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DIARIO DO GOVERNO.

Reservando para occasião mais opportuna o desenvolvimento destes principios, repito que approvo a redacção do paragrapho que está em discussão, com a intenção de que me fica salvo o direito de approvar ou rejeitar o Regulamento sobre a navegação do Douro, quando essa questão se tractar especialmente. (Apoiados.)

O Sr. Duque de Palmella: — O nobre Senador que acaba de sentar-se disse, que elle dava a sua approvação a este paragrapho da Resposta ao Discurso do Throno, julgando que por esse facto de maneira alguma se compromettia a approvar ou deixar de approvar a Convenção e o Regulamento a que no mesmo paragrapho se allude. Começarei o pouco que tenho a dizer, fazendo uma observação ácerca desta opinião; a minha neste ponto, é algum tanto contraria á do illustre Senador. Entendo que o Senado estará sempre em liberdade de approvar ou rejeitar o Regulamento (não n Convenção, porque, como já se disse, essa está rectificada, e não vem a ser sujeita á approvação das Côrtes) ou antes a parte do Regulamento que diz respeito a impostos e penalidades. Porem eu creio que o paragrapho da maneira porque está redigido, não implica a obrigação absoluta de approvar esse Regulamento, mas sim a approvarão dos principios sobre os quaes é baseada a Convenção. Estou persuadido disto, e sendo esta a minha convicção, devo dize-la com franqueza, mesmo para que a Camara não fique enganada; e como tive a honra de ser o redactor deste Projecto, digo que estas foram as intenções com que o escrevi, respondendo ás expressões do Discurso do Throno; e longe de ser isso um motivo para deixar de approvar o paragrapho, sou de opinião que é uma razão mais para que a Camara o adopte; nem eu posso convencer-me que uma reunião de Representantes da Nação, tão illustrados como os que se acham neste recinto, imagine que por meio deste ajuste se augmenta a probabilidade do contrabando em Portugal, ou se dá mais facilidade, para a introducção furtiva de generos de outro paiz no nosso.

Como se tracta unicamente das relações entre Portugal e Hespanha, direi que tendo estes dous Reinos por limites uma raia tão extensa, e tão destituida de obstaculos naturaes, tão facil de transitar n'umas partes e de vadiar em outras, parece incrivel imaginar-se que a unica communicação pela qual é facilimo evitar o contrabando, essa o vá augmentar. (Apoiados.) Ao contrario, parece evidente que offerecendo-se uma sahida legal e franca a alguns dos generos que entram fraudulentamente em Portugal, que offerecendo-se por meio de direitos tão medicos, como devem ser os de transito, um medo de exportação áquelles generos que super abundam nas Provincias limítrofes de Hespanha; parece, digo, que deverá diminuir o incentivo que ha para fazer o contrabando pela raia secca. Ora eu estou persuadido que, para evitar os descaminhos, que se receia tenham logar por esta communicação, basta uma só cousa; dous homens de bem que se colloquem um na entrada, e o outro no ponto do deposito, dous homens, digo, de probidade, e que de modo algum sejam capazes de roubar: havendo isto é impossivel fraudar-se a Fazenda, com mettendo-se quaesquer enganos ou roubos pela introducção desses generos. Sem querer recorrer ao sentimentalismo, ao qual nunca se deve recorrer quando se tracta de objectos tão positivos conto este, é preciso servir-se da razão, allegar factos, produzir argumentos, e não fallar á imaginação nem ás paixões; direi tambem que aquillo de que nós carecemos, pelo consumo unanime de todos os Portuguezes, é de communicações internas, estradas, canaes, pontes, em fim de meios de transporte para o commercio dos nossos generos; ora, uma unica communicação por agoa nos deu a natureza, e esse mesmo rio, bem ou mal navegavel, quer-se tornar inutil! A idéa deste ajuste não é nova; o illustre Senador que está sentado adiante de mim disse que já em 1823 se tinha tractado de um ajuste com Hespanha similhante a este; não digo que então se tractasse com toda a latitude com que actualmente se faz, mas é certo que este projecto data de muito mais longe, no tempo de Philippe 2.° navegou-se o Tejo, e a planta em que aqui se fallou, senão existe em Lisboa deve achar-se em Madrid; e posteriormente ainda houve outras tentativas. Concluo que se a Convenção tem algum defeito, é em não applicar ao Tejo e ao Guadiana tudo que nella se acha estipulado para o Douro. (Apoiados.)

