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CAMARA DOS PARES DO REINO
SESSÃO DE 29 DE JULHO DE 1848.
Presidiu — O Sr. Cardeal Patriarcha.
Secretarios — Os Sr.s M. de Ponte de Lima.
Margiochi.
Aberta a Sessão pouco antes das duas horas da tarde, estando presentes 28 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão.
O Sr. Presidente — Ainda que a Camara não está em numero, consta-me que ha alguns D. Pares na outra Camara, os quaes não tardarão em comparecer: parecia-me por tanto, que neste intervallo se poderiam lêr quaisquer pareceres ou requerimentos, que os D. Pares quizessem apresentar, ficando com tudo reservada a sua votação para quando houvesse numero.
O Sr. Secretario Margiochi — Participo á Camara, que os D. Pares os Srs. B. de Chancelleiros, e B. da Vargem da Ordem, me encarregaram de fazer constar á Camara, que S. Ex.ª não podiam hoje comparecer á Sessão por terem de ir a Cintra cumprimentar Suas Magestades. Usarei ainda da palavra para apresentar á Camara, a fim de ser tomada na consideração que merecer, uma representação, com trinta e tres assignaturas, datada de 15 de Julho corrente da Camara Municipal de Lamego, e de diversos lavradores do mesmo Concelho, em que transcrevem a representação que dizem ter dirigido ao Ministerio do Reino, na qual se propõem a demonstrar; primeiro, que a Lei de 21 de Abril de 1843 tem uma parte mui principal no desgosto e desalento dos lavradores do Douro; segundo que o Governo póde minorar, pelos meios ao seu alcance, esse desgosto e desalento; terceiro que a falta de execução da Lei augmenta o desgosto, que julgam actualmente mais visivel e geral.
O Sr. C. de Lavradio — Como essa representação tracta de um objecto de muito interesse, como é a agricultura do Douro, pedia que se lêsse, caso não fosse muito extensa. (O Sr. Presidente — É extensa — O Sr. Secretario Margiochi —Muitissimo.) Então peço que se imprima no Diario do Governo, ainda que seja por extracto.
O Sr. Presidente — Nesta representação faz-se uma analyse muito extensa da Lei de 21 de Abril de 1843, pela qual se concedeu á Companhia dos Vinhos do Alto Douro a quantia de 150:000$000 réis annuaes, e refere-se a outras provisões, queixando-se de se lhe não pagar em metal, mas sim com o desconto das Notas: é finalmente uma cópia da representação que foi dirigida ao Governo. A Camara pois resolverá se quer que esta representação se imprima no Diario do Governo.
O Sr. Sousa Azevedo — V. Em.ª dá-me a palavra?
O Sr. Presidente — Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Sousa Azevedo — Parece-me que mandando-se imprimir essa representação na sua integra no Diario do Governo, seria isso muito dispendioso, agora n'um extracto poderia ser; mas. (O Sr. Secretario Margiochi — Por extracto vão sempre as representações.) Vão os extractos das representações, mas não vão os extractos dos motivos em que ellas se fundam, e como eu não estou certo de quem responde por esse extracto, acho alguma difficuldade na impressão por esse modo.
Quanto porém a ir a uma Commissão, eu entendo que deverá ser enviada á Commissão de Administração Publica, e que esta com toda a brevidade venha propôr á Camara o que entender conveniente sobre este objecto, que é realmente grave e importante.
O Sr. C. de Lavradio — Sr. Presidente, eu tambem concordo em que a Representação se não imprima no Diario do Governo, attenta a sua muita extensão; mas visto os grandes desejos que a Camara tem de fazer justiça, eu pediria que em logar da Representação ser primeiro enviada á Commissão de Petições, seja desde já remettida á Commissão de Administração Publica, por isso que nós já sabemos o que ella contém.
O Sr. C. de Thomar — Eu simplesmente faço uma reflexão e é, que este negocio sempre que tem sido tractado, tem ido á Commissão de Fazenda, e por conseguinte era alli que me parecia dever ser remettida.
O Sr. Sousa Azevedo — Eu não creio que nessa Representarão se queixem de se cederem os 150:000$000, queixam-se talvez da applicação que se lhes dá: este objecto por conseguinte pertence á Commissão de Administração Publica; mas se razões houverem pelas quaes seja necessario ouvir a de Fazenda, a Commissão de Administração Publica a convidará, e se se julga que é objecto que pertença a ambas, póde-se votar que vá á Commissão de Administração, entendendo-se esta com a de Fazenda.
O Sr. C. de Lavradio — Quanto a dizer se, que este objecto sempre que tem sido tractado tem ido á Commissão de Fazenda, responderei que não é tanto assim, porque elle já aqui foi tractado, e nomeou-se então uma Commissão Especial, á qual elle foi enviado, e outros objectos similhantes aqui se tem tractado, sem que tenham ido á Commissão de Fazenda, mas sim á de Administração Publica... (O Sr. C. de Thomar — É engano.) Não ha engano, porque eu tenho assistido aqui a quasi todas as Sessões, e estou muito bem certo do que digo.
O Sr. C. de Thomar — Pois bem, não faço questão. Mande-se a Representação a ambas as Commissões reunidas de Administração Publica e Fazenda.
Assim se resolveu.
O Sr. Margiochi — Sr. Presidente, peço aos D. Pares, membros da Commissão Diplomatica e do Ultramar, que queiram ter a bondade de dar o seu parecer sobre o requerimento de diversos negociantes da Praça de Lisboa, por mim apresentado a esta Camara ha poucos dias, pedindo providencias contra o disposto na Portaria do Ministerio dos Negocios da Marinha e Ultramar, pela qual julgam ter sido dada uma falsa interpretação aos Tractados do Commercio de 8 de Março de 1841 com os Estados-Unidos da America, e de 3 de Julho de 1842 com a Gram-Bretanha, interpretação que consideram prejudicial ao nosso commercio com as possessões de Africa. Se attendermos ao grande e successivo augmento que tem tido nos ultimos annos este commercio, a Camara não deixará de reconhecer que este negocio nos deve merecer a maior consideração. É por esta razão que não posso deixar de o recommendar aos membros das mesmas Commissões.
