O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 83

83

DO DIARIO DO GOVERNO.

43.ª Sessão, em 4 de Setembro de 1840

(Presidencia do Sr. Duque de Palmella.)

Sendo aberta a Sessão, á uma hora e tres quartos da tarde, verificou-se a presença de 43 Srs. Senadores.

Leu-se a Acta da Sessão precedente, e foi approvada.

Mencionou-se um Officio pelo Ministerio da Guerra, incluindo duas Copias dos Mappas comparativos das medidas dos solidos e liquidos entre Lisboa e differentes Terras do Reino em que se acham estabelecidos Depositos de Viveres, pertencentes ao Commissariado do Exercito. — Passaram á Commissão Especial de Pesos e Medidas.

O Sr. General Zagallo: — O Sr. Carretti me pede participasse á Camara que não póde assistir á Sessão, impossibilitado por negocios urgentes.

O Sr. Secretario Machado: — Apresento tres Representações das Juntas de Parochia, e varios Cidadãos das Freguezias de Nossa Senhora da Graça dos Envendos, de Nossa Senhora da Visitação da Villa de Belver, e de S. João Baptista do Carvoeiro, todas do Concelho de Mação; igualmente tres Representações dos Escrivães dos juizes de Paz das ditas Freguezias contra a Proposta do Governo, apresentada na Camara dos Deputados, relativamente a retirar-se a administração Orphanologica aos Juizes de Paz; e os Escrivães pedem igualmente serem indemnisados no caso de se approvar o Projecto.

Ficaram reservadas para serem opportunamente remettidas á Commissão que houver de se occupar do referido assumpto.

O Sr. Miranda, Relator da Commissão de Fazenda, leu e mandou para a Mesa o seguinte

Parecer.

A Commissão de Fazenda examinou o Projecto de Lei remettido pela Camara dos Deputados, em que é garantido e aliançado o pagamento de um mez, pelo menos, em cada trinta dias a todas as classes activas e não activas a cargo do Thesouro.

A Commissão, considerando que da approvação deste Projecto de Lei resulta um grande beneficio para todos aquelles que são obrigados a rebater os seus Titulos ou Recibos, e de parecer que este Projecto deve ser approvado. Casa da Commissão 4 de Setembro de 1810. = Visconde do Sobral = Barão do Tojal = José Cordeiro Feyo = Luiz José Ribeiro = Manoel Gonçalves de Miranda.

Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo 1.º É garantido e afiançado o pagamento de um mez de vencimentos, pelo menos em cada trinta dias, a todas as classes activas, j e não activas do Estado, segundo a ordem estabelecida desde a ultima interrupção nos pagamentos.

Art. 2.º O Governo applicará qualquer excedente de receita que o Thesouro Publico produzir, á diminuição do atrazo destes pagamentos, a contar da referida ultima interrupção, a fim de que se possa ir gradualmente vencendo o mesmo atrazo com perferencia, a respeito das classes em que fôr maior.

Art. 3.° Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes em 1 de Setembro de 1040. = João de Sousa Pinto de Magalhães,

Presidente = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario = João Elias da Costa Faria e Silva, Deputado Secretario.

O Sr. Miranda: — Attenta a simplicidade da materia, e a sua reconhecida urgencia, eu pediria á Camara que decidisse hoje mesmo o Projecto que se acaba de lêr. (Apoiados.)

O Sr. Cordeiro Feyo: — No Diario do Governo appareceu um annuncio em que o Banco do Lisboa dá a entender, que se propõe a descontar os soldos aos Officiaes do Exercito e Armada: apesar de terem passado poucos dias, tem-se espalhado a noticia de que aquelle estabelecimento já não está na mesma intelligencia a este respeito, o que deu causa a que já hontem os recibos daquellas classes foram descontados particularmente a 15 por cento. Por tanto o Banco de Lisboa, que vai fazer outro annuncio declarando que vai descontar os mezes de Agosto e Setembro, com razão exige uma garantia na ordem regular dos pagamentos de que se encarrega. Não sei se o bem publico leva o Banco muito além do que talvez deveria, mas o desejo de beneficiar aquellas classes foi o que prevaleceu no animo dos seus Directores. (Apoiados.) Eu fazia tenção de apresentar dous additamentos a esta Lei, mas reduzi-los fiei a uma proposta especial, para que senão retarde o maior bem que se possa fazer a estes individuos.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Creio que o Banco desconta a todas as classes, activas e não activas....