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira: — Sr. Presidente, como se fallou na permissão da sahida pelo Douro das oitocentas mil fangas de trigo que o Governo Hespanhol ha dous annos pedio; cumpre-me fazer sobre isto algumas observações.

Apenas o Encarregado de Negocios de Hespanha fez este pedido, logo a isso se prestou o Governo Portuguez; porem ao mesmo tempo, entendeu que devia levar este negocio ás Côrtes, como levou; alli foi elle remettido a uma Commissão, a maioria dos membros desta fez esperar que se daria a authorisação ao Governo; porém depois as difficuldades foram taes, que este assentou dever retirar o Projecto.

Por esta occasião fallarei tambem do direito de bandeira, porque tractei este negocio conjunctamente com o da navegação do Douro. Debaixo desta denominação, se entende o privilegio que tem os navios com bandeira Hespanhola que carregam nos portos de Bordeos, de Marselha, e de Genova, de transportarem para Hespanha os generos de producção estrangeira, pagando nas Alfandegas de Hespanha menos direitos do que pagariam se fossem em navios com outra bandeira: este mesmo privilegio foi concedido, haverá dous annos, aos negociantes de Gibraltar, ao que se oppoz o commercio de Cadiz, porque lhe diminuia muito os seus interesses. Estando eu então no Ministerio dos Negocios Estrangeiros reclamei que este mesmo privilegio fosse concedido a Portugal, o que seria muito vantajoso ao nosso commercio; por quanto, se os algodões que vem da America desembarcar a Lisboa, podessem ir daqui para Barcelona, haviam necessariamente augmentar as transacções commerciaes; mas o Governo Hespanhol respondeu, que desejava extinguir tal privilegio, e que por isso o não queria conceder a outros portos, ao que redargui, dizendo, que Portugal pertendia sómente ter igual direito, em quanto elle fosse concedido a outros. Neste estado ficou o negocio á minha sahida da Administração. Chamo porém a attenção do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros sobre este ponto para o ter presente antes que termine a negociação do Douro.

Tem-se dito que o transporte por este rio do trigo de Hespanha hade augmentar o contrabando: direi, que é minha opinião que esta navegação dando sahida áquelle genero, deve produzir em Castella augmento nos preços, e logo que estes estejam equilibrados, a consequencia será que o contrabando ha de diminuir, por fazer menos conta aos especuladores. Para evitar que o trigo sahido do Porto não desembarque na costa de Portugal poderá exigir-se dos carregadores a apresentação de certificados dos Consules Portuguezes de que o trigo desembarcara em portos estrangeiros; do mesmo modo que naquella Cidade se pratica com o vinho que della sabe para a America. Uma observação porém me fez muito peso, a qual consiste em que, tendo-se exportado trigo estes ultimos annos, poderia a sahida dos trigos de Hespanha vir a influir em Portugal, diminuindo o valor do nosso genero, com prejuizo dos lavradores. Mas, Sr. Presidente, não está ainda provado (pelo menos para mim), que os oito mil moios de trigo que sahiram de Lisboa no anno passado, não fossem substituidos em grande parte por trigos entrados de Hespanha, quanto mais que é de todos sabido que fui toda a raia se faz immenso contrabando de cereaes; além de que, outra razão forte ha para se julgar que a sahida pelo Douro dos trigos Castelhanos não terá influencia nos preços do trigos Portuguezes, e vem a per, que oito mil moios de trigo, mesmo vinte mil moios, no mercado geral da Europa, é uma fracção insignificantissima, considerada em relação com a quantidade de trigo que annualmente se exporta de Dantzic, de Riga, de Hamburgo, de Odessa, da Sicilia, mesmo de Castella, por Santander, e de muitos outros portos da Europa, dos Estados-Unidos, e da Barbaria. Na Grã-Bretanha sómente, foram importados no anno de 1831 mais de um milhão e quatrocentos mil moios de cereaes. É pois claro que a exportação de mais alguns milhares de moios pelo Douro não poderá influir sensivelmente nos preços.