O Sr. C. de Lavradio — Eu não desejo tomar tempo á Camara; mas como pertenço á Commissão dos Negocios Externos, desejava saber se a Representação havia sido mandada á Commissão dos Negocios Externos ouvindo a de Marinha e Ultramar, ou se foi remettida ás duas Commissões reunidas, porque então é necessario saber quem ha de convocar as duas Commissões.
O Sr. Secretario Margiochi — A Representação foi remettida ás duas Commissões reunidas dos Negocios Diplomaticos e da Marinha e Ultramar.
O Sr. Sousa Azevedo — Devo advertir a Camara, de que a Representação a que o D. Par Margiochi allude, foi aqui por S. Ex.ª apresentada ha duas Sessões, é negocio de dous dias; mas como quem está ouvindo o D. Par não sabe em que tempo S. Ex.ª a teria apresentado, é conveniente dizer, que a apresentou ha dous dias, e que é o objecto mais moderno que existe hoje nas Commissões (Apoiados).
O Sr. Silva Carvalho — Vou lêr o Parecer da Commissão de Fazenda sobre a Proposição de Lei n.º 54.
O Sr. C. do Porto Côvo não o assignou por motivo de molestia, e os Srs. B. de Chancelleiros e Ministro dos Negocios Estrangeiros tambem o não assignaram, por não estarem presentes, mas todos votaram pelo Parecer.
O Sr. C. do Porto Côvo porém pediu-me, que participasse á Camara, que o seu mau estado de saude o impossibilitara de comparecer hoje na Sessão.
Mandou-se imprimir o Parecer. (1)
O Sr. Presidente — Não ha ainda numero, mas podemos continuar.
O Sr. Fonseca Magalhães — Sr. Presidente, ha um Projecto de Lei, impresso e distribuido por todos os D. Pares, cuja discussão me parece essencialmente necessaria, ou para melhor dizer — essencialissima, que é o Projecto sobre a creação dos Conselhos Disciplinares, e eu não creio que a sua discussão leve muito tempo á Camara
(O Sr. Presidente — E até está dado para ordem do dia.) Parecia me pois, que a Camara se poderia occupar desse Projecto, pondo de parte (por hoje se entende) a discussão que já hontem encetamos sobre o Projecto relativo aos differentes Decretos das Dictaduras que hoje, sem duvida, se não discutiria, e difficilmente se discutirá na Segunda feira; entretanto vai-se aproximando o dia da Commissão Mixta; e eu creio que a approvação deste Projecto sobre a creação dos Conselhos Disciplinares é em razão de ordem como uma condição essencial da approvação do Projecto das transferencias.
O Sr. Duarte Leitão — Duas palavras unicamente.
Queria dizer, que por isso mesmo que esse Projecto sobre a creação dos Conselhos Disciplinares não terá discussão, ou a que tiver será muito pouca, é que senão póde hoje discutir visto não haver numero.
O Sr. Fonseca Magalhães — Pois não se acabou de dizer, que havia numero apenas viessem alguns D. Pares que estavam na outra Camara?!..
O Sr. Presidente — Fui eu que o disse, mas porque me asseveraram, que na outra Camara estavam alguns D. Pares.
O Sr. Sousa Azevedo — Sr. Presidente, não me parecia muito conveniente, no estado em que a Camara se acha, o continuar na discussão do Projecto que hontem encetámos, o qual contém materia grave, e da mais alta transcendencia; porquanto D. Pares ha, que já entraram na discussão, e desejam certamente vê la correr; outros que tencionam tomar parte nella, e por isso convem-lhes ouvir produzir todas quantas razões pró ou contra se apresentarem na discussão para que à vista dellas ou tenham de mudar de opinião, ou de combate-las com aquelles argumentos, que melhor lhes parecer.
Todavia, a respeito do Projecto de Lei sobre a creação dos Concelhos Disciplinares não se dão as mesmas razões: este Projecto está em circumstancias especiaes, porque até acontece que elle se apresenta redigido da mesma maneira, por que esta Camara o approvou, quando aqui viera da Camara dos Srs. Deputados, tornando-se assim hoje a sua discussão mais de formalidade, se acaso a houver, do que de verdadeira necessidade. Intendia pois, que poderiamos entrar na discussão deste Projecto, e depois votar-se quando houver na Camara numero legal. Sei que este methodo é contrario á pratica até agora adoptada, mas a irmos contra essa pratica, seja antes n'um objecto de tal natureza e circumstancia, persuadindo-me que nenhuma inconveniencia resultará deste arbitrio, e que pelo contrario muito convirá a prompta approvação desta medida, que é do maior interesse. O Projecto, repito, está com pouca differença como foi approvado na outra Camara, e tambem como o foi nesta com algumas pequenas alterações, nas quaes V. Ex.ª tomou parte, e que eu não tenho dúvida de approvar.
A Camara resolverá como intender, que é mais conveniente e opportuno.
O Sr. D. de Palmella — Eu lembro a necessidade de uma proposta sobre o numero necessario para votar, differente do que está estabelecido; porque estamos todos os dias, por assim dizer, com este inconveniente: nós temos adoptado a regra de terça parte e mais um; mas é dos existentes em todo o Reino e Ilhas adjacentes. Ora, para haver este numero é necessario, que venham quasi todos os que estão em Lisboa, e a experiencia mostra, que é necessario fixar talvez essa mesma regra; mas em relação ao numero de D. Pares existentes na Capital. Desejaria pois muito, que algum membro desta Camara se encarregasse de fazer esta proposta.
O Sr. C. de Lavradio — Parece-me muito necessario tractar da alteração, que o Sr. D. de Palmella acaba de lembrar; mas segundo o principio que já tenho sustentado, desejaria que esta alteração fosse feita por uma lei (Apoiados), que regulasse tanto para esta, como para a outra Casa; porque, é muito importante o fixar definitivamente o numero de membros necessarios a cada uma das, Camaras para formar as suas resoluções. Desejaria pois, que algum dos D. Pares se encarregasse de apresentar um projecto de lei para regular esta materia, e eu pediria mesmo ao D. Par Relator da Commissão de Legislação, que fosse elle quem se encarregasse de propôr esse projecto. (Apoiados.)
