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peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se dispensa a impressão do parecer sobre o projecto do codigo civil, a fim de entrar em discussão logo depois de ser discutido o parecer que o sr. ministro da justiça acaba de mencionar.

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, estamos aqui sempre vendo apresentar requerimentos identicos ao que acaba de fazer o digno par, o sr. Rebello da Silva, para que não seja impresso o parecer sobre o codigo civil. Parece impossivel que se façam d'estes pedidos sobre objectos de tanta importancia, como é o de que se trata. Por n>ais que investigue, não vejo rasão alguma que possa justificar um tal pedido, pois que desde este momento até á noite, em que terá de verificar se a outra sessão, ha tempo sufficiente para se imprimir o parecer que, como se sabe, versa sobre objecto importantissimo; portanto...

O sr. Vaz Preto: — Sr. presidente, os requerimentos não se podem discutir. Peço pois a V. ex.ª que ponha á votação o requerimento do digno par, o sr. Rebello da Silva (apoiados).

O sr. Rebello da Silva: — Peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre o meu requerimento (apoiados).

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam o requerimento do sr. Rebello da Silva, para que o parecer sobre o codigo civil não seja impresso, e entre em discussão logo depois do parecer n.° 212 sobre o projecto n.° 194, tenham a bondade de o manifestar.

Foi approvado.

O sr. D. Antonio José de Mello: — Sr. presidente, peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se dispensa o regimento a fim de que, attenta a estreiteza do tempo que nos resta, se não imprimam os pareceres que têem sido hoje apresentados, assim como aquelles que ainda se apresentarem, seja qual for a sua importancia.

Posto á votação, foi approvado.

O sr. Costa Lobo: — Pedi a palavra simplesmente para rogar a V. ex.ª que mandasse lançar na acta que eu votei contra todas estas dispensas do regimento.

O sr. Visconde de Soares Franco: — Sr. presidente, mando para a mesa o parecer da commissão de marinha e ultramar sobre o projecto de orçamento das provincias ultramarinas, e peço a V. ex.ª que, visto a simplicidade e urgencia d'este projecto, o ponha á discussão em seguida ao codigo civil.

Assim se resolveu.

O sr. Presidente: — Passa-se á ordem do dia, e vae ler-se o parecer n.° 212, sobre o projecto de lei n.° 194.

PARECEU N.° 212

Senhores. —A commissão de legislação examinou o projecto de lei n.° 194, vindo da camara dos senhores deputados, tendo por objecto a reforma da legislação penal o a fixação do systema penitenciario, objectos correlativos e que era forçoso harmonisar: não foi mister detido trabalho para a commissão formular o seu parecer; porque estas materias, que têem sido objecto de tantas contestações e de tão eruditos escriptos, não eram estranhas aos seus membros, que sobre ellas têem opiniões assentadas.

Dois grandiosos principios encerra o projecto: 1.°, a abolição da pena de morte; 2.°, a adopção do systema de prisão cellular de dia e de noite, com trabalho o completo isolamento, mas só de preso a preso: a commissão de bom grado se associa ao pensamento do governo.

Ella, pelo que respeita ao primeiro principio, não é arrastada pelos argumentos engenhosos e subtis doa philosophos humanitarios, que negam á sociedade o direito de impor a pena de morte; se esta o não tivesse, tambem se lhe não poderia conceder o de applicar a prisão, porque a liberdade do homem é tão preciosa como a vida, e é mais conforme á sua dignidade morrer livre que viver escravo temporaria ou perpetuamente; mas a commissão entende que a pena de morte, nem é necessaria (e a experiencia o tem mostrado), nem satisfaz os fins da penalidade. Apparecem é verdade criminosos dotados de instinctos ferozes, de espirito recalcitrante, praticando e repetindo delictos que envergonham e horrorisam a humanidade; mas nem é n'elles impossivel a regeneração, como attestam varios exemplos da historia sagrada e profana, nem elles podem de novo offender a sociedade, emquanto por falta de provas de emenda moral estiverem na prisão: a onça, o leão, o tigre vivem inoffensivos dentro da jaula.