Concluo dizendo que considerado este negocio por todos os lados o acho de summa conveniencia, e por isso espero que nesta Camara achará apoio o Governo quando apresentar o Regulamento.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Sr. Presidente, é uma verdade desgraçada, que até aqui tudo quanto se tem dito de communicações interna fluviaes e terrestres, tem sido palavras vãs; mas eu não perco a esperança, e nem se póde perder, de que essas palavras venham a ter melhor effeito do que sumir-se no vago dos ares e mais nada, porque, de muitas vezes se repetir aquillo que se não faz, de expor a necessidade de se fazer, e de persuadir, por meio de exemplos de males, a precisão de os remediar, é que se chega, em certo tempo dado e depois de muito perdido, a fazer alguma cousa util. É bom não lançar sobre nós as culpas do que não podemos fazer; seriamos estranháveis se tivessemos despresado assumptos de tão grande importancia; mas as Administrações desde 1834 para cá não os tem despresado; as Administrações, contando com aquella em que servi, terão talvez errado, mas errar é dos homens, e em objectos taes primeiro, que se acerte, erra-se muito.

Sr. Presidente, as estradas de Lisboa ao Porto e de Lisboa a Elvas deviam ser as primeiras que se abrissem, porque são as grandes artérias de communicação para o interior do Reino, e principalmente porque esta de Lisboa a Elvas era um canal de communicação para a Capital do Paiz visinho, que d'ahi tambem no la dava para o Norte desse Estado, e para França. Suscitou-se uma questão; eu, emquanto estive no Ministerio, resolvi-a por um modo, e pessoas que me succederam (pessoas mais illustradas do que eu) resolveram-na por outro modo. Não quero dizer, longe estou disso, que se eu persistisse no meu empenho, que consistia em se encarregar o Governo da feitura destas duas grandes obras, deixando todas as propostas de emprezas, e applicando para as mesmas obras uma somma votada pelo Corpo Legislativo de 80 contos de réis, sobre que se poderia levantar a de mais dous milhões; se dando assim com este acto de patriotismo o exemplo e a instrucção necessaria; e além disto meios de subsistencia ao povo das Provincias; sendo dirigidos os trabalhos por um homem intelligente e pratico já conhecido em Inglaterra e fóra della por sua habilidade; não quero dizer, repito, que o resultado havia de infallivelmente corresponder aos desejos que eu tinha, e á minha intima, porém talvez, mui facil, convicção; digo sim, que se nisto prosseguisse como se tinha começado, pagando expropriações caras, como algumas que eu fizera pagar; se se continuassem a abrir adestradas, que se haviam incetado; se não fosse a preferencia dada a outros meios, póde ser que melhores tivessem sido as consequencias. Entretanto não foi assim; não quero dizer que me aconteceria bem, mas é certo que não succedeu melhor com os novos planos. Decidiu-se, que estas obras deviam fazer-se por empreza, e emprezas se apresentaram, e os homens que as commetteram tinham certamente muito bons desejos, porque no conseguimento dellas estava a tua propria fortuna e os seus interesses; e quando assim não seja não me parece que se possa conseguir cousa alguma. Discutiu-se em uma das Camaras do Parlamento a proposta da empreza da estrada de Lisboa ao Porto; o objecto foi mal avaliado; eu de boa vontade me alisto entre os que erraram na apreciação que delle se fez. E tal era a falta de conhecimento das circumstancias que a propria gente da era preza carecia de conhecimentos sobre a direcção que devia ler a estrada de Lisboa ao Porto; eu ouvi dizer mui seriamente que esta passaria por Agueda, Albergaria, ponte do Vouga, Aveiro etc. etc. como se estas povoações estivessem na mesma linha! Tal era a pressa, e a precipitação, com que se procedia em negocio tão grave, que ao notar-se o absurdo ninguem houve que se não admirasse de que nelle se tivesse advertido tão tarde. No Senado ha Membros que o eram da Camara dos Deputados a que me refiro, e diga-se se com este conhecimento de causa se podia approvar uma empreza? E approvou-se! Eu pergunto que havia de ser o resultado de uma tentativa calculada e avaliada tão ligeiramente?

Os emprezarios foram os que primeiro reconheceram que se tinham mettido era difficuldades invenciveis. O ardente desejo que a todos dominava de levar por diante o melhoramento indispensavel em communicações interiores, não existindo as quaes nenhuma Nação póde sahir do estado de barbaridade pura ou de civilisação; este desejo fez que rompessemos por obstaculos que deviam ser pesados antes, que não olhassemos para cousa nenhuma; e esta imprudencia deu o resultado que podia dar, quero dizer, não se fez a estrada. Os emprezarios recorreram ao Corpo Legislativo a pedir novas concessões, e neste caminho tem andado. Além disso, o Governo acha-se obrigado a pagar expropriações,