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O Sr. Sousa Azevedo — Duas observações: em primeiro lugar eu concordo com o Sr. C. de Lavradio em julgar, que o numero com que deve funccionar esta Casa, e mesmo a outra, é propriamente objecto d'uma lei; mas para o caso em que estamos não remedeia este alvitre de S. Ex.ª, porque o que chamou a attenção da Camara sobre a necessidade d'esta medida, foi o estado actual da Sessão, e a urgencia de decidir os negocios, que ha a tractar; e para este caso nenhuma providencia resultaria d'uma Proposta de Lei, que ainda tinha de ser discutida e approvada nas duas Casas do Parlamento. Proponho pois á Camara, que considerando a falta de numero em que nos achamos, dê alguma providencia para se poder tractar das materias, que estão para isso preparadas pelas respectivas Commissões desta Camara, e das que ainda hão de vir da outra Casa, sendo algumas de grave importancia.

Em quanto ao segundo ponto direi, que concordo com o Sr. C. de Thomar; mas em abono da verdade devo dizer que eu já li n'um dos extractos das Sessões da outra Camara, que o seu Presidente chamára a attenção da Commissão de Legislação sobre o projecto, que foi desta Casa ácerca de regular o n.º de Pares, com que póde constituir-se em Tribunal de Justiça, e disse que era necessario mostrar toda a defferençia pela Camara dos Pares, e discutir-se alli quanto antes aquelle projecto: por tanto se, a Camara Electiva não tem dado andamento a este objecto, é porque a Commissão ainda não appresentou o seu parecer, o que é de esperar que faça quanto antes, pois que já passou ha bastante tempo, e o negocio é urgente que passe nesta Sessão Legislativa, aliás não poderá a Camara dos Pares constituir-se em Tribunal de Justiça neste intervallo até á proxima Sessão. Approvo com tudo a indicação proposta a este respeito.

O Sr. C. de Thomar — Eu tambem estou, em que é mais conforme aos principios que seja fixado por Lei o numero; mas o principio e doutrina adoptada até agora é outra, pois todos sabemos que cada uma das Camaras tem estabelecido nos seus regimentos o numero com que póde funccionar; mas agora entendo, que para se poder fixar esse numero, não se póde fazer senão adoptando a lembrança do Sr. Duque de Palmella, e para isso mesmo é preciso estarem presentes trinta e dous Membros.

Pela entrada de alguns D. Pares constituiu-se a Camara com o numero legal.

ORDEM DO DIA.

Parecer n.º 50 sobre o Projecto de Lei n.º 43, estabelecendo Conselhos disciplinares, e o modo de procederem no exercicio da sua jurisdicção.

Parecer n.º 50.

A Commissão de Legislação examinou o Projecto de Lei, apresentado pelo Digno Par José Antonio Maria de Sousa Azevedo, o qual tem por objecto a creação dos Conselhos Disciplinares, e o modo de proceder no exercicio da Jurisdicção Disciplinar, que lhes é incumbida.

A Commissão pensa, que as providencias consignadas neste Projecto são necessarias para a boa administração da Justiça; e tendo ellas já sido discutidas, e approvadas por esta Camara na anterior Legislatura, é de parecer que o mesmo Projecto seja adoptado.

Sala da Commissão, em 13 de Julho de 1848. = José da Silva Carvalho = B. de Porto de Mós = Manoel Duarte Leitão = B. de Chancelleiros.

RELATORIO.

Senhores: A iniciativa que tomo no Projecto de Lei, que hoje tenho a honra de vos apresentar, tem por fim promover o andamento regular de um complexo de providencias que formem o systema do Conselho Disciplinar, convenientemente adaptado á Magistratura Judicial.

Tive eu a honra de apresentar este Projecto na Camara dos Srs. Deputados em 1843, quando me cabia a de fazer parte do Ministerio nesse tempo; e depois de approvado naquella Camara, passou para esta, que tambem o adoptou com pequenas alterações, em consequencia das quaes foi remettido á respectiva Commissão para fazer a ultima redacção, aonde ficou até que se concluiu a Legislatura, e por isso caducou em conformidade com o disposto na Carta de Lei de 16 de Março de 1836.

Esta succinta exposição justifica o motivo, porque intendo não só superfluo, mas até impertinente, fazer-vos a exposição dos fundamentos da conveniencia e necessidade do systema ou Conselho Disciplinar para a Magistratura Judicial; porque em verdade seria ousadia pretender esclarecer nesta Camara um objecto por ella discutido e votado. Omitto por tanto o relatorio que aliás offereceria á vossa consideração, se as expostas circumstancias me não convencessem de que assim devo proceder.

