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DIARIO DO GOVERNO.

Não tardou muito tempo, que estes passassem descendo a Calçada da Estrella em tropel repetindo aquelles gritos, que só são o meio de encubrir os seus fins. Quem não sabe que estes vivas são palavras com que os anarchistas costumam illudir os incautos, emquanto não tem prompta a mina que preparam debaixo do Throno, para lhe lançar fogo! (Apoiados.) Dão-se vivas á Rainha, e á Constituição, e devemos ficar descançados, quando estas palavras só sahem da bocca e não partem do coração, quando os factos tem mostrado constantemente que não se quer a Rainha, nem a Constituição? (Apoiados.) Tendo pasmado os revoltosos, fui para minha casa, aonde soube que tinha sido detida outra pessoa, que passava na sua carroagem no largo da Estrella, que a tinham feito apear, e que tinham procurado tirar-lhe os machos. Mas achando-te entre os revoltosos um individuo que a conheceu, offereceu-se para a acompanhar a alguma casa proxima. Indicando-lhe a minha, trouxe-a até alli, mas recomendou-me que não ficasse nella, porque não estava nella segura; donde se infere bem claramente, que depois de verificada a revolução, ainda havia outros projectos. Se isto é ordem, Sr. Presidente, não sei então o que seja desordem. (Apoiados.)

Um criado que tinham mandado de minha casa, para saber se havia mais algum movimento no centro da Cidade, voltou pouco depois, informando-me que tendo sido encontrado por alguns dos amotinados, que o quizeram detêr, lhe podera escapar, mas que fôra depois detido por uma patrulha de um regimento, que tendo verificado, que não fazia parte dos revoltosos, lhe recomendara que se recolhesse a sua casa. Vê-se pois que a desordem estava inteiramente do lado daquelles, e que a ordem existia nas medidas tomadas pelo Governo, e nos Corpos Militares da Capital. Sr. Presidente, depois de tudo o que se tem presenciado neste Paiz, do que se tem escripto, e do que se está passando, não se póde desconhecer que devemos procurar dar força ao Governo para manter a ordem, e sustentar a Rainha e a Constituição, porque se isto se não fizer se repetirão os desacatos contra tão sagrados objectos; e o resultado é obvio, Sr. Presidente. Muito se dizia a favor e em louvor da Carta Constitucional e ella desapareceu. Tambem a Constituição desaparecerá apesar dos vivas que se lhe dão, se não se cohibirem e castigarem estes excessos. (Apoiados.)

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Sr. Presidente, é justo que eu dê ao nobre Barão da Ribeira de Sabrosa um esclarecimento que elle não tem. — O Official Commandante do Corpo a que S. Ex.ª se refere, não commanda actualmente esse corpo, porque está com licença da Junta; é o seu immediato quem effectivamente está commandando; e se esse official immediato fosse encontrado, poderia merecer bem a nota de S. Ex.ª. Por esta parte ficamos entendidos.

A respeito da desordem com ordem, tambem entendo o nobre Barão optimamente: os homens appareceram no peior logar que podiam escolher, e fizeram o peior que para si podiam fazer, porque se foram metter em posição donde não poderiam facilmente sahir. A certos factos aos quaes embora se applique a palavra ardem que elles sempre suscitarão a idéa de desordem em todos aquelles que imparcialmente os avaliarem. Ora chame-se ordem ao proceder dos amotinados que foram correndo por essas ruas dando vivas ao seu modo; e repare-se que ao mesmo tempo se affixavam nas esquinas das ruas da Cidade baixa listas dos individuos que deviam ser assassinados davam-se vivas e caminhava-se ao Arsenal cujas portas foram arrombadas, e donde se levaram, armas para distribuir á multidão sediciosa, o que se effeituou tanto quanto foi possivel, e por todo o tempo que para isso houve. Pesados bem estes factos diga-se embora neste motim de sediciosos houve ordem; e o Governo faz mal em declarar-se contra tal ordem.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Depois do que se tem dito, e não estando a materia em discussão, porque aquillo de que se tracta é um objecto inteiramente differente, que creio já bastante esclarecido para se poder tomar a deliberação que cumpre á Camara sobre -continuar ou não continuar a Sessão, talvez eu não devesse accressentar uma palavra mais: mas, Sr. Presidente, a honra que me cabe de ter um assento nesta Casa, e de estar á testa da Repartição da Guerra, na occasião em que os Corpos do Exercito acabam de apresentar um modêlo de subordinação, de disciplina e de ordem; n'uma crise tão extraordinaria, em que um punhado de revolucionarios ousou tentar a perturbação de uma capital inteira, e manchar o bom nome desse Exercito: penso, Sr. Presidente, que ainda que já previnido pelo meu nobre collega o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, que explicou á Camara tudo aquillo que tinha chegado ao conhecimento do Governo, o que S. Ex, fez, como é seu costume com uma clareza tal que me não é dado imitar muitas vezes; devo com tudo em honra dessas Tropas, e para que ellas saibam que eu neste recinto, onde, como diste, me cabe a honra deter um assento, lhos fiz a justiça que ellas merecem, e tractei d; fazer conhecer á Camara que certamente Tropas que se conduzem deste modo são credoras de que o seu comportamento seja trazido ante o Corpo Legislativo para que elle pense sobre a consideração em que o deve ter, na certeza de que o desejo que ellas tem de merecer essa consideração sei que é aquillo que mais ambicionam. No meio do tumulto da noite passada, não houve um só acontecimento, da parte das Tropas da guarnição desta Capital, que podesse causar o menor dissabor ao Governo, ou aos habitantes de quem ellas são a natural protecção.

