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DIARIO DO GOVERNO.

da Serra Leoa mandaram restituir tudo quanto se havia tão illegalmente apresado.

Quando eu recebi esta noticia, acompanhada de um energico protesto feito em Cabo-Verde pelas Authoridades, e pelos Colonos defraudados, portesto a que me reporto, dirigi-me ao Governo Britannico, e reclamei como devia contra tantos, e tão repetidos attentados. O Governo Britannico é tão imperioso no que exige, como tardo, e lento em attender ao que delle se reclama. Respondeu-me pois, pouco mais ou menos, que mandaria examinar os factos. Creio que o exame não póde ainda arranjar-se a sabor, porque não me consta que Lord Palmerston os tenha já examinado.

No Estado da India não perde o Governo Britannico nem occasião, nem motivo de nos hostilisar, mas para nos consolar quando nós nos queixâmos, responde, que se as transgressões das nossas fronteiras se repetirem, o Governador de Bombaim terá a generosidade de restabelecer a paz com os suas proprias forças, isto é, usurpando Gôa, alva da infernal cubiça da Companhia das Indias, e do Gabinete de Inglaterra. Digo isto, Sr. Presidente, para fazer vêr, como não esfria nunca no coração do Gabinete Britannico o antigo plano de expulsar do Oriente todas as bandeiras, menos a sua.

Peço ainda licença á Camara para observar que a Marinha Ingleza era mandada praticar todos estes attentados contra a bandeira, e contra os subditos da RAINHA ao mesmo tempo que o Governo Britannico fingia querer negociar em Lisboa com o Sr. Duque de Palmella, com o meu nobre amigo o Sr. Visconde de Sá da Bandeira, e comigo mesmo. A Marinha Ingleza violava os Tractados; despresava as Convenções; desembarcava á mão armada em as nossas Possessões, e assenhoreava-se da nossa propriedade, ao mesmo tempo que o Gabinete Britannico apregoava em Londres, e o mandava apregoar na Europa (a um Governo que dispõem de tantos meios, nunca faltam jornaes que lhe vendam a consciencia e a patria) que o Governo Portuguez, que se arriscava a perder as suas Possessões Ultramarinas para condescender com as vistas cavilosas, e com a philantropia, mercantil, e egoísta da Gram-Bretanha, era o despresador dos Deuses, o quebrantador de Tractados, e o insultador da philantropia Britannica. Generosa e christianissima philantropia Ingleza, que grangêa 20 milhões de amphião para envenenar todos os annos cem mil chinas, e que declara guerra ao Imperador, porque não quer consentir que os Inglezes envenenem os seus vassallos! Ás reflectidas provocações, aos attentados repetidos que eu tenho mencionado, seguiram-se outros nas aguas do Zaire, e nos mares d'Angola. Um crusador Inglez mandou içar a nossa bandeira no tope do navio Portuguez Neptuno, e forçou o Paquete d'Angola a testimunhar o calculado insulto, a preversidade Argelina de o espedaçar e submergir! (Movimento.)

Nos portos do Brasil os crusadores já não procuram pretos, procuram o nosso ouro, e aonde o encontram, levam-no.

Agora mesmo que S. Ex.ª o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros diz que negocêa, os crusadores Britannicos apresam sem distincção o sal mandado de Benguela para Angola, os destacamentos que navegam d'Angola para Mossamede, e até as escunas do Governo. Ainda que Portugal tivesse a cobardia de submetter-se ao Bill de Lord Palmerston, nunca essas presas seriam licitas, por isso que foram feitas contra navios empregados em commercio permittido, e outras porque foram feitas antes da existencia do Bill. Este só foi sanccionado a 24 de Agosto de 1839, e o Almirantado tinha mandado correr sobre as nossas embarcações a 15 do mesmo mez.

Quem bem conhecia a Politica da Gram-Bretanha era o illustre, mas fallecido Rei, que em 1782 escrevia ao Conde da Lousan, Vice-Rei da India, as seguintes palavras: «Deveis ter entendido que a Gram-Bretanha, posto que minha Alliada, é a Nação mais infesta, e prejudicial aos meus dominios.»

Sr. Presidente, vou terminar a minha exposição, e pedir a S. Ex.ª o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros queira ter a condescendencia de informar-me:

Primo — Em que estado se acha a negociação do Tractado com a Gram-Bretanha para o fim de supprimir o trafico da escravatura ao Sul do Equador, Tractado que o Ministerio prometteu negociar?

