Página 875
875
CAMARA DOS DIGNOS PARES.
(Sessão de 8 de Julho de 1848.)
Tendo-se entrado na Ordem do dia, discutiram-se os artigos restantes da Proposição de Lei sobre o pagamento, e recebimento em notas do Banco de Lisboa, cujos artigos foram approvados com as emendas, que a Commissão de Fazenda lhes propozera, e uma pequena alteração proposta pelo D. Par C. de Porto Côvo. A seguinte Sessão terá logar Segunda feira (10 do corrente) tendo por Ordem do dia os Pareceres n.º 41, 43, e 44 sobre as tres Proposições de Lei, a saber — a 1.ª convertendo em Lei o artigo 32.° da Companhia Auxilio; a 2.ª regulando o Passaporte Real para as embarcações nacionaes mercantes, que navegam de mar em fóra; e 3.º creando um Corpo de Veteranos da Marinha.
Havendo occorrido, antes de se entrar na Ordem do dia, o incidente das observações que se fizeram sobre um artigo do jornal União, offensivo a alguns D. Pares, o que provocou larga discussão; resolveu a Camara, que anticipadamente á integral publicação desta Sessão, se publicassem os discursos respectivos áquelle incidente, que pelos seus Oradores se apresentassem revistos, e são os seguintes.
O Sr. Sousa Azevedo — Sr. Presidente, chamo a attenção da Camara sobre um negocio grave o importante; grave e importantissimo, porque diz respeito á honra desta Camara, em consequencia do atacar directamente, sobre um objecto de que lhe vou dar conhecimento, a honra e probidade de alguns de seus membros.
É a primeira vez na minha carreira parlamentar, que tenho de fazer allusão á publicação de um jornal; e não é a primeira vez, que eu tenho pensado e reflectido quão inconveniente é em regra, que nas casas do Parlamento se leve em conta, o que te diz nos jornaes; mas os exemplos que tenho presenceado, e a gravidade do caso me conduzem a chamar a attenção desta Camara, para o que publicou hoje um jornal muito conhecido a União, n'um dos seus artigos, no qual tractou de atacar, de prevenir, e não sei que mais, o Contracto do Tabaco, imputando-lhe gerencia maliciosa ácerca do agio das notas, com o que nada me importa, e cuja parte do artigo inteiramente desprezo, porque nada tenho com o que fez, ou posso fazer o Contracto do Tabaco, ou algum outro contracto ou pessoa. Moralisarei porém o que se acha no mesmo artigo com respeito aos membros desta Camara, que combatendo o parecer da maioria da Commissão de Fazenda, tomaram parte na discussão do projecto que hoje se continúa a discutir ácerca das notas do Banco de Lisboa, e peço licença á Camara para lêr o periodo do artigo a que me refiro, a fim de que as minhas observações possam ser mais facilmente entendida. (Leu o seguinte) «E em fim será certo, que alguns cavalheiros só começaram a guerrear a lei das notas, depois que o Contracto do Tabaco foi obrigado a realisar os seus pagamentos integralmente em metal, por isso que em metal realisa todas as suas vendas?» Note-se, que isto é dito por aquelle periodico, que tem defendido constantemente a doutrina do projecto do Governo vindo da outra Camara; é aquelle periodico que tem porfiadamente combatido as disposições do Decreto de 9 de Dezembro, e respondido ao opusculo do Sr. Conselheiro Franzini, e que apresenta hoje asserções injuriosas, que não podem deixar de dizer respeito aos membros desta Camara, que sustentaram o parecer da minoria da Commissão de Fazenda!