O Sr. Cordeiro Feyo: — Esta Lei não provém de contracto algum que se fizesse com o Banco; elle vai sómente descontar, por ora, a algumas classes porque não tem fundos sufficientes para descontar a todas.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Eu pensava o contrario: enganaram-me os bons desejos:

Não se fazendo outra observação, resolveu a Camara que dispensava a impressão do Projecto, e a sua discussão na generalidade, a fim de se tractar logo de cada um dos Artigos; os quaes foram successivamente lidos, e ficaram approvados sem debate.

O Sr. Vellez Caldeira, na qualidade de Relator da Commissão de Legislação, leu e enviou a Mesa o Parecer della, sobre os Projectos de Lei (da Camara dos Deputados, e do Sr. Lopes Rocha) ácerca de varias medidas excepcionaes em certos processos crimes. — Mandou-se imprimir para entrar em discussão.

Como Relator da Commissão de Administração, o Sr. Barão de Renduffe apresentou o seguinte

Parecer.

A Commissão de Administração Publica examinou attenta e circumspectamente o Projecto de Lei N.° 17 (*) proposto pelo Sr. Senador Serpa Machado, sobre o restabelecimento dos Seminarios; e para que a Commissão possa satisfazer á anciedade geral, de que elles sejam restabelecidos em differentes Dioceses do Reino, e por modo tal, que sem fallar-se ao que se deve á Religião, senão sobrecarregue o Estado, ou prejudique aos credores delle; entende a Commissão, que se deve requerer, que o Governo satisfaça aos seguintes quesitos.

1.° Que o Governo procedendo ás necessarias informações, as quaes remetterá a este Senado, dê o seu parecer sobre a conveniencia do restabelecimento geral de todos os antigos Seminarios, ou de quaes delles.

2.º Se os edificios, que lhes eram proprios nas differentes Dioceses, ainda existem administrados ou incorporados na Fazenda Nacional, e quaes delles podem reverter ao seu antigo uso.

3.° Quaes sejam os antigos bens e rendas, com que fossem dotados aquelles Seminarios, e que ainda existam administrados ou incorporados nos Bens Nacionaes.

Casa da Commissão 4 de Setembro de 1840. = Conde de Linhares, Presidente — Barão de Renduffe, Relator = Manoel Gonçalves de Miranda = D. Manoel de Portugal e Castro.

Foi approvado sem discussão.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Sr. Presidente, o atrazamento da publicação das Sessões desta Casa, tem-se feito digno de reparo. Os nossos principios, a nossa doutrina, as nossas opiniões em relação aos factos, aos Projectos de Lei, etc. nunca são conhecidos, senão muito tempo depois que a occasião tem passado, isto é, quando o Publico se occupa já de outros objectos, e por consequencia o Senado não é ouvido nem appreciado. Uma das causas que mais concorrem para aquelle atrazamento, é o demasiado tempo que os oradores desta Casa empregam em corregir os seus discursos, donde nasce, que a publicação de uma Sessão está muitas vezes dependente por muitos dias da vontade de um só orador, que por este modo põe o seu veto á publicação das Sessões. Para remediar este inconveniente tenho a honra de mandar para a Mesa o seguinte

Requerimento.

Proponho que o Chefe da Repartição de Tachygraphia seja authorisado a não esperar mais que 24 horas, pela correcção de qualquer discurso pronunciado neste Senado. Sala do Senado 4 de Setembro de 1840. = Barão da Ribeira de Sabrosa.

Ficou em cima da Mesa para ser ulteriormente tomado em consideração.

Passando-se á ordem do dia, foi lido o seguinte

Parecer.

A Commissão de Guerra examinando o Projecto de Lei N.° 31, vindo da Camara dos Deputados, pelo qual se concede á Viuva do Tenente Coronel Joaquim Paulo Arrobas, uma pensão de trinta mil réis mensaes, que não poderá accumular com o Monte-Pio, ou outra qualquer pensão, na conformidade da Lei do 1.º de Julho de 1839; e convencida dos relevantes serviços, que praticou seu defunto marido a favor da Causa da Legitimidade e da Liberdade Nacional, é de Parecer que seja approvado.

