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DIARIO DO GOVERNO.

Que eu não desejaria ter um assento nesta Camara se fosse considerada illegal a minha eleição: eu concordo com a opinião dos illustres Senadores que hoje disseram que desejavam que sómente viessem á Camara homens que representem a opinião verdadeira dos Povos, e não os eleitos só pelas maquinações de qualquer partido publico ou oculto: sempre se distribuiram listas sem que possa ser motivo de censura, mas nego que qualquer dos meus collegas dissesse a nenhum Empregado que havia de votar como lhe era indicado senão que seria dimittido. Pela minha parte porém, distribui muito poucas listas talvez não tantas como muitos dos Membros desta Camara que impugnam esta eleição.

Não podia deixar de dizer alguma cousa sobre estas eleições, visto que fallei contra as outras precedentes eleições e fui então um dos seis Senadores que votaram na minoria, persuadido de que nessas eleições não só houveram muitas irregularidades, mas se commetteram crimes para fazer triumphar um partido. Ora eu tenho ouvido com muita attenção, e tenho lido os extractos das Sessões a que não tenho podido assistir, e tenho visto que póde ter havido algumas irregularidades em algumas eleições, mas tenho a intima convicção de que estas irregularidades não tem comparação com as que se praticaram nas outras eleições, e que deram motivo a que eu votasse contra ellas.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Eu não impugnei a eleição de Villa Real; sou d'alli natural; tenho sido por alli candidato com varias fortunas, e não viria hoje queixar-me. Em 1838 fiz já a observação que repito: Mezão frio e Ribeira de Pena são fabricas de votos, em quanto votava todo O Cidadão activo eram menos os votos do que hoje que se exigem oitenta mil reis de renda para ser eleitor! Tenho em vista outro objecto que é dispertar a attenção do Governo, para que conheça destas fraudes: e quando o Sr. Almeida Proença apresentar o seu requerimento hei de pedir-lhe licença para o assignar; em consequencia não me opponho á eleição, nem o faria mesmo por motivos de delicadeza, porque nessas eleições figuram meus parentes, meus amigos, e outras pessoas bem intencionadas que podem ter hoje uma opinião, e mudar ámanhã.

O Sr. Trigueiros: — O que a Commissão quiz apresentar é que havia um excesso de 606 votos; e o que a Commissão disse, do que se deprehende é, que Villar de Maçada devia ter 183 e o excesso são 606.

(Vozes: — Votos, votos)

Julgando-se o debate sufficiente, foi approvada a eleição do Circulo de Villa Real.

Lido o Parecer relativo á eleição do Circulo de Penafiel, disse

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Tem-me cabido nesta occasião representar o papel do escravo em Roma, insultar o triumpho. As Actas de Bemviver, Parada, e Paço de Sousa não vem acompanhadas da relação dos votantes: mais as Actas falsificadas; e se eu fosse da Commissão tinha eliminado do meu calculo similhantes Actas, e similhantes votos, porque é o producto de uma falsificação; é a unica observação que eu queria fazer a respeito desta eleição.

Não havendo quem mais pedisse a palavra, approvou-se o Parecer da Commissão sobre a eleição do Círculo de Penafiel. Logo depois se approvaram tambem os que respeitam ás dos de Bragança, Ponta Delgada, Cabo-Verde, e Gôa, todos sem debate algum.

Lido o Parecer relativo á eleição do Circulo do Porto, teve a palavra

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Sr. Presidente, quando eu sube pelas folhas que representam as opiniões dos varios partidos em que o paiz está dividido, por muitas cartas particulares, e pela informação vocal de muitas pessoas, que as ultimas eleições no Porto haviam sido acompanhadas das violencias mais atrozes, e das fraudes mais escandalosas, pensei que naquella historia poderia haver alguma exaggeração. Assim o pensei, e assim o desejava; pois eu creio que profundas e mui negras manchas cairam em nossa reputação moral e politica, com o facto dos premeditados crimes que commetteram naquellas eleições nos dias 22, 23 e 24 de Março ultimo. Mas, Sr. Presidente, quando eu vi o modo pelo qual os Srs. Ministros e os seus representantes pertenderam sustentar a validade daquellas eleições e tentaram defender as authoridades - que as forçaram, corromperam e falsificaram, então, Sr. Presidente, com muito dissabor e vergonha minha, fiquei intimamente convencido de que as eleições do Porto foram feitas a cutello e a machado. Sr. Presidente, eu não quero tornar a fallar das violencias que o Exercito foi forçado a supportar; não fallo nas destituições, remoções, marchas e contra-marchas dos Corpos e dos Officiaes, nem das relegações de alguns delles; não fallo nem do excesso de despeza, nem dos padecimentos dos individuos, nem do azedume que taes medidas crearam entre os filhos do mesmo Corpo: pois é sabido que o Exercito foi considerado como um bando de Sipais; as eleições ampliaram as obrigações militares, a dilataram a esphera da subordinação; a urna foi elevada á cathegoria de brecha, e digno de castigo aquelle militar que recusasse, não disse bem, que deixou suspeitar, duvidaria assalta-la com uma lista côr de ervilha, ou de curcumá. Mas, Sr. Presidente, eu não posso deixar de fallar, para não atraiçoar o meu dever, nos crimes e prepotencias praticadas em algumas Assembléas eleitoraes do Porto.

