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DIARIO DO GOVERNO.

discussão, no caso que Portugal chegasse a effectuar com o Brasil um Tractado differencial; ora, esses generos dos Estados-Unidos que entram em concorrencia com os do Brasil em os nossos mercados, são muito limitados; por exemplo: o algodão, mas este nunca virá a pagar em Portugal direito algum, além de nominal, por ser materia prima, o arroz, aduella, e tabaco; os chamados generos coloniaes que se cultivam na Louisiana e Floridas, nunca cá virão por serem em quantidade muito insufficiente até para o consumo interno; o arroz de Carolina, é de uma qualidade e custo muito superior, e o seu consumo entre nós é muito limitado. — Este Tractado por consequencia, repito, é muito vantajoso para nós, porque os Estados-Unidos tem a comprar-nos quasi tudo quê produzimos, e nós a elles, minto pouco, devendo lembrar-nos que alli teremos 20 milhões da consumidores, e elles aqui 3 milhões, e que teremos portanto um saldo muito consideravel em nosso favor; porque mesmo além disso, todos sabemos o superior valor dos nossos productos sobre os delles, como bem observou o illustre Duque de Palmella; os direitos alli sobre o nosso Vinho são muito maiores do que os que pagam os vinhos de França; estes pagam uma quinta parte só do que pagam os vinhos de Lisboa e Porto, pagando estes 7 1/2 centimos por galão, em quanto os vinhos de França em vasilhas, só pagam 1 1/2 centimos, e o da Madeira 12 1/2 centimos por cada galão. A nossa Lei actual dos 15 por cento de direitos differenciaes em favor das importações feitos pelos nossos navios, não deve obstar a um Ministro illustrado, animado de vivos desejos, e zeloso pelo bem do seu Paiz, a que negoceie um Tractado aliás tão vantajoso, e que deve ser, a final, approvado pelo Poder Legislativo (apoiados). Eis aqui o que eu teria feito: teria negociado um Tractado, o melhor que tu podesse, e as Côrtes o approvaram ou não, mas as Côrtes de certo que não deixariam de approvar um tal Tractado, prenhe de tão ferteis resultados e vantagens futuras para nós.

Nações ha, muito espertas, que tem os mesmos generos que nós temos para exportar, e que não descançarei, nem perdem de vista um instante a promoção, por todos os meios, deste fim importantissimo para a sua prosperidade e interesses nacionaes, á custa dos nossos necessariamente, convindo até para isso, o fomentar e assoprar a desintelligencia e discordia entre nós e outras Nações, nossas alliadas naturaes, e unicas consumidoras dos nossos productos, para tirarem dahi proveito, e o estão tirando, em quanto nós, illudidos, ficámos a olhar, até que seja tarde, e o mal sem remedio. Eu sou, Sr. Presidente, em favor do Tractados; muitos haverão que chamem a esta minha declaração de fé, uma heresia politica, mas ainda que me queimem vivo por ella, eu hei de afoutamente, honradamente pronunciar a minha opinião em tal assumpto, porque aqui cumpre sempre fallar linguagem franca, e a verdade. Eu pois, Sr. Presidente, fazia tambem ámanhã um Tractado se podesse com a Inglaterra; digo mais, que teria sido pura nós uma ventura muito grande, se se tivesse effectuado um Tractado que esteve a ponto de se concluir com Inglaterra em 1836, no tempo do Ministerio do Sr. José Jorge Loureiro; foi na minha opinião, uma desgraça não se ter então concluido tal Tractado; aquelle Ministerio fez a honra de chamar-me por duas vezes, e ouvir-me sobre as diversas clausulas daquelle Tractado então em progresso de negociação; estou portanto bem ao facto das suas estipulações, que não hesito um instante em asseverar, eram concebidas em um espirito de absoluta reciprocidade, de conciliação e franqueza, e mesmo de generosidade da parte da Inglaterra. Por aquelle Tractado, nos concedia a Inglaterra, o que ella ainda nunca concedeu a nenhuma outra Nação, isto é, a livre e directa entrada dos nossos vinhos, e agoardentes em nossos proprios navios em todas as suas vastissimas e ricas Possessões, sobre o pé de igualdade, isto é, abrindo-nos os Canadas, Nova Scotia, e Nova Brunswick, n'America do Norte, Stoudenas Bahamas, Jamaica, Antilhas, Demeeara Berbrie, Ilhas de França e Ceilão, e Nova Hollanda, contendo milhões de riquissimos consumidores. Isto em retorno de lhe franquearmos sobre o mesmo pé as nossas Colonias, que quanto a mim até seria o meio mais efficaz dellas se desenvolverem rapidamente. A que deve por ventura a minha Provincia, a Ilha da Madeira, a sua actual grande civilisação e prosperidade, serão ao seu grande commercio e relações com a Inglaterra? A não serem estas, como poderia ella estar hoje no estudo florescente em que se acha — e de ler prestado, e estar prestando, tantos relevantes soccorros pecuniarios á mãi patria? Por consequencia, sinto, repito, e torno a repetir para que todos me ouçam muito bem, que nós não fizessemos aquelle Tractado com Inglaterra, elle teria evitado todas as difficuldades, embaraços, e apuros em que hoje se acham as nossas relações com aquelle Paiz, com quem tanto a nossa existencia politica como interesses vitaes, pedem e instam que cultivemos a mais perfeita boa intelligencia e harmonia, do contrario, quanto a mim, só nos podem seguir desastres e infortunios sem numero. Porque houve o Tractado de 1810, ha de seguir-se que todos os subsequentes hão de por força ser iguaes? Essa época já passou. A propria Inglaterra reconhece a força das idéas do da, ella mesma é que foi a primeira a abrir e encetar o novo systema de reciprocidade commercial, debaixo d'administração do illustrado Mr. Huskisson, que hoje rege a sua politica commercial, e vai penetrando todas as idéas e opiniões. Como os Corpos Legislativos sempre tem de approvar ou reprovar todos os Tractados, não tenho medo delles; quando são discutidos á luz do dia, e desfiados e meditados pelas Camaras antes de rateficados, que receios poderão elles causar? Por tanto peço ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, que renove a discussão desse Tractado; não tenha medo; apresente-o ás Côrtes, e se para o concluir fôr preciso romper pelas Leis de direitos differenciaes, que parece offerecer tão formidavel obstaculo, eu da minha humilde parte lhe prometto conceder um bill d'indemnidade, por essa iniciativa de violação, tão grande como esta Sala.