Pelo que respeita ao systema penitenciario muito se tem estudado, observado, experimentado e escripto. N'outras eras as penas dos crimes eram afflictivas ou infamantes; a prisão não era mais que meio de precaução ou segurança; idéa de a elevar á categoria de pena, nascida nos estados romanos, foi desenvolvida na America do Norte, onde se estabeleceram os dois systemas: o de Philadelfia, e o de Auburn, tendentes ao mesmo fim, mas por meios inteiramente oppostos; em um o isolamento absoluto e sem trabalho; em outro o isolamento durante a noite e o trabalho em commum durante o dia com a imposição do silencio.

Não tardou o convencimento dos inconvenientes de ambos; emquanto aquelle entorpecia o corpo, atrophiava o espirito e desvairava a rasão; este, a despeito do silencio forçado e nunca conseguido, degradava com o castigo corpóreo a dignidade do homem, extinguia entre taes conviventes os sentimentos de honra e pundonor, obstava á regeneração moral, e preparava a reincidencia futura.

Introduziram-se pois varias modificações, e foi inaugurado um systema ecléctico, consistindo no isolamento de dia e de noite, completo sómente de preso para preso; mas, permittido o trabalho, a conversação e o trato com pessoas que possam curar a molestia do coração pervertido, e infiltrar n'elle o bálsamo da virtude.

A commissão não pretende fazer uma inutil e inopportuna resenha de tudo quanto largamente escreveram sobre o objecto Ch. Lucas, Montalivet, Dometz, Bluet, Ducpo-tiaux, Vasselot, Moreau Christophe, Duchatel, Baumont e Tocqueville, Cerfberr, Boneville, Bonnet, Ferrus, Bucquet, Leon Vidal, Beranger, Rossi, Lepelletier do la Sarte e outros; mas não deve dissimular que entre immensos defensores do systema cellular modificado têem apparecido alguns impugnadores, e que em uma nação illustrada como a França, os governos têem mostrado alguma hesitação.

A mensagem da camara dos deputados em 1830, levada ao rei, o sentimento uniforme dos governos durante esse reinado, o resultado das visitas officiaes que a França mandou fazer aos Estados Unidos, á Inglaterra, á Hungria, á Suecia, á Noruega, á Dinamarca, a Belgica e á Toscana, a opinião da academia das sciencias moraes e politicas, os projectos de lei apresentados á camara, as consultas dos prefeitos, o as doutrinas largamente discutidas o approvadas nos congressos de Francfort e Bruxellas, tudo indicava a conveniencia de decretar o systema de prisão cellular com trabalho e isolamento de dia e de noite; era tal a opinião em França que já em 1852 estavam concluidas, Segundo esse systema, quarenta e sete prisões departamentaes, e quinze em construcção; isto não obstante, o ministro do interior, mr. de Persigny, por uma circular de 17 de agosto de 1853, annunciou que o governo renunciava ao systema de separação individual, ordenando-se voltasse ao antigo de separação por classes e categorias.

Esta circular, diz mr. Beranger, causou um espanto geral, e contra ella houve protestos. Deu-se porém um facto digno de memorar-se: o governo dinamarquez, que já tinha adoptado aquelle systema cellular desde 1841, propunha se a pedir aos estados que lhe votassem uma somma de 1.500:000 francos para a construcção de uma nova prisão cellular; mas abalado em sua opinião por aquella circular, commissionou o conselheiro d'estado mr. David de ir a França fazer um inquerito sobre o objecto, e em vista d'elle o governo persistiu no intento, a quantia foi votada, e ali se tem progredido na construcção de taes prisões.

A commissão, apreciando estes factos e as rasões ponderadas por todos esses escriptores, entende que a prisão com trabalho em commum tem os inconvenientes seguintes:

Confunde os diversos gráus de moralidade e imputação;

Torna injusta a pena que não é igual para todos, nem os affecta da mesma sorte;

Na presença dos companheiros ministra um motivo constante de distracção, que exclue a meditação e obsta ao arrependimento;

Alimenta uma especie de amor proprio pela certeza de ter muitos companheiros a expiar os excessos de uma vida desregrada;

Corrompe os ainda não corrompidos;

Difficulta a vigilancia e a segurança;

Facilita o conhecimento mutuo dos criminosos, motivo poderoso das reincidencias.