O Sr. Duarte Leitão — A Commissão de Legislação tomará em consideração a lembrança do Sr. C. de Lavradio: entretanto, por esta occasião não posso deixar de lembrar, que o projecto que se approvou nesta Camara a respeito do numero de, Juizes, que era necessario para se constituir o Tribunal de Justiça da Camara dos Pares, ainda não foi discutido na outra Camara, segundo me parece: ha muito tempo que elle foi d'aqui remettido, mas não tenho noticia nenhuma do seu andamento (Apoiados), e na verdade é muito necessario e urgente, que esse projecto se converta em lei. (Apoiados.)
O Sr. C. de Thomar — Este é um dos casos em que eu entendo, que o Sr. Presidente desta Casa se poderia dirigir ao Presidente da outra, porque foi para lá o projecto ficar morto, não teve ainda conclusão nenhuma quando isto é um negocio vital, que se deve votar nesta Sessão: por consequencia, eu proporia mesmo, que o nosso Presidente se dirigisse ao da outra Camara, fazendo-lhe vêr a necessidade que ha de tractar deste projecto (O Sr. D. de Palmella — Apoiado); e isto quanto antes.
O Sr. Duarte Leitão — Eu apoio o que diz o Sr. C. de Thomar, tanto mais que a Camara deve ficar certa, de que se se fecham as Côrtes sem que este projecto esteja convertido em lei, neste intervallo nunca mais se reune o Tribunal, ficando assim o D. Par, que está em processo, debaixo da culpa, sem ter andamento algum este nego cio. (Apoiados.)
(1) Será integralmente consignado quando se discutir.
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O Sr. Sousa Azevedo — Duas observações: em primeiro lugar eu concordo com o Sr. C. de Lavradio em julgar, que o numero com que deve funccionar esta Casa, e mesmo a outra, é propriamente objecto d'uma lei; mas para o caso em que estamos não remedeia este alvitre de S. Ex.ª, porque o que chamou a attenção da Camara sobre a necessidade d'esta medida, foi o estado actual da Sessão, e a urgencia de decidir os negocios, que ha a tractar; e para este caso nenhuma providencia resultaria d'uma Proposta de Lei, que ainda tinha de ser discutida e approvada nas duas Casas do Parlamento. Proponho pois á Camara, que considerando a falta de numero em que nos achamos, dê alguma providencia para se poder tractar das materias, que estão para isso preparadas pelas respectivas Commissões desta Camara, e das que ainda hão de vir da outra Casa, sendo algumas de grave importancia.
Em quanto ao segundo ponto direi, que concordo com o Sr. C. de Thomar; mas em abono da verdade devo dizer que eu já li n'um dos extractos das Sessões da outra Camara, que o seu Presidente chamára a attenção da Commissão de Legislação sobre o projecto, que foi desta Casa ácerca de regular o n.º de Pares, com que póde constituir-se em Tribunal de Justiça, e disse que era necessario mostrar toda a defferençia pela Camara dos Pares, e discutir-se alli quanto antes aquelle projecto: por tanto se, a Camara Electiva não tem dado andamento a este objecto, é porque a Commissão ainda não appresentou o seu parecer, o que é de esperar que faça quanto antes, pois que já passou ha bastante tempo, e o negocio é urgente que passe nesta Sessão Legislativa, aliás não poderá a Camara dos Pares constituir-se em Tribunal de Justiça neste intervallo até á proxima Sessão. Approvo com tudo a indicação proposta a este respeito.
O Sr. C. de Thomar — Eu tambem estou, em que é mais conforme aos principios que seja fixado por Lei o numero; mas o principio e doutrina adoptada até agora é outra, pois todos sabemos que cada uma das Camaras tem estabelecido nos seus regimentos o numero com que póde funccionar; mas agora entendo, que para se poder fixar esse numero, não se póde fazer senão adoptando a lembrança do Sr. Duque de Palmella, e para isso mesmo é preciso estarem presentes trinta e dous Membros.
Pela entrada de alguns D. Pares constituiu-se a Camara com o numero legal.
ORDEM DO DIA.
Parecer n.º 50 sobre o Projecto de Lei n.º 43, estabelecendo Conselhos disciplinares, e o modo de procederem no exercicio da sua jurisdicção.
Parecer n.º 50.
A Commissão de Legislação examinou o Projecto de Lei, apresentado pelo Digno Par José Antonio Maria de Sousa Azevedo, o qual tem por objecto a creação dos Conselhos Disciplinares, e o modo de proceder no exercicio da Jurisdicção Disciplinar, que lhes é incumbida.
A Commissão pensa, que as providencias consignadas neste Projecto são necessarias para a boa administração da Justiça; e tendo ellas já sido discutidas, e approvadas por esta Camara na anterior Legislatura, é de parecer que o mesmo Projecto seja adoptado.
Sala da Commissão, em 13 de Julho de 1848. = José da Silva Carvalho = B. de Porto de Mós = Manoel Duarte Leitão = B. de Chancelleiros.
RELATORIO.
Senhores: A iniciativa que tomo no Projecto de Lei, que hoje tenho a honra de vos apresentar, tem por fim promover o andamento regular de um complexo de providencias que formem o systema do Conselho Disciplinar, convenientemente adaptado á Magistratura Judicial.
Tive eu a honra de apresentar este Projecto na Camara dos Srs. Deputados em 1843, quando me cabia a de fazer parte do Ministerio nesse tempo; e depois de approvado naquella Camara, passou para esta, que tambem o adoptou com pequenas alterações, em consequencia das quaes foi remettido á respectiva Commissão para fazer a ultima redacção, aonde ficou até que se concluiu a Legislatura, e por isso caducou em conformidade com o disposto na Carta de Lei de 16 de Março de 1836.
Esta succinta exposição justifica o motivo, porque intendo não só superfluo, mas até impertinente, fazer-vos a exposição dos fundamentos da conveniencia e necessidade do systema ou Conselho Disciplinar para a Magistratura Judicial; porque em verdade seria ousadia pretender esclarecer nesta Camara um objecto por ella discutido e votado. Omitto por tanto o relatorio que aliás offereceria á vossa consideração, se as expostas circumstancias me não convencessem de que assim devo proceder.
Tambem me cumpre declarar a esta Camara, que no Projecto de Lei que offereço á sua consideração, tive o cuidado de copiar fielmente todas as provisões que ella approvou com as emendas offerecidas na respectiva discussão por diversos Dignos Pares; pois intendi que qualquer que fosse a minha opinião sobre a materia, não me permittiam as considerações de respeito, que consagro a todos os Dignos Membros desta Camara, e o conceito que igualmente formo da sua sabedoria, addicionar, ou de qualquer modo alterar o que esta Camara approvou.
