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DIARIO DO GOVERNO.

CAMARA DOS SENADORES

9.ª Sessão, em 3 de Julho de 1840.

(Presidencia do Sr. Duque de Palmella.)

ABERTA a Sessão, pela uma hora e meia da tarde, verificou-se a presença de 43 Srs. Senadores.

Leu-se, e foi approvada a Acta da precedente.

Sobre proposta do Sr. Presidente, resolveu a Camara, que os Membros da Commissão de Poderes passassem logo a examinar o diploma do Sr. Conde de Terena, José, Senador eleito pelo Circulo do Porto. (Sairam immediatamente da Sala.)

Mencionou-se a correspondencia:

1.° Um Officio pelo Ministerio dos Negocios Estrangeiros, remettendo exemplares de uma publicação, feita por Antonio Barão de Mascarenhas, intitulada = Commercio Portuguez em Bristol e Portos adjacentes, no anno de 1838, etc. = por elle dirigidos aos Membros da Camara. — Tendo-se distribuido, disse

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Sr. Presidente, em todo o tempo que eu tive a honra de ser Ministro da Corôa, não encontrei em quantos Empregados Publicos servem a Rainha fóra de Portugal, um homem mais zeloso dos interesses da sua patria, nem mais trabalhador que o Sr. Mascarenhas. (Apoiadas geraes.)

Esta é a verdade, e honra lhe seja feita.

Continuou a mencionar-se a correspondencia.

2.° Um Officio pelo Ministerio referido, transmittindo a seguinte

Carta de Officio. (Presidencia del Senado.) = Exm.º Senor. =

Ynterprete en esta ocasion de los sentimientos del Senado que tengo el honor de presidir, y usando de una iniciativa que siempre me será agradable, me torno la libertad de remitir á la ilustre Camara del Senado de Portugal, por conducto de V. E. una coleccion completa del Diario de las sesiones del Senado publicadas hasta este dia, que será seguida de las sucesivas, á la cual va unida otra de las del disueito Estamento de Proceres del Reino, por la analogia de sus atribuiciones legislativas con las del Senado.

Ruego á V. E. se sirva ofrecer á esa ilustre Camara este presente del Senado de Espana como un testimonio do la alta consideracion que le merece, y de la sinceridad, con que de sea entablar relacioneis que estrevnadas por una reciproca correspondencia, pueden tener saludable influjo en el bien destas respectivas Naciones, y servil dee menoss garantias de estabilidad en los vinculos de afianza y mutua estimacion que las unen.

Aprovecho gustosamente esta ocasion para ofrecer á V. E. mis respectos, y para aseguraile de la alta y distinguida consideracion, con que soy = De V. E. el mas atento y obediente servidor. = El presidente del Senado de Espana, Conde de Fontao.

Madrid, 30 de Marzo de 1840. = Exm.º Señor Presidente del Senado de Portugal. Concluida a leitura, disse

O Sr. Vellez Caldeira: — Proponho se declare que a Camara recebeu com especial agrado esse presente, e que seja retribuido. (Apoiados geraes.)

O Sr. Presidente: — Far-se-ha a declaração na Acta, e remetter-se-ha o que se poder juntar dos trabalhos que se tem publicado, tanto do Senado, como da Camara dos Pares. (Apoiados.)

Mencionou-se ainda

3.º Um Officio pelo Ministerio referido, accusando a recepção do outro desta Camara, e respondendo não constar, na Secretaria daquella Repartição, se mandasse proceder ás informações ácerca da Convenção com a Hespanha para a livre navegação do Douro. — Disse

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Na discussão da Resposta ao Discurso do Throno tem occasião de fazer ver, que o meu Requerimento foi illudido, e não satisfeito: é quanto por agora direi sobre esse Officio.

O Sr. Conde de Villa Real: — Eu tambem não disse tudo quanto desejava dever dizer, em outra occasião que a este respeito aqui fallei, porque me pareceu, que era importuno entrar em maior discussão nesse momento; e tambem me parece melhor reservar-me para quando se tractar da Resposta ao Discurso do Throno. A Camara ficou inteirada do 3.° Officio. O Sr. Secretario Machado participou que o Sr. Curry não comparecia hoje por incommodo de saude.

O Sr. Trigueiros, servindo de Relator da Commissão de Poderes, leu e mandou para a Mesa o seguinte

Parecer.

A Commissão de Poderes tendo examinado o Diploma do Sr. Conde de Terena (José), e tendo p achado conforme com a Acta definitiva, e mais papeis concernentes, pelos quaes foi approvada a eleição do Porto por onde foi eleito Senador, é de parecer que o mesmo Sr. deve prestar Juramento e tomar assento na Camara. Casa da Commissão, 3 de Julho de 1840. = Felix Pereira de Magalhães = Relator, V. P. do R. C. Trigueiros.

Foi approvado sem discussão; pelo que, sendo o referido Sr. Senador introduzido na Sala pelos Srs. Secretarios, effectivamente prestou Juramento e tomou loirar.

O Sr. Miranda: — Tenho a honra de mandar para a Mesa uma representação assignada por varios cidadãos de diversas classes, habitantes da Freguezia de S. Vicente de Fóra, desta Capital, pedindo a approvação das Propostas do Governo sobre a reforma administrativa, e Censo eleitoral. — (Reservou-se para ser remettida á Commissão que houver de conhecer desses assumptos.)

Sr. Presidente pela dissolução da ultima Camara cessaram os trabalhos da Commissão encarregada da redacção de um Projecto de Lei pura se igualarem em todo o Reino os Pesos e Medidas. Esta providencia é da maior importancia, e uma daquellas de que mais carece o paiz. Espero que ella possa ser apresentada a esta Camara na proxima Sessão; porém como ha alguns pontos regulamentares sobre que é necessario tornar uma resolução definitiva, convém que a Commissão reassuma os seus trabalhos, e por isso proponho os seguintes

Requerimentos.

1.° — Em consequencia da ultima dissolução das Camaras, cessaram os trabalhos da Commissão externa encarregada do Projecto de Lei, para se igualarem os Pesos e Medidas em todo o Reino, e como esta Lei é de grande importancia e necessidade proponho: que sejam convidados os Membros que formaram a referida Commissão para continuarem os seus trabalhos. Sala do Senado, em 3 de Julho de 1840. = Miranda.

2.º — Proponho que se peça ao Governo pelo Ministerio da Guerra, uma Caixa de Padrões dos Pesos e Medidas que se fabricaram no Arsenal do Exercito para as antigas Comarcas do Reino, e que seja remettida a esta Camara, para se pôr á disposição da Commissão de Pesos e Medidas. Sala do Senado, em 3 do Julho de 1840. = Miranda.

3.º — Proponho, que pelo Ministerio da Guerra se envie a esta Camara com toda a brevidade uma Taboa das relações em que se acham com as Medidas de Lisboa, de seccos e liquidos as Medidas respectivas dos diversos Concelhos do Reino, em que por conta do Estado se fazem fornecimentos, ou seja pela Repartição do Commissariado, ou pela da Intendencia das Obras Militares. Sala do Senado, em 3 de Julho de 1810. = Miranda.

A pedido do seu Auctor, foram julgados urgentes, lidos segunda vez, e todos successivamente approvados sem discussão.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Sr. Presidente, nunca me levantei tão perplexo como agora, porque não sei o que hei de dizer; não sei como hei de dizer o que devo observar, dizer: tambem é a minha perplexidade maior porque não estando presente o Sr. Ministro da Guerra, eu não posso hoje deixar de fallar delle, o que não é meu habito. Todo o Senado sabe que no dia 26 de Junho proximo passado apresentei um requerimento tendente á administração dos dinheiros publicos pelo Ministerio da Guerra, e todos igualmente sabem que este requerimento foi approvado no dia em que o Senado se constituiu: apesar disso ainda não foi satisfeito! O Senado ouviu que eu fiz o mesmo pedido ao Sr. Ministro da Fazenda, pedido que elle disse se satisfazia em meia hora, mas são passados dias, e taes informações ainda não vieram! Nestas circumstancias não sei o que hei de fazer, não sei o que hei de pensar: eu não quero tirar a illação que devia tirar, e é que quem esconde as contas não faz boas contas. Os meus requerimentos foram approvados pelo Senado, e então que hei de eu fazer, se o Sr. Ministro da Guerra, entende que não deve satisfazer aos pedidos do Senado? O Sr. Ministro póde indifinir esta materia por toda a eternidade; resignar-me, não posso nem devo: por tanto declaro, que o Sr. Ministro da Guerra me deixa na precisão de recorrer dentro em poucos dias, de duas medidas a uma, ou propôr uma Commissão de inquerito para examinar o que se faz a vinte dous contos de réis que cada mez se dão para a Divisão do Algarve, quando ella está por pagar, ou propôr uma mensagem á Corôa, pedindo respeitosamente a Sua Magestade que Se Digne affastar do seu Conselho um Ministro que não satisfaz aos Requerimentos dos Senadores, nem apresenta o Relatorio, nem o Orçamento da sua Repartição, violando assim os artigos mais essenciaes da Constituição.