Pelo contrario, entende a commissão que a prisão com trabalho e isolamento completo de preso a preso, tanto de noite como de dia, tem as seguintes vantagens:

Gradua a pena pela duração do tempo e pela difficuldade da communicação;

Excita a meditação durante a solidão;

Não offende o caracter moral do individuo;

Não admitte rigor, mas civilidade e conselho;

Adoça e humanisa os espiritos ferozes;

Evita a corrupção e facilita a ordem e a disciplina;

Aplana a indagação do temperamento do criminoso;

Assegura o segredo da ignominia;

Longe de aggravar a pena com o trabalho, serve este de distracção, promove os meios de beneficiar mulher e filhos, de idemnisar o offendido e o estado, e de começar vida regrada depois da soltura;

Prepara a regeneração moral, tornando provavel a emenda.

Em presença destas considerações não póde restar duvída sobre a preferencia; - é certo que esta reforma traz a necessidade de grandes despezas, e foi esse o fundamento visivel da circular de mr. Persigny; mas esse mal tem compensação na menor duração das penas, na restituição de braços arrancados ás industrias, no producto do trabalho obrigatorio, na possibilidade da indemnisação do offendido e do estado, na diminuição dos crimes e do tributo imposto pelo punhal, na maior segurança da vida e da propriedade, e na rehabilitação de muitos criminosos. Em summa, a commissão que considera indispensavel no nosso estado de finanças toda a economia possivel, entende que acima de tudo estão as reclamações da moral, e que é forçoso quanto antes fazer desapparecer este estado vergonhoso das nossas cadeias, ás quaes se póde applicar o que a respeito das da Turquia disse mr. Blanqui: « C'est la barbarie á son état le moins avancé».

O projecto tambem presta homenagem aos verdadeiros principios da sciencia, abolindo a pena de trabalhos publicos, e as de prisão perpetua e degredo perpetuo; mas estabelece como substituição á pena de morte a de prisão cellular perpetua, que a commissão em these reprova, e só a consente em hypothese como transição de um para outro systema, não vendo n'isso perigo, porque se os grandes criminosos derem provas inequívocas de uma completa regeneração moral, não deixarão de obter do poder moderador a commutação ou o perdão.

A commissão desejaria ver consignadas n'este projecto disposiçoes attinentes aos dois grandes auxiliares do systema; a saber: a libertação preparatoria e a detenção supplementar; mas não querendo retardar a adopção d'estas interessantes medidas, e podendo aquelles objectos ser tratados em separado, confia que o governo os não ha de esquecer.

A commissão pois emitte o seu parecer, submettendo á vossa approvação o seguinte projecto de lei.

(Segue o projecto que já foi publicado quando se discutiu na camara dos senhores deputados.)

Sala das sessões da commissão, 25 de junho de 1867. = =» José Bernardo da Silva Cabral, presidente =Felix Pereira de Magalhães = Conde de Fornos de Algodres =» Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão = Alberto Antonio de Moraes Carvalho.

O sr. Presidente: — Esta em discussão.

O sr. Costa Lobo: — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — Tem V. ex.ª a palavra.

O sr. Costa Lobo: — Eu não me disponho a discutir o projecto, porque é impossivel faze-lo n'estas circumstancias; mas confesso quo não póde o meu espirito soffrer que deixe passar esta occasião sem protestar (permitta-se-me a expressão) contra o systema que se esta seguindo. Tocados de uma especie de vertigem, como se diz, que sentem os viajantes que visitam as cataractas do Niagara que, vendo caír a agua aos turbilhões, se lhes perturba a vista, e quasi perdem a cabeça, tendo a tentação de se lançarem á agua; assim vejo a camara a lançar-se n'esta cataracta de leis que corre em turbilhões. Vendo isto não me atrevo a mandar para a mesa qualquer proposta que possa parecer que offerece algum obstaculo ao empenho de correr a passos precipitados, como se se tratasse de salvar o mundo, por modo que não se admitte nada que possa demorar essa obra, e desarranjar os planos salvadores, estabelecendo agora de novo a questão do pauperismo. Parece que se trata, que sei eu? de propor o decretamento da paz universal ou a pacificação immediata do Oriente... E tudo póde ser, porque na verdade parece que estamos todos inspirados, que não estamos discutindo n'um parlamento, mas formando um concilio ecuménico.

