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DIARIO DO GOVERNO.

CAMARA DOS SENADORES.

Sessão de 17 de maio de 1839.

(Presidencia do Sr. Duque de Palmella.)

TRÊS quartos depois do meio dia começou esta sessão; presentes 39 Srs. Senadores.

Leu-se e foi approvada a acta da anterior.

Distribuiram-se exemplares impressos das — Representações endereçadas às Côrtes Geraes da Nação Portuguesa, na sessão de 1839, pela sociedade pharmaceutica lusitana.

Passando-se á ordem do dia, foi lido o parecer da Commissão de Administração apresentado em sessão de 10 do corrente) sobre a proposta em que o Sr. Barão do Tojal requer que se recommende ao Governo, que pelos meios competentes faça effectiva a responsabilidade em que possa ter incorrido a commissão inspectora do Terreiro pela não execução da lei — o Decreto de 16 de Janeiro de 1837— (V. Diario N.º 117, a pag. 695, col. 2.ª) A Commissão conclue com o seguinte

Projecto de lei.

Artigo 1.º Os generos cereaes que forem exportados de porto de Lisboa, ainda que tenham dado entrada no Terreiro Publico, para outros portos portugueses, serão isentos do pagamento de direitos, seja qualquer que fôr a sua denominação ou applicação.

Art. 2.° Fica expressamente revogado para este fim o regimento, a mais legislação por que se regule o Terreiro Publico de Lisboa, e a de mais em contrario.

Sala da Commissão, em 10 de maio de 1839. = Barão de Villa Nova de Foscôa = Barão de Prime = Felix Pereira de Magalhães = Agostinho Pacheco Telles de Figueiredo = Manoel de Castro Pereira de Mesquita.

A Commissão de Legislação conforma-se com este projecto. Casa da Commissão, 10 de maio de 1839. = Manuel Duarte Leitão = Bazilio Cabral = Agostinho Pacheco Telles de Figueiredo = Venancio Pinto do Rego Cêa Trigueiros = Felix Pereira de Magalhães = Francisco Tavares d'Almeida Proença = Visconde de Laborim.

Estando presente o Sr. ministro da Fazenda teve a palavra e disse

O Sr. Visconde da Porto Côvo: — Sr. Presidente, é muito fraco o meu clamor para o levantar contra o projecto em discussão, por isso que vejo nelle assignados todos os conspicuos illustres membros da Commissão de Administração Publica, e da de Legislação; mas apesar d'isso o meu dever clama mais alto; e por isso não quero que se ignore a minha opinião em um negocio de tanta transcendencia e consideração, e por tanto direi algumas palavras a respeito do projecto em discussão.

O projecto em discussão consiste em que todos os generos cereaes, ainda tendo estado no Terreiro Publico, que forem exportados, sejam isentos de direitos, ou d» qualquer imposto, seja elle da denominação que fôr. A carta de lei de 31 de março de 1837, determinou que cada alqueire de trigo, que fosse importado para os portos de Lisboa e Porto, pagasse um vintem de direito; que o trigo mole por cada alqueire, além do tostão que já pagava, pagasse mais 60 réis; e determinou que todos os cereaes de qualquer natureza que fossem, ou do Algarve, ou das ilhas adjacentes, que entrassem no letreiro pagassem 10 réis, ou em qualquer outro porto do Reino. E para que foi lançado este imposto? Foi para servir de hypotheca especial, e para augmento da dotação da Junta dos Juros, a fim de pagar os juros e distracte de um emprestimo que então o Governo foi obrigado a contrahir; que sendo auctorisado para quatro mil contos, apenas o contrahiu de dous mil; e, se bem me lembro, aqui ao meu lado se assenta o illustre Senador que referendou esse decreto; logo sendo esta a applicação d’aquelle imposto (torno a repetir) para pagamento dos juros e distracte, perguntarei eu agora, está pago o capital d'esse emprestimo? Ninguem me responde que sim; e não havendo quem me responda, segue-se que o emprestimo não está pago; e em consequencia se esta Camara consignar este principio irá atacar a fé dos contractos, irá diminuir a dotação applicada para aquelles fins, e irá offender a confiança daquelles, que emprestaram o seu dinheiro ao Governo; e por estas, razões ou não podia deixar de pedir a palavra a fim de manifestar o meu voto. Agora olharei a questão por outro lado: tendo determinado a lei de 31 de março de 1837 que todos os cereaes pagassem este imposto, segue-se que passando esta lei ella importava uma lei em excepção, porque todos os cereaes exportados pelo porto de Lisboa ficavam isentos de um direito, ao mesmo tempo que todos os cereaes do Reino vindas a Lisboa são condemnados a pagar esse imposto; e nesse caso é uma lei de excepção que se não compadece com um Governo constitucional. Eu não quero pela minha parte consentir em que fique vogando a lei em favor dos cereaes que se exportarem pelo Téjo, e não tenham a mesma excepção os que se exportarem por outros portos do Reino. Estas razões convenceram-me a manifestar a minha opinião, ainda que ella não seja adoptada, vou com o meu voto a par da minha convicção; nem mesmo espero que esta lei passe n'esta Camara, porque não espero vêr que a Camara esteja em contradicção comsigo mesma; ainda antes de hontem se sanccionou no 3.º artigo do projecto da refórma do Terreiro, que nenhum dos cereaes que entrassem no Terreiro, e que se exportassem deixariam de pagar o direito da vendagem; e toda a Camara foi de voto que se não podia dispensar este imposto, e aquelle que é applicado para a dotação da Junta do Credito Publico.