O Sr. Conde de Linhares: — Penso que uma censura tão grave feita nesta Camara a um dos Ministros da Corôa, exige da delicadeza da

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mesma, que se lhe dê aviso antes de progredir este assumpto, para o habilitar a poder responder á mesma accusação. Os termos do Sr. Senador são de tal natureza, que de certo elle não julgará indifferente responder-lhe, e é tambem proprio do caracter de quem a profere sustenta-la á face do homem!

O Sr. Presidente: — Não ha resolução nenhuma a tornar neste momento.

Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Se o Sr. Senador me tivesse feito a honra de me dar attenção, veria que eu principiei dizendo, que não costumava fallar na ausencia de ninguem, e ainda agora fallei com toda a consideração do Sr. Ministro na parte que lhe podesse ser pessoal, na parte que é official não recebo lição de ninguem, e muito menos de quem me não tenha provado ainda, ou pelos seus discursos, ou pelos seus trabalhos legislativos, que póde aspirar ao gráu de magister, e levantar a ferula contra os seus Collegas; mas o Illustre Senador, que ainda nesta Casa não pediu a palavra senão sabre o Regimento, não deveria sertão impaciente. Eu já me tinha sentado; as minhas observações estão acabadas; mas se o Illustre Senador deseja dar já andamento a esta materia então desde já peço outra vez a palavra.

(Alguns Membros pedem a palavra.)

O Sr. Presidente: — Não vejo que haja mais que fallar sobre esta materia; um Sr. Senador deu uma explicação, ou fez uma declaração, e por tanto não ha que discutir.

O Sr. Miranda: — A palavra sobre a ordem.

O Sr. Presidente: — Mas não ha que fallar sobre a ordem, porque não ha desordem.

O Sr. Miranda: — Mas V. Ex.ª não sabe o que eu quero dizer.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra.

O Sr. Miranda: — O que diz o meu collega é justo, poderão os meus nobres collegas dizer talvez que elle fallou em um tom mais subido: cada um tem sua clave; o meu nobre collega fallou na sua; mas o que disse é exacto. Os Srs. Ministros, e principalmente o da Guerra tem sido remissos em satisfazer aos pedidos desta Camara, e indo por este modo, pouco e pouco mais de nada faremos na Sessão presente.

O Sr. Conde de Villa Real: — Pedi a palavra, porque ouvi dizer ao illustre Senador, que acaba de fallar, que elle esperava que não viessem os Ministros á ultima hora pedir um voto de confiança, eu não sei que precedente se possa apresentar que dê occasião a suppôr-se que o Ministerio a que eu tive a honra de pertencer, quer obrar desse modo: eu pela minha parte posso declarar que não era da nossa intenção pedir á ultima hora a approvação de medidas para esse fim. Sou tão opposto a isso, como fui quando em uma precedente Sessão impugnei essa maneira de proceder.

O Sr. Miranda: — Eu estava muito longe de me dirigir ao illustre Senador, porque o facto de elle estar agora aqui na Camara, como simples Senador, bastaria para o pôr ao abrigo da menor imputação, ainda quando eu fizesse, como não fiz, allusão alguma a S. Ex.ª que muito respeito.

O Sr. Presidente: — Seja-me licito dizer uma palavra sobre este assumpto; e é que a fim de que os Srs. Ministros da Corôa possam, como devem e como é justo, attender as requisições que lhe são feitas por esta Camara, é de esperar que tambem os illustres Senadores que as provocam se limitem áquellas que julguem absolutamente necessarias; aliás pedindo-se esclarecimentos ao Governo da maneira por que isso se tem feito em algumas Sessões, (não faço allusão a esta Camara), é evidente que se torna mais difficil poder presta-los.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Eu estou certissimo das intenções de V. Ex.ª mas este Senado é aquelle que menos tem importunado o Ministerio, parque, se sommarmos o numero dos requerimentos não chegam a dez; e eu sou o primeiro que levanto a minha voz de queixume.

O Sr. Pereira de Magalhães: — Sr. Presidente, por parte da Commissão de Legislação, pedia á Camara a quizesse permittir que se lhe unisse o Sr. Manoel Duarte Leitão. (Apoiados.)

O Sr. Mello e Carvalho: — Quando hontem se reuniu a Commissão de Legislação, para que eu tive a honra de ser nomeado, houve algum Sr. Senador que propoz a necessidade de se requerer a esta Camara que á mesma Commissão se reunisse o Sr. Manoel Duarte Leitão: eu fui de parecer contrario; e para que deste voto se não tirem illações alheias ao meu pensamento, é necessario que hoje o exponha muito explicitamente, e sem attender a considerações particulares ou geraes, que possam ter relações com individuos. A Camara tinha entendido que a Commissão de Legislação devia Ser composta de sete membros, e tantos foram votados; pareceu-me por conseguinte que não estava no arbitrio das Commissões o virem requerer a reunião de outro membro senão em caso de grande necessidade; e com quanto eu respeito muito as luzes do nobre Senador o Sr. Manoel Duarte Leitão, não duvidando mesmo aconselhar-me com elle quando seja necessario, pareceu-me não ser conveniente propôr-se á Camara a sua reunião á Commissão, porque era de alguma maneira colloca-la na necessidade de chamar mais um membro, contra o que tinha resolvido. Alem do que julguei, e ainda julgo, poder talvez offender-se deste modo o melindre de alguem, porque estando nesta Camara tão distinctos e illustres Jurisconsultos, parecia offender-se o proprio melindre do Sr. Manoel Duarte Leitão em designadamente ser elle chamado com preferencia a outro qualquer: e então, para que se não offendesse o melindre da Camara, nem o de algum dos Srs. Senadores, intendi eu que tal proposta senão devia fazer, e que nós, contando com a vontade do Sr. Manoel Duarte Leitão, o consultaríamos todas as vezes que fosse necessario. Se se attendesse á alta jerarchia de cada um, eu seria o primeiro a dizer que se chamasse o Sr. Manoel Duarte Leitão, como Presidente do Supremo Tribunal de Justiça; mas como eu entendo que a jerarchia nem sempre dá capacidade (o que de certo não acontece com o Sr. Leitão), porque não se segue que quem occupa altos empregos, tenha por isso grande saber; parece-me, repito, que para não offender o melindre dos membros da Camara que são Jurisconsultos, conviria não fazer similhante proposta, contra a qual votei. — É a explicação que eu tinha a dar.

O Sr. Leitão: — Estando muito obrigado ao Illustre Senador, que acabou de fallar, unicamente desejo declarar, que eu accedendo á opinião do Sr. Mello e Carvalho, e conhecendo tambem a debilidade das minhas forças, e a nenhuma necessidade que a Commissão tenha dos meus trabalhos pediria á Camara tivesse a bondade de me dispensar, não annuindo ao requerimento da Commissão.

O Sr. Pereira de Magalhães: — Tudo que acaba de dizer o Illustre Senador, é verdade, são aquelles os motivos que elle expoz; mas a maioria dos presentes na Commissão concordou em que se requeresse a adjunção do Sr. Leitão; como isto é de estilo, e nunca se negou a nenhuma Commissão, é a razão porque se assentou, se pedisse; agora a Camara decida se quer, ou não que o Sr. Leitão se una á Commissão.