Casa da Commissão 3 de Setembro de 18-10, = Duque da Terceira = Bernardo Antonio Zagallo = Barão de Almeidinha = Conde de Mello = Barão de Argamassa.

Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo unico. É concedida a D. Maria José Barreiros Arrobas, Viuva do Tenente Coronel Joaquim Paulo Arrobas, uma pensão de trinta mil réis mensaes, que não poderá accumular com o Monte-Pio, ou outra qualquer pensão na conformidade da Lei do 1.º de Ju-

(*) Este Projecto acha-se publicada em sua integra m Diario N.° 285, a pag. 1234.

Página 84

84

APPENSO AO N.° 261

lho de 1839. = Palacio das Côrtes, em 27 de Agosto de 1840. = João de Sousa Pinto de Magalhães, Presidente = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario = João Antonio Lobo de Moira, Deputado Secretario.

Teve a palavra

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Este negocio é muito conhecido, porque ha quatro annos que anda no Ministerio da Guerra e nas Côrtes. Essa Senhora requereu differentes vezes, e por differentes Ministros, e peço licença ao Senado para dizer, que eu fui o que lhe mandei abonar alguma cousa na esperança de que este Projecto fosse approvado. Muitos dos illustres Membros desta Camara conheceram o Tenente Coronel Arrobas; porque elle serviu na Terceira e no Porto: morreu de um typho, é verdade, mas os Facultativos julgaram que dos padecimentos, resultantes de ferimento de balla, lhe tinha vindo a morte: eu não sou Facultativo, mas acredito isto, e voto pelo Projecto.

O Sr. General Zagallo: — Ha dous Medicos, Sr. Presidente, que tractaram o Tenente Coronel Arrobas, os quaes attestam que morrera de um typho, proveniente de debilidade nervosa que procedera do ferimento que recebeu em Souto Redondo; é verdade que esses Facultativos não asseveram que a morte daquelle Official, fosse consequencia necessaria desse ferimento, mas tambem não affirmam o contrario, antes dizem ser possivel que a morte lhe proviesse em consequencia delle, sendo por isso a causa posto que remota do seu falecimento. Pelo que pertence ao que disse o meu illustre amigo o Sr. Vellez Caldeira, parece-me que S. Ex.ª não deu attenção ao que se tem dito sobre o caso presente, quando affirmou que esta pensão não póde competir á Viuva Arrobas, porque o caso senão acha comprehendido na Lei, visto que seu marido não morreu de baila em combate, o que é um facto, que ninguem avançou. Mas, Sr. Presidente, se este caso estivesse comprehendido na Lei, então não vinha elle aqui, (O Sr. General Raivoso: — Então não eram 30, haviam de ser 40$000 réis); por que ordenando aquella Lei, que a Viuva tivesse o soldo de seu marido por inteiro, caso estivesse provado que elle tinha fallecido de ferimento de baila, ou consequencias della, nem a pensão seria a que se propõe, nem haveria duvida alguma no Governo em lhe conceder o dito soldo. Mas havendo muita probabilidade em que a morte do Tenente Coronel Arrobas proviesse do seu ferimento, por quanto já disse que os Medicos não o affirmam nem negam, no caso de duvida devemos (como diz, a Commissão de Guerra da Camara dos Deputados) decidir-nos antes a favor da parte interessada, do que contra ella. Além disto, é necessario notar que a pensão que verdadeiramente se propõe por este. Projecto, é de 10$000: réis por mez, porque tendo esta Viuva o Monte-Pio de 20$000 réis mensaes ou 360$000 réis por anno, a differença, para 480$000 réis propostos, é de 120$000 réis annuaes, ou 10$000 réis por mez. Não se julgue portanto que a quantia que se concede, é muito excessiva, em relação aos serviços extraordinarios que este Official prestou; elle era muito conhecido de quasi todos os Membros desta Camara assim pela sua pessoa, como por esses serviços. (Apoiados.) Por tanto parece-me, que o Parecer da Commissão deve ser approvado; e nisto, não sou incoherente, porque quando aqui se tractou da pensão que se deu á Viuva do Barão de São Cosme, queria eu que esse objecto fosse remettido ao Governo, para este propôr não só aquella pensão, mas todas as que estivessem em casos analogos, para depois as approvar todas; mas como aquella se approvou antes disso, tambem agora approvo esta, bem como todas as mais, que aqui se apresentarem com igual justiça, por ser este o espirito com que procedi na discussão a que me refiro.

