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DIARIO DO GOVERNO.

interpretação que lhe davamos, o que de certo não teriamos conseguido se o exigíssemos com arrogancia e como um direito inquestionavel. Porém quando se declarou extincto o Tractado de 1810 foi necessario conceder um prazo de seis mezes para não prejudicar as especulações que de boa fé tivessem sido encetadas, e só depois desse prazo se podiam publicar as Pautas para terem effeito; e é essa a causa de ellas não haverem sido publicadas pela Administração que aboliu o Tractado.

Este systema das Pautas habilita o Governo para impôr direitos mais altos ou mais baixos, ou mesmo prohibitivos, sobre aquelles generos cuja producção sequer animar, ou sobre aquelles outros que se suppoem que o nosso Paiz nunca poderá produzir, e que por consequencia se devem admittir baratos vindo de fóra; mas estas considerações são de sua natureza variaveis, e conforme as variações do commercio: por exemplo, o Egypto, que ha dez annos não produzia nem uma sacca de algodão, agora enche os mercados da Europa desse genero; o commercio, por tanto, tem alterações frequentes segundo essas alterações, devem as Pautas tambem ser alteradas e melhoradas. Por conseguinte, quando se pertende que as Pautas se conservem intactas, pertende-se um absurdo; e mostra-se que se não entende a natureza do objecto de que se tracta; as Pautas devem alterar-se segundo as conveniencias, para isso é que ha Pautas, em logar de direitos fixos ad valorem, Applicando estas noções ao que disse o Sr. Visconde Sá, sustento que, não obstante a mudança que u nosso respeito se fez no Brasil, se nos não convier augmentar os direitos de certo generos daquelle Paiz, não o devemos fazer, porque não devemos cingir-nos tanto ao cumprimento de unia supposta obrigação, que causemos um prejuizo a nós mesmos; seria um absurdo.

A Camara toda está convencida da utilidade das nossas relações com o Brasil; das diligencias que devemos fizer para as promover; das difficuldades que nisso encontrámos; e da impossibilidade talvez de o conseguir: todavia está da nossa parte fazer os exforços possiveis, e deixemos o mais ao que quizer a Providencia.

Será talvez desnecessario seguir o nobre orador que acaba de sentar-se, em varios assumptos que elle tocou, e que são realmente alheios á materia do paragrapho de que se tracta; todavia farei uma ou duas observações sómente.

Disse que em materia de commercio não deviam legislar os interessados, e disse uma verdade innegavel; devem-se consultares interessados, sempre que isso possa ser, para obter a necessaria illustração, e guiar-nos peias opiniões dos Negociantes, dos Fabricantes, e das Associações Commerciaes; mas não deve adoptar cegamente tudo quanto elles disserem, porque as partes interessadas se deixara facil ente illudir pelos seus desejos. Por consequencia, não deve o Governo nem o Corpo Legislativo seguir cegamente esses pareceres, mas considerar os interesses e conveniencias do maior numero dos habitantes do Paiz; deve ver se para promover os ganhos de um indivíduo, em ponto pequeno, não prejudica os interesses em grande das classes productoras e do Thesouro. Li respondendo ao Sr. Visconde de Sá, relativamente a estas consolações, sómente lhe observarei que elle poderia ler encontrado na Secretaria d'Estado dos Negocios Estrangeiros provas de que isso que S. Ex.ª aconselha se fez no tempo dos seus antecessores, como í á vez nunca se tivesse feito antes nem se fizesse depois, mesmo no seu tempo; quando eu tive a honra de dirigir a Repartição dos Negocios Estrangeiros, consultei, acerca das nossas ralações com Inglaterra, com o Brasil, com os Pares do Norte da Europa, em fim com todos aquelles com quem tinhamos relações; consultei, digo, todas as Corporações Commerciaes existentes em Portugal e util grande numero de pessoas habeis; consultei os Chefes de todas as Repartições, e não vagamente, mas perguntando-lhes por escripto quaes eram as suas opiniões sobre uma serie de objectos para o que fiz listas de quisitos bem detalhados, sobre cada um dos pontos relativos aos nossos interesses commerciaes, e a esses quisitos pedi respostas, respostas que obtive e devem existir na Secretaria de Estado dos Negocios Estrangeiros, muitas das quaes mostram que se tirou proveito de adoptar este methodo, e algumas outras provam o que eu ha pouco disse, isto é, que as partes interessadas nem sempre são os melhores Juizes.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Depois do que acaba de expor o nobre Duque de Palmella, mal poderei eu dizer cousa que sirva de esclarecimento; mas em fim cumpre-me enunciar aquillo que entendo sobre um objecto de tamanha ponderação para a Nação Portugueza, isto é, sobre as nossas relações com o Brasil.