Em attenção pois a estas considerações tenho a honra de offerecer o seguinte
Projecto de lei n.º 43.
Artigo 1.º A jurisdicção disciplinar, ou de censura, tem por fim advertir, e corrigir as faltas dos Juizes, commettidas dentro ou fóra do exercicio de suas funcções, que, não tendo a qualificação de crimes ou erros de officio, mostram comtudo esquecimento, e abandono da dignidade do Magisterio, e do zeloso cumprimento de seus deveres.
unico. Esta jurisdicção não prejudica o direito de correcção, e censura para com os Juizos inferiores, que se acha estabelecido pela Legislação actual.
Art. 2.º Para tomar conhecimento das faltas, de que tracta o artigo antecedente, haverá no Supremo Tribunal de Justiça, nas Relações, e no Tribunal Superior do Commercio, Conselhos Disciplinares.
§. unico. Os Conselhos Disciplinares serão compostos dos Presidentes dos Tribunaes em que são creados, e de quatro dos seus Membros, tirados por turno, segundo a ordem da precedencia.
Art. 3.° Ao Conselho Disciplinar do Supremo Tribunal de Justiça compete o conhecimento das faltas especificadas no artigo 1.º, commettidas pelos Membros do mesmo Tribunal, e pelos de todos os Tribunaes de 2.º Instancia: ao das Relações, o das commettidas tanto pelos Juizes de Direito de 1.ª Instancia, qualquer que seja, ou venha a ser a sua denominação, como pelos Juizes Ordinarios do seu respectivo Districto Judicial: e ao do Tribunal Superior de Commercio, o das que commetterem os Juizes Presidentes dos Tribunaes Commerciaes de 1.ª Instancia.
Art. 4.º Os Conselhos Disciplinares sómente poderão ser convocados pelo seu Presidente a requerimento do Agente do Ministerio Publico, junto ao respectivo Tribunal, feito em virtude de ordem do Governo, e acompanhado de todos os papeis, que este lhe tiver remettido para melhor conhecimento da falta, ou faltas arguidas.
Art. 5.º O Conselho, reunido em conferencia particular, mandará que o Juiz arguido responda por escripto, assignando-lhe, para o fazer, um prazo razoavel em attenção á distancia da localidade da sua residencia, e á facilidade das communicações.
§. unico. A ordem para o Juiz responder ser-lhe-ha transmittida officialmente pelo Presidente do Conselho, com todos os papeis comprovativos da arguição.
Art. 6.º Se o Juiz arguido, ou o Agente do Ministerio Publico requererem ser admittidos a produzir prova testemunhal, o Conselho o admittirá, oral perante elle, se as testemunhas residirem na sua séde, e no caso contrario, por escripto, perante o Juiz de Direito mais proximo da Comarca do arguido, mandando expedir ordem aquelle para proceder ao inquerito dentro do um prazo, que lhe assignará, conforme o disposto no artigo antecedente.
Art. 7.° Findo este processo preparatorio, o Conselho, depois de ouvir por escripto o Agente do Ministerio Publico, deliberará, em conferencia particular, ou sobre a sua competencia, ou sobre a applicação da pena disciplinar.
§. unico. A decisão será tomada á pluralidade de votos, e sempre fundamentada: o ultimo Juiz, na ordem da precedencia, tirará o accordão.
Art. 8.° Quando o Juiz arguido, em sua resposta contra a competencia do Conselho, ou por ser a falta, que fôr objecto da arguição, qualificada por direito — crime — ou — erro de officio — requerer que se instaure o meio ordinario da querela; ou porque a mesma não esteja, por sua natureza e qualidade, sujeita á jurisdicção disciplinar, o mesmo Conselho, sobreestando na decisão final, proporá o processo em Mesa grande, ou conferencia particular de todos os Membros do Tribunal, e alli se decidirá unicamente o ponto da competencia.
§. 1.° Se o Tribunal decidir, que o caso não é da competencia da jurisdicção disciplinar, pelo ser de querela, assim o pronunciará por accordão, mandando que todos os papeis se devolvam ao Agente do Ministerio Publico, para usar dos meios competentes: se porém, tomar por fundamento o segundo dos motivos do protesto, declarados neste artigo, ordenará que mais se não prosiga pelo Feito. No primeiro destes casos se fará sempre no accordão expressa menção da Lei, que qualificar de — crime — ou de — erro de officio — a falta arguida.
§. 2.° Quando o Tribunal julgar competente a jurisdicção disciplinar, assim o pronunciará tambem por accordão; e o Conselho se reunirá depois em conferencia particular para proferir a sua decisão final.
Art. 9.º Ainda mesmo que o Juiz arguido não tenha protestado contra a competencia da jurisdicção do Conselho Disciplinar, se este entender, que a falta, ou faltas, de que se tractar, teem a qualificação de — crime — ou de — erro de officio — proporá o Feito em Mesa grande para, em conferencia particular de todos os Membros do Tribunal, se decidir a questão da competencia, observando-se tambem neste caso as disposições do artigo antecedente.
Art. 1.º Nos processos disciplinares servirá de Escrivão o Secretario, ou Guarda-Mór do respectivo Tribunal; e todas as suas decisões definitivas serão communicadas pelo Presidente á Secretaria de Estado dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça.
Art. 11.° A censura simples, imposta aos Juizes de 2.ª Instancia, e aos Membros do Supremo Tribunal de Justiça, é intimada aos mesmos pelo Presidente do Tribunal, a que pertencem, perante o seu respectivo Conselho Disciplinar, reunido em conferencia particular. A censura severa é dada tambem pelo mesmo Presidente em Tribunal pleno.
§. 1.º Para se levar a effeito o disposto neste artigo, quando os Juizes, a quem a censura é imposta, forem de 2.ª Instancia, o Conselho Disciplinar do Supremo Tribunal de Justiça expedirá a competente ordem ao Presidente do respectivo Tribunal.
§. 2.º A censura severa, ou a simples com reincidencia, será publicada no Diario do Governo.
Art. 12.° A censura simples, imposta aos Juizes de 1.ª Instancia, ser-lhes-ha intimada de ordem do Presidente da respectiva Relação, ou Tribunal Superior do Commercio, por um Juiz de igual graduação da mesma Comarca, se nella o houver, ou, não o havendo ahi, pelo Juiz de Direito da mais proxima; e, quando imposta aos Juizes Ordinarios, sê-lo-ha pelo da sua mesma Comarca.