Secundo — Se S. Ex.ª recebeu satisfacção alguma, como pareceu esperar, pelos attentados, commettidos pelos cruzadores Britannicos contra as nossas embarcações nas aguas do Zaire, nos mares d'Angola, á vista dos portos e fortalezas do Imperio do Brasil?

Tertio — Se no Tractado, de que o Ministerio deu tão boas esperanças na Sessão passada, se estipulam as perdas, e damnos, que possam dever-se aos Portuguezes interessados nas embarcações apresadas contra a fé dos Tractados pelos cruzadores Britannicos ao Sul do Equador?

Quarto — Se o Governo Portuguez admittiu a obrigação de pagar juros de pensões e soldos, que podessem ser devidas a alguns estrangeiros, que estiveram temporariamente ao serviço de Portugal?

Quinto — Que decisão tomou o Governo a respeito da reclamação de Lord Stuart de Roth-say?

Sexto — Que resposta tem dado o Governo Britannico á reclamação de Columbo?

Septimo — Qual foi o resultado da missão extraordinaria do Marquez de Saldanha a Londres?

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Sr. Presidente, eu não entrarei (nem creio que o nobre Senador que acaba de fallar tem desejo que eu entre) em explicações, que tragam uma discussão sobre a serie de factos que S: Ex.ª enumerou: respondendo portanto á sua pergunta, quanto em mim cabe neste momento, devo dizer-lhe que o Governo não foi menos solicito do que qualquer dos Governos anteriores, em sustentar a dignidade da Corôa de Portugal; estimei comtudo ouvir ao illustre Senador que elle não deixou pelos factos que mencionou verificar um rompimento, e d'ahi inferi eu que o nobre Senador tambem não quereria effeituar esse rompimento. Debaixo destes mesmos principios é que, eu tambem, e a Administração a que tenho a honra de pertencer, procedemos: foi certamente o negocio das nossas relações com Inglaterra, o objecto mais importante e mais urgente de que tivemos de nos occupar. Eu não posso satisfazer hoje ás perguntas do nobre Senador, porque todas versam sobre negociações que estão pendentes; mas não tardará muito tempo em que a respeito de algumas seja plenamente illustrado, porque julgo do meu dever dar conhecimento ás Camaras do resultado das negociações a que alludem os quesitos apresentados pelo nobre Senador.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Ninguem respeita mais a S. Ex.ª o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros do que eu, por todas as qualidades que lhe reconheço, e elle tem; mas não é possivel, Sr. Presidente, que neste estado da Sessão eu me possa contentar com similhante explicação; e se o Senado me dá licença, contarei uma historia com que me entretinham quando era rapaz... {Vozes— diga, diga). Houve um Medico que prometteu a certo Rei, que em dez annos havia de ensinar um macaco a fazer versos heroicos; alguem advertiu ao Medico que isso não era possivel: mas elle respondeu — não se afflija vossê que no espaço de dez annos já terá morrido, ou o Rei, ou eu, ou o macaco. Mutatis mutandis é a doutrina do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: o anno passado disse-se-me — espere para o anno que será satisfeito, tudo se ha de fazer; agora responde-se-me que ainda não é tempo; e para o anno que vem terei alguma resposta similhante: porém em todo este espaço, ou eu morro, ou S. Ex.ª desapparece do Governo; e fico sem ter a explicação. Assim não é possivel, Sr. Presidente, e por mim declaro que me não posso contentar com esses mysterios do Governo, porque em fim o Ministerio póde esconder aquillo que escreve, mas não aquillo que faz. E como ha de o Ministerio esconder que mandou a Londres o illustre neto do Marquez de Pombal com uma corda ao pescoço pagar dividas, parte das quaes não deviamos, e pedir perdões de injurias que não fizemos? Eu desejo que o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros não confunda certa firmeza louvavel no seu logar, com uma obstinação inconveniente: S. Ex.ª obstina-se n'um mysterio diplomatico que nunca existiu, e assenta levar os negocios á sua conclusão com uma reserva, que os factos desgraçadamente não justificam. Como póde o Governo deixar de satisfazer a uma pergunta tão simples, como a do estado das reclamações de Lord Stuart? Lord Stuart reclamou em 22 de Outubro de 1831, e V. Ex.ª Sr. Presidente, respondeu que se carecia de uma resolução das Côrtes. Eu tenho aqui as Actas do Conselho de Ministros desse tempo, e posso dizer ao Senado o que S. Ex.ª julga dever calar.