Eu vejo, sr. presidente, que se approva o orçamento em poucos minutos, que se faz o mesmo com as reformas das secretarias, com o decretamento dos codigos, com a reforma do systema penal, e com tudo que ha de mais importante. Já estou vendo propor dispensas de regimento para impressão, e até para nem se lerem os pareceres! Por certo ninguem deixará de dizer que o parlamento portuguez esta inspirado! Isto sim, que é progresso; onde esta ou onde fica o systema inglez? Pois no meio d'estes calores tropicaes hão de seguir-se as formulas inglezas tão frias?! Havemos de estar aqui dez e doze horas a discutir, como ali se faz? Nós para discutirmos uma reforma eleitoral ou qualquer assumpto importante gastamos só uma sessão, e até, sendo necessario, uma pequenissima parte d'ella. Atrevemo-nos a reformar a legislação penal, sem estudo e sem ter que substituir-lhe. De que hão de Bervir aquellas velhas ordenações e aquelles fosseis livros classicos de jurisprudencia criminal? Qual será a sorte d'essas volumosas obras de Pegas, de Lobão, de Pereira e Sousa e de tantos jurisconsultos e praxistas?! Ahi passam n'um momento, depois de approvado o projecto do codigo civil, das estantes dos magistrados, juizes e advogados, para as tendas e mercearias, aonde vão servir de papeis para embrulhar (riso). Com um simples traço de penna ficam as bibliothecas reduzidas a nada!

Para que se ha de, a fallar a verdade, levar muito tempo com estas reformas, se tudo se póde fazer em poucos minutos? Realmente o que parece impossivel é que este expediente não esteja adoptado em toda a parte, e desde ha muito posto em execução.

Mas, como disse, sr. presidente, eu não discuto o projecto, porque o não posso discutir. Occorre-me porém n'este momento que quando Alvaro de Almada, intimo amigo do infante D. Pedro, duque de Coimbra, sucumbia no campo da Alfarrobeira, aos golpes do inimigo, diz o chronista que elle se expressara da seguinte maneira: fartar rapazes, fartar. Eu digo rapazes para conservar o rigor da phrase e a exactidão historica, mas sem a minima intenção de applica-la a ninguem. Ha muito quem diga que nós estamos a inverter o verdadeiro systema parlamentar, e porque não? A fallar a verdade parece que alguma rasão têem os que assim pensam, porque, por exemplo, tratando-se da questura, houve aqui uma questão longa e aturada sobre quem havia de tomar conta da segurança da casa e d'estas columnas, bem como da limpeza e segurança da mobilia; e agora para se decretar a abolição da pena de morte e considerar o systema cellular como o melhor meio de substitui-la, bastam alguns minutos. Diz-se que tudo esta muito bom no projecto, mas nós não o sabemos, nem sequer pela simples leitura do projecto, que não se dá tempo para ter, quanto mais para o meditar.

O que eu penso, Sr. presidente, é que quando d'aqui era diante dois membros do parlamento se encontrarem, ha de acontecer-lhes o mesmo que, segundo diz Cicero, acontecia aos aruspices quando se encontravam, que olhavam um para o outro e riam-se. Não digo mais nada, sr. presidente, e peço desculpa á camara por lhe ter occupado o tempo apresentando estas considerações e imagens. No entanto sempre direi que, quanto a mim, tomaria a resolução de adiar todos estes projectos até que houvesse o tempo necessario para serem estudados e discutidos como merecem e devem Belo; a camara porém fará o que quizer. Pela minha parte fiz o que devia, porque me pesaria sobre a consciencia deixar de apresentar aqui a minha opinião sobre o systema que vejo a camara seguir.

(O orador não reviu o seu discurso.)

O sr. Marquez de Sá: — Sr. presidente, emquanto á questão da abolição da pena de morte, já na camara dos pares se tratou n'outro tempo; V. ex.ª mesmo me convidou a assignar um projecto de lei para a sua abolição em todos os casos. Eu n'esse tempo era de opinião que esta pena devia conservar-se para ser applicada ao crime de assassinato premeditado. Depois porém modifiquei a minha opinião. No anno de 1864, no ministerio do sr. duque de Loulé, o minis-