O Sr. Tavares de Almeida: — O primeiro Senador que abriu a questão foi daquelle parecer pelas razões que disse, nós, os outros Membros da Commissão, attendendo por uma parte ao merecimento do Sr. Manoel Duarte Leitão, e por outra parte á pratica e usança desta Casa, que já se verificou em mim mesmo, quando o anno passado me uniram á Commissão de Legislação; entendemos que, por isso que o voto do Sr. Leitão era muito importante (e porque quando se elegeu a Commissão não estava presente, por isso não fôra eleito) era não só do nosso dever, mas até de utilidade publica reclamar a presença de S. Ex.ª na Commissão. (Apoiado.) E por isso sou de opinião que se faça esta proposição á Camara, esperando della haja de deferi-la; por quanto é muito importante que os trabalhos das Commissões venham perfeitamente preparados, e para conseguir esse fim naquella, a que eu perco, julgo muito importante a addição do saber do Sr. Manoel Duarte Leitão. (Apoiados.)

O Sr. Trigueiros: — Na Commissão de Legislação fui eu de opinião, que se convidasse o Sr. Manoel Duarte Leitão, e que se pedisse a esta Camara, que elle fosse addicionado á mesma Commissão, e isto por duas razões; a primeira movido pela utilidade que S. Ex.ª podia prestar aos trabalhos da Commissão, porque apesar de que conheça em todos os meus collegas luzes muito sufficientes, comtudo achando-as eu igualmente no Sr. Leitão, não só não julgava indifferente, mas até de summa utilidade, que ás outras se accrescentassem estas, o que seria mais proveitoso, e do que resultaria maior acerto nos nossos trabalhos: outra razão tenho para concordar com a opinião do primeiro Membro, que apresentou esta proposta na Commissão, e pela qual digo que o Sr. Leitão não podera rejeitar o convite que se lhe fez; S. Ex.ª levado da delicadeza, que sempre o costuma acompanhar em todas as suas acções, o anno passado, quando chegou a esta Casa o Sr. Tavares de Almeida, fez-lhe igual convite que foi correspondido; e hoje que o mesmo lhe faz o Sr. Pereira de Magalhães, creio que o não rejeitará; e nestas circumstancias, tendo aquelle nobre Senador acceitado a sua proposta, não será de esperar que o Sr. Leitão deixe de assentir á nossa, afins de concorrer comnosco nos trabalhos daquella Commissão (apoiados).

O Sr. Lopes Rocha: Sr. Presidente, as razões que apresenta o Sr. Mello e Carvalho são de puro melindre, e são filhas do respeito que elle teve ao numero de Membros que esta Camara nomeou para a Commissão de Legislação; em consequencia sendo o estylo parlamentar nunca se negar ás Commissões o auxilio das pessoas que ellas pedem, eu rogo a V. Ex.ª queira propôr á Camara se deve ou não unir o Sr. Manoel Duarte Leitão á Commissão de Legislação, e na caso de assim o decidir a Camara (como espero) peço, e a Camara igualmente creio pedirá, ao Sr. Manoel Duarte Leitão que faça todo o sacrificio que poder para auxiliar a Commissão. (Apoiado.)

Sem mais discussão resolveu a Camara que o Sr. Leitão fosse unido á Commissão de Legislação.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Sr. Presidente, a questão que se acaba de concluir, traz-me á memoria uma cousa que eu tinha tenção de fazer na Sessão antecedente, e era dizer a V. Ex.ª e á Camara, que a minha saude é tão precaria que me não permitte tomar parte nos trabalhos das Commissões, e por isso peço que me dispensem da Commissão Diplomatica, para onde me fizeram a honra de nomear, por que de certo não posso lá fazer cousa nenhuma.

O Sr. Presidente: — Eu espero que o seu estado de saude não seja tão precario, que o embarace sempre de concorrer á Commissão.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Eu não me excluo por outra cousa, senão porque realmente não posso ir á Commissão, o que aliás estimarei muito; mas não me sendo possivel, peço a minha demissão em fórma.

O Sr. Presidente: — Propola-hei, mas não posso deixar de dizer que votarei contra.

O Sr. Vellez Caldeira: — E um precedente que não tinha havido até agora nesta Camara, impedir-se que um Membro pedido por uma Commissão, lhe fosse concedido, mas isto acabou. Alguns tem já pedido a sua demissão, como o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, para serem Deputados, mas tem sido sempre costume constante das Camaras, negar similhantes dispensas, e o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, apesar do seu máu estado de saude, ha de fazer o sacrificio, quando não fôr sempre, de ir á Commissão as vezes que podér.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Mas a praxe não é tão exacta como S. Ex.ª avançou; muitas vezes tem sido pedidas dispensas, e muitas vezes tem sido concedidas, e é forçoso que eu diga que na Camara dos Deputados, onde tive a honra de ser Membro, muitas vezes se tem feito isso. Eu mesmo, sendo Membro da Commissão de Guerra, tractando-se um requerimento do Sr. General Azedo, e Barão de Albufeira, fui dispensado da Commissão porque o Visconde de Bobeda de quem elles se queixavam, era meu parente, e eu disse que não podia ser Juiz naquella causa. Agora digo que não posso concorrer á Commissão Diplomatica, e de certo lá não hei de ir; o Senado decida como quizer.

Consultada a Camara, negou a dispensa pedida pelo Sr. Barão.

O Sr. Barão de Renduffe, Relator da Commissão de Administração, leu e mandou para a Mesa um Parecer della, pedindo informações de diversas Authoridades, sobre uma representação dos habitantes da Villa de Monsarás. — Ficou para segunda leitura.

O Sr. Trigueiros: — Eu pedi a palavra para perguntar aos illustres Membros da Mesa, se sobre ella se acham os Projectos de Lei que deviam ser remettidos da Camara dos Srs. Deputados.

O Sr. Secretario Machado: — Aqui estão, e igualmente as copias dos que lá se perderam.

O Sr. Trigueiros: — Então renovo a minha iniciativa, sobre os Projectos de Contrabandos e Cereaes, e Reforma do Terreiro Publico de Lisboa; e peço que sejam remettidos á Commissão competente para seguir os tramites do Regimento.

O Sr. Vellez Caldeira: — Parecia-me neces-

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sario que se nomeasse a Commissão de Agricultura, porque é muito importante não só para esses objectos mas para muitos outros.

O Sr. Presidente: — A Commissão de Agricultura não é comprehendida naquellas que o Regimento manda nomear, e como ha a de Administração não haverá inconveniente em lhe serem remeti idos estes Projectos (Apoiados).

O Sr. Vellez Caldeira: — Era para approveitar os conhecimentos de muitos Senadores que são proprietarios, e que não entram nessa Commissão, que eu pedia se nomeasse a de Agricultura; os trabalhos quanto mais divididos melhor caminham, entretanto, se a Camara assentar que não é necessaria, eu não direi mais nada.

O Sr. Tavares de Almeida: — Eu não me oppunha a que se nomeie uma Commissão de Agricultura, ou quantas quizerem; mas como esta materia já está approvada nesta Camara, voltando agora á Commissão de Administração, creio que economizaria mos algum tempo: internemo-nos em formulas, e não damos conta de cousa nenhuma. Eu sou de opinião que os Projectos vão á Commissão de Administração até com urgencia, (porque a materia está tractada) e para que dê o seu Parecer, e volte a esta Camara para poder começar-se a fazer alguma cousa. A Beira Baixa está innundada de contrabando, porque as Leis actuaes são deficientes; tenho ouvido as authoridade s queixaram-se disto, e eu tenho-lhe dito que ha de sahir uma Lei, e esta Lei ha um anno que foi para a Camara dos Deputados, lá dormio, lá esqueceu, e lá morreu; agora veio outra vez, e começa de novo a tractar-se nesta. Eu proponho que vá á Commissão de Legislação, ou outra qualquer, que dê o seu Parecer com urgencia, para fazermos alguma cousa que tenha utilidade (Apoiados).

