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DIARIO DO GOVERNO.

CAMARA SOS SENADORES.

19.ª Sessão, em 23 de Julho de 1840.

(Presidencia do Sr. Machado, 1.° Secretario.)

TRES quartos depois da uma hora da tarde, foi aberta a Sessão, verificando-se estarem presentes 43 Srs. Senadores.

Lida a Acta da precedente Sessão, ficou approvada.

Estando presente tambem o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, passou-se á Ordem do dia, que era a continuação da discussão do Projecto de Resposta ao Discurso do Throno.

Leu-se o §. 10.º, que havia ficado adiado na antecedente Sessão. (V. Diario N.º 190, a pag. 994.) É concebido nestes termos:

«As relações de commercio e amizade entre Portugal e o Brasil são fundadas em tantos, e tão claros motivos de reciproco interesse e benevolencia, que a Camara dos Senadores não póde deixar de adoptar a lisonjeira esperança, que Vossa Magestade manifesta, de as vêr consolidadas em breve por meio de ajustes diplomaticos mutuamente vantajosos.»

Tinha a palavra

O Sr. Conde de Villa Real: — Sr. Presidente, por occasião da discussão sobre a negociação do Tractado do Commercio com, o Brasil, tem-se fallado no Tractado da independencia, e no facto da independencia daquelle Imperio. Considero, Sr. Presidente, que estas materias tem uma certa connexão, porque era na occasião de se assignar o Tractado da independencia, que se deviam ter fixado as nossas relações commerciaes com é Brasil.

Sem me demorar em reflexões sobre as causas, que existiam na natureza das cousas, e pelas quaes se podia presumir que a independencia do Brasil se havia de verificar em uma época mais ou menos remota, devemos reconhecer que ficou decidida, essa independencia desde que a Côrte se estabeleceu no Rio de Janeiro, com todo o apparato dos Tribunaes que havia em Portugal. Verdade é que isso aconteceu no tempo em que os Francezes occupavam este Reino, mas mesmo depois da sua expulsão era facil conhecer que se tornava realmente impossivel que o Brasil, levado áquelle estado, quizesse ficar dependente de Portugal. (Apoiados.) Deram-se porém circumstancias, e póde dizer-se que houve imprudencias, que fizeram com que na volta do Senhor D. João 6.º para Portugal se azedassem os espiritos das pessoas que podiam (obrando de accôrdo) conseguir que se tirasse o partido possivel da separação do Brasil: entenda-se porém que dizendo isto, não quero fazer inculpações a ninguem. Reconheço que nas Côrtes, que naquella occasião se achavam reunidas, havia homens de grande préstimo e de muito saber, e que um grande numero delles tinham de certo desejos de promoverem o bem do seu Paiz. (Apoiados.) Succedeu porém a esta época a de 1823, na qual o Governo immediatamente procurou renovar relações directas com o Brasil.

Fui por esse tempo mandado a Inglaterra, e tendo-se mallogrado a missão, que se enviou ao Rio de Janeiro, fui encarregado da negociação do Tractado da independencia. Apesar de todos os esforços, que fiz para bem desempenhar esta commissão, não posso deixar de confessar que nenhuma ambição tinha de assignar o Tractado da independencia do Brasil, porque de facto, teria assignado a desmembração da Monarchia. Esta negociação teve o andamento que consta da correspondencia desse tempo, até ao momento em que recebi instrucções para apresentar um Projecto de Tractado com o Brasil. É de advertir que esta negociação se tinha entabolado debaixo da mediação da Inglaterra, e da Austria. Tinha pois apresentado em uma conferencia com os Commissarios brazileiros, a que assistiam os Plenipotenciarios das Potencias Mediadoras, um Projecto do Tractado, sobre o qual os primeiros não julgaram poder dar logo a sua opinião, reservando-se a dá-la em outra conferencia, depois de examinarem bem o dito Projecto. Tinha eu porém toda a esperança, uma quasi certeza, de que Mr. Canning os induziria a acceitar o Projecto de Tractado sub spe rati.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Eu pedia a V. Ex.ª, a bondade de especificar as datas.