Estas relações desde o Tractado de separação, é bem certo que nunca estiveram n'um pé de perfeita igualdade, e que muita gente se queixou de que os productos de Portugal pagassem no Brasil algum tanto mais, que os do Brasil pagavam em Portugal, e que o Governo permittisse a admissão, principalmente de certas bebidas, espirituosas (a cachaça), com um direito quasi nullo, em quanto subsistia o direito regular de 18 por cento, pago pelos nossos vinhos e outras mercadorias de Portugal, no Brasil, que era exigido com toda a severidade. Mas depois do malogro do Tractado que negociara, no Rio de Janeiro, um Ministro Portuguez com o Ministro dos Negocios Estrangeiros daquelle Imperio; Tractado sobre que se fundaram muitas esperanças, e que se dizia dever ser apoiado fortemente pela maioria que o Governo do Brasil tinha então nas Camaras, especialmente na dos Deputados; Tractado que por uma transmutação singular foi rejeitado por essa maioria, e approvado pois minoria, quando o contrario se esperava; Tractado do qual depois quasi officialmente se disse que não podia deixar de ser renovado, chegando se a prometter (assim o ouvi affirmar) que em mais opportuna occasião seria apresentado, tal qual estava redigido, ao Corpo Legislativo, quando pelo contrario o Ministro Brasileiro disse depois que o que se tinha promettido era, que um novo Tractado alli seria levado em occasião competente: finalmente, depois de malogrado esse Tractado, correu como opinião geral e incontestavel entre os Membros do Corpo Legislativo do Brasil, e pessoas influentes, (que não convinha fazer Tractado algum de commercio entre Portugal e aquelle paiz. Esta opinião teve alli grande sequito, e obstou a que, por algum tempo, da nossa parte se fizesse qualquer tentativa: mas a final fez-se, e não deixou, um certo modo, de ser bem acolhida pelo Ministro dos Negocios Estrangeiros, o Sr. Lopes da Gama, que recebeu um Projecto do Tractado offerecido pelo nosso Negociador, uma Copia do qual foi por este remettida ao Governo. Mas vendo o Governo que, apesar do acolhimento que tinha tido esse Projecto, nada se fazia, porque o Ministro do Brasil hesitava em negociar antes de ter grande probabilidade de achar apoio nas Camaras, receiando um acontecimento desagradavel como produzira a rejeição do primeiro Projecto; o Governo, digo, julgou que este negocio, além de outros que é sabido termos com o Brasil, exigia que alli se mandasse um Plenipotenciario com instrucções claras, terminantes, bem entendidas, e (por assim dizer) quasi explicada e discutidas com elle; em fim enviou-o, e foi munido de instrucções sobre diversos assumpto, a respeito dos quaes a probidade da sua pessoa, a capacidade e conhecimentos de que e dotado, dão esperanças de algum feliz resultado.