Nestes termos, sem dar explicações a respeito de factos particulares, que ficarão para a discussão da materia, refiro-me ao que disse o meu nobre collega, a respeito do Commandante que foi encontrado: accrescentarei que elle não estava em serviço, por estar tractando da sua saude, e recolhia para casa de sege, e o Governo não podia fazer mais do que evitar que se desenvolvesse o germen da desordem, e os factos provaram que o Governo tinha tomado as medidas mais fortes e apropriadas, pois que apesar de se terem arrombado as portas do Arsenal do Exercito, apesar dos revoltosos se haverem apoderado de armas, e munições, a tranquillidade publica foi logo restabelecida; e para que continue a não ser perturbada, é que o Governo apresentou na outra Casa a Proposta que lhe parece dever discutir-se em ambas as Camaras com urgencia, a cujo respeito o Senado provera em sua sabedoria, quando a mesma Proposta aqui chegar, como o julgar justo.

O Sr. Visconde de Laborim: — Sr. Presidente, este negocio é gravissimo, e como tal demanda toda a meditação, e repetidas providencias opportunamente adequadas; e por isso eu requeiro que nos constituamos em Sessão permanente, e não saiamos d'aqui sem se decidi a Proposta do Governo, e para esse fim seria conveniente que a Sessão fosse adiada até ás quatro horas da tarde. (Apoiados)

O Sr. Presidente: — Não tenho duvida em pôr a votos a moção do Sr. Senador, mas peço licença para antes disso observar a S. Ex.ª o que me consta acometer na outra Camara; ainda que não é muro parlamentar tractar aqui do que se passa naquella Casa, com tudo n'uma occasião tão extraordinaria, é inevitavel que os dous Corpos co-legislativos tenham algum contacto: a outra Camara levantou a Sessão por uma hora; agora são tres, e por tanto nada fazia o Senado em adiar os trabalhos sómente por uma hora: conseguintemente creio que seria mais conveniente que o adiamento fosse até ás cinco horas.

O Sr. Visconde de Laborim: — Eu convenho inteiramente no que V. Ex.ª acaba de dizer.

Consultada a Camara resolveu declarar-se em Sessão permanente, que ficaria adiada até as cinco horas da tarde de hoje. Sendo quasi tres, disse

O Sr. Presidente: — Está interrompida a Sessão.

Ás sete horas se reunio novamente a Camara, e disse

O Sr. Presidente: — Continua a Sessão. E continua sómente para o fim de declarar á Camara que me constou não seria possivel discutir-se esta noite a Proposta que foi apresentada pelo Ministerio na outra Camara; neste mesmo accôrdo estão os Srs. Ministros da Corôa: por consequencia para conciliar essa necessidade inevitavel em que nos achâmos de deferir ainda os trabalhos com a resolução pela qual a Camara se declarou em Sessão permanente, diremos que a Sessão continua a ficar adiada para ámanhã.

O Sr. General Zagallo: — Parecia-me que era melhor dar por concluido o adiamento desta Sessão. O Senado reune-se ámanhã como de ordinario, e não sabendo nós quando a outra Camara acabará de discutir a Proposta do Governo, é claro que se vimos para aqui, só para esperar por ella, havemos por força perder tempo: por tanto, parecia-me que a Sessão ámanhã começasse tractando os objectos que se acham dados para ordem do dia, e logo que da outra Camara chegar o Projecto por que se espera, immediatamente passaremos a tractar delle. Faço esta observação com o fim de se aproveitar tempo: já hoje perdemos um dia que se poderia ter empregado na discussão de algum dos objectos pendentes, e se amanhã ficarmos sem fazer nada até ao momento quo nos seja enviado o Projecto, que se espera, é provavel que continuemos ainda perdendo muito tempo.

O Sr. Presidente: — Eu queria sustentar a decisão da Camara; com tudo tomarei a liberdade de observar ao Sr. Senador que a Sessão de hoje não foi perdida, porque ella não teria logar a não ser este incidente; e em quanto á possibilidade de não estar cá o Projecto ámanhã, nada embaraça, porque podem os trabalhos principiar por outro qualquer objecto.

O Sr. Leitão: — Queria dizer o mesmo que V. Ex.ª acaba de observar: póde a Sessão principiar uma ou duas horas mais cêdo; creio que o Sr. Zagallo não terá duvida nisto.

O Sr. Visconde de Laborim: — De ficar a Sessão adiada para ámanhã ás dez horas não se segue prejuizo algum: a Camara dos Srs. Deputados declarou-se em Sessão permanente, é de esperar que finalize esse trabalho; e finalizado elle chega a tempo de ser aqui discutido: o mais é fazer questão de palavras.

O Sr. Presidente: — Vejo que não ha opposição, antes parece que todos estamos de accôrdo. — A Sessão continuará ámanhã ás dez horas da manhã; e se ainda não tiver chegado o Projecto da outra Camara, tractar-se-ha dos objectos que se acham dados para ordem do dia. Está interrompida a Sessão.