Começarei por Santo Ildefonso, por esta praça eleitoral, que foi tomada d'assalto pela Policia do Porto. O que se passou alli? Rogo a S. Ex.ª o Sr. Relator da Commissão queria ter a condescendencia de lêr, ou permittir que eu leia o protesto da Mesa eleitoral de Santo Ildefonso; Mesa surpreza, Mesa derrotada, que para salvar a vida foi obrigada a abandonar armas e bagagens. Lerei este importante documento, e peço ao Tachygrapho-Mór tome notas da sua integra, a fim de ser publicado quando esta Sessão se imprimir.

(O Orador leu então a documento abaixo transcripto).

Auto de interrupção e protesto da Acta da Eleição do apuramento de votos na 1.ª Assemblea eleitoral da Freguezia de Santo Ildefonso. Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos e quarenta, aos vinte e tres dias do mez de Março, nesta Igreja Parochial de Santo Ildefonso, pelas nove horas da manhã, constituida a Mesa eleitoral nos termos da Lei, como consta da respectiva Acta, estando presente o Parocho Coadjutor da sobredita Freguezia José Borges de Vasconcellos, e havendo os Mesarios presentes lançado as suas listas nas respectivas urnas, se procedeu á recepção das listas dos mais eleitores presentes pela fórma prescripta no Artigo quarenta e seis da Carta de Lei de nove d'Abril de mil oitocentos e trinta e oito. E procedendo-se nesta operação com a devida regularidade; notou a Assembléa que se amontoavam em tom ameaçador a grande numero de individuos suspeitos, e estranhos uma grande parte delles á mesma Assembléa, os quaes cercando a Mesa, debaixo do especioso pretexto de vigiarem a urna, e os trabalhos da Mesa em razão de ser Setembrista, desta fórma não só afrontavam a Mesa, mas provocavam a desordem, intromettendo-se em todos actos da Mesa, oppondo-se á votação de muitos Cidadãos recenseados só porque eram Setembristas; e a maior parte artistas; ameaçando e insultando, afugentavam assim da urna, muitos Cidadãos pacíficos com o titulo de Miguelistas, como que se estes não tivessem o direito de Cidadãos Portuguezes, ou houvesse Lei que os impedisse de votar. Tão escandaloso procedimento, tinha o fim sinistro de afugentar da Urna os eleitores principalmente artistas, de que abunda esta Assembléa eleitoral, para não augmentar o número das listas Setembristas, como de facto conseguiram; chegando o excesso dos amotinadores a tal ponto que, collocou a Mesa n'um estado de coacção tal si que por uma e muitas vezes se viu na necessidade de interromper os seus trabalhos. E conhecendo a Mesa, que além do que fica exposto, o fim principal de taes motins, era para que esta abandonasse o seu logar, ou que com esta confusão se commettesse alguma irregularidade para que a maioria que os Setembristas nesta Assembléa costumam obter em todas as eleições, não podesse prejudicar a maioria Cartista no Circulo eleitoral; revestiu-se a Mesa de constancia e varonilidade bastante para supportar a guerra acerba dos a amotinadores e perturbadores, e a Mesa não abandonou o seu logar, e ía mantendo a ordem, já supplicando, já admoestando, e já finalmente exigindo das Authoridades que assistiam ao acto, as providencias para manter a ordem dos trabalhos, e o respeito devido á Mesa, e assim continuariam até final se os amotinadores não tivessem apoia como ao diante se ha de demonstrar. Comtudo, a Mesa não seria justa, se passasse em silencio os relevantes serviços que, nos dias vinte e dous, e vinte e tres lhe prestaram o Doutor Delegado, e Regedor de Parochia, que com incansavel trabalho se esforçaram a cohibir os insultos, e repetidos motins e desordens, offerecendo á Mesa a Sua coadjuvação por meio da força se a Mesa á julgasse necessaria para apoiar os trabalhos, e garantir as vidas dos seus Membros, por cujo serviço honra lhes seja feita mas, nem o respeito das Authoridades, nem a prudencia da Mesa, era bastante a cohibir a repetição de scenas tão desagradaveis: antes pêlo contrario, parecia que estavam decididos a nada respeitar, e neste caso de pouco, ou nada valiam á Mesa, o zêlo e bons desejos manifestados por aquellas Authoridades, sendo assim que, por muitas vezes, não foram attendidas nem obedecidas. Finalmente a Mesa, achando-se constantemente n'uma perfeita coacção, não lhe restava outro recurso que, o de abandonar o seu posto, visto que não só não confiava em apoio, mas porque não podia obrar nem deliberar livremente, estando na firme convicção, e nem outra cousa era de presumir que os perturbadores tinham apoio superior, e a razão desta asserção é a seguinte:

