O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1200

DIARIO DO GOVERNO.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: - Sr. Presidente, se o nobre Barão da Ribeira de Sabrosa carecesse de testemunhos em abono do que acaba de dizer ácerca da grande solicitude que lhe mereceu essa divida, imposta mais, ainda sobre o caracter nacional, do que sobre os bens nacionaes, (Entrou o Sr. Ministro da Fazenda.) se assim posso explicar a minha idéa; se elle como digo, precisasse já de algum testemunho, o meu seria o primeiro, porque na occasião em que S. Ex.ª tractou mais determinadamente desse objecto, me fez a honra de convocar-me entre outras pessoas cuja opinião consultou; eu sou reconhecido a esse signal de consideração. — Agora accrescentarei que a Administração actual não tem empregado menos diligencias para bem concluir este negocio; e porque vejo que o Sr. Ministro da Fazenda entrou, só me caberá dizer, que esta Administração procurando conciliar o desempenho da sua obrigação com a possibilidade dos seus meios, julga ter fortes motivos, para accreditar que haverá uma convenção para assegurar o pagamento aos credores a contento e annuencia delles e tão suavemente quanto é possivel para nós. Para terminar assim esta pendencia concorre a boa vontade que ha, em uma parte de pagar, e na outra de ser paga sem grande sacrificio do seu devedor. — Eis aqui tudo quanto posso dizer a este respeito, e deixo ao Sr. Ministro dos Negocios da Fazenda o dizer, o que mais ha de particular sobre este objecto, que no meu conceito deve ser satisfatorio para o Senado.

O Sr. Pereira de Magalhães: — Eu pedi a palavra não para impugnar a materia do paragrapho, que acho boa, mas para chamar a attenção do Sr. Ministro da Fazenda sobre alguns factos da Administração a seu cargo, que merecem exame e providencias.

Ha um clamor geral nos credores do Estado por falta dos pagamentos que lhes são dividos, e tambem é certo que ha falta de meios para effectuar esses pagamentos; mas esses meios escaceiam tanto mais quanto é o desleixo, que effectivamente existe na arrecadação da Fazenda; o Discurso da Corôa, no paragrapho a que este responda, promette providencias para se melhorar: mas medidas ha a tomar que não necessitam das promettidas propostas; e então eu vou apontar alguns factos sobre os quaes o Sr. Ministro podera dar providencias.

Ha em Lisboa Recebedores de Julgado para arrecadar as decimas, mas estes Recebedores creio que são logares imaginarios, que só apparecem no tempo marcado para a cobrança, e logo desapparecem, de que resultam graves males á Fazenda Publica; vou prova-lo com factos. — Um meu amigo tem uma propriedade em Lisboa, e incumbiu-me de fazer pagar as decimas, que devesse essa propriedade: mandei indagar quem era o Recebedor da respectiva Freguezia, e ninguem soube dizer quem era, Bem aonde morava; então esperei que se annunciasse a abertura do cofre; e por essa occasião perguntou-se ao Recebedor se recebia as decimas da referida propriedade pelos semestres passados? Respondeu-me que não tinha taes Roes, nem Ordem para as receber, e sómente recebia as tocantes ao semestre para que abrira o cofre. Instou-se segunda vez effectuar-se o pagamento; e respondeu que não tinha em seu poder papeis nenhuns a tal respeito, e o mais que podia dizer era, que esses conhecimentos tinham sido relaxados ao Poder Judiciario, e que se entendessem com o Solicitador da Fazenda; mas procurando-se este, disse que não tinha em seu poder taes conhecimentos: e o resultado de tudo isto qual é, Sr. Presidente? O estarem as decimas por pagar — e a Fazenda privada do seu producto. (Apoiados.) Ora, exemplos similhantes a estes ha muitos outros. (Apoiados geraes.) Eis aqui pois um dos muitos motivos donde procede, que o Thesouro não possa pagar o que deve; e é por isso que eu rogo a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Fazenda, que indague, se esses Recebedores de Freguezia são entes imaginarios, ou como os meteoros que apparecem e desapparecem: porque eu entendo que taes homens devem estar sempre com a sua porta aberta, para receberem os impostos áquelles que querem satisfazer as quotas, que lhes foram lançadas. A pratica actual é, pôr um Edital á porta da Igreja, a algumas vezes no Diario do Governo, que se abre o cofre por vinte dias; mas se um dia depois fôr alli qualquer pessoa para pagar, já não acha o Recebedor para receber. Ora, se o conhecimento fosse logo relaxado ao Poder Judiciario, o resultado seria favoravel á Fazenda; mas não acontece assim; a Fazenda não tam esse proveito, e o devedor fica sujeito ao capricho do Recebedor para ser, quando este quizer, intimado para pagar o capital com excessivas custas! (Repetidos apoiados.) Isto ninguem dirá que não é uma perfeita violencia feita aos contribuintes, sem utilidade para a Fazenda. A pratica de se assignarem os vinte dias; para o pagamento das decimas por meio do Edital nas portas das igrejas, e por aviso no Diario, é pessima: ha muita gente que de tal annuncio não tem noticia, porque não lê o Diario, nem costuma ir lêr o que se affixa nas portas da Igreja; outra porque ainda que quizesse não sabe lêr; outra porque são Senhoras despidas de relações, por meio das quaes podessem ter tal noticia; outra finalmente são viuvas, ou donzellas recolhidas, que nada sabem do que se publica nas Diarios, nem do que se affixa pelas esquinas: — e daqui resulta que todas essas pessoas são violentadas a pagar excessivas custas, porque não acudiram a pagar nos vinte dias de que não tiveram nem podiam ter noticia! (Apoiados geraes.) Para obstar pois á continuação de taes vexames, lembro um methodo que se reduz ao seguinte: — O encher o Recebedor todos os conhecimentos, sem os assignar, e manda-los a casa de cada um dos collectados, para avista delles irem pagar dentro do prazo, que se marcar no mesmo conhecimento quando forem pagar levam esse conhecimento, que antecedentemente receberam, pagam, e é então assignado nesse acto pelo Recebedor, e esta assignatura servirá de recibo: por esta fórma, que tenho por muito simples, creio eu, Sr. Presidente, que se evitarão muitissimas injustiças, que actualmente se estão fazendo, e que mais aggravam o mal, que os contribuintes já soffrem. (Apoiados.) Nós devemos empregar todos os meios possiveis, para diminuir ao povo o gravame, que sobre elle pésa, e como entendo, que este principio de justiça é conhecido de todos os illustres Senadores, nada mais direi a tal respeito.

