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DIARIO DO GOVERNO.

Ministro dos Negocios Estrangeiros, promovi e dei alguns passos para se adiantar a negociação de um Tractado de Commercio com os Estados Unidos, e para esse fim dirigi uma Nota ao actual Ministro, que ainda aqui se acha, para que elle pedisse ao seu Governo que o munisse dos plenos poderes necessarios para se dar seguimento a essa negociação; os plenos poderes vieram, mas chegaram quando eu já tinha saído do Ministerio, e então a communicação que elle fez ao nosso Governo creio que ficou sem resposta, mas em todo o caso a negociação ficou sem effeito: quaes foram os motivos disso, não sei nem tracto agora de os indagar; o Sr. Barão do Tojal, que esteve no Ministerio parte do intervallo que decorreu de 1835 para cá, assim como outros Srs. que presentes se acham, poderão informar a Reunião sobre este ponto, mas o certo é que não houve resultado algum. E verdade que o actual Ministro dos Estados Unidos se acha proximo a partir para o seu paiz com uma licença prolongada, e não sei quando voltará; mas, se se perder, por negligencia a occasião, adiar-se-ha essa negociarão que talvez se perca para sempre (apoiados). Quanto mais que os Tractados de Commercio, que os Estados Unidos tem com varias Nações acabam quasi todos em 1842; então é muito provavel que cada Governo faça as suas diligencias para obter vantagens, e vantagens que talvez nos trarão a impossibilidade de promover o nosso Commercio naquelle paiz.

O Tractado que o Governo dos Estados Unidos deseja concluir comnosco, não é, segundo entendo, um Tractado de Navegação, como acaba de dizer o Sr. Barão do Tojal, é um Tractado de Navegação e Commercio, aquelle Governo queria igualar os seus navios aos nossos no Commercio directo entre os dous paizes, quanto a direitos, e queria tambem que estipulassemos que seriam postos a par das Nações mais favorecidas para os direitos que deveriam pagar os seus generos em Portugal, e os nossos na America. Bem longe de ter feito progresso nestes cinco annos, a negociação atrazou-se, e ficou mais difficultosa pelas razões que o Sr. Barão do Tojal acaba de mencionar, porque se promulgou em Portugal uma Lei sobre direitos differenciaes que torna impossivel a concessão do favor que os Estados Unidos pedem e offerecem: essa Lei, em quanto subsistir, embaraça inteiramente o Tractado de Navegação; não é possivel que elle tenha logar. Não é possivel tambem, creio eu, que nenhum Ministro proponha ás Côrtes uma excepção dessa Lei a favor de uma unica Nação; mas é certo que deve ser revogada, se se quizerem fazer Tractados desta natureza. Não entrarei agora no amplo desenvolvimento desta idéa, que poderia sustentar com muitas razões; entre outras haveria a de estimular fortemente outras Nações com as quaes temos Commercio, e Commercio importante; se se concedesse favor especial a uma Nação com a impossibilidade de o conceder a outra. A difficuldade para a conclusão da outra parte do Tractado, isto é, sobre a admissão de generos no pé da Nação mais favorecida em ambos os paizes, resulta de uma idéa que tem havido entre nós, idéa que é muito nacional (confesso que a tenho tido, e que tem sido mesmo uma idéa fixa para mim) vem a ser, procurar concluir um Tractado com o Brasil, no qual se concedam favores especiaes, e reciprocos aos dous paizes; se este Tractado podesse vir a concluir-se, sei ía impossivel igualar a admissão dos generos de outra Nação a essa que era então a mais favorecida, porque os generos dos Estados Unidos competem alguns delles com os do Brasil, e seria tolher-nos a faculdade de effectuar o Tractado com o Brasil, se começássemos já negociando deste modo com os Americanos (apoiados). E possivel comtudo que os Estados Unidos consintam que se faça alguma excepção a favor do Brasil, pelo menos a respeito de certos generos (como são — assucar, caffé e outros) com os quaes não concorrem; e então, podendo obter-se essa reserva, confesso que eu desejaria muitissimo se não perdesse esta occasião de encetar, ao menos, aquelle systema de Tractado que eu tinha concebido em 1835, que tinha levado bastantemente avante, e que esperava poder concluir com felicidade se as circumstancias politicas do paiz, me não tivessem separado do Ministerio dos Negocios Estrangeiros (Apoiados geraes).