O Sr. Conde de Villa Real: — Foi nos fins do anno de 1824, depois de ter havido uma communicação directa com o Brasil, como já disse, mas na qual eu não tive parte alguma, porque só fui encarregado da negociação em Inglaterra. Mr. Canning, que então era Ministro dos Negocios Estrangeiros em Inglaterra, e tambem o Plenipotenciario Britannico tinha-me sempre declarado que muito desejaria se fizesse um Tractado com o Brasil, debaixo de condições razoaveis, porque apesar do interesse que tinha o Governo Britannico de fixar as suas relações commerciaes com o Brasil, esperaria um tempo razoavel, para que nós fizessemos nosso Tractado debaixo de condições possiveis. Quando pois recebi instrucções para apresentar o Projecto de Tractado, procurei obter que lhe désse o seu apoio, e pelo que passei com elle concebi, como disse, a esperança de que elle persuadiria os Commissarios Brasileiros, e assignariam este Projecto sub spe rati. Deviam fazer esta declaração na seguinte conferencia. Mas poucos dias depois daquelle em que apresentei o Projecto, aconteceu chegar a Inglaterra o Paquete do Rio de Janeiro, e nelle Monsenhor Vidigal, o qual trazia instrucções aos Commissarios Brasileiros, e ordens positivas para que não aceitassem as estipulações daquelle Projecto, porque já tinha sido remettido directamente para o Rio de Janeiro, e alli offerecido alguns mezes antes de se haver remettido para Londres. Mr. Canning tendo então conhecimento deste facto, que eu mesmo ignorava, estranhou muito esse procedimento, como injurioso para as Potencias Mediadoras. Ambos os seus Plenipotenciarios se mostraram escandalisados, e Mr. Canning logo declarou que era inutil continuar a negociação em Londres, e que de nada serviria reunir outra vez a conferencia, porque á vista das ordens recebidas pelos Commissarios Brasileiras só podiam dizer que rejeitavam o Projecto que lhe era proposto. Dahi resultou, Sr. Presidente, o tomar tambem logo Mr. Canning a determinação de mandar Lord Stuart ao Rio de Janeiro para fixar as relações commerciaes da Inglaterra com o Brasil. Deu-lhe porém ordem de passar por Lisboa, para que o Governo Portuguez, se quizesse, podesse ainda aproveitar a occasião de concluir um Tractado com o Brasil, mandando algum Plenipotenciario ao Rio de Janeiro.

Nada direi pois sobre a missão de Lord Stuart, porque ella é bem conhecida, e só recordarei que então já se tinha mudado o Ministerio de Portugal, tendo sahido delle o Sr. Duque de Palmella. Na minha opinião era essa, como indiquei, a occasião mais propria para se negociar com o Brasil um Tractado de Commercio, e para fixar as nossas relações com aquelle Imperio. Entretanto só se assignou o Tractado de 25, cujas estipulações são de todos sabidas. Apesar de se dizer então, que as negociações para a conclusão de um Tractado de Commercio vantajoso tinham ficado adiantadas, nenhum resultado tinham tido, quando a mudança politica, que houve em Portugal em 1828, interrompeu as relações de Portugal com o Brasil. Todos os Governos depois de 1834 se occuparam do importante objecto das relações com o Brasil, mas em 1835 é que se entabulou uma nova negociação para aquelle fim.

Não necessito repetir que eu tambem desejaria muito que se restabelecessem as nossas relações commerciaes com o Brasil, debaixo do pé de reciprocas vantagens, por quanto existindo em ambas as Nações costumes analogos, a mesma lingoagem, e póde dizer-se que os mesmos habitos, tudo concorre para que entre ellas se restabeleçam relações mais estreitas, e que reciprocamente se concedam mutuas vantagens. (Apoiados.) Com tudo eu sempre fui de opinião, que convinha obter uma decisão definitiva a esse respeito com brevidade, para que só com essa esperança, na certeza de a poder realisar, não deixassemos passar a ocasião de estabelecer relações commerciaes com outras Potencias.