Sr. Presidente, eu não só não duvido, mas até estou intimamente persuadido, de que cada um dos Membros desta Camara, que sustentou o Parecer da maioria da Commissão ácerca do Projecto sobre as Notas do Banco, o fizera por considerar mais fortes os seus fundamentos, e que todos votaram por esse. Parecer muito conscienciosamente (Apoiados); reconheço que só motivos e considerações de interesse do Paiz os levavam a assim proceder (Apoiados); mas é necessario que igual justiça se faça aos que sustentaram o Parecer da minoria da Commissão, com quanto suas razões e argumentos não fizessem peso sobre as convicções dos que sustentavam o Parecer da maioria (Apoiados). Será porém licito vir lançar censuras e aceitações aos Membros da minoria desta Camara, só porque não tiveram as mesmas convicções que os da maioria?! Será permittido entrar de um modo tal no sanctuario da consciencia de cada um?! Chega a licença de uma imprensa desenfreada a atacar a liberdade de pensar, e discutir dos Membros do Parlamento?! Podem ser permittidas calumnias e aleivosias desta natureza, querendo-se estabelecer assim um systema de oppressão?! E sabe esta politica de um jornal, que sustenta a do Governo! Sabe de um jornal, cujo programma, enganador, era que não atacaria ninguem, e vem hoje atacar alguns Membros do Parlamento, atacando por isso todo o Parlamento!
Sr. Presidente, se acaso se assentasse nesta, ou na outra Camara um individuo, que por interesses de alguma corporação, ou pessoas viesse ao Parlamento advogar qualquer objecto, esse representante da Nação tornar-se-ia indigno de occupar uma cadeira era qualquer casa do Parlamento (Apoiados); deveria ser processado, e severamente punido (Apoiados). Se estivessemos n'outras circumstancias, se as verdadeiras regras de reger os Estados se podessem observar, o Ministerio Publico deveria accusar esse escriptor, que assim vem atacar a liberdade dos Membros do Parlamento; mas já que isto não tem legar, pedi a palavra para lançar, do modo possivel, toda a expressão, e a mais forte que possa haver, da censura e stygma, sobre a aleivosia e calumnia, que em tal artigo se contém contra alguns Membros desta Camara (Apoiados).
Até aqui tenho fallado só de principios geraes, e da dignidade dos quatro ou cinco Membros desta Camara, que sustentaram o Parecer da minoria da Commissão: agora vou mostrar, por satisfação á mesma Camara, que, no caso de que se tracta, a calumnia á evidente e palpavel: peço por tanto a attenção da Camara.
Sr. Presidente, pelo que se diz no artigo do Jornal, que a Camara ouviu lêr, pretende-se inculcar, que a substituição da minoria da Commissão de Fazenda tinha por fim alliviar o Contracto do Tabaco de pagar em metal o preço da respectiva arrematação! Mas, Sr. Presidente, a Camara e o publico tem o conhecimento da doutrina dessa substituição, segundo a qual se estabelecia, que todos os pagamentos ao Estado, e por conta do Estado, seriam feitos a metade em metal e ametade em notas pelo valor do mercado, que é o mesmo que pagar tudo em metal (Apoiados); aonde está aqui pois o favor ao Contracto do Tabaco, se elle havia de pagar tudo como se fosse em metal?! Mas ainda peço a attenção de V. Ex.ª, Sr. Presidente, e muito desejo que ma preste (O Sr. Fonseca Magalhães — Descance.) Eu não estou cançado, este ponto é muito grave. (Apoiados). Chegou a tanto o escrupulo da minoria da Commissão, que muito reflectidamente alterou o Decreto de 9 de Dezembro, na parte em que concedia 2 por cento de bonus, ou favor em beneficio do pagador ao Estado: estes 2 por cento eram para compensar a differença, que podesse haver entre o agio do dia do pagamento, e a tarifa ou estiva estabelecida no fim da semana antecedente: isto a qualquer pagador ao Estado pouco poderia avultar; mas para o Contracto do Tabaco ainda era de importancia pela elevada cifra do seu pagamento; e então o que fizemos nós, conhecendo o terreno que pizavamos, a terra onde estavamos, e a época em que vivíamos? Dissemos — fóra o bonus — e não o adoptámos, pois lá, se diz na substituição, que se pagará metade em metal, e metade em notas pelo valor do mercado, sem nenhum beneficio para o pagador. Estabelecemos tambem, que a tarifa fosse diaria, e não semanal, para tornar impossivel esses males que se attribuiam á estiva; e prevenimos tudo, estabelecendo em regra geral os pagamentos ao Estado em metal, que é o que significa a disposição de pagar metade em metal, e metade em notas do Banco de Lisboa pelo seu valor no mercado, mas isto sem o bonus, ou favor de 2 por cento, aos que pagassem ao Estado. Eis-aqui o primeiro fundamento, que prova inconcussamente, que é uma perfeita calumnia o que se diz dos Cavalheiros, que combateram o projecto que veio da outra Camara, com a provisão de que o Contracto do Tabaco pagasse em metal (Apoiados).