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Esta conversação não sendo regular, versa sobre um objecto tão importante que não posso ficar silencioso nesta occasião: poderia referir o Sr. Barão do Tojal ao que já lhe respondi sobre o mesmo assumpto na antecedente Sessão; fallo porém neste objecto com tanta mais confiança, quanto tenho uma opinião decidida pelo que toca á necessidade de adoptar nas nossas relações commerciaes, os principios que na época presente regulam em geral as relações commerciaes de quasi todas as Potencias. Acho-me porém na impossibilidade de o fazer segundo a nossa legislação actual. Debaixo desses principios, como disse o meu amigo o nobre Senador que me precedeu, tinha elle intabolado esta negociação com os Estados Unidos, e com a Inglaterra, e quando eu tornei ao Ministerio em 1836, foi elle encarregado desta outra vez, e póde-se dizer que a levou a conclusão, porque já se tinha concordado nos pontos essenciaes do Tractado.

Quando eu estive no Ministerio dos Negocios Estrangeiros desejei concluir um Tractado com os Estados Unidos, e podia-se verificar. O Governo dos Estados Unidos tinha tirado o excesso de direitos que pagavam os nossos vinhos, debaixo da idéa de que se estabeleceria um principio de reciprocidade, não só em quanto á Navegação, mas em quanto a pagarem reciprocamente nos dous paizes, só os direitos a que estivessem sujeitas as Nações mais favorecidas. Pouco depois chegou aos Estados Unidos o conhecimento do Decreto que estabeleceu direitos differenciaes; e logo se authorisou o Presidente a impôr novos direitos sobre os nossos vinhos. O outro obstaculo que se apresenta para se poder fazer este Tractado de Commercio é relativo ao Brasil, porque tenho idéa de que o Governo dos Estados Unidos não admittia a excepção a favor do Brasil. Estes mesmos embaraços teve o Sr. Barão do Tojal no tempo em que esteve no Ministerio, e se o Tractado se podesse fazer hoje em cinco minutos tambem se podia ter feito então. Mas o Sr. Barão do Tojal sendo Ministro da Fazenda não o conseguiu porque não póde. Eu tenho os mesmos desejos do Sr. Barão do Tojal, acho-me no mesmo caso. Tenho tido varias occasiões de fallar com o Ministro da America que aqui se acha, e persuado-me que me faz justiça vendo que eu não posso fazer tal Tractado [Vozes: — Póde, póde).

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira: — Ainda que não seja occasião propria de tractar deste negocio, acho que a discussão tem sido util porque tem mostrado a opinião dos membros desta Casa.

Disse um illustre Senador que se linha deixado o negocio sobre este Tractado em certo pé, quando teve logar a revolução de Setembro de 1836. Eu tomei então conta da pasta dos negocios estrangeiros, mas deverei dizer que depois da Administração do Sr. Duque de Palmella tinha havido outra antes de Setembro. Eu tive varias conferencias com o Sr. Encarregado de Negocios dos Estados Unidos sobre este objecto, que considero de mui grande importancia, porque aquelles Estados podem vir a ser um vasto mercado para os nossos vinhos: mas para levar a effeito qualquer medida, naquelle tempo, oppunha-se o Decreto dos direitos differenciaes, recentemente publicado. Entretanto esse obstaculo poderia vencer-se, porque o Tractado em todo o caso deveria ser apresentado ao Corpo Legislativo. A questão para mim foi outra; tinha mudado o nosso systema commercial, a parecia-me um absurdo não deixar tempo para fazer a experiencia dos seus effeitos. Agora que são passados tres annos, já podemos ter conhecido qual é mais vantajoso; (apoiado, apoiado), e parece-me que agora é occasião de entrar nessa questão. Ainda que não tenho os mappas dos ultimos annos sobre a nossa Navegação, parece-me que podemos considerar o Governo habilitado a poder tractar. O Sr. Moniz, no Congresso Constituinte, apresentou um Projecto pelo qual se determinava que o Governo alterasse os direitos de tonelagem, em favor das nações cujos governos podessem a navegação portugueza no pé da sua propria: a esse Projecto eu fiz a emenda de que fosse facultativo ao Governo, mas não obrigativo, o poder fazer essa alteração de direitos; emenda que foi admittida pelo Auctor do Projecto. Com tudo não me parece que seja necessario fazer Lei alguma a tal respeito, porque o Governo tem na sua mão tractar, e depois vir ao Corpo Legislativo pedir a approvação dos Tractados que houver feito.