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Sr. Presidente, a respeito de contrabando: ha poucos mezes é tal o escandalo no Porto do que se faz em agoas-ardentes, que os contrabandistas ajustam-se com os negociantes a levar a agoa-ardente por mais uma moeda em pipa aos seus proprios armazens, sem receio de nenhum daquelles a quem incumbe cohibir taes crimes. E segundo me informam, porque eu não posso responder pela exactidão do que me escrevem, tem entrado desde Janeiro até hoje 2:600 pipas de agoa-ardente franceza, isto é, tem-se impedido o consumo de 20 mil pipas de vinho do Paiz! O contrabando é o cancro de Portugal, porque quanto maior é mais protectores tem.

Os Projectos renovados pelo Sr. Trigueiros foram admittidos) havendo-se dispensadas as duas leituras: quanto á sua direcção disse

O Sr. Tavares d'Almeida: — Eu proponho que o do contrabando vá á Commissão de Administração, ouvida a de Legislação.

O Sr. Miranda: — Este Projecto é de sua natureza tão simples que será indifferente remettê-lo a uma ou a outra Commissão, póde mandar-se a qualquer. A negligencia da Administrarão publica é a causa primaria dos contrabandos: custa a crêr que, tendo nós os melhores vinhos da Europa, démos azo a que em Portugal se admittam aguas-ardentes estrangeiras! (Apoiados). Mas porque acontece assim? Porque neste Paiz a cousa que menos ha é Administração, póde dizer-se que não existe. Se desapparecesse, o Ministerio dos Negocios do Reino, em quanto á Administração activa, nada soffria o Paiz; soffreriam sim alguns pretendentes porque não obtinham esta ou aquella graça; em quanto ao mais nada se perdia, nada absolutamente. Por tanto posto que seja indifferente, como já disse, que o Projecto vá a qualquer Commissão, será todavia mais natural que se remetta á de Administração Publica; se se mandasse á de Agricultura, diria ella quanto o contrabando é prejudicial á prosperidade do Paiz, mas as medidas para cohibir tal abuso, pertence propo-las á Commissão de Administração.

Resolveu-se que os dois Projectos fossem mandados á Commissão de Administração, e que se nomeasse uma Commissão de Agricultura.

O Sr. Conde de Villa Real: — Levanto-me com algum embaraço para fallar a respeito de um ataque pessoal, que me foi feito em outro logar, porque não é muito parlamentar, procurar responder nesta Camara ao que se disse na Causara dos Deputados, nem essa é a minha intenção.

Sahindo ante-hontem desta Camara achei no Diario do Governo, como referencia ao que eu tinha dito na Camara dos Deputados em 11 de Fevereiro, isto é = que eu esperava poder concluir um Tractado sobre a Escravatura com Inglaterra, porque tinha a certeza, que esta se achava disposta a fazê-lo, que eu com a declaração tinha burlado a Camara dos Srs. Deputadas e a Nação. = Esta asserção é demasiado séria para que eu deixe de desaggravar-me publicamente; e tendo a honra de ser Senador, pareceu-me, que é nesta Camara que o devo fazer, preferindo este meio ao de me dirigir a um jornal... (Vozes: — Falle, falle) Esta expressão indica que eu asseverei na Camara dos Deputados uma cousa que não era exacta; que eu linha dito uma falsidade. Nunca ter a feito aquella asserção se não tivesse fundamento certo para isso. Neste caso, tinha provas escriptas, que poderia produzir fazendo um Requerimento para se requisitarem da respectiva Secretaria d'Estado; mas como seria fazei um pedido sobre factos de que eu tenho tanto conhecimento como o actual Ministro, que serve interinamente esta Repartição dos Negocios Estrangeiros, pareceu-me mais a proposito dar eu mesmo essa explicação francamente, e dizer, que, quando tive a honra de entrar no Ministerio, foi a minha idéa tractar de concluir um Tractado decoroso com a Inglaterra para a repressão do trafico da escravatura; portanto nas primeiras communicações que tive com o Ministro Britannico, logo fallei neste negocio, e ainda no mez de Janeiro fiz uma communicação official a este respeito; e nesse mesmo mez (não em resposta a essa communicação, mas a outras communicações verbaes sobre o mesmo objecto e a uma correspondencia que tinha tido com o mesmo Ministro) recebi della uma Nota na qual dizia que o Governo Britannico, não teria duvida em concluir o in Tractado com Portugal, se este o quizesse fazer. Já se vê que isto era o resultado das primeiras aberturas que tinha feito. Eu não disse portanto na Camara dos Deputados que tinha a certeza de concluir o Tractado, disse que tinha a certeza de que o Governo Inglez se prestava a fizer um Tractado com Portugal.

Não entrarei em mais particularidades sobre tal assumpto; o facto é como acabo de referir, e é falso tudo quanto se lê no Diario a respeito de eu ler avançado uma asserção para que não linha dados sufficientes e de ter burlado a Camara dos Srs. Deputados. — Terminarei aqui, porque não quero se diga, que aproveitei esta occasião para fazer um ataque pessoal.

O Sr. Pereira de Magalhães: — Sr. Presidente, eu peço ao Sr. Secretario, o favor de vêr se está sobre a Mesa o Projecto sobre a creação do Tribunal de Contas?

O Sr. Secretario Machado: — Está; veio com os outros.

O Sr. Pereira de Magalhães: — Eu adopto a proposição deste Projecto, visto que o seu illustre auctor já não faz parte do Senado, e peço que vá á Commissão de Fazenda com urgencia para dar sobre elle o seu parecer (apoiados). Renovo tambem a minha proposição sobre outro que apresentei na Sessão passada, ácerca da organisação geral de Fazenda. Sr. Presidente, o meu Projecto não prestará para cousa alguma em muitos dos seus pontos, mas contêm um principio eminentemente constitucional, e que em Portugal se não tem seguido (e dahi provêm a confusão e desordem deste ramo), que é, separar a administração, a arrecadação, e a fiscalisação da Fazenda. Quando se propoz o Projecto para a creação do Tribunal de Contas, fui eu de voto que se não approvasse emquanto senão provesse sobre o modo de regular os outros dous ramos — administração e arrecadação; decidio-se, que se discutisse este Projecto, porque tractar do outro seria muito longo, e eu entrei na discussão, vendo que toda a Camara se esforçava para concluir o Projecto sobre o Tribunal de Contas; e não podia deixar de ser assim, porque se achava animada do patriotico que ha de mostrar sempre, visto que, em quanto não houver fiscalisação de Fazenda, não ha Governo bom, e todos Os dias havemos de estar com questões sobre contas, mas taes contas não ha de haver. Por tanto, eu adopto a Proposta como minha, e peço a V. Ex.ª queira remette-la á Commissão de Fazenda para esta dar o seu Parecer com urgencia, e renovo tambem a minha Proposição sobre a organisação geral da Fazenda.

Dispensadas as leituras de que tracta o Regimento, ambos os Projectos renovados pelo Sr. Pereira de Magalhães foram remettidos á Commissão de Fazenda.

O Sr. Presidente: — A Commissão nomeada para apresentar o Projecto de Resposta ao Discurso do Throno terminou o seu trabalho, que na proxima Sessão apresentarei á Camara.

Passando-se á ordem do dia, entrou em discussão o seguinte

Parecer.

Senhores: — A Commissão de Guerra, fendo examinado o Projecto de Lei, vindo da Camara dos Deputados sobre á reintegração dos ex-Officiaes, e ex-Officiaes inferiores do Exercito, que em consequencia dos acontecimentos politicos de 9 de Setembro de 1836 pediram e tiveram a demissão do serviço, é de parecer que seja approvado. = Casa da Commissão 1 de Julho de 1840. = Duque da Terceiras Visconde de Samodães = Bernardo Antonio Zagallo = Barão de Almeidinha = Barão de Argamassa.

Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo 1.° É o Governo authorizado a reintegrar nos Postos, legalmente adquiridos, todos os ex-Officiaes do Exercito, e ex-Officiaes inferiores, que, em consequencia dos acontecimentos politicos de 9 de Setembro de 1836, pediram e tiveram a demissão do serviço.