O Sr. Duque da Terceira: — Eu queria unicamente dizer que o Major Arrobas morreu provavelmente de um ferimento de balla, não naquelle momento em que a recebeu? mas annos depois, porque, desde o momento em que foi ferido em Souto-Redondo, nunca mais teve saude, ficando com uma perna sempre em muito máo estado: isto não só os Facultativos o dizem nos seus attestado, mas eu vi o estado em que elle ficou. Era um Official benemerito, que fez grandes serviços na Ilha Terceira, e no Porto, e por tanto acho que toda a Camara concordará em que se dê esta modica pensão á sua familia. (Apoiados,)

O Sr. General Raivoso: — Se a minha consciencia me não aconselhasse a votar a favor deste Projecto eu votaria contra elle por ser de augmento de despeza, por isso que eu voto sempre contra tudo que forem despezas novas; porém esta tem uma excepção. O Sr. Duque da Terceira Commandante do Exercito daquelle tempo já disse tudo quanto podia dizer-se em referencia ao objecto, não ha duvida; S. Ex.ª e muitos outros Srs. que estão nesta Sala, e V. Ex.ª mesmo são testemunhas do facto porque conheceram o Tenente Coronel Arrobas, um homem como um gigante de um volume extraordinario antes de ser ferido em Souto-Redondo; e tambem que depois que recebeu a ferida no pé nunca mais teve saude, emmagrecendo tanto que não parecia o mesmo homem; até que ultimamente lhe veiu um typho que o acabou; mas advirta-se que a morte foi consequencia da ferida que lhe offendeu os nervos, e de que ficou sempre muito nervoso, e foi isso que o fez deixar de existir, por consequencia não se faz favor á viuva do Tenente Coronel Arrobas approvando-se este Projecto cumpre-se a Lei, que digo? Não se cumpre a Lei, porque ella devia receber 40$000 réis mensaes, por isso que seu marido morreu visivelmente de uma ferida recebida em combate; e para prova disto não eram precisos os attestados dos Medicos, quando todos o conheceram um gigante em forças e volume antes de ser ferido, e desde que o foi, ficou um valetudinario, até que morreu thysico com a pelle sobre osso. Por tanto, repito que se não faz favor á viuva deste distincto Official, dando-se-lhe 30$ réis mensaes; entendo antes que se lhe faz uma injustiça em se lhe não dar o que determina a Lei de 1790, isto é, 40$000 réis mensaes, que era o soldo por inteiro de seu marido; cedendo porém ás circumstancias approvo o Projecto. (Apoiados.)

(Vozes: — Votos. Votos.)

Julgando-se a materia discutida, foi o Projecto approvado no Artigo Unico que o constituia.

Leu-se depois este

Parecer.

A Commissão de Guerra examinando o Projecto de Lei N.° 35 vindo da Camara dos Deputados, pelo qual é reintegrado no Posto de Tenente, graduado em Capitão do Exercito, Tiburcio Joaquim Barretto, em attenção a ter sido demittido por opiniões politicas em 1824, e aos bons serviços que tem prestado em defeza do Throno Legitimo, e das Liberdades Patrias, é de parecer que seja approvado. Casa da Commissão 2 de Setembro de 1840. = Duque da Terceira. = Bernardo Antonio Zagallo. — Barão de Argamassa. = Conde de Mello. = Barão de Almeidinha.

Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo 1.º É authorisado o Governo para reintegrar no Posto de Tenente graduado em Capitão do Exercito a Tiburcio Joaquim Barretto, em attenção a ter sido demittido por opiniões politicas em 1824, e aos bons serviços que tem prestado em defeza do Throno Legitimo, e das Liberdades Patrias.

Art. 2.° Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 29 de Agosto de 1840. João de Sousa Pinto de Magalhães, Presidente. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario. = João Antonio Lobo de Moira, Deputado Secretario.

