O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

910

DIARIO DO GOVERNO.

homem. — Senhores, vamos á verdade: pois a Irlanda estará além do Indostão ou da China?... O nobre Senador terá lido, porque é muito curioso, a viagem de um Principe Alemão, que pertence a uma Nação cujo caracter impaciencia em pensar, quero dizer a perseverança desapaixonada em dar o justo valor ás cousas, sem mais affeição á Inglaterra do que á França. O escripto que cito tem uma grande reputação de imparcialidade, eu o preferiria por isso aos epigramas e aos doestos em prosa ou verso de nacionaes ou de estrangeiros. Não digo que a Irlanda está em civilisação e prosperidade ao par de Inglaterra, sei que está muito abaixo; mas, Sr. Presidente, a comparação com os porcos, em verdade não convem a nenhum ente que tenha a nossa fórma (apoiadas). A Nação Irlandeza, assim como todas as Nações, tem o seu bom e o seu mau, tambem tem os seus grandes homens, e bastaria contar um para não dever comparar-se com porcos. Mas deixemos este episodio trazido habilmente pelo nobre Senador, e respondido pôr mim com outro episodio, sem que por isso pretenda as honras de defensor ou advogado dos Irlandezes.

Vista a approvação dada á primeira parte do paragrapho, não tenho mais observações que fazer por agora; nem entrarei nas particularidades produzidas pelo nobre Senador, se bem que provam que temos sido maltratados e insultados por uma Nação estrangeira, não deixam tambem de provar a necessidade em que estamos de fazer o Tractado; este é o grande objecto, porque está reconhecido que não ha possibilidade de acabar com os effeitos desse bill infausto e prepotente senão a celebração de um Tractado. É a isso que uns Governo prudente se deve applicar, conformando as suas estipulações com a nossa honra e dignidade, tendendo directa e sinceramente ao duplicado fim de alcançar a abolição desse bill, e a repressão efficaz do commercio da escravatura (Apoiados).

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Não é possivel responder de uma maneira mais polida e brilhante, do que S. Ex.ª o Sr. Ministro dos Negocios do Reino acaba de fazer; mas permitta S. Ex.ª que eu diga, que illudiu todas as perguntas, parque não respondeu a nenhuma cabalmente.

Acabou S. Ex.ª dizendo, que era necessario fazer um Tractado sobre escravatura: e quem é que duvida disso, Sr. Presidente! Ninguem, por certo. Pois que não é possivel apresentar documento mais authentico, para mostrar o grande interesse que nós manifestamos pela abolição da escravatura, do que o Decreto publicado em 10 de Dezembro de 1836, e as medidas que para o fazer executar, se tem empregado desde então até hoje. Como se diz pois, que não queremos fazer um Tractado depois do que se tem passado, e á vista daquelle Decreto, no qual se com minaram as penas mais severas contra os traficantes de escravos? Sr. Presidente, ainda não sahio do Gabinete Britannico papel algum, em que se manifestem idéas que se não encontrem exaradas no Decreto de 10 de Dezembro de 1836, depois do qual, ninguem tem direito para dizer que a Corôa Portugueza não quer essa abolição do trafico (apoiados). Ninguem, certamente tem mostrado mais vontade pela total extincção do trafico, do que o Governo Portuguez. E isto foi reconhecido pelo proprio Tenente Tucker, da marinha Britannica, que assim o confessa na Convenção que propoz e assignou com o Vice-Almirante Noronha. Alli se declara que nós tinhamos nos mares d'Angola forças sufficientes para reprimir o trafico. Depois destes sacrificios, attestados pela diminuição d'exportação, e pelas noticias do Brasil, aonde está o direito, ou o motivo para insinuar que o Governo de Portugal não quer abolir o trafico? Mas este louvavel fim não se póde conseguir senão depois á algum tempo de repressão; e obrigar-nos a sacrificios maiores é igual a despojar-nos (Apoiadas).

Sr. Presidente, porque fatalidade se exigem só de nós tamanhos sacrificios? De nós, que arriscamos nossas collonias, e paralisamos, por alguns annos, o commercio, que lhes dava vida, e não se ha de ter o mesmo procedimento, nem exigir as mesmas concessões da Dinamarca, da Suecia, dos Estados-Unidos, França, e da Russia (apoiados). E só contra o pobre Portugal; porque (note-se) apresou-se um navio Russo, é verdade, mas foi muito bem tractado, e conduzido a Portsmouth, e alli desembaraçado. Tem se apresado negreiros Norte-americanos; mas todos são levados aos portos da União; porém a nós, que somos ha quatrocentos annos, alliados da Inglaterra, e malfadados alliados, ha duzentos, o premio que se nos dá dessa antiga alliança, é o insulto e o saque (Sensação).

