussão o

PARECER N.° 194

Senhores. — A commissão de administração publica foi presente o requerimento que dirigiu á camara Henrique Schalck, pedindo que se for approvado o projecto de contrato com a empreza de abastecimento das aguas de Lisboa, seja ella obrigada a satisfazer as responsabilidades que pesavam sobre a extincta companhia, da qual o supplicante pretende haver 59:475$490 réis.

A commissão entende que ob direitos do supplicante hão do ser decididos pelos tribunaes, e que não pertence á camara intervir no objecto do requerimento.

Sala da commissão, em 21 de junho de 1867. =¦ Conde de Thomar—José Augusto Braamcamp = Luiz Augusto Rebello da Silva = José Bernardo da Silva Cabral = Conde de Fornos de Algodres = Marquez de Ficalho = José Joaquim dos Reis e Vasconcellos.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Mello e Saldanha: — Mando para a mesa um parecer da commissão de guerra. Leu-se na mesa.

O sr. Marquez de Fronteira: — Sr. presidente, proponho que se consulte a camara sobre se dispensa o regimento, a fim d'este projecto poder entrar desde já em discussão.

Consultada a camara, resolveu affirmativamente.

Entrou portanto em discussão o

PARECER N.° 202

Senhores. — A commissão de guerra foi presente o projecto de lei n.° 197, vindo da camara dos senhores deputados, auctorisando o governo a considerar como alumno habilitado com a carta geral do curso de engenheria militar da escola do exercito, com destino para esta arma, ao alumno habilitado com a carta do curso de engenheria da escola militar da Belgica o visconde de Seisal (Pedro), applicando-se-lhe as disposições do artigo 45.° e seus §§ do decreto com força de lei de 24 de dezembro de 1868.

A vossa commissão, tendo examinado attentamente a proposta do governo e os fundamentos que a motivaram, é de opinião que o indicado projecto de lei deve ser approvado por esta camara para poder subir á sancção regia.

Sala da commissão, em 22 de junho de 1867. = Conde de Campanhã = Marquez de Sá da Bandeira = José Maria Baldy — Marquez de Fronteira = D. Antonio José de Mello 6 Saldanha.

PROJECTO DE LEI N.° 197

Artigo 1.° É o governo auctorisado a considerar como alumno habilitado com a carta geral do curso de engenheria militar da escola do exercito, com destino para esta arma, ao alumno habilitado com a carta do curso de engenheria da escola militar da Belgica o visconde de Seisal (Pedro), applicando-se-lhe as disposiçoes do artigo 45.° e seus §§ do decreto com força de lei de 24 de dezembro de 1863.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 22 de junho de 1867. = Cesario Augusto de Azevedo Pereira, deputado presidente = José Maria Sieuve de Menezes, deputado secretario = Fernando Affonso Giraldes Caldeira, deputado secretario.

Foi approvado sem discussão, e a mesma redacção.

O sr. Presidente: — A camara determinou que na terça e quarta feira, alem das sessões diárias, haja tambem sessões nocturnas, mas é preciso que se saiba a hora a que devem começar.

Vozes: — Oito e meia ou nove horas.

Não ha nenhum projecto sobre a mesa, mas esperam-se bastantes da imprensa, e então peço aos dignos pares que na terça feira venham á hora marcada no regimento para a sessão, e previno de que a sessão nocturna ha de começar ás nove horas. A ordem do dia é a discussão dos pareceres que estiverem impressos.

Está levantada a sessão.

Eram mais de cinco horas.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão de 22 de junho de 1867

Ex.mos srs. Condes, de Lavradio e de Castro; Marquezes, de Ficalho, de Fronteira, de Sá da Bandeira e de Vallada; Condes, da Azinhaga, de Campanhã, do Farrobo, de Fonte Nova, de Fornos, da Ponte e de Thomar; Viscondes, de Almeidinha, de Algés, de Condeixa, de Fonte Arcada, de Ovar e de Soares Franco; Mello e Carvalho, D. Antonio José de Mello, Rebello de Carvalho, Pereira de Magalhães, Braamcamp, Silva Cabral, Reis e Vasconcellos, Lourenço da Luz, Baldy, Rebello da Silva, Almeida Pessanha, Fernandes Thomás e Ferrer.

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