O Sr. Pereira de Magalhães: — Este projecto foi apresentado sobre um requerimento do Sr. Barão do Tojal; e eu creio que á primeira cousa que se deve fazer, é lêr o parecer da Commissão, porque elle traz os motivos, em que se funda o projecto.

O Sr. Visconde de Porto Côvo: — Eu fallei sómente do projecto, porque não vi impresso parecer algum.

O Sr. Telles Caldeira: — Eu só agora é que tenho conhecimento exacto do parecer que acaba de lêr-se; porque o não vi impresso; e por causa da minha molestia que a Camara sabe muito bem que foi prolongada, e ainda hoje a minha saude não -é muito boa. Sendo eu membro da Commissão de legislação não tive parte no parecer, e é com muita repugnancia que fallo nesta occasião contra elle; pois que me custa separar da opinião dos meus collegas.

A lei de que se tracta é tão clara que não admitte duvida para que seja necessario interpretação; a razão que se dá para o projecto de lei, é porque a commissão do Terreiro duvida cumprir a lei existente, e a commissão a não devia interpretar, porque isso pertence ás Côrtes tão sómente. A lei não é duvidosa, porque; diz: (leu). Será o trigo producção nacional Ninguem me dirá que não; logo os cereaes estão comprehendidos. Diz-se; mas a lei só tractou das alfandegas, porque nestas é que se pagam os direitos de consumo, e o que se paga tio Terreiro não são direitos de consumo. A isto respondo eu com a discussão de antes de hontem era que os Srs. da Commissão de Agricultura disseram que os 20 réis eram direito de consumo: diz a Commissão que o Terreiro é regulado por leis especiaes, e que estas leis não foram revogadas; embora tenha o Terreiro leis especiaes, quando uma lei se expressa em termos genericos, está claro que comprehende não só as especialidades, mas a generalidade; e muito me admira que os meus collegas digam isto, porque não ha lei nenhuma que derrogue com especialidade as leis anteriores em contrario. O nobre Visconde de Porto Côvo disse que isto ía atacar a lei que se tinha feito antes de hontem, Votando 20 réis de vendagem; mas se o genero não se vende, nem se consome neste porto não se ataca de fórma alguma a lei, nem póde ser obrigado a este direito o genero que se exporta. — Resumindo digo que a lei de 1837, é expressa e não precisa do interpretação, e se precisa interpretação deve dar-se-lhe sem fazer uma lei nova, pois que isto que está neste projecto, lá esta na lei de lê de janeiro de 1837.

O Sr. Visconde de Porto Cervo: — Eu aproveitarei a palavra para explicar uma idéa, em que não fui bem entendido pele Sr. Vellez Caldeira. Eu não fallei do imposto dó genero que se consumisse em Lisboa, nem á lei és 31 de março o diz; porque ella diz que todos os generos cereaes de qualquer parte do Hei rio purgarão 10 réis para a dotação da Junta dos Juros, os elle» entrem no Terreiro, ou em outro qualquer porto do Reino; e dizendo isto, eu não quiz deffender que os generos cereaes só pagásseis quando fossem consumidos em Lisboa; disse sim, que não podia consentir em que os trigos vindos das provincia viessem pagar 10 réis, quando os que sahissem pela foz do Téjo, não pagassem; e que entendia que a lei era de excepção, e que se não compadecia com o sistema constitucional.