Tambem me cumpre declarar a esta Camara, que no Projecto de Lei que offereço á sua consideração, tive o cuidado de copiar fielmente todas as provisões que ella approvou com as emendas offerecidas na respectiva discussão por diversos Dignos Pares; pois intendi que qualquer que fosse a minha opinião sobre a materia, não me permittiam as considerações de respeito, que consagro a todos os Dignos Membros desta Camara, e o conceito que igualmente formo da sua sabedoria, addicionar, ou de qualquer modo alterar o que esta Camara approvou.

Em attenção pois a estas considerações tenho a honra de offerecer o seguinte

Projecto de lei n.º 43.

Artigo 1.º A jurisdicção disciplinar, ou de censura, tem por fim advertir, e corrigir as faltas dos Juizes, commettidas dentro ou fóra do exercicio de suas funcções, que, não tendo a qualificação de crimes ou erros de officio, mostram comtudo esquecimento, e abandono da dignidade do Magisterio, e do zeloso cumprimento de seus deveres.

unico. Esta jurisdicção não prejudica o direito de correcção, e censura para com os Juizos inferiores, que se acha estabelecido pela Legislação actual.

Art. 2.º Para tomar conhecimento das faltas, de que tracta o artigo antecedente, haverá no Supremo Tribunal de Justiça, nas Relações, e no Tribunal Superior do Commercio, Conselhos Disciplinares.

§. unico. Os Conselhos Disciplinares serão compostos dos Presidentes dos Tribunaes em que são creados, e de quatro dos seus Membros, tirados por turno, segundo a ordem da precedencia.

Art. 3.° Ao Conselho Disciplinar do Supremo Tribunal de Justiça compete o conhecimento das faltas especificadas no artigo 1.º, commettidas pelos Membros do mesmo Tribunal, e pelos de todos os Tribunaes de 2.º Instancia: ao das Relações, o das commettidas tanto pelos Juizes de Direito de 1.ª Instancia, qualquer que seja, ou venha a ser a sua denominação, como pelos Juizes Ordinarios do seu respectivo Districto Judicial: e ao do Tribunal Superior de Commercio, o das que commetterem os Juizes Presidentes dos Tribunaes Commerciaes de 1.ª Instancia.

Art. 4.º Os Conselhos Disciplinares sómente poderão ser convocados pelo seu Presidente a requerimento do Agente do Ministerio Publico, junto ao respectivo Tribunal, feito em virtude de ordem do Governo, e acompanhado de todos os papeis, que este lhe tiver remettido para melhor conhecimento da falta, ou faltas arguidas.

Art. 5.º O Conselho, reunido em conferencia particular, mandará que o Juiz arguido responda por escripto, assignando-lhe, para o fazer, um prazo razoavel em attenção á distancia da localidade da sua residencia, e á facilidade das communicações.

§. unico. A ordem para o Juiz responder ser-lhe-ha transmittida officialmente pelo Presidente do Conselho, com todos os papeis comprovativos da arguição.

Art. 6.º Se o Juiz arguido, ou o Agente do Ministerio Publico requererem ser admittidos a produzir prova testemunhal, o Conselho o admittirá, oral perante elle, se as testemunhas residirem na sua séde, e no caso contrario, por escripto, perante o Juiz de Direito mais proximo da Comarca do arguido, mandando expedir ordem aquelle para proceder ao inquerito dentro do um prazo, que lhe assignará, conforme o disposto no artigo antecedente.

Art. 7.° Findo este processo preparatorio, o Conselho, depois de ouvir por escripto o Agente do Ministerio Publico, deliberará, em conferencia particular, ou sobre a sua competencia, ou sobre a applicação da pena disciplinar.

§. unico. A decisão será tomada á pluralidade de votos, e sempre fundamentada: o ultimo Juiz, na ordem da precedencia, tirará o accordão.

Art. 8.° Quando o Juiz arguido, em sua resposta contra a competencia do Conselho, ou por ser a falta, que fôr objecto da arguição, qualificada por direito — crime — ou — erro de officio — requerer que se instaure o meio ordinario da querela; ou porque a mesma não esteja, por sua natureza e qualidade, sujeita á jurisdicção disciplinar, o mesmo Conselho, sobreestando na decisão final, proporá o processo em Mesa grande, ou conferencia particular de todos os Membros do Tribunal, e alli se decidirá unicamente o ponto da competencia.