S. Ex.ª inverteu uma expressão minha quando disse, que eu affirmára que o Brasil, e as Colonias Hespanholas perdiam tanto mais quanto fôsse menos o seu numero de escravos importados. Eu não me expliquei assim; entendo porém que as rossas, e plantações d'America do Sul, hão de produzir metade menos, do que produzem hoje, vinte annos depois da completa abolição do trafico. Cabeça de branco não tolera o sol dos Trópicos nos pesados trabalhas da rotação, da derruba, e da ceifa. Tambem me parece que, vedado absolutamente o trafico, que dizima a população Africana, ha de esta vir a ser tão numerosa, que os estabelecimentos dos Europeos no litoral hão de ser de difficil conservação. O meu pensamento é que a philantropia Ingleza estava ligada com os interesses do seu commercio. Quando mais abundantes forem as produções do Brasil, e de Cuba etc. mais prejudicadas ficam as Possessões Inglezas nas Ilhas de barlavento, sota vento etc, etc. Eu não sou o inventor destas previsões: lá estão os Brasileiros levando já petições ao Parlamento sobre esta materia, e já o Marquez de Barbacena, grande proprietario na Bahia, tinha feito uma proposta analoga, ácerca da qual ha notas de Lord Palmerston, e de Mr. Ouseley na Collecção de documentos, que tenho aqui citado.

S. Ex.ª o Sr. Ministro dos Negocios do Reino disse, que senão lembrava em que tempo haviam começado as hostilidades da Malinha Britannica entre nós, eu o aponto: foi em 20 de Setembro de 1830, quando em toda a Costa d'Africa se ignorava a Revolução de 9 do mesmo mez. Tem sido, portanto, uma leviandade attribuir áquella Revolução os insultos, que os Crusadores Britannicos nos tem feito.

Disse S. Ex.ª, que todas as Nações tem feito Tractados para abolir o trafico. É verdade; mas é perciso distinguir duas cousa Primeiramente que perde, em que arrisca a Suecia, a Dinamarca, a Russia, Napoles, Sardenha, etc, etc. prohibindo o trafico dos negros, ellas que não tem dominios na Costa d'Africa? Sr. Presidente, nós somos os Senhores da maior parte do territorio, que produz esse malfadado fructo preto; são intimas cantigas as nossas relações com aquelle paiz, que hoje carece mais delle, o Brasil; a suspensão immediata do trafico arruina Angola, Benguela, Moçambique etc. por muitos annos: nada disto soffrem as potencias que já negociaram na Europa; portanto entre nós e ellas, não ha relação. Em segundo logar, a Gram-Bretanha tracta com aquellas Nações ad equalem, e a nós quer tratar-nos como povo conquistado, impondo-nos condicções affrontosas, e incompativeis com a independencia da Nação. Nem a França, nem a Suecia, nem a Dinamarca etc. etc. consentiriam no aviltamento de entregar seus filhos aos tribunaes da Serra Leoa, ou do Cabo de Boa Esperança.

Concluiu S. Ex.ª dizendo, que não tendo nós ainda concluido um Tractado com a Inglaterra, não era de extranhar, que fossemos mais mal tractados. Perdoe-me S. Ex.ª, mas não posso conformar-me; porque nós, attendendo a tão antigas allianças, e aos sacrificios que fazemos, tinhamos direito a mais contemplação, se no Governo Britannico não dominasse o capricho de querer humilhar-nos, porque nós quizemos dispensar-nos da sua funesta, e disputada tutella. Nós, que pelo Decreto de 10 de Dezembro de 1836, fizemos mais do que a Gram-Bretanha tinha direito de reclamar antes de 1851: nós, que temos feito tudo quanto podemos para fazer cumprir rigorosamente aquelle Decreto, deviamos esperar do Governo Britannico outro tractamento, e não a ferro, e fogo, e o saque das nossas embarcações sem distincção de Commercio, nem de derrota. Portuguezes, aprisionados em navios do Estado, foram lançados nas praias desertas da Costa d'Africa, clima muito ameno, e abandonados á morte!

Suprema philantropia!

S. Ex.ª, disse, que era uma verdade amarga, mas verdade, que se havia abusado da nossa bandeira; convenho: mas seria esse um motivo bastante para o procedimento iniquo, que o Governo Britannico tem comnosco? Qual é a bandeira de que senão tem abusado? Não é a bandeira Americana, e Hespanhola tão abusada como a nossa foi? Aqui estão os documentos apresentados ao Parlamento, que o deixam vêr. Entretanto, é contra nós sómente, que a Inglaterra desenvolve-o seu poder! E porque se abusa da nossa bandeira, indo com ella traficar a Madagáscar, ha de a Rainha de Portugal ser ultrajada! E exemplar documento de justiça! Mas faz-se contrabando de escravos e«m muito risco, e a grande custo. Sem duvida ha de assim acontecer, em quanto for tão grande a procura delles na America. Mas não haverá contrabandistas na Europa? Será a Gram-Bretanha isenta de contrabandistas? Lêa-se a sua, legislação, e saber-se-ha.