O Sr. Pereira de Magalhães: — A discussão dada para andem da dia de hoje tem duas partes; a primeira versa sobre o requerimento do Sr. Barão do Tojal, a segunda é relativa ao projecto de lei offerecido pelas Commissões de Administração Publica e de Legislação: quanto á primeira pediria eu que se reservasse até que o Sr. Barão estivesse presente; e direi alguma cousa pelo que respeita á segunda, principiando por responder ao Sr. Vellez Caldeira, e respondendo depois ao Sr. Visconde de Porto Côvo.

Verdade é que o decreto de 16 de janeiro de 1837 estabeleceu a regra geral de que todos os productos de agricultura, industria, os manufactura portugueza, que fossem exportados de uns para outros portos portuguezes, não pagassem direito algum; mas esta lei não foi cumprida pelo Terreiro pelas tres seguintes razões: primeira, porque ella não revogou expressamente o regimento ao Terreiro, que em um dos seus artigos impõe um vintem em alqueire dos cereaes pelo facto da sua entrada alli (o regimento chama a este direito de vendagem, o eu não sei que se lhe possa chamar outra cousa em vista do que a lei diz): segunda razão, dada pela commissão do Terreiro, porque a lei lhe não foi remettida para a executar: a terceira, porque foi publicada pelo ministerio da Fazenda e o Terreiro está debaixo da inspecção do Reino. — Nem o Terreiro, nem a praça de Lisboa entenderam que aquella lei era applicavel aos cereaes entrados no Terreiro, decorrendo quatorze mezes desde janeiro de 1837 até março de 38, o Terreiro continuou percebendo os direitos; circumstancia esta que reforçou a opinião da commissão inspectora. Em 14 ou 15 de março de 1837 foi expedida uma portaria pelo ministerio do reino para que o Terreiro cumprisse a lei, o Terreiro cumpriu-a e começou a dar despacho aos generos exportados para os portos portuguezes sem exigir direito algum; depois d'isto houve a reforma do Terreiro, instaurou-se a commissão inspectora, e logo que chegou á sua noticia aquella portaria, determinou ao administrador que a não cumprisse: appareceu então pela primeira vez a duvida que até esse tempo não existia. Alguns negociantes requereram ao Governo para que obrigasse a commissão inspectora a cumprir aquella portaria, o Governo ainda nada havia decidido a este respeito, até que appareceu a proposta do Sr. Barão do Tojal, apresentada com o fim de se recommendar ao Governo fizesse effectiva a responsabilidade d'aquella commissão, por não ter dado andamento áquella lei. Esta proposta foi remettida ás Commissões de Administração, e á de Legislação, e ahi se ponderaram todas estas circunstancias, examinaram-se todas as leis respectivas ao negocio, examinaram-se as respostas dadas pela commissão do Terreiro; tudo se via com a maior madureza e circumspecção: o resultado foi assentar-se neste parecer.

Pela minha parte julgo-o bem fundado, por que o decreto de 16 de janeiro de 1837 diz no seu preambulo, que para evitar que a alfandega das Sete Casas, e a alfandega grande de Lisboa não continuem a exigir direitos de consumo dos generos de producção, manufactura e industria nacional, que se exportarem de Lisboa para outros portos do Reino, etc. Já se vê que o que o legislador teve em vista foi, que todos os generos de producção, manufactura, ou industria portugueza, sendo exportados de uns para outros portos nacionaes ficassem isentos de direitos, uma vez que se despachassem nas duas alfandegas; mas o Terreiro Publico nem é alfandega grande, nem Sete Casas: além d'isto o decreto não tracta do direitos de vendagem, que são os que se pagam no Terreiro, mas de consumo. Disse um illustre Senador, respondendo aos argumentos da Commissão inspectora, que pela formula geral = ficam revogadas todas as leis em contrario = ficavam tambem revogada o regimento do Terreiro: a pratica é outra, Sr. Presidente, e o illustre Senador, o Sr. Caldeira, sabe muito bem que até pela ordenação todas as leis de que se não faz expressa menção não ficam revogadas, e muito mais nesta lei… E então parece que se esta lei comprehendesse os generos que dão entrada no Terreiro, devia revogar o seu regimento, e ser expedida pela secretaria do Reino, e não pela fazenda. Por estas circuns-