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DIARIO DO GOVERNO.

za de um Paiz em fabricar dentro de si tudo quanto se fabrica nos demais Paizes, para o tornar independente dos outros; (Apoiados.) isto não é possivel. Quem disser = eu quero vender, e não quero comprar, = diz um absurdo: e então sem que de maneira alguma me queira, possa, ou deva declarar contra o desenvolvimento de qualquer ramo de industria, direi que neste assumpto se erra muitas vezes ena Economia-politica, como em muitos outros. A mim affigura-se-me que mais facilmente se póde fabricar entre nós aquelle genero, para cuja producção temos meios melhores e mais faceis, do que outros Paizes: esta industria deve ser objecto de todas as nossas especulações e tentativas. Não me parece sensato o intento de nos tornarmos fabricantes, no supposto de que poderemos rivalisar em perfeição e barateza com as fabricas de Inglaterra. Não temos nem machinas, nem as materias primas, nem os habitos e conhecimentos que derivam delles, e gastaremos muitos annos de tirocinio para chegarmos á perfeição em que hoje se acham os trabalhos fabris em outras terras; mas sem que deixemos de especular em taes manufacturas, aproveitemos principalmente os meios de que a providencia nos dotou, a nós habitantes desta parte da Peninsula; desenvolvamos tambem a industria, para que temos os meios faceis, que podêmos aperfeiçoar, e cujos productos venderemos baratos aos que delles precisam, e que necessariamente nos hão de comprar, em troca de outros productos. Mais de uma vez muitos de nossos homens d'Estado esclarecidos e patriotas tem, para assim dizer, querido que o nosso Paiz fosse, invita Minerva, Paiz fabricante, de tal modo que a estrangeiros não comprássemos nada de seus artefactos. Sonhou-se então com estabelecimentos de fabricas, e que só o eram em miniatura; e para as sustentar nunca se fez mais do que pedir a prohibição da concurrencia com os estrangeiros nos mercados de Portugal. Todos sabem quão grandes são os inconvenientes de tal protecção, que sem duvida se deve dar, mas não directa é exclusivamente a certos ramos, com detrimento de todos os demais. Não entendamos que a nossa prosperidade virá de não comprarmos productos alheios, mas sim de trocarmos muitos valores dos nossos; e os nossos de grande e subido preço, e que podem aperfeiçoar-se e vender-se em concurrencia com todos, são os vinhos de Portugal, o seu azeite, as suas fructas, e o seu sal: este ultimo é uma grande riqueza, cujas materias primas são agoa e o sal com muito pouca mão de obra; producto que, pelo que nós vamos vendo, e o que o illustre Senador sabe, tem tido um augmento grandissimo ha dous annos a esta parte.

Eis-aqui o que eu entendo que se deve ter em vista quando se tracta de dar fomento á nossa industria; isto é, encaminhar o desenvolvimento della áquelles ramos em que podêmos ser superiores a outros Paizes. Neste sentido foi o Tractado de Methuen um incentivo da industria de Portugal. Diminuiram os productos de fabricas de lanificios; mas quanto augmentaram os das fabricas de vinhos? O caso não está em demonstrar a diminuição de um genero de trabalho e seu producto, está sim em comparar os proveitos geraes, ou as perdas em um e outro caso. Está demonstrado que a riqueza do Paiz augmentou com o augmento da cultura e fabricação dos vinhos; é pois injusto affirmar que o desenvolvimento dessa industria nos empobreceu, porque as manufacturas de lanificios decahiram. O certo é que desde esse Tractado obteve a exportação dos nossos vinhos grandissimo incremento; a riqueza que veio a Portugal por essa exportação, os capitaes que em consequencia entraram fizeram produzir os rochedos do Douro, povoar as suas montanhas, augmentar a bella Cidade do Porto, e enriquecê-la, e os seus beneficios se estenderam a todo o Paiz, que se entregou a uma industria de que tira grandes vantagens.