§. 1.° Se o Tribunal decidir, que o caso não é da competencia da jurisdicção disciplinar, pelo ser de querela, assim o pronunciará por accordão, mandando que todos os papeis se devolvam ao Agente do Ministerio Publico, para usar dos meios competentes: se porém, tomar por fundamento o segundo dos motivos do protesto, declarados neste artigo, ordenará que mais se não prosiga pelo Feito. No primeiro destes casos se fará sempre no accordão expressa menção da Lei, que qualificar de — crime — ou de — erro de officio — a falta arguida.

§. 2.° Quando o Tribunal julgar competente a jurisdicção disciplinar, assim o pronunciará tambem por accordão; e o Conselho se reunirá depois em conferencia particular para proferir a sua decisão final.

Art. 9.º Ainda mesmo que o Juiz arguido não tenha protestado contra a competencia da jurisdicção do Conselho Disciplinar, se este entender, que a falta, ou faltas, de que se tractar, teem a qualificação de — crime — ou de — erro de officio — proporá o Feito em Mesa grande para, em conferencia particular de todos os Membros do Tribunal, se decidir a questão da competencia, observando-se tambem neste caso as disposições do artigo antecedente.

Art. 1.º Nos processos disciplinares servirá de Escrivão o Secretario, ou Guarda-Mór do respectivo Tribunal; e todas as suas decisões definitivas serão communicadas pelo Presidente á Secretaria de Estado dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça.

Art. 11.° A censura simples, imposta aos Juizes de 2.ª Instancia, e aos Membros do Supremo Tribunal de Justiça, é intimada aos mesmos pelo Presidente do Tribunal, a que pertencem, perante o seu respectivo Conselho Disciplinar, reunido em conferencia particular. A censura severa é dada tambem pelo mesmo Presidente em Tribunal pleno.

§. 1.º Para se levar a effeito o disposto neste artigo, quando os Juizes, a quem a censura é imposta, forem de 2.ª Instancia, o Conselho Disciplinar do Supremo Tribunal de Justiça expedirá a competente ordem ao Presidente do respectivo Tribunal.

§. 2.º A censura severa, ou a simples com reincidencia, será publicada no Diario do Governo.

Art. 12.° A censura simples, imposta aos Juizes de 1.ª Instancia, ser-lhes-ha intimada de ordem do Presidente da respectiva Relação, ou Tribunal Superior do Commercio, por um Juiz de igual graduação da mesma Comarca, se nella o houver, ou, não o havendo ahi, pelo Juiz de Direito da mais proxima; e, quando imposta aos Juizes Ordinarios, sê-lo-ha pelo da sua mesma Comarca.

Art. 13.º A censura severa, imposta aos Juizes de 1.ª Instancia, será intimada pessoalmente pelo Juiz de Direito da Comarca mais proxima, designada pelo accordão, na sede da sua residencia, e na presença de dous dos seus Substitutos, e do Agente do Ministerio Publico, devendo para isso comparecer perante elles o Juiz accusado no dia que aquelle lhe designar.

§. 1.° Nas Comarcas de Lisboa e Porto, será feita a intimação perante os Juizes de Direito de cada uma das mesmas Comarcas, na presença do Agente do Ministerio Publico da Vara a que a intimação da censura severa fôr commettida.

§. 2.° A mesma censura, quando imposta a Juizes Ordinarios, ser-lhes-ha intimada pelo Juiz de Direito da respectiva Comarca, porém, pessoalmente, e na presença tambem de dous dos seus Substitutos, e do Agente do Ministerio Publico.

§ 3.º Nas Ilhas adjacentes, em que não houver mais de uma Comarca, a censura severa, imposta aos Juizes, será levada a effeito, ou pela fórma prescripta neste artigo, ou pelo modo que ao Conselho parecer mais conveniente, segundo no accordão se declarar.

Art. 14.º Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Sala da Camara dos Pares, em 5 de Julho de 1848. = José Antonio Maria de Sousa Azevedo.