Mas o bill passou, ouvi eu dizer. E porque o bill passou, devemos nós submetter-nos. Esta doutrina é impropria desta Casa. Supponhamos que ámanhã passava nas Côrtes de Madrid uma. Lei, declarando, que o Além-Téjo pertencia á Casa de Castella: por a doutrina que tenho ouvido aqui prégar, segue-se que nós deviamos abandonar o Além-Téjo. O argumento prova de mais, e por isso nenhuma impressão me fez.

Tornou-se a repetir, que alguns navios estrangeiros obtiveram passaportes nacionaes. É possivel que alguma authoridade delinquisse, e por isso tem sido castigada; mas que passaportes trazem as embarcações Hespanholas, e Americanas? E quando os despachos são completamente falsos, tambem nós havemos de pagar por isso?

S. Ex.ª o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros continuou dizendo, que o mal da falta d'um Tractado era reconhecido, e que a isto senão tinha dado remedio. Perdoe-me S. Ex.ª mas neste ponto está deslumbrado. O mal tem sido conhecido, e logo depois da separação do Brasil lembrou o remedio. Na Regencia da Senhora Infanta D. Isabel Maria algumas Ordens se expediram para Angola pela Repartição da Marinha, mas tambem ninguem poderá negar, que nós temos ainda a reserva de quinze annos. A Gram-Bretanha não quererá, e talvez queira, tornar-nos responsaveis pelo periodo da Usurpação: pois que apenas elle terminou, logo S. Ex.ª o Sr. Duque de Palmella se occupou da negociação, e depois delle todos os Ministerios que se lhe seguiram. Não é portanto exacto dizer-se que senão quiz dar remedio. S. Ex.ª o Sr. Duque de Palmella sabe o respeito, que eu tributo á sua capacidade, e experiencia dos negocios; mas S. Ex.ª me dará licença que eu diga por esta occasião, que sempre me parece, que duas concessões, que S. Ex.ª fizera logo no preambulo, e no 3.º Artigo do seu Projecto de Tractado, tem fornecido argumentos ao Governo Britannico contra nós. O Governo Britannico é astuto, e serve-se maravilhosamente de tudo quanto aqui se diz em seu abono. S. Ex.ª o Sr. Conde de Villa Real, deixou aqui perceber na Sessão de 26 de Fevereiro do anno passado, que a sua opinião seria, que a separação do Brasil déra aos Cruzadores Britannicos, o direito de apresamento ao Sul do Equador, e os Cruzadores assim tem....

O Sr. Conde de Villa Real: — Um Artigo do Tractado de 1818 não dá authorisação para apresar os navios ao Sul do Equador, mas dá authorisação para os registar.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Pela leitura do Diario do Governo de 4 de Março de 1839, entendi eu, que S. Ex.ª fizera aquella concessão. E de certo alli se encontra alguma cousa disto.

Finalmente o mal conheceu-se, e quiz dar-se-lhe remedio. Assim que o Sr. Visconde de Sá da Bandeira entrou no Ministerio dos Negocios Estrangeiros, negociou logo franca e lealmente: um Tractado foi ajustado entre elle, e Lord Howard de Walden, que o Governo Britannico regulou depois de negociado, Nesta Collecção de documentos ha varias notas, ou despachos que indicam toda a marcha dessa negociação. Deixou o meu nobre amigo o Ministerio, eu manifestei os mesmos desejos, e já nesta Casa o demonstrei. Todos os Ministerios depois de 1836 tem querido tambem negociar, mas com decoro, e é isto o que o Governo Britannico não quer. O Governo Britannico quer libertar os negros aviltando os brancos. Eu pedi que se esperasse pelo encerramento das Côrtes, para que podesse empregar-me na negociação, ou remedio, e respondeu-se-me com a apresentação do bill porque essa apresentação estava promettida, e o Ministerio precipitou-se para lisongear certas paixões á nossa custa. Não é portanto exacto dizer-se, que senão quiz applicar o remedio: o mal vem de que o Governo Britannico só quer curar o mal á sua moda, que é mutando-nos. Sr. Presidente, a prova disto está no Ultimatum de Mr. Jerimongham. Minha convicção é leal, Sr. Presidente, a este respeito, que eu não duvidei dizer um dia diante d'Augustas Personagens, que eu antes queria emigrar, ou morre, do que assignar tão