Sr. Presidente, apezar dos esforços da minoria, da Commissão, passou o projecto do Governo como estava; isto é, determinou-se que os pagamentos ao Estado, e por sua conta, fossem feitos, tres quartas partes em metal, e uma em notas pelo seu valor nominal. E com effeito, depois disto vencido nesta Camara, não offereci eu ainda uma substituição ao artigo 3.º, a qual defendi com todas as minhas forças, apezar de já estar sanccionado, que o Contracto do Tabaco pagaria! como dispôz o projecto, isto é, em metal? Será isto verdade ou mentira? (Apoiado.) Se pois estava já decidido, que o Contracto pagasse em metal; e se eu continuava na emenda, ou substituição ao artigo 3.° do projecto, estabelecendo a doutrina, que me parecia preferivel sobre o modo da amortisação, e apresentando os meus argumentos, posto que fracos talvez, mas com esforço; como é possivel, em presença destas considerações, disse-se que o projecto era combatido, porque se não queria que o Contracto do Tabaco pagasse, em metal?! (Apoiados.) Eis-aqui o segundo fundamento, que convence de calumniosa a asserção do jornal; e ainda ha uma terceira razão mais forte que estas duas, o que parece talvez impossivel; mas eu vou manifesta-la perante a Camara.
Já aqui disse o Sr. Silva Carvalho, e invoco os testimunhos do Sr. Presidente do Conselho, assim como do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, e do Sr. Ministro da Fazenda, que por certo o daria se estivesse presente, e de todos os meus collegas da Commissão de Fazenda, que houve uma reunião na Secretaria do Reino, a que todos concorreram, na qual, tractando-se do projecto sobre as Notas do Banco, e discutindo-se a materia, eu expressamente disse ao Governo, que se S. Ex.ª (permitta-se-me a expressão) transigissem comigo em alterar a disposição do artigo 3.º, eu concordaria com S. Ex.ªs a respeito do artigo 1.º e seus §§. era um dos quaes estava estabelecido o pagamento em metal do Contracto do Tabaco. (Apoiados.) Esta foi a minha primeira proposta; mas como o Governo a não acceitou adoptei então a substituição organisada pelo meu nobre amigo o Sr. Silva Carvalho, com algumas alterações em que concordou o mesmo D. Par, bem como o Sr. B. de Chancelleiros, convencionando todos tres, que senão passasse aquella substituição, teria então logar a minha primeira idéa de offerecer a substituição ao artigo 3.º (Apoiados.) Esta razão por tanto é ainda mais forte, e prova irrefragavelmente que eu concordava com o Governo em deixar passar o artigo 1.º, que estabelecia o pagamento do Contracto do Tabaco em metal, uma vez que S. Ex.ª admittissem, que o artigo 3.º fosse alterado, e se adoptasse outra amortisação, o que nada tinha com o Contracto: parece-me pois ter mostrado até á saciedade, que é perfeita calumnia o que nesse jornal se diz. (O Sr. Presidente — Apoiado. — Apoiados de differentes logares.)
Agora rematarei, fazendo um requerimento a V. Ex.ª, ao qual me parece que está nas suas attribuições o defferir; mas quando o não esteja, espero que se consulte a Camara, e que esta approve o meu pedido. Visto que as Sessões desta Camara tem a sua publicação tão atrasada, e ser de grande conveniencia rebater a asserção do jornal com uma resposta prompta, pedia eu que, ainda que fosse em extracto, se fizesse menção Segunda feira no Diario do Governo, debaixo da epigraphe de Sessão da Camara dos D. Pares, da declaração que fiz, e que foi geralmente apoiada pela Camara, para salvar a honra dos D. Pares pertencentes á minoria da Commissão, dos que defenderam a substituição, e por ella votaram, e a de todos em geral, porque o ataque é á Camara (Apoiados repetidos).