Art. 2.º As reintegrações, que tiverem logar, em virtude do Artigo antecedente, não habilitam os reintegrados para receber soldo algum ou pret pelo tempo, em que estivessem fóra do serviço, nem para considerar-se restituidos ás Commissões, em que se achavam, ou com direito ás promoções, que desde aquella época tem sido feitas no Exercito.

Art. 3.° Fica revogada toda a Legislação em contrario. = Palacio das Côrtes em 30 de Junho de 1840. = João de Sousa Pinto de Magalhães, Presidentes José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario = João Elias da Costa Faria e Silva, Deputado Secretario.

Teve primeiro a palavra, e disse

O Sr. J. M. Crespo: — Sr. Presidente, sendo a vez primeira que tenho a honra de tomar assento em Parlamento, e por consequencia tambem a primeira vez, que tenho a honra de fallar na presença de tão nobres e respeitaveis Srs. peço me desculpem, se não satisfizer a todas as legalidades, que são neste logar rigorosamente exigidas.

Sr. Presidente, o Projecto de Lei apresentado na Camara dos Srs. Deputados, e approvando na mesma, e de que hoje sé tracta, é de toda a justiça. Porém, Sr. Presidente, eu não quizera que se fizesse uma Lei para similhante caso, porque depois da amnistia, pouco depois dos acontecimentos desastrosos do Chão da Feira e Ruivães, o Governo, Se fosse justo e generoso, como devia, estava no seu direito e na restricta obrigação de reintegrar ou empregar todos os individuos, tanto militares como civis, complicados em taes acontecimentos politicos, ou tivessem ou não pedido a sua demissão, porque tudo foi forçado, e muito forçado.

Sr. Presidente, ainda hoje duvido quem foi mais leal, e se eu fôra orador, e tivesse a facilidade de expressão, apresentaria as minhas idéas, para vêr se podia demonstrar a verdade do que acabo de expender: no entanto, apesar da convicção em que estou de não ser a Lei necessaria, com tudo concordo em approvar o Projecto de Lei, com o addicionamento de que se pague aos individuos comprehendidos nesta mesma Lei ametade dos seus soldos desde áquella época até ao presente, ou que se indique ao Governo alguma indemnisação.

Sr. Presidente, permitta-se-me dizer tirais alguma Cousa analoga ao que acabo de expender, e que me diz respeito. Que tendo eu sido Commandante de um Batalhão Nacional, onde alguns serviços prestei á Causa da Liberdade e da Excelsa Rainha, vieram os acontecimentos de Setembro produzir a minha exoneração; é verdade, que nada perdi com ella, porque todos os meus serviços têem sido e são gratuitos.

Apenas porém appareceu quem pugnasse pela Lei Fundamental, por nós todos jurada e que ainda não tinha sido jurada a Constituição de 1838, reassumi o Commando, e me uni aos que no Chão da Feira despresaram as vantagens que ganharam á custa do sangue todo liberal, e todo liberal, Sr. Presidente. Nesse momento a maior parte dos soldados do meu Commando me abandonaram, porque estavam na terra da sua naturalidade, e por fim a generosa Proclamação do General da opposição, hoje o Ex.mo Conde de Bomfim, acabou de dissolver os restos do Batalhão. Então, Sr. Presidente, foi forçoso recolher-me a minha casa, e a Officialidade do Batalhão do meu Commando, que sempre foi fiel aos seus principios;

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é isto de accôrdo com o General, então chamado rebelde ou revoltoso. Sr. Presidente, qual foi o resultado? Um sequestro nos meus bens por ordem dos Generaes, e do Sr. Gosta Cabral, hoje S. Ex.ª o Ministro da Justiça! Um sequestro, Sr. Presidente, por motivos politicos, mandado fazer por alguns dos homens desembarcados nas Praias do Mindello, e que trouxeram á frente o Codigo das garantias Portuguezas!

Sr. Presidente, custa a acreditar, mas foi certo; assim como ser eu intimado para ir residir em Midões, para onde se tinha mandado Um plano para eu ser assassinado. Tambem fui chamado ao Juizo Correccional, mais o meu amigo, Delegado hoje em Setubal; julgo unicos em Portugal deste modo perseguidos naquelle tempo. Sr. Presidente, premitta-se-me dizer mais, fui perseguido e sequestrado pelos homens do Usurpador em 1828, porém estes foram mais benignos, porque não tinham em frente na terra da minha naturalidade o Juiz Amaral, executor das determinações da Alçada que acompanhou o Exercito de Setembro, e cujo Juiz ainda se acha no mesmo Logar ha mais de tres annos, Logar aonde perseguiu, e continua a perseguir os homens que não são do seu partido. Ministro, que soube aproveitar boas custas no processo do sequestro que me fez, mandando contar vinte idas a minha casa na Batalha, não tendo alli ido mais do que uma!

Eis-aqui, Sr. Presidente, considerações que eu teria omittido se não visse que ficam sempre impunes estes excessos, os quaes se devem apresentar á vindicta publica para os avaliar justamente como merecem.

Sr. Presidente, concluo em dizer, que devemos ser fieis ao juramento que voluntariamente tivermos prestado: jurámos a Constituição de 1838; sobre ella se devem basear as Leis para fazer estavel a tranquillidade no nosso Paiz; serviços que os nossos Constituintes anciosamente esperam das Camaras presentes, devendo acabar todas as animosidades de partidos. E o meio é empregar a todos os individuos complicado nos acontecimentos de que se tracta, não demittindo quem se achar empregado, seja qual fôr a sua côr ou opinião com tanto que cumpra com os seus deveres, e que não intrigue. Este é o meu modo hoje de pensar. (Apoiados)

O Sr. Basilio Cabral (sobre a ordem): — É costume geralmente seguido no Parlamento Portuguez, todas as vezes que se tracta de discutir um Projecto de Lei, assistir á discussão delle o Ministro da Repartição a que o objecto desse Projecto de Lei diz respeito: é este exactamente o caso em que presentemente nos achâmos, accrescendo, que este Projecto de Lei teve origem na Camara dos Srs. Deputados por uma Proposta do Governo. Em consequencia digo, que me parecia conveniente convidar-se o Sr. Ministro da Guerra para vir assistir a esta discussão.

O Sr. Presidente: — Este Projecto foi dado para ordem do dia de hoje, e o Ministerio tinha disso noticia; por tanto se elle o julgasse conveniente, teria comparecido para tomar pane na sua discussão (apoiados). Tem a palavra o Sr. Leitão.

O Sr. Leitão: — Sr. Presidente, não tencionava fallar acêrca deste Projecto, porque tendo a deliberação de o approvar, e conhecendo que a maioria da Camara, ou para melhor dizer, a Camara toda, estava disposta a approva-lo por entender que é de toda a justiça, assentava eu que não devia tomar tempo á Camara fazendo algumas reflexões sobre a sua materia; porém como um illustre Senador que já ha dias pediu a palavra para fallar sobre a materia do Projecto, quando elle entrasse em discussão, pareceu pelo seu discurso que não só queria increpar a Administração actual, mas tambem ai Administrações anteriores, de uma das quaes «u fiz parte, e de outros amigos meus; julguei por isso ser de absoluta necessidade o pedir a palavra á V. Ex.ª, para fazer algumas observações a respeito do que acaba de dizer o illustre Senador.

Sr. Presidente. Bem longe de ser injusto o Governo por não dar ao Decreto de 4 d'Abril a extenção, ampliação, ou interpretação que o illustre Senador diz que lhe devia dar, eu digo que fez o que devia, não fez o que não podia fazer, e seguiu as regras da justiça (apoiados). O que contém o Decreto de 4 d'Abril? Contém um acto do Poder Real, concedendo amnistia, ou, por outras palavras, determinando o esquecimento e absoluto silencio sobre os acontecimentos pastados a que se refere mas este Decreto não comprehendia, nem podia comprehender a especie que se apresenta neste Projecto (apoiado). É necessario, Sr. Presidente, não digo, não conhecer, não digo, ignorar, mas certamente, não se recordar, em quer consistem os effeitos necessarios de uma amnistia, ou de um Decreto de esquecimento, para lhe attribuir tal amplitude. A Constituição da Monarchia diz que pertence ao Rei conceder amnistia em caso urgente, e quando o pedir a humanidade, e o bem do estado. A amnistia concede-se, quando se dão circumstancias, em que as Leis, parece, deverem considerar-se inapplicaveis; circumstancias, em que a acção multiplicada das Leis teria todos os espiritos em sobresalto, e produziria inquietações, que precipitariam em resoluções violentas, e perigosas. Então é perciso desarmar as Leis, e entrar de novo em uma ordem de coisas, em que todos recebem protecção igual.