O Sr. Castro Pereira: — Não tomarei muito tempo á Assembléa. Pedi a palavra unicamente para que do meu silencio sobre este importante assumpto senão possa inferir que eu, na qualidade de Ministro dos Negocios Estrangeiros que tive a honra de ser, tractei com indifferença os interesses do paiz. Apello para o meu nobre collega o Sr. Barão do Tojal: elle sabe que eu fiz o pouco que nessa época se podia fazer, e todos sabem que a revolta de 1837, e a guerra civil, que então infelizmente se ateou em Portugal occupou, quasi exclusivamente, a attenção do Ministerio de que eu fazia parte; entretanto não deixei de fazer todos os esforços possiveis, de acôrdo com o meu nobre amigo o Sr. Barão do Tojal, para dispor a opinião a fim de obter votos na Camara Constituinte, para desviar os estorvos legaes, que nos impediam de concluirmos com vantagem um Tractado com os Estados Unidos.

O Sr. Duque de Palmella: — A minha explicação refere-se unicamente a uma asserção, que é um engano do Sr. Barão do Tojal, quando involuntariamente attribuiu á Administração do Sr. Loureiro (meu amigo e que muito respeito) a negociação do Tractado com Inglaterra: esse Tractado foi começado no meu tempo, quando eu tinha a honra de presidir ao Conselho da Rainha, continuando depois pelo Sr. Loureiro, e no tempo em que outra vez entrei para o Ministerio, levado por mim quasi ao ponto da sua final conclusão. Esse Tractado julgo que nos era vantajoso (apoiados), não só continha a faculdade de que fez menção o Sr. Barão do Tojal, para abrir ao nosso commercio os portos das Possessões de Inglaterra, mas tambem outras estipulações, as quaes é desnecessario agora referir-me, umas puramente commerciaes, e outras relativas, por assim dizer, a pontos que tocam de perto a honra nacional, e que então tinhamos levado quasi aos termos de se concluirem de uma maneira mutuamente satisfatoria, o que agora será talvez mais difficil.