O Sr. Presidente — Eu não gosto de assumir attribuições, que me não pertencem, mas a respeito dessa parece-me, que posso deliberar por mim (Apoiados).
O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros — O que eu tenho a dizer é muito pouco.
Concordo perfeitamente com o que disse o D. Par ácerca dos excessos da imprensa; mas como S. Ex.ª fallou em periodicos do Governo, e isto se possa talvez repetir, desejo que V. Ex.ª saiba, e a Camara, que o Governo não tem nada com o que dizem os periodicos (O Sr. Sousa Azevedo — Eu não disse que era do Governo, disse que sustentava a politica do Governo. Eu tenho lido nesse jornal algumas reflexões sobre a questão pendente, ou para melhor dizer, sobre um folheto publicado pelo Sr. Franzini; e declaro, que no meu modo de entender, tenho achado essas reflexões muito sensatas, muito urbanas, e muito polidas, pelo menos na sua maior parte. O numero de hoje não o li, e creio que é a esse que S. Ex.ª se refere (O Sr. Sousa Azevedo — É o de hoje); mas traga o que trouxer, o Governo não tem nada com isso.
Eu lastimo, como o D. Par, todos os excessos dos periodicos, e não são elles poucos: ainda no outro dia um dos principaes, entre muitas insinuações, todas offensivas desta Camara, e com especialidade da sua maioria, senão pejou de fallar em um voto, que custara quatro moedas: isto na verdade é passar todas as balisas! Repito — que concordo em que se publique tudo o que for em desforçamento do D. Par, e da Camara.
O Sr. Margiochi — Pedi a palavra para declarar, que approvo o que disse o D. Par o Sr. Sousa Azevedo, e para acrescentar que a allusão, que no jornal União se faz aos D. Pares, que votaram pelo projecto da minoria da Commissão de Fazenda, ou o assignaram, não tem applicação alguma a S. Ex.ª, e menos a póde ter a mim pela circumstancia especialissima, de que principiei a combater a medida do quarto em
Página 876
876
Notas do Banco de Lisboa nos pagamentos, pelo seu valor nominal, quando desta medida senão tinha ainda exceptuado o Contracto do Tabaco, ao qual se davam 200:000$000 de réis em metal, se fosse approvado o primeiro projecto que se apresentou a este respeito; e para provar o que affirmo, lembrarei á Camara o relatorio que lhe apresentei em 12 de Maio ultimo (Apoiados): neste relatorio encontram-se algumas allusões, que mostram quanto eu me oppunha a fazer tal concessão aos Contractadores. Despréso por consequencia, como calumnia, a allusão do jornal de que se tracta (Apoiados); e entendo que não tem applicação alguma, nem aos D. Pares, nem a mim, porque fui o primeiro que impugnei o beneficio, que se quiz fazer ao Contracto do Tabaco, e votei por uma proposta de lei da qual, pelas rasões que deu o D. Par, nenhum beneficio resultava aos Contractadores.
O Sr. C. de Thomar — Entendo que é muito justificado o procedimento do D. Par, que vendo em um jornal uma insinuação, a qual lhe é offensiva, aproveita a occasião de explicar-se para desaggravar a sua honra: assim entendo que o Sr. Sousa Azevedo procedeu bem em quanto se propôz explicar um facto, que foi mal interpretado. Toda a Camara nos apoiados que deu a S. Ex.ª mostra, que repelle a calumnia, que o D. Par disse ter sido publicada no jornal a que se referiu: eu espero que a Camara procederá da mesma fórma em caso identico. Fez bem o Sr. Sousa Azevedo em pedir, que a sua explicação fosse immediatamente publicada no Diario do Governo: assim obteremos tambem que outras explicações sejam publicadas (Apoiados).