Ora, em que consistirão os effeitos naturaes da amnistia? Consistem, primo, em inhibir as authoridades de tornar conhecimento desses factos: — segundo, em repor todos aquelles, que nesse Decreto são comprehendidos, no gôso dos seus direitos civis e politicos; mas neste gôso dos direitos politicos não se comprehende a restituição aos empregos que legalmente se perderam, não havendo declaração expressa; e muito mais quando esses empregos senão podem dar senão por uma escala fixa, regular, impreterivel. A respeito destes não podia o Governo, nesse Decreto de amnistia, fazer essa ex-pressa declaração, porque ella excedia os seus poderes. A demissão dada aos militares que a pediram, não póde em si considerar-se uma injustiça do Ministerio, para poder ou dever ser remediada por elle, ou pelos subsequentes Ministerios; por quanto esse acto de pedir a demissão, que alguns Militares praticaram, foi um acto de renuncia ao qual o Governo accedeu, (apoiados). E tambem, Sr. Presidente, sendo a amnistia um Decreto de esquecimento, ou de absoluto silencio, segue-se, como consequencia necessaria, que, pelo que respeita a terceiro, toma as coisas no estado em que se acham no momento de sua publicação: e não se podendo duvidar que neste caso havia terceiros interessados, e com direitos adquiridos, (porque, segundo a Legislação militar, a. antiguidade e a actividade do serviço dá direitos que não podem ser violados), o Governo não podia por um acto seu offender estes direitos, com a publicação de um Decreto de amnistia. E estando fixada a maneira de se fazerem as promoções, e sendo a regra geral estabelecida na Lei, que estas sejam reguladas pela antiguidade dos Militares effectivos; segue-se, que o Governo não tinha authoridade por um acto seu, para proceder, violando esta Lei. Eis-aqui os motivos pelos quaes o Governo, nem podia dar maior amplitude ao Decreto de amnistia, nem tambem podia interpretar da maneira, que se disse. Verdade é, que se o Decreto precisasse interpretação, não era por uma Lei que devia ser interpretado; que não é por um acto do Corpo Legislativo que ha de ser interpretado um acto proveniente da Real Prerrogativa = Ejus est interpretare, cujus est condere = O Governo publicou aquelle Decreto, e se elle precizasse interpretação, só o Governo é que, o podia interpretar; mas, Sr. Presidente, esse Decreto não precisa interpretação, porque o seu espirito é clarissimo; não comprehendeu, como não podia comprehender, o caso de que se tracta. Todos os Ministros que referendaram esse Decreto (e eu fui um delles), desejavam que se fizesse então, o que agora se pretende fazer por este Projecto de Lei; mas esses Ministros sabiam bem quaes eram os seus direitos para usar delles, os seus deveres para os não violar, e os limites da sua authoridade para os não ultrapassar (Apoiados).

Sendo pois certo, que a providencia, de que se tracta, não póde ser regulada senão por uma Lei, será justo que se faça esta Lei? Sobre este ponto eu não desconvenho da opinião do illustre Senador. Esta Lei é justa, porque as considerações particulares que se poderiam fazer a respeito de terceiros, devem ceder no caso presente á rasão politica: é necessario por uma vez extirpar o germe de todas as divisões, e destruir as raizes de todos os odios e dissensões, que nos têem dividido, para que possamos um dia vêr levantado felizmente entre nós o altar da concordia (apoiados geraes). Agora direi, Sr. Presidente, que a regra que manda regular as promoções pela antiguidade, não obstante ser uma regra geral não é tal, que não tenha excepções nas Leis Militares existentes; não tractarei agora de indicar, ou fazer a enumeração dessas excepções; porque além de ser isso desnecessario, seria tambem inopportuno o fazê-lo, diante de uma Assembléa aonde estão, tantos e tão abalisados membros da profissão militar; mas julgo bastante o dizer, que estabelecendo as Leis actuaes já excepções a aquella regra geral, não é muito que, no caso presente, cesse o rigor dessa regra por motivos tão ponderosos, e tão dignos da consideração do Legislador. Nem eu supponho, que haverá no» Exercito um só digno Official que não estime, e senão encha de satisfação, veneno entrar de novo nas fileiras aquelles que a seu lado combateram a tyrannia; nem supponho, que haja. algum, que senão encha de prazer ao abraçar de novo os camaradas, que partilharam todos os seus perigos, assim como participaram sempre, da sua gloria (Apoiados).

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira: — A Lei que está em discussão, refere-se a militares que, quasi sem excepção, serviram a Causa da independencia e da Liberdade do Paiz; Officiaes; que por circumstancias politicas, deixaram o serviço. Foi seguramente com grande prazer que a Administração de que eu tinha a honra de fazer parte viu que esses Officiaes queriam dimittir-se; mas o Governo, viu-se inhabilitado a oppôr-se a que elles sahissem do Exercito. O illustre Senador pela Guarda acaba de explicar as razões porque o Governo, quando lavrou o Decreto da amnistia, não pode comprehender esta classe de militares; razões que foram ponderadas naquella occasião,

É pois com grande satisfação que eu concorro com o meu voto para que esses militares voltem ás fileiras; e parece-me, que o mais conveniente, é approvar a Lei como ella está (Apoiados).

O Sr. Trigueiros: — Tão cabalmente se combina com as minhas idéas, o que acabou de dizer ha pouco o Sr. Manoel Duarte Leitão, que eu poderia dispensar-me de accrescentar nadai ao que elle disse, ou porque tudo está dito, ou porque se disse melhor do que eu o podarei dizer. Mas, Sr. Presidente, eu não posso neste momento deixar do pagar um tributo de respeito áquelles que podem; ter parte na Lei, que este Senado está para votar. Este Projecto deve ser olhado por dous lados: primeiro, se a Lei é necessaria; e segundo, se é util. Senão estes dous pontos que eu tractarei com toda a brevidade que o estado de clareza, em que a questão se acha, exige de mim.

Será a Lei necessaria? Eu digo que é necessaria; tão necessaria que sem ella julgou o Governo que não podia reintegrar estes militares, e eu julgo, que o Governo andou bem. Pretendesse que a amnistia é comprehensiva não só do delicto, mas tambem do acto pelo qual os Officiaes militares pediram sua demissão; pessoas ha que tem podido achar motivo de questionar, e á força de sophismar a questão tem progredido; vejamos porém o que é amnistia. — Amnistia é uma palavra grega, que foi adoptada pelos Romanos; passou destes para algumas Nações modernas da Europa, que a tem empregado com a mesma significação. Sr. Presidente, o que é a amnistia pelos proprias palavras que empregam os que tem definido estas palavras injuriarum, et offemionum oblivio, esquecimento das injurias, e das offensas, que se tem commettido; mas se esta só definição não basta, eu serei obrigado a trazer o testimunho daquelles que a introduziram no Codigo das palavras, e provarei com elle o uso que della se fazia, e as idéas, que elle comprehende. Que esta não comprehende mais que o esquecimento do delicto, é tão evidente, que Cicero dizia que se lisongeava de ter introduzido a palavra amnistia na lingoa dos Romanos, e que acreditava que esta introducção não seria inutil, applicando-se a idéa que ella significava aos crimes que as guerras civis tinham occasionado, porque elle entendia que nem todos os crimes das guerras civis deviam ser punidos: e Cicero entendia que sómente a respeito á delictos é que se empregava a palavra amnistia, e Cicero foi o introductor da palavra na lingoa Latina, e é desta, que ella passou para outras lingoas, e para a nossa. Eu não posso considerar que estes militares praticassem um delicto, e por isso ella não os póde comprehender. Tenho ouvido trazer as intenções de cada um, tenho ouvido fazer uso dellas para provar a desnecessidade desta Lei, sei que se augmenta com as circunstancias que forçaram os Officiaes a pedirem sua demissão; mas que são intenções perante a Lei? E dessas intenções, e dessas cir-

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cumstancias conclue-se, que o acto de pedir a demissão seja um crime? O facto é que estes militares pediram a sua demissão; o Governo lha acceitou, e tanto um como outro estavam no seu direito; não vejo crime neste acto, a que possa applicar-se esquecimento, nem injuria que perdoar; se acaso a amnistia podia comprehender este facto seria pelas intenções de hostilizar o systema novamente proclamado, systema, que ainda nem era definido, porque a Constituição não estava feita, mas as intenções não podem pertencer ao imperio dos homens, nem ser objecto de uma Lei.