O Sr. Sousa Azevedo — Sr. Presidente, escusado é cançar a Camara com a explicação dos motivos, que justificam a conveniencia da adopção deste projecto. Em todos os paizes aonde ha Systema Representativo, aonde ha a divisão dos Poderes Politicos, que formam esse mesmo systema, tem-se intendido ser necessario, que o Poder Politico = Judicial = que tem estabelecido como primeiro annel da cadêa de suas attribuições, ou antes da sua essencia, o ser independente, seja acompanhado de provisões, e medidas que façam, com que o uso e exercicio das suas attribuições seja o mais conforme ao fim da sua propria Instituição: era portanto impossivel, que o Governo Portuguez deixasse d'attender á necessidade d'uma Instituição desta natureza; e com effeito em 1843, tendo eu a honra de estar nos Conselhos de Sua Magestade dirigindo a Secretaria d'Estado dos Negocios da Justiça, apresentei um projecto de lei tendente a obter este fim; e da sua materia se tractou muito minuciosamente na Commissão de Legislação da outra Casa, e depois na mesma Camara Electiva, na qual se fizeram algumas alterações á proposta originaria do Governo, passando depois o projecto para esta Camara, aonde não foi impugnado o principio da conveniencia dessa Instituição, e foram na maxima parte approvadas as provisões do projecto, como tinham vindo da Camara dos Srs. Deputados, introduzidas algumas emendas e alterações, com as quaes intendo que elle ficou aperfeiçoado. Já se vê pois pela resumida historia, que dou deste projecto, que elle contem maioria corrente, que foi quasi plenamente approvada na Camara Electiva, e na Hereditaria; mas como acabasse a legislatura antes de ser sanccionada a lei, caducou o projecto em conformidade com as disposições da Carta de Lei de 16 de Fevereiro de 1845; e eis-aqui a razão porque eu tomei a iniciativa, e propuz nesta sessão o mesmo projecto, declarando no respectivo relatorio, que ommittia a exposição dos motivos de conveniencia da adopção desta medida, porque haviam sido conhecidos, e devidamente appreciados por esta Camara na ultima sessão legislativa. É por tanto, na minha opinião, fóra de duvida, que muito convem adoptar este projecto; e com quanto se possa dizer, que algumas das attribuições, que nelle se contêem, competem aos Presidentes dos Tribunaes, é todavia certo que de ordinario as attribuições, que se concedem a uma authoridade individual, quando teem alguma cousa de odioso, não se exercem com efficacia e rigor; e é isto o que exactamente tem acontecido a respeito dos Presidentes dos Tribunaes, que sempre receiam dar execução a attribuições, que aliás lhes pertencem, mas de que podem resultar advertencias, e correcções a seus collegas; sendo ainda para advertir, que as presidencias dos Tribunaes são logares de commissão, do que eu intendo que resultam graves inconvenientes, e entre elles sobresáe o de não serem bons executores de certas providencias aquelles, que teem de descer da cadeira da presidencia, a arbitrio do Governo, para virem sentar-se ao pé dos demais membros do mesmo Tribunal. Isto já se observava na antiga magistratura: as attribuições concedidas aos Presidentes dos Tribunaes para exercerem a devida superintendencia ácerca dos respectivos Magistrados, quasi nunca produziram bom effeito, e tudo conduz para demonstrar a absoluta necessidade, e conveniencia desta lei, para que não possa deixar de se estabelecer o processo das admoestações é censuras, a respeito dos diversos Magistrados do Poder Judicial, quando se derem justos motivos de assim se praticar, e segundo as regras e formalidades estabelecidas. É tambem sabido, que por isso mesmo que o Governo não exerce, nem deve exercer qualquer acção a respeito dos differentes actos, que praticam os Magistrados no exercicio de suas funcções, e com relação ao seu comportamento moral o civil; e possam a tal respeito haver faltas ou omissões, que com quanto não devam classificar-se crimes, carecera de alguma correcção ou advertencia, o que não poderia ter logar por um processo ordinario, é muito conveniente, que existam regras estabelecidas, as quaes graduem segundo os casos occorrentes os termos das advertencias e correcções, havendo sempre muita consideração á necessidade destas, e á dignidade e decóro dos Magistrados Judiciaes.

É escusado cançar á Camara com a continuação destas reflexões porque certamente ella as considera e attende tão bem e melhor do que eu, e por isso julgo que um projecto desta natureza está nós circumstancias de se approvar, sendo desnecessaria a discussão na generalidade, por quanto se algum D. Par intender, que se deve supprimir, eu alterar de qualquer forma alguma de suas provisões, isso mesmo terá logar na discussão especial de cada um dos artigos ou §§ do projecto.

O Sr. Duarte Leitão — Eu tambem entendo que é desnecessario fizer longo discurso para provar a conveniencia e necessidade deste Projecto. O que acabou de dizer o Sr. Sousa Azevedo é o que me parece sufficiente, para que a Camara se convença de que não póde haver duvida alguma em ser adoptado, principalmente sendo, como é, o mesmo Projecto, que já foi approvado por esta Camara. Com tudo farei algumas breves reflexões sobre o mesmo objecto.