Tambem me não parece, pedindo a devida venia ao nobre Visconde de Sá da Bandeira, que devamos sempre argumentar de comparações, e buscar analogias, como se o que se pratica vantajosamente era um Paiz deva por isso produzir em outro os mesmos resultados. Já se disse, e mil vezes se repete, que as Pautas reguladoras dos direitos são necessarias, são indispensaveis em nossas Alfandegas. Esta materia não é nova em Portugal: ha mais de quarenta annos que se tracta de formar as Pautas. Trabalharam neste assumpto todos os Governos, mais ou menos absolutos, assim como os Constitucionaes. Nem Pautas tem relação alguma com a politica dos partidos que nos dividem, porém um delles apossou-se da feitura das ditas Pautas, e nella se forticou, levantando por seus jornaes um clamor grande, e desentoado para dar o partido opposto como declarado inimigo dellas. É pasmosa a facilidade com que os nossos jornalistas decidem sobre questões difficilimas, que no Parlamento se ventilam ás vezes com muita reflexão e madureza, e sentenceiam corrente calamo a uns de ignorantes, outros de perversos, áquelles de vendidos e corrompidos, porque não seguem as idéas de um escriptor, pela maior parte das vezes, só habilitado para calumniar magistralmente. Um dos recursos de que se serve um partido politico é este de attribuir as Pautas aos seus homens, e tornar os seus adversarios inimigos dellas, e de tudo quanto se entenda protecção á industria do Paiz. Recurso miseravel, por lhe não chamar atrocidade! Como levo dito, ha quarenta annos que se trabalha na formação de Pautas das Alfandegas: toda a gente sabe quaes obstaculos houve á sua execução; mas o negocio é grave: e sem offensa nem a individuos, nem á Nação, póde dizer-se que entre nós não são antigos os conhecimentos commerciaes. Por muitos annos entregues ao commercio com o Brasil, que tinhamos exclusivamente, poucos estudos eram necessarios para o fazermos proveitosamente. Esta historia é sabida, ninguem ignora como se amontoaram grandes fortunas, adquiridas por homens, que só possuiam a boa qualidade da perseverança, sem lhes ser necessario estudo algum. Viemos pois a formar as Pautas, objecto novo para nós, e se bem que os membros das Commissões encarregados de as fazer fossem homens muito dignos, e muito entendidos, mal se podia esperar que desde logo conseguissem fazer obra perfeita. Aconteceu o que acontece sempre, que os primeiros ensaios são defeituosos. Que devia pois, entender-se? Que o tempo, e a experiencia as iriam aperfeiçoando: mas succedeu o contrario. Valeu um triste preconceito de que o Governo por ser Governo era contrario á existencia de Pautas; e determinou-se, que nunca elle lhe podesse pôr a mão, para altera-las na parte mais insignificante — provisão desgraçada, que está em opposição a tudo quanto se pratica em outros Paizes. O Governo devia ter a faculdade de alterar alguns artigos para dar conta ás Côrtes do facto, e suas causas; porém o que se fez foi authorisar o Governo para pedir as alterações, como se fosse necessario conceder-lhe essa faculdade. Segue-se d'aqui mui grande desvantagem ao commercio, que todos os dias perde pela falta da authorisação que o Governo deve ter para decidir casos não previstos, ou decisões mal calculadas, sendo obrigado depois a dar conta do seu procedimento ao Corpo Legislativo. Só assim se póde proteger o commercio, que por característica principal tem a rapidez, e actividade em suas operações. Quem isto desejar nem se oppõe á existencia das Pautas, nem quer a ruina da Nação Portugueza; antes parece que o contrario se deve concluir. Em consequencia da minha observação, devo pedir licença ao nobre Senador para lhe dizer, que não é seguramente em consequencia dos direitos prohibitivos, que o Imperio da Russia tem pannos para vestir os seus soldados, mas em consequencia das fabricas, que tem suas, e por elle costeadas para esse fim: as suas circumstancias são especiaes; elle faz os pannos para o fardamento do seu numeroso exercito; assim como fabrica armas, e equipamentos, etc. etc. A industria fabril da Russia cresce, este Imperio faz em tudo grandes progressos, mas não em virtude de direitos prohibitivos, repito. Não será antes porque, desde longo tempo, todos os talentos estrangeiros podem alli naturalisar-se! Pela protecção que os seus Monarcas dão a todas as illustrações? É um Paiz aonde estrangeiros são Generaes, Ministros, Embaixadores, em uma palavra, tudo. É impossivel que não façamos o contraste entre este modo de vêr as cousas, e o com que se avaliam n'outros Paizes, Já assisti a uma discussão, sobre a venda dos Bens Nacionaes, na qual um partido politico, que se dava as honras de eminentemente liberal, queria excluida compra os estrangeiros, em quanto eu, havido então por meus adversarios como menos liberal, fazia votos porque viessem homens e mulheres industriosos fazer assento em nossa terra, toma-la por sua patria, e exercer nella a sua industria, enriquecer-se em uma palavra (Uma voz: — Tambem os Judeos?) Tambem os Judeos; e porque não? Talvez em primeiro logar: não sou inimigo delles, quem sabe se de algum sou parente! Quem lêr um calculo muito simples feito por Alexandre de Gusmão ha de ter muito receio de pronunciar a asserção contraria. (Riso.) — Porém, como dizia, com toda a verdade, o patriotismo da Russia não é este, a sua economia politica é generosa e grande.