Art. 13.º A censura severa, imposta aos Juizes de 1.ª Instancia, será intimada pessoalmente pelo Juiz de Direito da Comarca mais proxima, designada pelo accordão, na sede da sua residencia, e na presença de dous dos seus Substitutos, e do Agente do Ministerio Publico, devendo para isso comparecer perante elles o Juiz accusado no dia que aquelle lhe designar.
§. 1.° Nas Comarcas de Lisboa e Porto, será feita a intimação perante os Juizes de Direito de cada uma das mesmas Comarcas, na presença do Agente do Ministerio Publico da Vara a que a intimação da censura severa fôr commettida.
§. 2.° A mesma censura, quando imposta a Juizes Ordinarios, ser-lhes-ha intimada pelo Juiz de Direito da respectiva Comarca, porém, pessoalmente, e na presença tambem de dous dos seus Substitutos, e do Agente do Ministerio Publico.
§ 3.º Nas Ilhas adjacentes, em que não houver mais de uma Comarca, a censura severa, imposta aos Juizes, será levada a effeito, ou pela fórma prescripta neste artigo, ou pelo modo que ao Conselho parecer mais conveniente, segundo no accordão se declarar.
Art. 14.º Fica revogada toda a Legislação em contrario.
Sala da Camara dos Pares, em 5 de Julho de 1848. = José Antonio Maria de Sousa Azevedo.
O Sr. Sousa Azevedo — Sr. Presidente, escusado é cançar a Camara com a explicação dos motivos, que justificam a conveniencia da adopção deste projecto. Em todos os paizes aonde ha Systema Representativo, aonde ha a divisão dos Poderes Politicos, que formam esse mesmo systema, tem-se intendido ser necessario, que o Poder Politico = Judicial = que tem estabelecido como primeiro annel da cadêa de suas attribuições, ou antes da sua essencia, o ser independente, seja acompanhado de provisões, e medidas que façam, com que o uso e exercicio das suas attribuições seja o mais conforme ao fim da sua propria Instituição: era portanto impossivel, que o Governo Portuguez deixasse d'attender á necessidade d'uma Instituição desta natureza; e com effeito em 1843, tendo eu a honra de estar nos Conselhos de Sua Magestade dirigindo a Secretaria d'Estado dos Negocios da Justiça, apresentei um projecto de lei tendente a obter este fim; e da sua materia se tractou muito minuciosamente na Commissão de Legislação da outra Casa, e depois na mesma Camara Electiva, na qual se fizeram algumas alterações á proposta originaria do Governo, passando depois o projecto para esta Camara, aonde não foi impugnado o principio da conveniencia dessa Instituição, e foram na maxima parte approvadas as provisões do projecto, como tinham vindo da Camara dos Srs. Deputados, introduzidas algumas emendas e alterações, com as quaes intendo que elle ficou aperfeiçoado. Já se vê pois pela resumida historia, que dou deste projecto, que elle contem maioria corrente, que foi quasi plenamente approvada na Camara Electiva, e na Hereditaria; mas como acabasse a legislatura antes de ser sanccionada a lei, caducou o projecto em conformidade com as disposições da Carta de Lei de 16 de Fevereiro de 1845; e eis-aqui a razão porque eu tomei a iniciativa, e propuz nesta sessão o mesmo projecto, declarando no respectivo relatorio, que ommittia a exposição dos motivos de conveniencia da adopção desta medida, porque haviam sido conhecidos, e devidamente appreciados por esta Camara na ultima sessão legislativa. É por tanto, na minha opinião, fóra de duvida, que muito convem adoptar este projecto; e com quanto se possa dizer, que algumas das attribuições, que nelle se contêem, competem aos Presidentes dos Tribunaes, é todavia certo que de ordinario as attribuições, que se concedem a uma authoridade individual, quando teem alguma cousa de odioso, não se exercem com efficacia e rigor; e é isto o que exactamente tem acontecido a respeito dos Presidentes dos Tribunaes, que sempre receiam dar execução a attribuições, que aliás lhes pertencem, mas de que podem resultar advertencias, e correcções a seus collegas; sendo ainda para advertir, que as presidencias dos Tribunaes são logares de commissão, do que eu intendo que resultam graves inconvenientes, e entre elles sobresáe o de não serem bons executores de certas providencias aquelles, que teem de descer da cadeira da presidencia, a arbitrio do Governo, para virem sentar-se ao pé dos demais membros do mesmo Tribunal. Isto já se observava na antiga magistratura: as attribuições concedidas aos Presidentes dos Tribunaes para exercerem a devida superintendencia ácerca dos respectivos Magistrados, quasi nunca produziram bom effeito, e tudo conduz para demonstrar a absoluta necessidade, e conveniencia desta lei, para que não possa deixar de se estabelecer o processo das admoestações é censuras, a respeito dos diversos Magistrados do Poder Judicial, quando se derem justos motivos de assim se praticar, e segundo as regras e formalidades estabelecidas. É tambem sabido, que por isso mesmo que o Governo não exerce, nem deve exercer qualquer acção a respeito dos differentes actos, que praticam os Magistrados no exercicio de suas funcções, e com relação ao seu comportamento moral o civil; e possam a tal respeito haver faltas ou omissões, que com quanto não devam classificar-se crimes, carecera de alguma correcção ou advertencia, o que não poderia ter logar por um processo ordinario, é muito conveniente, que existam regras estabelecidas, as quaes graduem segundo os casos occorrentes os termos das advertencias e correcções, havendo sempre muita consideração á necessidade destas, e á dignidade e decóro dos Magistrados Judiciaes.
É escusado cançar á Camara com a continuação destas reflexões porque certamente ella as considera e attende tão bem e melhor do que eu, e por isso julgo que um projecto desta natureza está nós circumstancias de se approvar, sendo desnecessaria a discussão na generalidade, por quanto se algum D. Par intender, que se deve supprimir, eu alterar de qualquer forma alguma de suas provisões, isso mesmo terá logar na discussão especial de cada um dos artigos ou §§ do projecto.
