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CAMARA DOS PARES DO REINO

SESSÃO DO 1.º DE AGOSTO DE 1848.

Presidiu — O Sr. Cardeal Patriarcha.

Secretarios — Os Sr.s M. de Ponte de Lima.

Margiochi.

Aberta a Sessão pela uma hora e tres quartos da tarde, estando presentes 32 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão.

O Sr. D. de Palmella — Peço a palavra para antes da Ordem do dia. (O Sr. Presidente — Não ha correspondencia, e tem a palavra o Sr. D. de Palmella antes da Ordem do dia.) É para participar á Camara, que havendo sido avisado antes de hontem á noite, de que Sua Magestade tencionava vir hontem a Lisboa, e dar Beijamão, tomei a liberdade de nomear uma Deputação, interpretando que seria esse o desejo da Camara, cuja Deputação teve a honra de ser apresentada a Sua Magestade, e de ser recebida com a sua costumada benignidade (Apoiados).

O Sr. B. de Lamego — O D. Par o Sr. Bispo de Vizeu encarregou-me de participar a V. Em.ª, que não podia hoje assistir á discussão, por lhe ser necessario ficar em Cintra.

O Sr. B. da Vargem da Ordem — Pedi a palavra para um requerimento.

REQUERIMENTO.

Requeiro que pelo Ministerio da Fazenda se informe esta Camara com urgencia quanto tem recebido a Junta do Credito Publico, pelo que deixou de receber na quantia de 240:000$000 réis da sua consignação, pela Lei de 3 de Abril do corrente anno, que authorisou o Governo a levantar a dita quantia, e que devia ser paga á Junta pelo rendimento da Decima. 1.º de Agosto. = B. da Vargem.

Eu peço a urgencia deste requerimento, porque tendo de ser submettida a esta Camara a Lei de meios, assento que são necessarios os esclarecimentos que peço.

Foi logo plenamente approvado.

O Sr. Silva Carvalho — Pedi a palavra para lêr um Parecer da Commissão de Fazenda. Este requerimento e papeis que acompanham o Projecto, foram remettidos á Commissão, e é necessario recommendar na Secretaria, que haja cuidado em que se não desencaminhem.

O Sr. Presidente — Manda-se imprimir, e o D. Par pede que sejam impressos tambem os documentos?...

O Sr. Silva Carvalho — Os documentos não é preciso, basta só o Parecer com o Projecto, e o que pedi é que tivessem cuidado na Secretaria com esse requerimento, para que se não desencaminhasse.

Mandou-se imprimir. (1)

O Sr. C. de Thomar — Peço a palavra para fazer um requerimento. (O Sr. Presidente — Tem a palavra.) É o seguinte, e proponho a sua urgencia.

REQUERIMENTO.

Requeiro que se peçam ao Governo quaesquer representações que lhe fossem dirigidas expondo a necessidade de augmentar o número dos Juizes do Supremo Conselho de Justiça, por não ser sufficiente o número de onze creados por Lei. — 1.º de Agosto de 1848. — C. de Thomar.

O Sr. Presidente — Devo participar á Camara, que me foi representado por um dos Srs. Secretarios ser necessario, que a Camara sanccione as nomeações, que a Mesa fez durante o intervallo das Sessões, cujas nomeações na conformidade do Regimento devem ser sanccionadas pela Camara. (Apoiados). No outro dia já se sanccionaram os ordenados, e julgo conveniente lêrem-se essas nomeações para a Camara as sanccionar como é regular.

O Sr. D. de Palmella — Apoiado.

Sendo lida pelo Sr. Secretario a relação daquellas nomeações, foram todas approvadas.

O Sr. Presidente — Recebeu-se agora um Officio que vai lêr-se.

CORRESPONDENCIA.

Um Officio da Camara dos Srs. Deputados, participando que não admittindo as alterações feitas nesta Camara á Proposição de Lei sobre o Orçamento do Estado, se deveriam sujeitar á decisão de uma Commissão Mixta, para a qual procederia a nomear os Membros, que por parte da mesma Camara lhe deviam concorrer.

O Sr. Presidente — Proceder-se-ha á eleição dos Membros desta Camara para a Commissão Mixta, logo que chegue a lista dos Membros da outra Camara. Vamos á Ordem do dia.

ORDEM DO DIA.