O que realmente levantou um alto queixume da nossa parte para com o Brasil foi o augmento, e extraordinario augmento, de 50 por cento de direitos que, pelo Decreto de Maio de 1839, caiu sobre os vinhos de Portugal. Eu não quero ser aqui um advogado do Brasil, mas desejo olhar os negocios como elles são, e fazer justiça a todos. Nós não podemos, entendo eu, culpar muito o Brasil, porque depois que as nossas Pautas (de que não maldigo) fizeram quebrantar o Tractado como elle se executava, alterando o direito sobre os generos do Brasil em Portugal, tambem lá se alterou o direito que se costumava pagar desde muito antes da separação, e que se não tinha alterado com ella. O Governo do Brasil representou, e representou durante muito tempo, contra os direitos differenciaes, e sobre tudo contra os direitos addicionaes, porque estes recaindo expressamente sobre generos Coloniaes, que recebemos quasi exclusivamente do Brasil, foi, por assim dizer, um imposto nos productos daquelle paiz, com a quasi unica excepção do bacalhau, imposto cujo rendimento formou uma receita para augmentar a da Junta do Credito Publico. Então o Brasil queixou-se, e queixou-se não da medida geral das Pautas, sem embargo de que tinha esta medida como uma infracção das estipulações existentes entre os dous paizes, mas especialmente da excepção, contra elle imposta, dos direitos addicionaes; queixou-se, tornou a queixar-se, ameaçou (permitta-se-me usar desta phrase) de tomar uma medida como represalia da que nós tinhamos tomado, e tomou-a depois de muito tempo: não ha duvida, eu o sei, e todos sabemos, que por mais de uni anno solicitou o Brasil que olhassemos por nós e vissemos que elle não havia de tolerar unia infracção ao Tractado, sem se mostrar resentido, e sem augmentar os direitos dos nossos productos. Ainda mais, o Governo do Brasil não queria depois contentar e com impôr um augmento de direitos sobre os nossos vinhos, queria tambem comprehender as manufacturas de forro, linho, e outras que se importam de Portugal, e não o fez: pouco seria o valor, mas que leve isso em mira, todos o sabemos. Eu vi uma Memoria a este respeito, que fôra impressa n'uma folha do Brasil, vi o parecer de alguns homens a quem aquelle Governo consultou, e d'ahi se conhece quaes eram as suas intenções: é verdade com tudo, que o direito foi lançado sobre os vinhos de todos os paizes. Não ha duvida que quando aqui chegou a noticia, pelo enunciado da medida entendeu-se, que os vinhos de Portugal eram o objecto exclusivo della, eu tambem, como toda a gente, me persuadi do mesmo, porém breve se viu que a medida comprehendia os vinhos de todas os Nações, que não tivessem Tractado com o Brasil. Não adverti desde logo que as Nações exportadas de vinho não tinham taes Tractados; se exceptuarmos o vinho do cabo, de que poderão s entrar no Rio de Janeiro algumas duzias de garrafas unicamente, como aconteceu no anno de 1888, com a circumstancia de não terem comprador. Isto sei eu por informações, que tenho por officiaes, de pessoas de todo o credito. Então viemos a saber que foram feridos do mesmo augmento de direitos, não só os vinhos de Portugal, mas tambem os do Hespanha, os da Sicilia, e em fim os de todos os paizes que os produzem, porque aconteceu que esses Estados não tinham Tractado com o Brasil.

Mas, disse S. Ex.ª o Sr. Visconde de Sá, ha sempre uma excepção contra Portugal: eu não poso comprehender que tal excepção exista, (O Sr. Barão do Tojal: — Apoiado) porque não vejo differença alguma da proporção em que está o valor dos vinhos Portuguezes relativamente ao valor dos outros vinhos; os vinhos da Catalunha tem, e tiveram sempre, um valor menor no mercado do Brasil, do que os de Portugal; os da Sicilia do mesmo modo, e os de França estão nessa proporção; então digo eu que, regulando-se o augmento do direito pelo valor do genero, necessariamente há de caír maior direito no nosso vinho que tem maior preço. E como eu entendo a questão, e póde ser que a não entenda como ella é; mas ouvindo negociantes da praça de Lisboa, e mais de um, e de dous interessados neste negocio, cujas fortuitas estão entregues á exportação deste genero para o Brasil, e perguntando-lhes se acaso pela regulação destes direitos, os vinhos de Portugal tinham maior despeza do que os outros, asseguraram-me que não, e que por ultimo se tinham feito alguns arranjos, a respeito da cobrança destes direitos, que eram favoraveis aos nossos vinhos.

Parece-me pois que nós augmentando os direitos sobre os generos Brasileiros, démos logar a que os Brasileiros augmentassem os direitos a uva dos generos Portuguezes, ao mesmo tempo que tambem os augmentaram para outra Nações; comtudo o Governo do Brasil não duvidará, se nós lhe fizermos algumas concessões, diminuindo esses direitos, entrar comnosco em um accordo amigavel a respeito dos generos de Portugal. Não é muito que o Brasil exija que diminuamos o imposto lançado nos seus generos, quando nós queremos, que elle diminua aquelle que foi lançado aos nossos; neste caso parece-me improprio exigir sem animo de compensar. Eu já disse em outra parte que as Nações não fazem favores, mas fazem trocas; e então pertence ao Governo o considerar se a concessão, que o do Brasil assegura, que está prompto a fazer a respeito desses direitos, vale a pena de lhe fazermos igual diminuição a respeito dos outros a que estão sujeitos os seus generos. Isto é negocio para ser considerado pausadamente; mas é força dizer que a importação dos nossos, vinhos não teve a terrivel diminuição que se augurou quando chegou aquella desanimadora noticia do augmento dos 50 por cento, e menos tem lido proximamente.

Ha pouco tempo se disse n'outro logar, era referencia ao assumpto de que neste agora se tracta, que os tanoeiros abandonavam as aduellas, que os lavradores já não cavavam as vinhas etc. a imaginação de um homem pintada com linguagem sonora, ás vezes produz effeito;