O Sr. Duarte Leitão — Eu tambem entendo que é desnecessario fizer longo discurso para provar a conveniencia e necessidade deste Projecto. O que acabou de dizer o Sr. Sousa Azevedo é o que me parece sufficiente, para que a Camara se convença de que não póde haver duvida alguma em ser adoptado, principalmente sendo, como é, o mesmo Projecto, que já foi approvado por esta Camara. Com tudo farei algumas breves reflexões sobre o mesmo objecto.
Estabelecem-se neste Projecto Conselhos Disciplinares, para que exercendo a jurisdicção disciplinar, se faça effectiva a correcção que muitas vezes é precisa, em razão de certos factos praticados pelos Juizes. A disciplina propriamente di-la é a maneira de viver de cada um, segundo as regras da sua profissão: em qualquer Corporação, que exerça authoridade publica, é necessario que os Membros de que ellas se compõem vivam de uma maneira conforme com o que exige a natureza da sua instituição, e que estejam submettidos a uma vigilancia estabelecida para manter a exacta observancia dos seus deveres. Nem basta, que os Juizes não violem directa, e dolosamente a Lei escripta: tanto mais se exige delles a pratica da virtude, quanto mais importantes são as funcções que exercem. Se devem administrar justiça aos outros, devem tambem respeitar-se a si mesmos, e conservar a sua dignidade, e reputação. Não se tracta pois neste Projecto do modo de julgar, e punir os factos criminosos dos Juizes, a que as Leis impõem penas; não se tracta de crimes, nem dos factos, que se punem, como erros de officio, que verdadeiramente são tambem crimes. Quando a Lei manda castigar os erros do officio; quando manda processar criminalmente o official, ou empregado, que commetter erro de officio, não quer dizer — erro de entendimento — é preciso que haja dólo, e mesmo a Ordenação o declara, accrescentando em alguns casos as palavras — maliciosamente, ou por malicia — e seria contradictorio o impôr penas, e considerar criminoso um simples erro de entendimento. E é tambem certo, que alguns crimes commettidos no exercicio, ou por motivo do exercicio das funcções judicies, não são qualificados pela Ordenação, como erros de officio, como se vê do §. 45.º do titulo - Do Regedor. — A Carta Constitucional falla em crimes, e erros de officio; e sem duvida alguma dá a estas expressões o mesmo sentido, que lhes deram as Leis anteriores. Não é destes factos criminosos, que se tracta agora neste Projecto, porque para elles as Leis teem estabelecido o respectivo processo, assim como tem declarado, e em alguns casos precisam ainda declarar, as competentes penalidades.
A Lei disciplinar tem por fim reprimir todo o esquecimento, toda a violação dos deveres que o Juiz deve praticar pelo caracter, e natureza das funcções que exerce. Para que um Juiz desempenhe, como deve, as suas obrigações, é necessario que tenha respeito á opinião publica, e temor do Deos; porque de outro modo pouco effeito em muitos casos poderão ter as Leis criminaes para o reprimir. Para que seja bom Juiz muitas qualidades se requerem; e é na verdade bem grande o catalogo de predicados, que, conformando-se com o que a Ordenação disse do Regedor, de Chanceller-mór, os Escriptores indicam, para que se possa considerar um perfeito Juiz; mas — quis est hic, et laudabimus eum? Fecit mirabilia in vita sua.
Se não é de esperar que facilmente se encontrem tantas qualidades reunidas, ao menos empreguem-se os meios para evitar, que o Juiz não comprometta a sua dignidade e a administração da Justiça; e aquelle que se apartar dos deveres da honra, e que pela sua conducta desacreditar o Tribunal a que pertence, seja corregido pelos meios indicados na Lei (Apoiados).
Já com muita razão observou o D. Par o Sr. Sousa Azevedo, que na organisação politica actual é indispensavel haver estes Conselhos Disciplinares. Na Legislação antiga a censura dos Desembargadores era commettida ao Regedor da Casa da Supplicação, e ao Governador da Casa do Porto; porque se os Juizes viviam de uma maneira indigna e impropria do logar que tinham, eram por aquelles admoestados particularmente; e se da primeira vez senão emendavam, eram admoestados perante os outros Desembargadores; e se nem assim se emendavam, o Regedor dava parte a El-Rei; mas este procedimento não tinha logar a respeito dos factos verdadeiramente criminosos, porque diz a Ordenação, que se houver informação, de que o Juiz recebeu dadivas, ou fez algum erro em seu officio, seja processado conforme as Leis do Reino. Mas, na organisação politica actual é necessario que se estabeleça um Tribunal para esse fim, e a este Tribunal é necessario que se lhe estabeleça um pouco de arbitrio; porque é verdade que as Leis criminaes não podem deixar de ser precisas; mas nesta materia de disciplina não se podem determinar todas as hypotheses, como é bem manifesto; e por isso é de absoluta necessidade que o Conselho, exercendo esta jurisdicção disciplinar, possa usar do seu prudente arbitrio em muitos casos.
Parece-me pois que o projecto está nos termos de poder ser approvado na sua generalidade, e por isso nada mais direi, reservando para quando se tractar da especialidade, o dizer alguma cousa se fôr necessario.
Foi o Projecto plenamente approvado, e remettido á outra Camar.
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O Sr. Silva Carvalho — Sr. Presidente, como agora está na Camara o numero de Pares preciso para se poder votar, eu faço a seguinte
PROPOSTA.
Proponho que as resoluções desta Camara sobre qualquer objecto, sejam tomadas por metade e mais um dos D. Pares que estiverem em Lisboa, para o que todos os que se ausentarem serão obrigados a participarem á Camara a sua ausencia. Sala das Sessões, 29 de Julho de 1848. = Silva Carvalho.
Entendo não ser necessario motiva-la, porque os seus motivos estão na cabeça de todos; e é realmente custoso que a Camara dos Pares se reuna muitas vezes, e que por fim se retirem os que estão presentes sem poderem trabalhar, por não haver o numero legal de Membros, que para isso são precisos (Apoiados). Eu conheço, Sr. Presidente, que muitos D. Pares não vem assistir ás Sessões, por terem motivo justificado; mas outros não o terão. O facto é que se torna necessario, que a Camara se tire deste embaraço, e para esse fim é conveniente, que se tome uma resolução: eis-aqui pois o motivo porque apresentei esta proposta, a qual declaro urgente. (Apoiados.)
Foi admittida a Proposta.