Accrescentarei agora, Sr. Presidente, que é actualmente permittido por Lei, o fazer-se encontro nas decimas, quando o collectado é originario credor por titulos, que se denominam de = Divida Publica = nada parece mais simples, do que o credor chegar ao Recebedor da decima com o seu credito na mão, e dizer-lhe = eu sou o originario credor como provo por este Titulo, e venho para que se me faça o encontro na conformidade da Lei, no que devo de decima por taes propriedades = e o Recebedor fazer o encontro na presença do Titulo. Porém não é este o methodo que se manda observar: é preciso para isso requerer ao Thesouro, e depois de uma longa operação de informações, e respostas inuteis; porque tudo se reduz a saber, se o colectado é o originario credor, o que consta do Titulo que apresenta, apparece a decisão; mas acontece, que este demorado processo não se acaba dentro dos vinte dias, porque se abriu o cofre para se effectuar o pagamento, gasta mezes, e quando o credor obtem a decisão do seu negocio, e se apresenta com ella, (ainda que seja um dia depois dos vinte), já o Recebedor não existe, nem o cofre, e o credor fica sujeito sem culpa sua, a soffrer uma penhora do Poder Judiciario, e tem depois que pagar avultadas custas!!! O que eu acabo de dizer corrobora-se com um exemplo, que eu vou apontar, e vem a ser; que sei haver muitos credores, que requereram ao Sr. Ministro da Fazenda similhantes encontros, ha mais de tres mezes, e até hoje não obtiveram ainda solução sobre o seu pertendido encontro: ha porém uma cousa favoravel aos pertendentes, e vem a ser, que as suas dividas não foram ainda relaxadas ao Poder Judiciario: mas se o tivessem sido já, não estavam elles obrigados a pagar o principal, e avultadas custas? Certamente: e tambem é igualmente certo, que isto é a maior das injustiças. — Chamo pois á memoria do Sr. Ministro da Fazenda este objecto, para que o tenha em toda a consideração, e prouva de remedio.