O Sr. General Zagallo: — Sr. Presidente, esta restituição é proposta pelo Governo, e ahi está o Relatorio do Ministerio da Guerra; que conta a historia deste Official: elle foi demittido creio que em 1824, e depois até degradado; esteve por fóra muito tempo, não tendo sido por isso reintegrado, como foram outros em iguaes circumstancias: entretanto, immediatamente que o Exercito Libertador chegou ao Porto, elle apresentou-se e foi empregado em commissões que desempenhou (como diz o Sr. Ministro da Guerra) com muita distincção. Por tanto acho que é de toda a justiça que elle seja reintegrado no mesmo posto que tinha de Tenente graduado em Capitão; e se a Camara quer que se leia o Relatorio do Sr. Ministro da Guerra.... (Vozes: — Nada. Nada.) Pois bem; são esses os motivos porque a Commissão julgou que era de toda a justiça que este Official fosse reintegrado. (Apoiados.)

Não havendo quem pedisse a palavra, foram successivamente approvados os dous Artigos comprehendidos naquelle Projecto; e disse

O Sr. Presidente: — A Deputação encarregada de apresentar á Sancção Real os Decretos resultantes dos dous Projectos de Lei, que se acabam de approvar, assim como de outros que anteriormente o haviam sido, será composta dos Srs. Conde de Villa Real, Medeiros, Duque da Terceira, Arouca, Pereira de Magalhães, Costa e Amaral, e Serpa Saraiva: serão avisados do dia e hora que Sua Magestade Resolver para a apresentação da Deputação.

Continua a discussão do Projecto de Lei sobre a creação do Tribunal de Contas. Foi lido o seguinte

Art. 16.º Se no exame das Contas, a que o Tribunal proceder, encontrar falsidades, ou concussões, dará conta aos Ministros da Fazenda, e da Justiça para fazerem processar perante os Tribunaes ordinarios os falsarios, ou concussionarios.

O Sr. Mello e Carvalho: — Levanto-me unicamente para observar que me parece proprio se accrescente a este artigo a palavra = peculato. = (Apoiados.)

O Sr. L. J. Ribeiro: — A Commissão acceita este additamento.

Não se fazendo outra reflexão, approvou-se o Artigo 16.º com a addição proposta; o que se segue foi approvado sem discussão:

Art. 17.° O Tribunal podera proceder á revisão de qualquer conta, que tenha julgado, ou a requerimento do responsavel acompanhado de documentos legaes, que provem, ou justifiquem o engano, que tiver havido; ou ex-officio, ou a requerimento do Procurador da Fazenda, quando pela verificação ou exame de outras Contas venha no conhecimento de que nella houve erro, ou omissão.

Entrou em discussão o

Art. 18.° As resoluções do Tribunal serão cumpridas executivamente. Destas resoluções poderão interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, tanto o Procurador da Fazenda, como as Partes, provendo-se dentro de tres mezes contados da publicação do julgado, e sem prejuizo da execução. — Para cumprir-se a decisão do recurso, os Substitutos do Tribunal formarão uma Secção especial.

Teve a palavra

O Sr. Mello e Carvalho: — O Artigo que está em discussão, no meu entender, é um pouco vago, e póde trazer muitas difficuldades na pratica. Diz elle que as resoluções do Tribunal serão cumpridas executivamente, e que destas resoluções poderão interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, tanto o Procurador da Fazenda, como as partes; provendo-se dentro de tres mezes contados da publicação do julgado, e sem prejuizo da execução, e que para cumprir-se a decisão do recurso, os Substitutos do Tribunal formarão uma Secção especial. — Ora quando se tracta de erro de facto, ha o meio da revisão sobre a qual o Artigo antecedente tem providenciado; mas quando ha erros de direito, entendeu a Commissão, e muitissimo bem, que na carencia de outro Tribunal, ou Estação mais propria e competente sómente poderia emendar esses erros de direito o Supremo Tribunal de Justiça: mas este não póde definitivamente entrar no fundo da questão, segundo o seu Regimento, porque conhece sómente das irregularidades e nullidades do processo, e da má ou errada applicação do direito á especie; é necessario por tanto que bem se determine aqui qual é a competencia do Tribunal Supremo a este respeito, o que, segundo a letra do Artigo, não está bem definido. Além disso, supponha-se que ha erros nesses processos, tal ou qual se organisarem seja qual fôr a sua formula, ainda mesmo anomala; ainda assim é necessario que se declare a quem compete emendar esses erros, se é ao proprio Tribunal com os proprietarios, ou em Secção distincta e separada, como ad hoc, composta dos seus Supplentes quando desempedidos. Ora, quando o Artigo diz que = para cumprir-se a decisão do recurso, os Substitutos do Tribunal formarão uma Secção especial, = não vejo para que, porque o cumprimento de uma determinação superior é uma cousa e a emenda é outra; cumprir um julgado é um acto necessario, emenda-lo suppoem liberdade; aqui diz-se para cumprir, mas eu entendo que para o cumprimento de decisões não será necessario que se forme uma Secção especial. A vista destas razões, e para ser breve sobre uma materia que já em outra Sessão se debateu, offerecerei uma Substituição, porque, como o Projecto tem de voltar á Commissão, poderá ella então avaliar e dar-lhe a consideração que merecer, ou dar-lhe o desenvolvimento que entender, a fim de tirar todo o equivo-