Um jornal, que sustenta a politica da opposição, ahi tem publicado, que desde que fallou o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, as consciencias dos Pares da maioria ficaram manietadas á sua cadeira, e que não houve duvida em sacrificar com o seu voto o furto! Não será isto uma insinuação insidiosa? Não será uma grande calumnia? (Apoiados geraes). Pois bem: leiam os D. Pares a Revolução de Setembro, e ahi encontrarão estas, e outras calumnias!
Os D. Pares que votaram na minoria estão muito superiores aos ataques, que lhes possam ser feitos por taes motivos (Apoiados); mas no mesmo caso estão os Pares da maioria (Apoiados).
Tudo o que se está passando hoje nesta Camara, e tudo o que lemos nesses jornaes, que diariamente se publicam, prova evidentemente, que se torna indispensavel rever a Lei repressiva dos abusos da imprensa: quanto a mim é necessario pôr a coberto da calumnia, dos doestos, e indecencias, o Chefe do Estado, e os Corpos colegisladores (Apoiados repetidos). Eu espero que o Governo, se não apresentar o respectivo projecto nesta Sessão, porque está adiantada, o apresentará na Sessão proxima (Apoiados).
O Sr. Silva Carvalho — Eu não tinha tenção de fallar nesta materia; mas já que os D. Pares da minoria da Commissão de Fazenda procuraram desaggravar-se da grave injuria, que lhes fez o periodico, a que alludiram, eu não devo ficar silencioso, e concordo absolutamente em tudo quanto dissseram, e em especial com o meu collega e amigo o Sr. Sousa Azevedo.
Sou eu um daquelles, que mais esmagado tem sido pela imprensa deste Paiz, e ha muitos annos. (O Sr. D. de Palmella — Peço meças.) É verdade, tambem V. Ex.ª o tem sido. Quando em 1823 eu me retirei deste Reino para Inglaterra, a fim de fugir ás perseguições que se tentavam contra a minha pessoa, levantaram-me os periodicos mil calumnias: disseram que eu hia arrastando comigo as immensas riquezas deste Paiz; sabe Deos o que eu arrastava. E creio que ninguem hoje duvida dos meus haveres em tal occasião!... (Apoiados. — O Sr. B. de Porto de Moz — E a custodia?) É verdade, até com as mulheres me indispozeram! Uma Senhora em Londres, que tambem se tinha retirado deste Paiz, fallando a meu respeito disse nessa occasião — não lhe perdoo ter trazido roubada aquella Custodia para Inglaterra, onde ha mulheres tão lindas, apesar de que eu não conheço tal rapariga. Alguém disse-lhe, que a custodia não era nenhuma mulher: então observou a Senhora — eu pensava que custodia era alguma mulher assim chamada, que elle tinha trazido comsigo. (Riso.)
Sei quem são os auctores desse periodico, que por bem conhecidos se não confrontam: eu desprezo tudo quanto elles dizem. A minha vida publica está patente, não se offende com os ditos dos periodicos, dos quaes nunca fiz, nem faço caso algum.
O Sr. B. de Chancelleiros — Sr. Presidente, eu pedi a palavra para fazer duas declarações: a primeira consiste, em que eu por incommodo de saude não pude hontem vir assistir á sessão: — a segunda é, que se eu estivesse presente quando se votou a substituição do D. Par o Sr. Sousa e Azevedo, votaria por ella.
Agora em quanto ao incidente que está em discussão, direi só duas palavras. Sr. Presidente, desde que frequentei a Universidade de Coimbra sempre tenho tomado tabaco; mas tomo-o comprado com o meu dinheiro, e infelizmente sempre o peior que se fabrica nas nossas fabricas. (Riso na Camara.)
O Sr. Sousa Azevedo — Eu fiquei muito satisfeito quando vi pedir a palavra o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, porque pensei, que S. Ex.ª ia abundar nas minhas idéas de stigma pela affronta, que no jornal a que alludi, se faz a esta Camara; mas com sentimento meu digo que não succedeu assim, porque S. Ex.ª de algum modo pertende diminuir a importancia do ataque contra alguns D. Pares.