Passando a outro ponto, digo, que o nobre Senador fez menção de uma palavra, que escapou a um Deputado Brasileiro, quando se, referia á Nação Portugueza, a que chamou nação de tres milhões de piolhosos, ou cousa similhante. Não significa isto cousa importante, nem acho que fosse muito a proposito repetir phrase tão baixa. Foi ainda um resto de indisposição que saíu da boca de um homem de não grandes espiritos: facilmente se lhe podéra responder com phrase de igual jaez, e talvez não mal apropriada, mas nem isto é offensa nacional, nem a Assembléa ou a Nação Brasileira se acham hoje animadas de sentimentos ião, ignobeis a nosso respeito. Quem assim fallou senão se arrependeu, é um miseravel, que julga que um torpe insulto vale como um argumento.

Considerando seriamente as nossas relações; com o Brasil, não me parecem ellas de tão pouco momento, por isso que longos habitos nos tem enlaçado com os seus habitantes, habitos que hão de durar por muitos annos, por isso mesmo que este commercio se faz mais, como se fosse entre Portuguezes e Portuguezes, do que entre Portuguezes e uma Nação estranha. Além disto, eu não olho só para os consumidores Portuguezes; eu considero que o nosso commercio com o Brasil póde ter muito mais considerações do que os de Portugal; e isto é objecto que merece a attenção do Governo, e nós podemos contar, (não sei, se me convem dize-lo na posição em que estou) que o. Governo do Brasil ha de convir comnosco, uma vez que saiamos dos limites do justo, não carecendo de apresentar-nos (como alguem nos, quiz figurar) de joelhos diante do Brasil, para que nos accuda para não perecer-nos de miseria. Não é verdade que estejamos em tão desgraçada dependencia, nem jámais démos idéa della. Os que nos culpam de não ter ainda feito Tractados, os que exageram tanto os inconvenientes de medidas tomadas no Brasil a respeito dos nossos vinhos, são pelo contrario os que procuram dar idéa da nossa necessidades de ceder mais do que é proprio e decente: o. Governo não tem esse pensamento, nem jámais, o terá. Eu considero que nos é vantajoso o commercio que fazemos com o Brasil, por muitas razões; sendo uma, como disse, o ser elle entre Portuguezes e Portuguezes. Os Inglezes vão fundar casas suas nos Paizes com quem negoceiam muito, e os nossos já as tem no Brasil, e boas, e muito justamente acreditadas. Não considero o Brasil na escala das Nações com quem devemos ter relações commerciaes; porque para nós aquelle Paiz está em situação excepcional. Todas as forças de um e outro lado tendem a firmar estas relações, que são vantajosas para ambas as partes; e seria demencia, em qualquer dellas, querer afrouxar os laços de interesse mutuo que nos unem por necessidades iguaes. (Apoiados.)

O Sr. Duque de Palmella: — Sr. Presidente, esta discussão tem sido muito dilatada, mas certamente não tem sido inutil, (Apoiado.) antes creio que se deve felicitar a Camara de ter apresentado (e talvez pela primeira vez depois que em Portugal ha Camaras Legislativas) o expectaculo de um debate no qual os dous lados desta Casa tem rivalisado, mas rivalisado em desejos de ser uteis, de esclarecer o Paiz, e de manifestar verdadeiro patriotismo, ambos isentos de idéas a pouca das e de ambições. (Apoiados.) Entretanto é indubitavel que a discussão tem divagado muito, nem rigorosamente se lhe, póde chamar discussão, tem sido uma especie de exame vago sobre todas as nossas relações politicas, e principalmente commerciaes com todo o Mundo: respeito muito o tempo da Camara para querer abusar delle, seguindo todos os Oradores que me precederam nas diversas questões que se tem tractado occasionalmente, nem vejo necessidade disso porque a maior parte dellas hão de vir a ser tractadas quando se tomarem em consideração os objectos especiaes a que muitos dos Preopinantes se referem todavia, e sómente de passagem, farei uma ou duas observações sobre o que se disse, principalmente a respeito do Brasil.

Observou com toda a razão o Sr. Barão de Tojal que não deviamos sacrificar as nossas relações com outros paizes, onde abundam mais os consumidores daquelles generos que nós em