Por esta occasião tocarei em outro ponto importante, e que tem relação com o objecto de que se falla. Segundo dizem os papeis publicos existe em París uma Commissão composta de Inglezes e de Francezes, nomeados pelos respectivos Governos, cujo objecto é tractar de uma alteração das Pautas respectivas: diz-se que tem concordado em diminuir os direitos dos ferros inglezes, importados em França, e os direitos dos vinhos francezes importados nas ilhas britannicas, diminuição que se diz ser de 183 por cento. Se isto é verdade os nossos vinhos em Inglaterra não poderão concorrer com os vinhos de França. Ainda que estou certo que o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros ha de ter este objecto em vista, não me pareceu desacertado fallar sobre elle, e chamar sobre este assumpto a attenção dos membros desta Casa. Concluo pois dizendo que me parece acertado aproveitar esta occasião, e não deixar partir o Ministro dos Estados Unidos, sem que elle leve o Tractado concluido.

O Sr. Duque de Palmella: — Estava bem longe, e estou o mais que é possivel, de fazer increpação a nenhuma das Administrações passadas, e principalmente ao meu nobre amigo o Sr. Visconde de Sá; de maneira alguma quiz accusar a ninguem: narrei a parte historica da questão de que se tracta, e disse que por motivos que se ignoram, e outros dos quaes são patentes, não se continuou a negociação que estava encetada com os Estados Unidos. Agora é urgente continua-la, quando mesmo eu não podesse, por causa da Lei sobre os direitos differenciaes, estipular cousa nenhuma ácerca da nossa navegação, nem por isso deixaria de procurar fazer um ajuste quanto aos direitos de importação dos generos: não sei se o Ministro dos Estados-Unidos se acharia authorisado a cortar por metade o Tractado que elle propoz, ajustando uma parte delle, e sobrestando na outra; a ser isto possivel, não sei porque o Governo deixaria de pedir a necessaria authorisação ao Corpo Legislativo para negociar sobre a base dos direitos differenciaes, mas, torno a dize-lo, de uma abolição total, no caso de se manifestar, como já poderá conhecer-se pelos mappas desde que a Lei existe, que ella não favorece senão apparentemente a nossa industria, e que, em vez de um bem, tem produzido um mal; isto é uma questão de facto, mas sendo assim, como eu creio que é, não vejo inconveniente nenhum, antes vejo uma grande vantagem em se pedir ás Côrtes, que revoguem essa Lei (apoiados). A estipução relativa á admissão reciproca dos nossos generos sobre o pé das nações mais favorecidas, seria tanto mais util a Portugal, quanto é certo que os Estados Unidos são (como o Sr. Barão do Tojal muito bem observou) grandes consumidores de vinhos, e nós somos grandes mercadores do mesmo genero; é este o nosso ramo principal de Agricultura. Os vinhos francezes estão pagando nos Estados Unidos direitos seis vezes menores que os nossos, e por isso a importação dos vinhos francezes na America é, creio que oito vezes maior que a dos de Portugal: por consequencia, bastam estas duas observações para provar quanto poderemos lucrar se obtivermos igualar os direitos dos nossos vinhos aos que alli pagam os de França.

Esta questão do Tractado de Commercio com os Estados-Unidos é interessante até pela consideração de que entre nós houve essa idéa desde o primeiro momento da independencia desses Estados; o com effeito, no anno seguinte concluiu-se um Tractado entre o celebre Francklin e o nosso Embaixador em França, o qual nunca foi ratificado, assim como tambem não tiveram exito as negociações para o mesmo fim posteriormente encetadas por Luiz Pinto de Sousa, D. João de Almeida, o Visconde da Lapa, e por ultimo as que eu mesmo comecei em 1835.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Eu não quero tomar o tempo a esta Assembléa; só quero dizer que referi factos sem fazer increpações a ninguem; agora só accrescentarei uma observação, e é, que em quanto existe uma Lei, eu não posso ir contra ella.

O Sr. Barão do Tojal: — O nobre Duque de Palmella alludio justamente áquelles pontos os quaes eu considerava serem o tropeço á conclusão desse Tractado; e bem receava eu que fossem talvez as esperanças de se effectuar com o Brasil um Tractado especial ou excepcional, que paralisassem as nossas negociações. — Movido eu de zelo pelos interesses do roeu Paiz, e tendo a peito todas as medidas que possam conduzir a alcançar-lhe o maior beneficio possivel, nunca perdi de vista este Tractado que julguei, e julgo tão conducente a este fim; e o proprio Ministro a quem fallei me assegurou que sendo isso indispensavel se podia deixar alguma previsão suspensiva no Tractado para subsequente