O Sr. Margiochi — Parece-me que a proposta do D. Par nos vai pôr em maiores difficuldades, do que aquellas em que estamos actualmente. Por esta proposta nenhuma medida será resolvida, sem que seja approvada por metade e mais um do numero de Pares que estiver em Lisboa: actualmente estão em Lisboa cincoenta e um D. Pares, logo segue-se que approvada a proposta será necessario, que hajam vinte e seis votos a favor para se poder tomar qualquer resolução.
O Sr. C. de Thomar — Não é isso: o espirito da proposta é, que se possa votar com vinte e seis Membros, dado o caso de estarem em Lisboa cincoenta e um D. Pares.
O Sr. D. de Palmella — A duvida do D. Par o Sr. Margiochi, não subsiste, por não ser essa a mente do D. Par author da proposta: a mente de S. Ex.ª é, que só se tome resolução estando presentes na Camara metade e mais um dos Membros existentes em Lisboa. (Apoiados.)
Porém eu observo, que a proposta não está em discussão, e requeiro que ella seja remettida á Commissão de Legislação para dar o seu parecer.
O Sr. Silva Carvalho — No caso que se approve que vá á Commissão de Legislação, eu requeiro que ella se retire para ir confeccionar o seu parecer.
Resolveu-se nessa conformidade.
O Sr. Presidente — Vão ler-se as alterações feitas nesta Camara á Proposição de Lei, que lhe enviou a Camara dos Sr. Deputados, com as quaes lhe será reenviada, se forem julgadas conformes ao que se vencera.
Alterações feitas pela Camara dos Pares na Proposição de Lei da Camara dos Srs. Deputados de 23 de Junho do corrente anno, que authoriso o Governo a conceder á Companhia representada por Luiz Vicente d'Affonseca e José Maria da Silva, o exclusivo da navegação que se fizer em barcos de vapor, entre os portos de Lisboa, do Algarve, e Ilhas da Madeira, Canarias, S. Miguel, Terceira, e Fayal. (*)
Artigo 1.° O Governo é authorisado a conceder á Companhia representada por Luiz Vicente d'Affonseca, e José Maria da Silva, ou a outra qualquer, que maiores garantias ou melhores condições offerecer em publica concorrencia, o exclusivo da navegação que se fizer em barcos movidos por vapor entre os portos de Lisboa, do Algarve, das Ilhas da Madeira, Canarias, S. Miguel, Terceira, e Fayal.
§. 1.º Approvado.
§. 2.° Será igualmente concedida á Companhia, exempção de direitos de importação dos barcos movidos por vapor que forem necessarios ao seu serviço.
§. 3.º Approvado.
§. 4.º Approvado.
§. 5.º As concessões authorisadas por esta Lei poderão sómente ter logar sem prejuizo do que se acha decretado nas Leis prohibitivas da navegação de cabotagem em navios estrangeiros, e da acquisição de embarcações portuguezas por estrangeiros.
§. 6.º Verificar-se-ha legalmente a realisação de, ao menos, um quarto do capital da Companhia, e a quantia sufficiente do resto, antes que se effectuem as mesmas concessões.
Art. 2.º Approvado.
Art. 3.º Approvado.
§. unico. Approvado.
Art. 4.º Approvado.
Julgadas conformes com o que se vencera, expediram-se para a outra Camara.
O Sr. Presidente — Acaba de chegar á Mesa um officio da Camara dos Srs. Deputados.
CORRESPONDENCIA.
Um officio da Camara dos Srs. Deputados, remettendo uma Proposição de Lei sobre o modo pelo qual sejam divididos os emolumentos das Secretarias de Estado.
O Sr. Sousa Azevedo — Sr. Presidente, esta Projecto não pertence á Commissão de Administração Publica, assim como nada tem de especial com a Commissão de Fazenda, porque não augmenta, nem diminue as despezas do Estado, e tracta só do modo como se devem dividir os emolumentos, que se pagam nas Secretarias de Estado. Na Camara electiva foi examinado pela Commissão de Legislação; e não é por me eximir, porque estou prompto a dar a minha opinião sobre este objecto, tanto na Commissão como na Camara; mas este Projecto é da competencia da Commissão de Legislação, porque se tracta de saber a verdadeira intelligencia que hade dar-se á respectiva Lei, e de avaliar segundo ella, a execução que tem lido. Voto portanto que vá á Commissão de Legislação.
O Sr. Duarte Leitão — Eu não me opponho a que vá á Commissão de Legislação; mas o que intendo é que esta materia é propria de todas as Commissões, porque abrange todas as Secretarias; e então eu propunha, que juntamente com a Commissão de Legislação fossem ouvidos alguns Membros das outras Commissões (Apoiados).
O Sr. C. de Lavradio — Sr. Presidente, no nosso Regimento determina-se, que hajam Commissões especiaes, quando a materia contêm especialidade que não pertence a nenhuma das Commissões já estabelecidas, e este é um dos casos; porque, este Projecto não pertence nem á Commissão de Fazenda, nem á de Administração, nem á de Legislação, e deve ser objecto de uma Commissão especial: com tudo não me opponho a que vá á Commissão de Fazenda, nem á de Legislação.
O Sr. Presidente — Eu ia propôr que fosse remettido á Commissão de Legislação, podendo ella convidar os Membros das outras Commissões, que julgasse conveniente (Apoiados).
Resolveu-se naquella conformidade.
O Sr. Silva Carvalho — Peço a palavra. (O Sr. Presidente — Tem a palavra) Sr. Presidente, a Commissão de Legislação acha-se falta de numero, porque tem estado doente o D. Par o Sr. V. de Laborim, e não sei se poderá continuar a assistir ás sessões: portanto exige ao menos um Membro mais, e pedia a V. Em.ª que consultasse a Camara se convinha, em que V. Em.ª mesmo o nomeasse.
O Sr. Presidente — O D. Par faz um requerimento para que se augmente mais um Membro á Commissão de Legislação....
O Sr. C. de Thomar — Proponho que seja o Sr. Sousa Azevedo.
O Sr. Duarte Leitão — Apoiado.
O Sr. Presidente — Em primeiro logar proporei á Camara se quer que se addicione mais um Membro á Commissão de Legislação, e em segundo logar que seja nomeado pela Mesa.
Approvado.