Estabelecem-se neste Projecto Conselhos Disciplinares, para que exercendo a jurisdicção disciplinar, se faça effectiva a correcção que muitas vezes é precisa, em razão de certos factos praticados pelos Juizes. A disciplina propriamente di-la é a maneira de viver de cada um, segundo as regras da sua profissão: em qualquer Corporação, que exerça authoridade publica, é necessario que os Membros de que ellas se compõem vivam de uma maneira conforme com o que exige a natureza da sua instituição, e que estejam submettidos a uma vigilancia estabelecida para manter a exacta observancia dos seus deveres. Nem basta, que os Juizes não violem directa, e dolosamente a Lei escripta: tanto mais se exige delles a pratica da virtude, quanto mais importantes são as funcções que exercem. Se devem administrar justiça aos outros, devem tambem respeitar-se a si mesmos, e conservar a sua dignidade, e reputação. Não se tracta pois neste Projecto do modo de julgar, e punir os factos criminosos dos Juizes, a que as Leis impõem penas; não se tracta de crimes, nem dos factos, que se punem, como erros de officio, que verdadeiramente são tambem crimes. Quando a Lei manda castigar os erros do officio; quando manda processar criminalmente o official, ou empregado, que commetter erro de officio, não quer dizer — erro de entendimento — é preciso que haja dólo, e mesmo a Ordenação o declara, accrescentando em alguns casos as palavras — maliciosamente, ou por malicia — e seria contradictorio o impôr penas, e considerar criminoso um simples erro de entendimento. E é tambem certo, que alguns crimes commettidos no exercicio, ou por motivo do exercicio das funcções judicies, não são qualificados pela Ordenação, como erros de officio, como se vê do §. 45.º do titulo - Do Regedor. — A Carta Constitucional falla em crimes, e erros de officio; e sem duvida alguma dá a estas expressões o mesmo sentido, que lhes deram as Leis anteriores. Não é destes factos criminosos, que se tracta agora neste Projecto, porque para elles as Leis teem estabelecido o respectivo processo, assim como tem declarado, e em alguns casos precisam ainda declarar, as competentes penalidades.

A Lei disciplinar tem por fim reprimir todo o esquecimento, toda a violação dos deveres que o Juiz deve praticar pelo caracter, e natureza das funcções que exerce. Para que um Juiz desempenhe, como deve, as suas obrigações, é necessario que tenha respeito á opinião publica, e temor do Deos; porque de outro modo pouco effeito em muitos casos poderão ter as Leis criminaes para o reprimir. Para que seja bom Juiz muitas qualidades se requerem; e é na verdade bem grande o catalogo de predicados, que, conformando-se com o que a Ordenação disse do Regedor, de Chanceller-mór, os Escriptores indicam, para que se possa considerar um perfeito Juiz; mas — quis est hic, et laudabimus eum? Fecit mirabilia in vita sua.

Se não é de esperar que facilmente se encontrem tantas qualidades reunidas, ao menos empreguem-se os meios para evitar, que o Juiz não comprometta a sua dignidade e a administração da Justiça; e aquelle que se apartar dos deveres da honra, e que pela sua conducta desacreditar o Tribunal a que pertence, seja corregido pelos meios indicados na Lei (Apoiados).

Já com muita razão observou o D. Par o Sr. Sousa Azevedo, que na organisação politica actual é indispensavel haver estes Conselhos Disciplinares. Na Legislação antiga a censura dos Desembargadores era commettida ao Regedor da Casa da Supplicação, e ao Governador da Casa do Porto; porque se os Juizes viviam de uma maneira indigna e impropria do logar que tinham, eram por aquelles admoestados particularmente; e se da primeira vez senão emendavam, eram admoestados perante os outros Desembargadores; e se nem assim se emendavam, o Regedor dava parte a El-Rei; mas este procedimento não tinha logar a respeito dos factos verdadeiramente criminosos, porque diz a Ordenação, que se houver informação, de que o Juiz recebeu dadivas, ou fez algum erro em seu officio, seja processado conforme as Leis do Reino. Mas, na organisação politica actual é necessario que se estabeleça um Tribunal para esse fim, e a este Tribunal é necessario que se lhe estabeleça um pouco de arbitrio; porque é verdade que as Leis criminaes não podem deixar de ser precisas; mas nesta materia de disciplina não se podem determinar todas as hypotheses, como é bem manifesto; e por isso é de absoluta necessidade que o Conselho, exercendo esta jurisdicção disciplinar, possa usar do seu prudente arbitrio em muitos casos.

Parece-me pois que o projecto está nos termos de poder ser approvado na sua generalidade, e por isso nada mais direi, reservando para quando se tractar da especialidade, o dizer alguma cousa se fôr necessario.

Foi o Projecto plenamente approvado, e remettido á outra Camar.