Agora, pelo que respeita á utilidade, esta é que é a todos os respeitos clara e demonstrada; é sempre util que haja socego na Republica, e isto se conseguirá vinculando os interesses; e sempre util que haja a maior somma de servidores, e servidores leaes; e sobre a lealdade destes Officiaes é que eu quero exprimir-me. Eu não acho senão um facto na historia que possa ser comparado ao proceder destes homens; é o facto de um Freitas, e um Pacheco, o primeiro Alcaide-mor de Coimbra, segundo do Castello de Celorico; tinham elles jurado fidelidade a Sancho 2.°, e tudo fizeram para conservar seu juramento; resistiram por todos os modos a Affonso 3.º seu irmão, e só depois que souberam, que Sancho 2.º tinha fallecido em Toledo, e tendo ido áquella Cidade, fazendo-o desenterrar, e entregando-lhe as chaves do Castello, só então reconheceram outro Rei; Affonso 3.º apreciou sua lealdade, e as Fortalezas foram entregues por elle a feitos tão leaes, e seus filhos tiveram o privilegio de succeder-lhes.

Sr. Presidente, um Governo, seja elle qual fôr, que vir praticar um facto de lealdade, todo o que vir assim guardar seu juramento, se elle entende os seus interesses, não póde deixar de o apreciar, e de ter na maior conta o proceder, e as pessoas de quem o pratica (apoiado). Que fizeram estes Officiaes? Tinham jurado um Codigo, e tinham dado a sua fé a uma Lei; esta Lei tinha sido atacada, esta Lei ia ser destruida, e a lealdade delles obriga-os a retirar-se da scena publica! Honra lhes seja feita; o seu juramento ficou intacto; aqui não existe crime, e a amnistia não lhe podia ser applicada. Não commetteram crime de rebellião, porque elles não podiam atacar nem desapprovar um Codigo, que de futuro havia de ser feito; tambem por este lado não podiam ter crime. Então que resta a estes Cavalheiros? Resta-lhes a honra, poucas vezes imitada; homens que tem em si um merito que a Sociedade não póde deixar de aproveitar; eu só os comparo com esses dous heroes do tempo de Affonso 3.º, elles os imitaram na lealdade, e imitemos nós o Grande Rei na politica.

Não estou persuadido que se possa dispensar a Lei; estou persuadido que a Lei é proveitosa e necessaria. Homens, que de si deram tão boa conta, jámais poderão ser despresados, sem que a Sociedade soffra em seus interesses, e jámais poderão deixar de ser empregados no serviço della, sem que a mão que os separar, commetta um erro governativo.

O Sr. General Zagallo: — Eu como Relator da Commissão de Guerra esperava para pedir a palavra, que o Projecto tivesse opposição; como eu vi, que a não tinha, não a pedi; mas vendo que a discussão se vai adiantando, e para que? para mostrar a necessidade de se approvar o Projecto? Se ninguem se oppõe a elle, que necessidade ha desta discussão! Eu mesmo como Relator da Commissão não tive precisão de fallar para a sustentar, porque os Srs. que fallaram antes de mim, tiveram a bondade de me livrar desse trabalho; portanto, poço a V. Ex.ª queira consultar o Senado, se a materia está discutida (Apoiados).

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Eu approvo o Projecto na sua generalidade, mas reservo-me o direito de fazer-lhe um additamento.

O Sr. Conde de Linhares: — Ouvi um Membro desta Camara asseverar, que alguns Officiaes tinham dado as suas demissões constrangidos. Pelo que me pertence, devo declarar que a dei sem constrangimento algum, e mui reflectidamente. Havendo prestado como Par do Reino (que tive a honra de ser) o meu juramento á Carta Constitucional, que então nos regia; considerei-me obrigado pela mesma letra do juramento, ao menos a deffender indirectamente as instituições juradas, que de direito ainda eram então a Lei do Paiz, já que não era possivel deffende-las de outra sorte; e portanto julguei que era do meu dever, não ter parte alguma na mudança que se ía fazer de uma Constituição para outra, e pedi a minha demissão, que desejo conservar em testimunho de que assim obrei livre e espontaneamente.

Agora quanto ao que respeita ao effeito benefico desta Lei é inutil que o pondere, pois é evidente a todos, e certamente digno do maior elogio o espirito que o inspirou. Penetrado com tudo de reconhecimento pela parte que me póde tocar, não presisto menos na resolução de não acceitar.

Julgando-se a materia sufficientemente discutida, o Sr. Presidente poz a votos o Parecer da Commissão, e foi approvado.

Immediatamente foram lidos os Artigos 1.º e 3.º do Projecto, e ficaram approvados sem discussão alguma.

Teve depois a palavra

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Tem sido sempre a minha opinião, e o meu desejo, que é um grande bem toda e qualquer medida que se propõe para lançar algum balsamo sobre feridas abertas pelas nossas dissenções politicas: esta Lei parece-me que preenche este fim, mas não me parece que preenche tudo quanto é necessario para que seja tão util e saudavel, como deve ser. Tem havido, desde 1826, tres classes de Officiaes demittidos: a primeira foram aquelles, que se retiraram com o Marquez de Chaves para a Hespanha: a segunda os Officiaes, que foram aprisionados com as armas na mão na Ilha Terceira: e a terceira classe de Officiaes demittidos, ou porque o pediram, ou por alguma outra circumstancia, é composta daquelles, a quem esta Lei deve applicar-se. Quando na ultima legislatura se apresentou este Projecto de Lei na Camara dos Deputados, apresentou-se outro tendente, a reparar outros infortúnios; mas vejo agora que foi separado, e para supprir essa falta, peço licença para lêr o seguinte

Artigo addicional.

«As disposições da Convenção d'Evora Monte são extensivas:

§. 1.º A todos os Officiaes Militares que têem sido demittidos por opiniões politicas, desde a publicação da Carta Constitucional de 1826, e fizeram depois parte do exercito do usurpador.

§. 2.° Apodos os Officiaes Militares que foram prisioneiros em quaesquer acções na guerra da Restauração.» — Barão da Ribeira de Sabrosa.

Parece-me, Sr. Presidente, que seria de justiça, e um acto de generosidade desta Camara, approvar-se este additamento, até para mostrar a sua benevolencia, admittindo nesta Lei o que na outra Casa está dependente de um novo Projecto, e que foi separado deste, apesar dos desejos que tinham animado a legislatura antecedente. O additamento que eu tive a honra de lêr, é textualmente copiado de um Projecto assignado pelos Srs. Deputados Barão de Leiria, Barão de Monte Pedral, e Jervis d'Athoguia, que me disseram deveria alli ser tractado; mas não tendo a fortuna de o ter sido quando este o foi, peço licença para tornar a dizer que será um acto de justiça, e de benevolencia deste Senado, se animado, como é, de philantropia consentir, que esta Lei não passe sem este additamento, fazendo assim um beneficio a esses malfadados, que foram demittidos, e que nunca mais perceberam real depois que D. Miguel caiu, porque não foram incluidos na Convenção d'Evora Monte. Seja-me licito dizer, que ha entre elles alguns Officiaes de merecimento, e de muitissima honra, que certamente merecem a contemplação desta Casa. Quanto a lealdade, tambem elles se poderiam dizer leaes: não tinham elles no seu partido tão pouca gente, e tinham por si a opinião de alguns Gabinetes Estrangeiros: V. Ex.ª o sabe melhor do que eu. Se o additamento fôr admittido, a Camara irá levar a consolação, não só a uma classe de Officiaes demittidos, mas a duas. Mando o additamento para a Mesa, que, como disse, é copia fiel do Projecto que já existe na outra Casa (Assim o fez).