O Sr. Presidente — A Camara approva que seja nomeado pela Mesa? (Apoiados.) O Sr. Sousa Azevedo é quem a Mesa nomeia pelos votos da Camara (Muitos apoiados).
O Sr. Sousa Azevedo — Eu agradeço a V. Em.ª, e á Camara; mas eu já pertenço ás Commissões de Fazenda, de Administração, e Especial dos arranjos da Casa: entretanto não me escuso (Muitos apoiados).
O Sr. D. de Palmella — Sobre a ordem. A Mesa faz favor de dizer qual era o outro Projecto que estava dado para Ordem do dia?
O Sr. Presidente — Era o Parecer N.º 62, sobre o Projecto relativo ao pagamento dos reclamantes portuguezes.
O Sr. D. de Palmella — Eu pedia a V. Em.ª que se discutisse este Projecto, por uma razão: são tres horas e meia, e nenhum dos Srs. Ministros está presente, e segundo consta não é provavel que venham hoje á sessão por estarem occupados na outra Camara (Apoiados). A materia que estava em discussão é muito séria, e exige que estejam presentes os Srs. Ministros; este objecto tambem é serio; mas não é tanto como o outro, e parece-me que se podia discutir já. (Apoiados.)
O Sr. C. de Lavradio — É o cumprimento de um artigo do Tractado.
parecer n.º 62 sobre a Proposição de lei n.º 49, authorisando o Governo a pagar aos Reclamantes portuguezes, residentes em Portugal, a segunda e ultima prestação, por saldo das suas reclamações.
Parecer n.º 62.
A Commissão de Fazenda examinou, com o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, o Projecto de Lei n.º 49, sobre ser o Governo authorisado a pagar aos Reclamantes Portuguezes, residentes em Portugal, a segunda e ultima prestação, por saldo das suas reclamações. A Commissão é de parecer que o Projecto deve ser approvado, porque é o cumprimento de uma Convenção entre a Corôa de Portugal e a do Brasil.
Sala da Commissão, em 18 de Julho de 1848. = C do Porto Côvo. = José da Silva Carvalho. = Felix Pereira de Magalhães. = C. do Tojal. = José Antonio Maria de Sousa Azevedo. = B. de Chancelleiros. = José Joaquim Gomes de Castro.
Proposição de lei n.º 49.
Artigo 1.º O Governo é authorisado, em execução da Convenção concluida em 4 de Dezembro de 1840, entre a Corôa de Portugal e a do Brasil, a pagar aos Reclamantes Portuguezes, residentes em Portugal, o segundo rateio por saldo da importancia das reclamações, que foram liquidadas e julgadas pela Commissão Mixta Portugueza e Brasileira, estabelecida no Rio de Janeiro, em virtude do artigo 8.° do Tractado de 29 de Agosto de 1825, contado o respectivo juro até ao dia 30 de Junho de 1846, em que se deve verificar o pagamento.
Art. 2.° O mencionado rateio será de trinta e seis por cento para aquelles dos mesmos Reclamantes, que no primeiro rateio receberam neste Reino sessenta e quatro por cento, e de doze por cento para aquelles que no dito primeiro rateio receberam neste Reino vinte e um por cento, tendo já recebido, por sua conta, seus Procuradores, no Rio de Janeiro, sessenta e sete por cento, e pagando-se a cada um na conformidade das duas Tabellas annexas a esta Lei, sob numeros 1 e 2.
Art. 3.° Este pagamento deverá ser feito em Inscripções, com vencimento de juro desde o 1.º de Julho de 1846, ao preço de setenta e tres por cento, e os minimos serão pagos a dinheiro.
§. unico. Os juros das Inscripções que se emittirem em virtude, desta Lei, serão pagos, na razão de cinco por cento ao anno, pela Junta do Credito Publico.
Art. 4.° A Junta do Credito Publico é dotada, para este effeito, pelo rendimento do Pescado fresco, com a quantia de réis seis contos setecentos trinta e cinco mil, que receberá do Ministerio da Fazenda, em prestações, conjunctamente com a consignação já estabelecida sobre o mesmo rendimento.
Art. 5.º A Commissão, creada por Decreto de 21 de Agosto de 1841, para levar a effeito, pelo modo expresso na citada Convenção de 4 de Dezembro de 1840, a distribuição dos fundos destinados ao pagamento dos mencionados Reclamantes, requisitará ao Thesouro Publico as Inscripções e o dinheiro necessario para os minimos, á vista dos titulos legaes apresentados pelos mesmos Reclamantes. = (Com a assignatura da Presidencia da Camara.)
O Sr. Silva Carvalho — Sr. Presidente, este projecto foi á Commissão de Fazenda, que deu sobre elle o seu parecer, e é em consequencia do Tractado que houve entre Portugal e o Brasil; e o que se comprehende nelle é para o Governo satisfazer a prestação, e diz o modo como o deve fazer, e não póde haver inconveniente nisto. (Apoiados.) Inclue tambem as tabellas das quantias, e os nomes das pessoas que tem a receber o saldo das suas reclamações.
Foi plenamente approvada a proposição com as tabellas annexas. (Vid. Diar. do Gov. n.º 217, pag. 1187 e 1188.)
O Sr. Presidente — Agora na Segunda feira é dia de grande galla, e não póde haver Sessão. (O Sr. V. de Benagazil — É contra o Regimento.) Estão convidados os illustres membros da Commissão de Legislação, para que reunam, a fim de examinarem a proposta urgente do Sr. José da Silva Carvalho. (Apoiados.)
O Sr. Fonseca Magalhães — E tambem esse requerimento apresentado pelo Sr. Margiochi, que me parece urgente.
O Sr. Presidente — E tambem as duas Commissões a quem foi esse requerimento, o qual interessa ao nosso commercio. Em quanto á ordem do dia para Terça feira é a continuação do projecto sobre as leis das Dictaduras. (Apoiados.)
O Sr. D. de Palmella — Ha sobre a Mesa uns poucos de projectos vindos da outra Camara de menor importancia, e que podiam tambem dar-se para ordem do dia como supplementares. (Apoiados.)
O Sr. Presidente — Ha o parecer n.º 51, e se estiver presente o Sr. C. de Linhares será tambem dado para ordem do dia. Está fechada a Sessão — Eram quasi quatro horas.
O Sub-Director da Secretaria, Chefe da Repartição de Redacção, José Joaquim Ribeiro e Silva.