O Sr. Presidente: — Peço licença para observar ao nobre Senador que não ha objecto algum de debate: fez as perguntas para que tinha prevenido o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros; o Sr. Ministro disse que julgava contrario ao serviço responder actualmente a essas perguntas; por tanto parece que esta discussão não póde continuar...

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Na fórma do Regimento, eu tenho sempre a palavra duas vezes sobre qualquer materia; S. Ex.ª deu-me uma resposta demasiado diplomatica, mas que me não satisfaz na minha qualidade de Senador, e seria uma tyrannia que se me tolhesse o direito de replicar.

O Sr. Presidente: — Pois continue: eu queria concluir que no caso de continuar a discussão era preciso que se mandasse para a Mesa uma proposta.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Como eu tenho o direito de fallar duas vezes, usarei delle largamente, já que S. Ex.ª foi tão reservado. — S. Ex.ª não póde dizer-me em que estado se acha a negociação do Tractado com a Grã-Bretanha para a suppressão da escravatura; por tanto concluirei eu que essa negociação está como estava, apezar de S. Ex.ª nos ter dado outras esperanças a Sessão passada, não só no Discurso da Corôa, mas n'outra Sala. Farei ver que no Tractado de Vienna, que V. Ex.ª mesmo negociou se estipulou a indemnisação de perdas e damnos para os proprietarios das embarcações Portuguezas que haviam sido illegalmente apresadas ao Norte do Equador (se bem me lembro) desde 1810 até 1814, estipulando-se logo 300 mil libras sterlinas, e depois as Commissões em Londres entregaram muito mais, como ninguem sabe melhor do que V. Ex.ª: ao menos quero reclamar que, em qualquer Tractado que se fizer com Inglaterra, não fiquem desgraçados e sem alguma indemnisação aquelles Portuguezes que á sombra da sua bandeira navegavam bona fide. S. Ex.ª na Sessão passada de alguma sorte deixou perceber que pedira satisfação por um navio que a Marinha Britannica havia mettido a pique nas aguas do Zaire; ao menos do banco dos Ministros sahiram algumas expressões que significavam o que acabo de dizer, se a minha memoria me não falha; e então, no fim de um anno, não ha de o Governo dizer, se recebeu alguma explicação a este respeito! Tambem póde ser segredo; mas eu digo que se S. Ex.ª o tivesse sabido já o tinha publicado; e como o não publicou, concluo eu que nenhuma resposta recebeu ainda. — A respeito dos juros de soldos e pensões, é fama publica (e na minha posição sempre me sirvo deste argumento) que S. Ex.ª, o meu nobre amigo o Sr. Marquez de Saldanha fôra portador de tres milhões de Ex-chequer bills, ou Bilhetes do Thesouro para pagar certas dividas, liquidadas, ou não liquidadas, e que nessas despezas entra o pagamento de juros de soldos, e pensões, juros que nunca se pagaram senão por Lei, ou Tractado. E em quanto a Lord Stuart por uma pensão, de que deve desistir, e que V. Ex.ª lhe negou em 22 de Outubro de 1834, sendo Presidente do Conselho de Ministros; não sei se o Ministerio admittio esta reclamação; pois sei que S. Ex.ª, recebeu uma nova reclamação em 19 de Fevereiro. E a isto que resposta deu o Governo? Sr. Presidente, ha dous modos de conduzir os negocios, ou com muito mysterio, ou com muita publicidade; eu admitti o segundo, por ser aquelle que mais convinha ás nossas circumstancias. Que resposta deu o Governo Britannico á reclamação de Columbo? Eu sei que ha grandes homens em Inglaterra que são de opinião que se nos deve uma indemnisação por Ceilão etc. Ora, quanto á embaixada do Sr. Marquez de Saldanha, tendo o Governo disposto de mais tres milhões de cruzados na vespera da reunião das Côrtes, não seria urgente que SS. Ex.ªs viessem dizer os motivos que a tal excesso os havia forçado? Parece que as Cortes tinham obrigação de o saber, e o Governo de justificar estas transacções, ou então não fallemos mais em Governo Representativo.

Limito-me por agora a estas observações, mas não quero perder o direito de pedir ao Senado me conceda a palavra uma terceira vez, depois de ouvir o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Sr. Presidente, eu tambem tenho conhecimento da historia que contou o nobre Senador, e posso-lhe dizer que não foi com aquelle sentido que eu declarei as minhas intenções, porque, se dependesse só do meu desejo, francamente