O Sr. Miranda: — Quando appareceu o Projecto, que se acha em discussão, tambem me lembrou fazer-lhe um additamento, e por uma razão muito simples; porque, quando se tracta de applicar um principio de justiça, ou de generosa conveniencia, devera ser plenas as suas consequencias, necessarias, e não parciaes, não, em sua applicação, actos de favor, solicitados e concedidos a retalho. O meu additamento seria muito mais amplo do que aquelle que apresentou o meu illustre collega. Muitos Portuguezes que fizeram relevantes serviços ao Paiz foram demittidos, não só na classe Militar, mas nas civis; portanto, a medida tomada a respeito de uma classe de Empregados, devia igualmente adoptar-se a respeito das outras: deste modo a Lei seria um grande acto de justiça, de generosidade, se assim se quizer, e concorreria efficazmente para o restabelecimento da ordem, e para se desvanecerem os vestigios que ainda existem de nossas ultimas discordias; porém reflectindo que com o intento de fazer justiça a todos senão faria talvez a ninguem, e seriam privados de um beneficio immediato, os benemeritos Militares a favor de quem se apresenta este Projecto, entendi que não devia apresentar o meu additamento. Quando eu assim procedi a respeito daquelles que soffreram perseguições, e o exilio pela Causa da Liberdade, e que a esta Causa fizeram serviços eminentes, parece-me, que não ha razão, nem justiça para se embaraçar o immediato effeito desta Lei, com o fundamento de se attender aos que combateram nas fileiras do usurpador, e ou voluntaria, ou involuntariamente sustentaram e defenderam a sua causa. Acho justo e acedo aos principios de generosidade, que manifestou o meu collega, mas em primeiro logar devem ser attendidos os que combateram pela Causa do Legitimo Throno e da Liberdade, os que soffreram por ella, e em quanto o ultimo destes não fôr attendido, grave injustiça seria attender aquelles (Apoiados). No entanto, elles são nossos irmãos, são nossos concidadãos, e o tempo deve lançar um véo sobre o passado; oxalá assim aconteça, e que, reconhecendo-se a imperiosa força da época em que vivemos, se desvaneçam esperanças criminosas.

Peço portanto ao meu illustre collega queira retirar o seu additamento, em vista das razões que acabo de expor, e que me induziram anão apresentar o meu. E minha opinião, que desde já se faça a justiça, e o bem que é possivel fazer-se; e por isso peço a V. Ex.ª queira pôr á votação, se o additamento do meu nobre collega, é ou não admissivel. Devemos considerar que para attender-se aos individuos aos quaes o additamento se refere, seria necessario que os Srs. Ministros estivessem presentes, porque seria conveniente ouvi-los, a fim de não haver uma resolução precipitada. Porém antes de proceder-se á votação, peço ao illustre collega, que se senta á minha direita, queira retirar o seu additamento; porque, apesar de todos nós abundarmos nos seus principios de generosidade, parece-me que não é esta a occasião de os applicar a individuos a quem aliás todos nós desejamos beneficiar (Apoiados).

O Sr. General Zagallo: — Sr. Presidente, como Relator da Commissão, não posso de maneira nenhuma apoiar nem rejeitar um assumpto de que nella senão tractou; direi portanto a minha opinião como Senador. Sou inteiramente conforme com as idéas dos meus illustres amigos os Srs. Barão da Ribeira de Sabrosa, e Miranda, relativamente a um acto de philantropia de que todos, creio eu, estão possuidos para o grande fim de unir a Nação Portugueza: entretanto, desejando eu muito tambem que aquelle additamento fosse approvado juntamente com este Projecto de Lei, com tudo assinto as razões que acaba de dar o Sr. Miranda, sobre a differença que se deve fazer entre uns e outros individuos: (apoiado) não obstante aquelles merecerem toda a contemplação, e eu mesmo me haver empenhado com muitas pessoas, para que na Camara dos Deputados passe um Projecto de Lei para admittir esses desgraçados, principalmente os que foram demittidos na Ilha Terceira, que tem estado a morrer de fome por culpa dos seus proprios amigos que senão lembraram de os comprehender na Convenção d'Evora Monte; apesar disso, digo, concordo nos principios do illustre Senador, e tambem me parece que, para não embaraçar o bem, que póde já resultar aos Militares, que estão nas circumstancias deste Projecto, seria conveniente, que se approvasse como está, e que o illustre Senador o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, esperasse mais alguns dias, porque estou persuadido que a Commissão de Guerra da outra Casa, tem entre mãos um Projecto de Lei sobre este mesmo assumpto, que com muita brevidade será remettido a esta Camara, que o ha de approvar por acclamação, como eu espero (Apoiados).

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Agradecendo muito as expressões do illustre Senador, não serei ingrato a ellas: entretanto observarei, que não devia presumir-se necessaria a presença do Ministerio para tractar de um additamento, quando senão julgou precisa para discutir o objecto principal; em segundo logar, direi, que este additamento não exclue outro

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qualquer accrescentamento; terceiro, que eu o não julgava uma medida de rigoroso dever, mas de justiça e equidade, porque (como acaba de dizer o meu nobre amigo) se os negocia dores de D. Miguel estivessem menos assustados, (riso) ou tivessem tido mais previdencia, estas duas classes de Officiaes teriam sido admittidas na Convenção d'Evora Monte, porque era justo, e Sua Magestade imperial não se imporia a que fossem comprehendidos; o que houve foi puro esquecimento dos commissarios miguelistas, e talvez que pressa na approvação de quem representava D. Miguel. Sr. Presidente, eu retiro o additamento, porque acabo de ouvir de toda a Camara expressões de tanta benevolencia, que não posso deixar de crer, que ellas hão de resoar em outro logar, e que um Projecto de Lei d'alli nos será remettido, que acuda a esses desgraçados; senão vier, eu me encarrego de o apresentar ao Senado (Apoiados geraes).

O Sr. Vellez Caldeira: — Eu tambem tencionava fazer um additamento a este Projecto, e não é de agora que tenho estas idéas, mas desde o anno de 1838, ou desde a primeira reunião da Camara dos Senadores, e chamo o testemunho dos meus nobres collegas da Commissão de Legislação; aí propuz eu a restituição de todos aquelles que tinham sido demittidos, não como um acto de justiça, mas como um acto de generosidade, com o fim de acabar todas as dissensões entre Portuguezes: esse Projecto nunca veio á Camara porque os meus collegas me disseram que vinha prejudicar outro que se discutia, que era o da organisação judiciaria, mas protestei-lhe logo que quando esse viesse á discussão, eu havia de apresentar o meu additamento para a restituição de todos os Empregados que tinham sido demittidos, ou exonerados. Porém como o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa deu um testemunho de docilidade retirando o seu additamento, tambem eu não quero demorar a discussão apresentando o meu, e peço a V. Ex.ª proponha se a materia está discutida.

Tendo-se resolvido affirmativamente, annuiu a Camara a que o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa retirasse o Artigo addicional.

O Artigo 3.º do Projecto foi approvado sem discussão.

Leu-se um Officio pelo Ministerio do Reino, participando, que Sua Magestade a Rainha resolvera, que, durante a Sua ausencia da Capital, os Decretos das Côrtes que houverem de subir á Sancção Real, Lhe sejam apresentados pelos respectivos Ministros, dispensada a formalidade das Deputações. — A Camara ficou inteirada.

O Sr. Presidente lembrou que o dia seguinte era de guarda na Freguezia onde se acha situado o Palacio das Côrtes; pelo que se resolveu que não houvesse Sessão.

S. Ex.ª declarou então que a proxima teria logar na Segunda feira, 6 do corrente; tendo dado para Ordem do dia a nomeação da Commissão de Agricultura, e leituras, fechou a Sessão pelas quatro horas menos um quarto.

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