Pelo Artigo setenta e um da supracitada Lei, a Policia da Assembléa eleitoral, pertence ao Presidente e á Mesa, por isso nenhuma diligencia póde ter logar dentro della, sem expressa requesição desta: mas de repente, na tarde do dia vinte e dous, a Igreja, sem requesição alguma da Mesa, foi invadida pela força armada da Guarda Municipal, entrando na frente o Ex.mo Administrador Geral, e o Commandante Geral da Guarda Municipal, o qual na frente de seus soldados, com a espada desembainhada, e sem respeito algum ao logar Santo aonde entravam, invadiram o Templo com os Bonés na cabeça, e é bayoneta calada, romperam no excesso, não só de invadir a Authoridade da Mesa, mas maltrataram com as pontas das bayonetas, e com cronhadas alguns Cidadãos que estavam para votar, só porque estes gritavam com razão, contra similhante violencia e attentado; sendo neste a acto preso maltractado o Cidadão José Pinto da Rocha, só porque era Setembrista, e sê oppunha a tão escandalosa invasão, e infracção da Lei: e bem longe de prenderem os amotinadores antes parece receberam galardão e louvor; o que tudo teve por fim afugentar da urna os pacificos artistas, e mais inermes Cidadãos; tendo a Mesa sido victima sem duvida destas Guardas Pretorianas, se não soffresse este choque com paciencia inimitavel. Assim continuou a Mesa os seus trabalhos até o sol posto, ordenando-se que no dia vinte e tres pelas nove horas da manhã, continuariam os trabalhos eleitoraes. Com effeito, no dia vinte e tres, á hora marcada, e tomando o seu logar o Cidadão Joaquim José do Valle, na qualidade de Secretario da Mesa, foi ameaçado com a morte, se não abandonasse o seu logar, o que este fez para salvar a vida, e aconselhado por pessoas prudentes. E constituida assim a Mesa, com a falta deste Membro, proseguiu os trabalhos, sempre como fica dito, no meio de motins e desordens, ouvindo-se vozes por differentes occasiões de morras, e á urna, á urna! Constando mais á Mesa, que no fim da tarde avançava pela rua de Santa Catharina, para o lado da Igreja Parochial, força armada de Caçadores vinte e oito a marche-marche, com armas carregadas, e promptos a descarregar fogo, tractou a Mesa de acautellar a urna, dando os trabalhos por acabados daquele dia, e se recolheram os Mesarios a suas casas, com anímo positivo d'alli não voltarem pelo risco que soffriam suas vidas. E por que lhes consta que no dia vinte e quatro, se concluíra o apuramento, faltando os Secretarios Joaquim José do Valle, e Francisco Alves de Sousa Carvalho, e bem assim o Escrutinador Antonio Joaquim de Queiroz, e o Revezador José de Vasconcellos Noronha e Menezes: desde já protestam os Membros que faltaram ao apuramento por nullidade desse acto, a que não faltaram por culpa sua, mas em razão da falta de providencias que garantissem a sua segurança individual, produzindo a coacção em que estiveram, e risco de vida; impedimento fysico que os inhabilitou da comparencia. E de tudo para constar lavrei este Auto que vai assignado pelo Presidente e mais Mesarios da sobredita Mesa eleitoral. = E eu Francisco Alves de Sou-