Eu peço licença a S. Ex.ª para lhe observar, que quando fallei dos artigos publicados nesse jornal, em sustentação do projecto do Governo, não disse, como S. Ex.ª quiz attribuir-me, que elles não eram concebidos em termos e estylo de civilidade: disse só que continham doutrinas, a respeito das quaes eu me não referiria, porque isto nada vinha para acaso, e o que stygmatisei foi a calumnia lançada contra alguns D. Pares. Mas o Sr. Ministro disse, para diminnir ou atenuar aquella asserção, que tambem pela imprensa se tinha assacado a um illustre Deputado, que recebêra quatro moedas, não sei para que Sr. Presidente, esse facto não vem nada para ocaso presente: se o jornal a que me referi fallasse só de mim, e dissessa que tinha recebido quatro ou mais moedas, eu o despresaria, como tenho despresado outros; mas não. Senhores, esse art.º ataca os Membros desta Camara, classificando-os de protectores de um contracto importante, de um contracto que é collossal em Portugal. A differença pois que ha entre o exemplo trazido por S. Ex.ª, e o objecto em questão, é palpavel; porque acolá ha o ataque a um respeitavel Deputado, concebido em termos inacreditaveis, e aqui ha uma grave imputação sobre o exercicio das funcções de alguns Pares, um ataque directo contra a independencia da Camara dos D. Pares (Apoiados). Mas quando houvesse tambem aquelle abuso, póde um justificar o outro?!
O D. Par o Sr. C. de Thomar disse, que era um jornal da opposição se tinha dito tambem, que desde que o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros tinha vindo declarar a esta Camara a sua opinião ácerca deste projecto, a consciencia dos D. Pares da maioria tinha ficado presa ás cadeiras do Ministerio. Sr. Presidente, reprovo similhante expressão por ser impropria da imprensa livre, e de applicar-se aos D. Pares; reprovo-a tambem porque isso não serve para fim nenhum (Repetidos apoiados). Mas ha grande differença entre uma e outra cousa. Se me dissessem, que eu tinha votado manietado á cadeira dos Ministros, eu ainda poderia sustentar que por motivos de politica a minha opinião era preferivel. (O Sr. C. de Thomar — Mas dizia-se que era para roubar a outros.) Na presença dessa declaração, cedo então de continuar as observações que ia fazendo, e reprovo igualmente com o D. Par aquella asserção.
Sr. Presidente, a sanha deste jornal é tal, e tão qualificadamente demonstrada, que chegou a sua intolerancia a menoscabar o caracter dos Membros desta Camara, que pela maior parte das vezes votam com a maioria, só porque elles uma vez tiveram a ousadia de não votarem com o Governo! Quer-se que se vote contra as convicções? Isso não póde ser. É até onde póde chegar a intolerancia! (Apoiados — Apoiados).
Sr. Presidente, eu espero que os assignantes daquelle jornal hão de na presença deste facto, desgostar-se de tal politica, que nenhum partido politico de ordem póde approvar, nem considerar vantajoso em nenhum sentido. (Apoiados.)
O Sr. C. de Thomar - Como eu é que fiz algumas reflexões, ácerca da necessidade de uma revisão na Lei sobre a liberdade de imprensa, é preciso explicar o meu pensamento, porque um D. Par inverteu o que eu disse.
O D. Par disse — faz-se ameaça vá liberdade de imprensa! Eu não fiz ameaça nenhuma á liberdade de imprensa; o que disse foi, que era, necessario que se fizesse uma Lei, que pozesse a salvo o Chefe do Estado, e as Camaras, das calumnias que diariamente se publicam; quem assim falla não quer atacar a liberdade de imprensa; desejo vêr a salvo estes dous objectos; e quem se não convencerá desta necessidade, observando a carreira de immoralidade, que vai seguindo essa imprensa!.. Sr. Presidente, em quanto assim marcharmos, nenhum fructo tiraremos da liberdade, e mostramos que nem a sabemos avaliar. (Apoiados geraes.)