Agora, Sr. Presidente, farei outra observação, e vem a ser: quando se entrega dinheiro a um particular como depositario delle, e este depositario dispõe do dinheiro a seu arbitrio, e delle não dá conta, commette um crime, que pelas nossas Leis é gravemente punido; e a esse infiel depositario dá-se um nome muito máu: mas quando o Governo faz o mesmo eu não me atrevo a dar-lhe o nome.... O certo porém é, Sr. Presidente, que algumas heranças de pessoas que falesceram no Ultramar, devendo pela Lei entrar no Deposito Publico, entraram (não sei porque) no Thesouro, e este dispoz dellas: vieram depois os herdeiros requerer que se

lhes entregassem, obrigaram-nos a fazer justificações dispendiosas, mas depois de tudo isto não se lhes restituíram essas heranças que são suas! Porém eu noto que nem no Relatorio dos Srs. Ministros, nem nas suas propostas, se lê uma só idéa que tenda a pedir meios para pagar essas heranças: o que eu esperava vêr em attenção a ser uma divida sagrada, ou antes uma restituição; porque não é nada menos do que entregar a seu domno o que é seu, a sua propriedade, na qual por motivo nenhum se devia pôr mão. — É por estes fortes motivos, que eu peço a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Fazenda, que empregue todos os meios para que taes dinheiros sejam sem demora restituidos, e se entreguem a quem de justiça o devam ser. (Apoiados.)

Ainda chamarei a attenção de S. Ex.ª sobre outro ponto. — É conhecida de S. Ex.ª certa operação que se fez para extinguir o papel-moeda, de cuja operação senão tirou o proveito desejado, e della só resoltou o ficarem na mão dos particulares mais de dois mil contos de réis, os quaes vieram a estas mãos em troco de moeda corrente nas suas transacções. Ora, lendo eu o Relatorio do Sr. Ministro da Fazenda, não encontro nelle uma só palavra, sobre meios de indemnisar os particulares desta inorme quantia, que está em seu poder, quasi sem valor nenhum; por quanto, ainda que na folha commercial vem com o valor de 40 por cento, nem esse mesmo tem; porque, se apparecessem no mercado tres ou quatro contos de réis para vender, não se achará quem os tome: cem, ou duzentos mil réis, haverá quem os tome, porém maior quantia de certo não. Digo pois, que dous mil contos de réis na mão dos particulares devem ser retirados, e o Governo deve empregar para isso medidas muito promptas. (Apoiados.) Este dinheiro foi para um emprestimo nacional, que tem hipothecas nacionaes, e que ainda hoje existem, e a Junta do Credito Publico está com elle pagando outras obrigações. Este emprestimo é de uma natureza muito mais sagrada do que qualquer outro; porque além de ser um emprestimo como qualquer outro, ás suas Apolices deu-se curso forçado, como moeda legal; e na minha umilde opinião entendo, que ainda que se extinguisse o dinheiro de papel, como moeda não se lhe podia tirar a naturesa d'Apolices de um emprestimo, para se pagarem os seus juros pelos rendimentos que lhe estavam consignados. (Apoiados.) Mas agora não se tracta disto; o que eu quiz sómente foi chamar a attenção do Sr. Ministro da Fazenda, para que preponha meios de se resgatar, quanto antes essa, enorme somma de papel moeda, que está na mão dos particulares como é de Justiça? é verdade que S. Ex.ª me podera responder que as actuaes circumstancias em que está a Fazenda Publica, o não permittem: mas eu direi que permittem, e permittem ainda muito mais, Sr. Presidente, o caso está em cortar muitas despezas superfluas e desnecessarias, que se fazem e de grande inutilidade. (Apoiados geraes.)

Aqui ficarei, Sr. Presidente, e nada mais digo por agora, porque outra melhor occasião espero ter para o fazer.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Sr. Presidente, principiarei por responder ao illustre Senador que acaba de fallar, dizendo que não cabem ao Governo as censuras que lhe dirigiu, nem tem a culpa que suppõe nas irregularidades que apontou. Diz o illustre Senador que os cofres das decimas não estão abertos o tempo necessario, o que não só produz o atrazo de arrecadação que existe desde 1837, mas engana os collectados e os obriga a serem executados. Não creio que isto seja assim; antes me parece que se cumpre o que a Lei recommenda: depois dos lançamentos feitos e mandados cobrar abrem-se os cofres por tempo determinado, mas os collectados na generalidade não se lembram nem se occupam de ír examinar as quantias em que foram lançados, e só o sabem quando os Officiaes lhe batem ás portas para lhas pedir. Isto é o que na realidade succede, e todos nós que somos proprietarios o sabemos, porque assim nos tem acontecido. — O Governo procura remediar os gravissimos inconvenientes, que se tem ponderado, e deseja impedir que os contribuintes paguem de facto quasi dobradas contribuições em consequencia das custas que lhe cressem. (O Sr. Barão do Tojal: — Apoiado.) E para esse fim tenciona, propôr ás Camaras uma Lei difinitiva de lançamento e arrecadação da decima. A Administração anterior já teve isto mesmo em vista, e nomeou uma Commissão, de que tive a hon-