Seguiu-se por tanto em 1836, quando eu estive no Ministerio, uma negociação com Inglaterra, conservando-se em vista o Tractado que se fizesse com o Brasil, debaixo dos principios de mutuas vantagens. Era o Plenipotenciario de Portugal o Sr. Duque de Palmella, que dirigiu essa negociação, com a maior attenção aos interesses e á dignidade de Portugal, como se teria visto se tivesse podido assignar o Tractado que estava ultimado. A negociação com o Brasil não se concluiu, porque não se rectificou o Tractado que por aquelle tempo se tinha assignado; e como por esse motivo não ficassem determinadas as nossas relações commerciaes com o Brasil, nenhumas vantagens tirámos dos passos que se deram para esse fim. Neste ponto a minha opinião é differente da que aqui já se inculcou, porque das questões que suscitou no Rio de Janeiro a rectificação desse Tractado, e de tudo quanto se publicou alli a esse respeito, se seguiram as difficuldades, que depois se tem encontrado, para concluir um novo Tractado, tendo o Governo Brasileiro já declarado que não poderia annuir deforma alguma áquelle Tractado. Com tudo convém tentar, se é possivel, estabelecer as nossas relações commerciaes com o Brasil, debaixo dos principios que se tem indicado. Mas devemos penetrar-nos da verdade da observação, que já aqui se apresentou, isto que será impossivel fazer um Tractado com qualquer Potencia estrangeira, exigindo della a concessão de certas vantagens, sem que pela nossa parte lhe concedamos um equivalente era outras vantagens. (Apoiados.) Sr. Presidente, á posição em que o nosso Paiz se acha offerece tanta facilidade para as communicações com o Brasil, por um lado, e com as Potencias da Europa pelo outro, que será de muita utilidade o vêr se é possivel concordar em estipulações, que convidem os Brasileiros a trazerem a Portugal os seus productos, e a fazer neste Porto um deposito delles, para daqui serem reexportados para outros Paizes. É esta mais uma razão de conveniencia para se concluirem as nossas negociações com o Brasil, porque tendo em consideração todos estes objectos, devemos esperar que se animará muito o nosso commercio.

Sr. Presidente, sim eu entrar nas particularidades relativas a esta negociação porque seria inopportuno, e poderia ser prejudicial, o promover uma discussão anticipada sobre a marcha que póde ter esta negociação, repetirei sómente, que uma vez que se não possam conseguir vantagens decididas para Portugal, por um Tractado com o Brasil, será necessario admittirmos o principio de reciprocidade para com elle tambem, a fim de não nos prendermos nas negociações com outras Potencias, e de fixarmos quanto antes as nossas relações commerciaes com Inglaterra. (Apoiados.)

O Sr. Barão do Tojal: — Sr. Presidente, o ponto é interessante, e todo o tempo que se gastar com a sua analyse não o dou eu por perdido, nem lhe chamarei desperdicio. (Apoiados.)

Eu tenho para mim como these, que os Tractados têem mais ou menos importancia na relação dos consumidores, que contêm o Paiz, com o qual se celebram, e quando eu considero que o Brasil por ora não encerra mais do que oitocentos mil consumidores, ou quando muito um milhão (porque á população escrava, de tres milhões não chamo eu consumidores dos nossos productos), não se póde justamente esperar que o consumo que o Brasil hade dar aos nossos productos e mercadorias, em concorrencia com os das mais Nações, seja tão grande ou tão importante, como muitos pretendem sustentar que o será; e digo mais que, ainda mesmo que alli se aos concedesse um favor ou differença nos direitos, nem o resultado por muitos annos seria extraordinario, nem as vantagens, quanto a mini, seriam iguaes ás que sacrificaríamos, collocando-nos na posição por um Tractado excepcional com o Brasil, de não podermos concluir Tractados de reciprocidade com outras Nações de capacidade muito mais vasta pela sua população, opulencia, e luxo, para o consumo dos nossos productos.

O sonho porém em que nós temos estado, de que poderiamos alcançar esse Tractado excepcional ou especial do Brasil; esse sonho, creio eu que acabou; porque ha outras, e grandes Nações commerciaes, que têem uma consideravel influencia no Brasil, como são a Inglaterra, França, e particularmente a Austria, que em razão das relações de familia, e sua cathegoria, a exerce alli superior, e muito superior a nós. A Austria pois tem desenvolvido, e continua hoje a desenvolver um espirito fa-