PARECER N.° 55 SOBRE A PROPOSIÇÃO DE LEI N.º 48, confirmando os differentes Decretos das Dictaduras, cuja discussão foi encetada a pag. 1213, col. 3.ª Pausa.

O Sr. Presidente — Na ultima Sessão em que se tractou deste objecto, parece-me que tinha pedido a palavra o Sr. C. de Thomar sobre a ordem e sobre a materia: fallou sobre a ordem, e parece-me que lhe resta a palavra sobre a materia.

O Sr. C. de Thomar — Sr. Presidente, porem quanto desisto da palavra, porque ha D. Pares que não podem deixar de ser ouvidos sobre a materia: eu já fallei, e pedirei a palavra quando julgar conveniente.

O Sr. Duarte Leitão — Peço a palavra.

O Sr. Presidente — Não sei se mais algum D. Par tinha a palavra pedida da outra Sessão, a não ser o Sr. Fonseca Magalhães, e o Sr. C. de Thomar: se acaso isto não é exacto, e algum D. Par tivesse a palavra, queira declara-lo.... Não ha reclamação, e portanto dou a palavra ao Sr. Duarte Leitão.

O Sr. Duarte Leitão — Sr. Presidente, assignei este parecer da Commissão com declarações, e devo expor á Camara quaes são estas declarações.

O artigo 1.º do projecto explica-se do seguinte modo — Continuam a ter observancia todos os Diplomas, contendo materia legislativa, publicados pelo Governo desde 21 de Maio de 1846; e diz no §. unico — exceptuam-se — isto é, não continuam a ter força de lei taes e taes Decretos, e o Decreto de 10 de Março de 1817, que eleva a quinze o numero de Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, cujas disposições são declaradas sem effeito. Por tanto, segundo as expressões do projecto, segundo a formula nelle empregada, este Decreto não continua a ter força de lei; tem a tido até agora; mas, não continua a te-la. Este é certamente o pensamento exprimido pelas palavras do projecto, e o seu obvio e genuino sentido, e não póde ser outro.

Continuam em vigor os outros Decretos; mas este não — d'aqui em diante as suas disposições são declaradas sem effeito — para o futuro. Esta formula, ou outra equivalente é a que se emprega na revogação das leis; a lei revogada fica sem effeito para o futuro, sem que a nova lei possa desfazer o que por effeito daquella se consummou; e se fosse possivel que a lei decretasse sobre o passado, devia necessariamente declara-lo; mas dizendo simplesmente, que são declaradas sem effeito as disposições da lei revogada, não faz mais do que uma revogação segundo a regra geral, e com os effeitos, que tem todas as revogações das leis anteriores. Por tanto, concordo inteiramente, sem a menor hesitação, com a opinião da illustre Commissão em quanto ao principio, de que se houvesse logar á revogação deste Decreto de 10 de Março, não podia tal revogação ter effeito retroactivo; e tambem intendo que foi uma cautela muito conveniente da Commissão era o declarar (O Sr. D. de Porto de Mo: — Apoiado) para evitar duvidas. Mas não julgo que ainda não se declarando, fosse facil encontrar, quem na execução lhe desse effeito retroactivo, porque seria contrariar um dos primeiros principios constitucionaes. E tambem me parece, que o pensamento da outra Camara, donde veio remettido este projecto, foi igualmente não dar á lei effeito retroactivo, e antes ao contrario, sustentar todos os actos que estavam consummados, segundo o Decreto de 10 de Março. Parece-me isto, porque intendo que pela simples leitura do projecto vindo da outra Camara, é este o unico sentido que se lhe póde dar; nem me parece possivel, que houvesse quem pensasse, que taes expressões em uma lei revogatoria eram as proprias para annullar os actos preteritos, praticados em virtude da lei anterior. Pela minha parte, se eu pertencesse ao Governo, que houvesse de executar a lei, nunca a intenderia de modo, que podesse ter effeito retroactivo. Parece-me pois, que a Camara dos Srs. Deputados exprimindo-se pelo modo, porque o fez, teve manifestamente em vista, que esta lei não tivesse o vicio da retroactividade, e que não se violasse um dos mais salutares principios da Constituição, e mais necessarios para a segurança da propriedade, e para a tranquillidade dos Povos.