O Sr. Barão do Tojal: — Sr. Presidente, longe de mim o intento de roubar ao nobre Duque a quem muito respeito, a gloria de ter sido o primeiro que entabolou a negociação para um Tractado tão vantajoso entre Portugal e Inglaterra; se mencionei o Ministerio Loureiro foi porque este Ministerio como já observei, me fez a honra de me chamar por duas vezes, e me consultou sobre a minuta desse Tractado, porque sendo eu Negociante, e tendo vivido muito tempo em Inglaterra o na America (ainda hoje negociando da Madeira, com esses paizes assim como com as Colonias Inglezas) estava bem ao facto de varias circumstancias relativas a este commercio: vi então e muito auditei sobre a minuta do Tractado, que com as modificações que se lhe admittiam, me pareceu muito vantajoso, e agora maior honra tributo ao nobre Duque por ser o primeiro que concebei: essa idéa, e repito que tenho muita magôa da não ter sido levado a effeito, e quanto serviço faria de certo o nobre Duque ao seu paiz se hoje, mais que nunca, abatidos como se acham os nossos vinhos, podesse influir para a conclusão de tão boa obra por elle principiada, e que com algumas alterações, tanto impulso e prosperidade communicava á nossa agricultura e navegação. As difficuldades que então para isso se apresentaram, estou persuadido que eram sobre esse mesmo favor que se pertendia dar ao Brasil, no caso que o Brasil viesse a concluir comnosco um Tractado commercial excepcional; oxalá Deos permitta que se venha a concluir, mas receio que não; hão de haver muitas intrigas estrangeiras para o malogro, figurando-se-lhes que d'ahi poderão resultar consequencias muito nocivas aos seus respectivos commercios. A mim consta-me, em parte confidencialmente, que a unica difficuldade que sobreveio nessas discussões, foi que a Inglaterra não queria ceder do principio de igualdade absoluta, e então insistia que no caso de se conceder ao Brasil esses direitos differenciaes, ella, para resalva do principio, ficaria com uma margem de poder propôr certo favor nos direitos sobre manufacturas especificas, concedendo-nos da sua parte tambem iguaes excepções relativas a certos dos nossos productos; caso este que só poderia vir a ter logar quando se chegasse a verificar o Tractado excepcionai com o Brasil. Da difficuldade de ajustar esta idéa é que, creio, proveio a demora: quanto as estipulações sobre direitos, segundo estou informado, e vi, não creio que d'ahi podessem apparecer grandes difficuldades. Entretanto, repito que nós somos por natureza uma Nação agricola e navegante; como tal, precisamos de Tractado com certas Nações grandes e commerciaes, não do phantastica reciprocidade mas de igualdade de facto; carecemos de que taes Nações commerceiem comnosco, e sem Tractados que protejam nossos productos, é fertil pertende-lo; precisamos que os nossos vinhos, azeite, sal, fructas, lãa, artefactos que espero irão melhorando muito, sejam pelo menos igualmente favorecidos como o forem os das mais Nações que nesses paizes importarem taes generos no pé mais favorecido. Quanto aos nossos direitos differenciaes podemos relaxa-los em favor daquella Nação ou Nações com quem nos convier tractar e commerciar neste pé, para com taes, e sómente com taes não póde haver duvida em se abolirem taes direitos differenciaes, pois que gosando os nossos navios do mesmo foro nos seus portos, a nossa navegação prosperaria, mas para isso não é preciso abolir a Lei em globo, porque iríamos favorecer aquelles que nos excluem dos seus portos, como aconteceu em França, e outros portos do Continente; os nossos navios no Havre, ou em outro qualquer porto Francez, pagam na razão de 3 e meio francos por Tonelada, e a consequencia da abolição da Lei seria pagarem os navios Francezes quasi nada em Portugal, e os nossos navios um direito prohibitivo por lá. Ora os Francezes, que conservam e abraçam o systema restrictivo e de exclusão, em geral, querem relaxar este seu systema em favor dos generos que importam dos Estados Unidos, e procuram por este modo obter os votos do Congresso, igualando ultimamente o direito sobre os algodões de largo fio (o Americano) que pagava mais, com o de curto fio, o do Brasil e Egypto que pagava menos, o que importava um grande favor para aquelle, e não pequena desvantagem para estes, tudo com o fito de excitar a benevolencia do Congresso, a fim de renovarem o Tractado que expira em 1812, e renovado elle, nós poderemos abandonar a idéa de jámais participarmos do vantajoso commercio que podemos aliás estabelecer para sempre com aquelles vastos e florescentes Estados. A nós cumpre-nos ter Tractados commerciaes com quatro grandes Nações, a Inglaterra, Brasil, Estados Unidos, e a Russia: com esta ultima já tivemos um muito vantajoso, concluido entre a Senhora D. Maria I, e a Imperatriz Catharina II, que muito conviria renovar da melhor fórma possivel, porque os mercados Russianos podem fornecer um grande consumo aos nossos vinhos brancos, reduzido que seja o direito excessivo de mais de 40$ réis por pipa que hoje alli pagam, e em retorno podemos importar linho, canhamo, ferro, e muitas materias primas de que carecemos.

Concluo dizendo que se ás Côrtes forem presentes Tractados taes feitos com estas Nações grandes e ricas, segundo as bases que levemente aqui tenho indicado, estou persuadido e positivamente convencido, que não poderão dei-