Página 85

85

DO DIARIO DO GOVERNO.

co que póde seguir-se da maneira vaga com que está concebido. A Substituição é = «Das disposições finaes ou incidentes, que não possam mais ser emendadas ou reparadas, em que houver violação das formulas ou de direito -expresso, haverá recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça que, ou em ultima instancia, julgará o objecto controvertido, ou mandará proceder á reforma do processo e mais diligencias que entender necessarias para esclarecimento da verdade.

«§. 1.° O recurso de revista poderá ser interposto ou pelo Procurador Geral da Fazenda, ou pelas partes, dentro de trinta dias da intimação da sentença, que será feita pelo Secretario, lavrando termo della no respectivo processo.

«§. 2.º No recurso de revista subirão os proprios papeis sem traslado, sendo a remessa feita em oito dias depois da sua interposição— ao Supremo Tribunal de Justiça.

«§. 3.º O que pelo Supremo Tribunal de Justiça fôr mandado ou julgado, será cumprido pelo Tribunal de Contas, e executado pelas Justiças u Tribunaes ordinarios, ou excepcionaes, quando a sua execução delles dependa.

«§. 4.° Sendo a revista apresentada em tempo não se fará execução nos bens do condemnado dentro de seis mezes continuos, contados do dia da apresentação da revista, se depositar quantia liquida, ou prestar fiança idonea. O condemnado porém que tiver bens de raiz não os poderá alhear antes da decisão final, ruas, por esse mesmo facto, ficarão hypothecados.» Setembro 3 de 1840. — Mello e Carvalho.

Parece-me que com este desenvolvimento ficará mais certa a competencia do Tribunal Supremo a este respeito, assim como ficará mais regular a marchar que se deve seguir em similhantes casos. É necessario accrescentar, que, como o Tribunal Supremo não póde conhecer do fundo das questões, (porque o Tribunal Supremo não é instituido para utilidade particular, mas do publico) é preciso dar-lhe, nestes casos, uma authoridade, por assim dizer, especial em virtude desta Lei, pela qual elle possa julgar do fundo da questão como bem lhe parecer. Voltar o processo ao Tribunal de Contas sem decisão definitiva do Supremo Tribunal de Justiça, para alli ir ser decidido pelos Supplentes, parece-me uma incoherencia, porque deste modo os Supplentes em Secção especial vem a ler mais authoridade para julgar definitivamente do que os proprietarios. Direi mais, se os Supplentes forem impedidos, ou se por falta dos proprietarios tiverem tido alguns delles voz na primeira decisão, como remediar-se este inconveniente? Accrescentarei, que em França, onde estes recursos de cassação são para o Conselho d'Estado, julga-se a cassação n'uma Secção, e na outra é decidida a causa. Lembrarei finalmente aos illustres membros da Commissão, que considerem, se não será mais conveniente, que, havendo o recurso de revista para o Supremo Tribunal, fosse esta antes concedida por uma das suas Secções, e julgada pela outra; e não dar authoridade ao mesmo Tribunal de Contas para decidir definitivamente pelos Supplentes porque composto de proprietarios ou de Supplentes, o Tribunal é sempre o mesmo. — Mando a Substituição para a Mesa, a Commissão fará della o uso que quizer.