Mas a illustre Commissão com razão fez esta declaração para evitar questões, porque no caso de que se tracta, alguns inconvenientes poderiam seguir-se da falta de tal declaração; e o legislador deve considerar os perigos, que podem resultar do seu silencio, e acautela-los. Todavia devo dizer, que não me levantei para fallar dos poderes que tinha o Governo para publicar este Decreto, nem da sua validade, e força de lei que tem tido sempre, e da sua execução, como lei. A questão do poder, que o Governo tinha para publicar o Decreto de 10 de Março, poder derivado das circumstancias em que o Reino se achava, poder manifestamente comprehendido na declaração do Decreto de 26 de Outubro de 1846; não tencionei que fosse objecto do discurso, ou para melhor dizer das explicações que tenho a fazer. Este objecto, se houvesse necessidade de ser tractado, muito melhor o havia de ser por V. Em.ª, e pelos outros Srs. da Commissão. V. Em.ª foi o primeiro que assignou o parecer da Commissão, e se fosse necessario, exporia os motivos, porque não póde contestar-se o poder, que tinha o Governo para publicar aquelle Decreto, e faria vêr os effeitos desastrosos que se seguiriam para a tranquillidade publica e administração da justiça, se acaso se desfizesse o que já se fez, e está consummado, e a incerteza dos direitos, e as perturbações resultantes da nullidade das sentenças, cactos judiciaes praticados por aquelles Juizes do Tribunal, de que se tracta.

Parece-me, que a Camara acreditará que tambem me não seria muito difficultoso dizer algumas cousas a este respeito; mas concordando eu nesse ponto com a Commissão, intendo que é mais conveniente, que tal objecto seja tractado por quem, melhor do que eu o póde tractar, no caso que seja necessario. As minhas declarações não versam por tanto nem sobre os poderes do Governo, nem sobre a impossibilidade de que esta lei tenha effeito retroactivo, pontos estes, em que eu concordo com a Commissão, e em que me parece indubitavel, que a Camara ha de concordar, impedindo que se viole um dos mais sagrados principios da Carta: as minhas declarações são outras.

Eu intendo que o Decreto não se deve revogar, porque a medida nelle estabelecida é absolutamente necessaria para a administração da justiça, Sr. Presidente, eu não julgo, nem jamais podia presumir, que sómente as minhas palavras produzissem um effeito que aliás muito estimaria, a saber: que os illustres Membros da Commissão alterassem a sua opinião. Seria presumir demasiadamente; e comtudo tenho esperança de que mostrarei a necessidade da conservação do Decreto; e permitta-me a Commissão, que eu igualmente declare, que se os motivos dessa necessidade forem evidentes, grande serviço se faria ao Paiz em não decretar a revogação; e por isso é muito para desejar, que possa haver alguma modificação na opinião da Commissão. Pediria do mesmo modo ao Governo, que concorresse para que o Decreto se não revogasse; porque, que precisão ha de que elle se revogue, para que d'aqui a poucos mezes venha este Governo, ou outro, que veja a sua necessidade, propor a mesma providencia? Por isso intendo na minha consciencia, que é melhor conservar este Decreto; e tenho a idéa de que o Governo não está longe de acreditar que a medida é necessaria.

Ha actualmente quatorze Conselheiros no Supremo Tribunal de Justiça, e por este Decreto foi elevado o seu numero a quinze. Antes de continuar, direi primeiro, que não intendo, que sejam ministeriais todas as questões sobre as medidas que o Governo propõe; e não julgo, que no objecto que nos occupa, seja a questão ministerial. Mas dizia eu, que pelo Decreto de 10 de Março foi elevado o numero a quinze; e parece-me muito melhor, que o Governo em logar de concorrer para a revogação deste Decreto, pelo contrario nomeasse outro Conselheiro para o logar que se acha vago. E por esta occasião peço licença ao D. Par o Sr. C. de Thomar, que é de opinião contraria á minha, para lhe dizer, que o sustentar S. Ex.ª a opinião de que são desnecessarios estes Conselheiros, faz-lhe sem duvida muita honra, porque não quer sacrificar, o que pensa em sua consciencia, aos seus interesses; por quanto, pelo mesmo principio, por que o Sr. Ferrão foi despachado para o Supremo Tribunal de Justiça, talvez pertença ao D. Par o Sr. C. de Thomar o ir para esse logar vago: digo, talvez, porque regulando o despacho pelo mesmo principio, por que se regulou o do Sr. Ferrão, sómente poderia haver questão entre o Sr. C. de Thomar, e o Sr. Farinho, para verificar a sua antiguidade da Relação dos Açores. Intendo pois, que o Sr. C. de Thomar, sendo de opinião contraria, falla contra os seus interesses proprios; e então permitta-me S. Ex.ª que eu advogue a sua causa; porque, em verdade, defendendo a necessidade da conservação destes logares, advogo a causa daquelles, que tem direito a entrar para o Tribunal.

Sr. Presidente, já se disse nesta Camara, e eu repetirei agora, que o Sr. D. Pedro de saudosa memoria, quando em Setembro de 1833 organisou o Supremo Tribunal de Justiça criado pela Carta, determinou que houvessem quatorze Conselheiros, um dos quaes era o Procurador Geral da Corôa: ficou portanto o Tribunal com doze Juizes, o Presidente treze, e o Procurador Geral da Corôa quatorze; e as Secções do Tribunal ficaram com seis juizes cada uma. Depois em 1836 foram reduzidos os Conselheiros ao numero de onze; e por esta occasião permitta-me a Camara mencionar um facto. Eu, como já aqui disse neutra occasião, fui um dos Membros da Commissão encarregada da reforma judiciaria; e quando se tractou deste ponto, disse ao Sr. Vieira de Castro, que o Tribunal não podia ficar com menos juizes do que aquelles que tinha, não incluindo o Procurador Geral da Corôa, a respeito do qual se determinou, que não fosse necessariamente Membro do Tribunal. Mas o Sr. Vieira de Castro, por motivos que não é necessario expor agora, respondeu-me que era cousa que não podia fazer; e que se havia de effeituar a reducção, fixando-se o numero de 11 Conselheiros, incluindo o Presidente. Lembrou então o expediente dos Supplentes, e assim se determinou.

Não tardou porém muito tempo, que se não conhecesse, que essa medida não produzia o resultado que se tinha esperado; e evidentemente se mostrou, que mesmo com os Supplentes não podia marchar devidamente a administração da justiça naquelle Tribunal. Mas até 1840 assim se foi passando, com inconvenientes no serviço, como logo direi, porque nesse espaço de tempo fui Presidente do Tribunal. Em 1840 foram restituídos aquelles que haviam sido demittidos pelos acontecimentos de Setembro de 1836, e ficou numero sufficiente de Conselheiros no Tribunal. Em 1841, na Novissima Reforma Judiciaria, contou-se com este numero dos reintegrados para a ordem do serviço, e para o julgamento; e assim se mandaram dividir e formar as Secções do Tribunal. O artigo 793 §. 1.º da Nov. Reforma Judiciaria diz: A divisão em Secções lerá logar, em quanto houver o numero de Conselheiros necessario conforme a Legislação em vigor.

E qual é esta Legislação em vigor? Os feitos civeis hão de ser vistos por cinco, e podem ser julgados por tres: os feitos crimes hão de ser vistos por sete, e não podem ser julgados por menos de cinco. Na Reforma de 1841 estabeleceu-se, que os feitos crimes não podessem ser julgados por menos de cinco; mas que o podessem ser por seis ou por sete, e portanto é manifesto, que a Lei contou com o numero de sete em cada Secção. Se a Lei não suppuzesse sete Juizes em cada Secção, mandando vêr os feitos crimes por sete, sendo possivel, e julga los por cinco ao menos, seria contradictoria; e a declaração — sendo possivel — seria inutil. Seria contradictorio considerar para este fim ambas as Secções, mandando vêr os feitos pelos Juizes da outra Secção, depois de as ter dividido, e obrigar os Conselheiros a irem a todas as quatro Sessões da semana. E seriam inuteis as palavras — sendo possivel — estando divididas as Secções; porque neste caso não podendo funccionar divididas, sem que haja ao menos cinco effectivos em cada uma, se a Lei quizesse, que passassem os feitos para a outra Secção afim de se preencher o numero de sete, era escusado absolutamente, que dissesse — sendo possivel — porque em tal caso era sempre certo, que na outra Secção devia haver os que faltavam para esse numero. O que evidentemente a Lei quiz, é que cada Secção seja composta de sete Juizes; mas como apesar disso, é possivel que muitas vezes não haja mais que cinco desimpedidos, sejam

(1) Será integralmente consignado quando se discutir.