O Sr. Serpa Machado: — Eu farei algumas observações sobre o Artigo 16.º e continuarei a notar as anomalias, que encontro neste Projecto. Quando eu digo que elle é anomalo não quero dizer que é contrario á Constituição, porque é filho della, mas pelo modo por que é organisado e que em outra Sessão, eu lhe chamei anomalo; e admira-me que um nobre Senador désse um sentido differente a esta palavra; eu não quero dizer que seja contrario á Lei, quero dizer que é irregular: é neste supposto que eu continuarei a apresentar as anomalias que aqui encontro.

Achando-se estabelecido na Constituição que os Tribunaes de Justiça sejam inamoviveis; este Tribunal é composto de membros temporarios que podem ser excluidos; logo neste sentido, ha indubitavelmente anomalia: acho tambem outras de igual importancia; porque sendo igualmente determinado que todos os processos sejam julgados em duas instancias, aqui apparece uma só: ora no systema de Jurisprudencia reputa-se sempre uma maior garantia a decisão de duas instancias, e não de uma só. De mais, dizendo-se que estas resoluções se devam cumprir comulativamente não só em relação ao exame das contas do Thesouro mas de todos aquelles que são responsaveis, = fica claro que esta execução lhe póde dizer respeito; e então seria bom dizer como se hão de fazer estas execuções: nós vemos, pelo que pertence ás execuções da Fazenda, que se a conta corrente é contra os exactores da Fazenda, é uma cousa, se é por multas estabelece a Reforma Judiciaria outro processo, estabelece processos conforme a natureza da sentença, e conforme a qualidade das pessoas a quem se refere: dizer o artigo que nestas execuções se proceda executivamente, é deixar em duvida o modo porque as sentenças se devem executar; devemos dizer se se deve adotar o methodo seguido para todos as causas de Fazenda, ou se se deve adotar algum outro methodo de execução que se acha estabelecido. Tambem ha uma irregularidade neste processo admittir o recurso de revista sem suspensão quando a quantia não é importante, não é de grande consequencia, mas dizer que isto tenha logar seja qual fôra importancia da condemnação isto póde ser de consequencia; depois dos bens vendidos será muito difficil o remediar este mal, e é por isto que sempre se costuma esperar: era pois menos inconveniente o esperar decidir-se a revista, e suspender-se a execução, do que determinar que elle se execute immediatamente: por tanto parece-me que nesta parte tambem o artigo deve ser alterado. Igualmente acho de grande consequencia e cousa singular, (mesmo no caso de revista) que se mande emendar uma sentença, por uma justiça de menos consideração que a primeira; porque entre proprietarios e substitutos ha alguma differença, mas aqui alterando-se a ordem regular fazem uma Secção de substitutos para reformar o que fizeram os Proprietarios em que se tem mais confiança: então faça-se o que diz o Sr. Mello e Carvalho, ou estabeleça-se outro qualquer methodo, com tanto que não seja este. Eu não posso deixar de notar a differença de haver duas instancias, o recurso de uma instancia para outra: o recurso da revista é só fundado na nullidade dos processos tudo isto são anomalias, tudo isto são irregularidades, estas não se podem admittir sem que haja poderosas razões que as justifiquem esta medida mal tomada póde trazer a ruina de uma casa, de uma familia etc. A pratica mostrará o que tenho exposto e os inconvenientes que talvez se não possam remediar.

A vista disto ponho na presença da Commissão estas anomalias, não para a censurar, mas para saber as razões especiaes que as determinaram.

O Sr. Pereira de Magalhães: — Eu principio por pedir venia á Commissão de Fazenda para sustentar o artigo, o responder a alguns argumentos que contra elle se fizeram: pedi palavra porque, segundo minha lembrança; fui eu o author deste artigo, e o offereci por ser uma garantia tanto para a Fazenda como para os responsaveis.

Em quanto ao desenvolvimento que lhe dá o Sr. Mello e Carvalho, direi que o espirito deste Projecto foi estabelecer regras geraes para serem desenvolvidas pelo regulamento de que falla o Artigo 19.°, e então aqui estabeleceu-se a regra geral deixando o seu desenvolvimento para esse regulamento; e, segundo eu pude entender da leitura que fez o Sr. Mello e Carvalho, a suo substituição é inutil. Em quanto ao processo, certo é que ha de ser applicado a este recurso de revista o que está em praxe no Supremo Tribunal de Justiça; por tanto inutil é explica-lo aqui, e tanto mais inutil que a ordem do processo alli seguida é muito singela, e podiamos ir altera-la sem necessidade, e talvez prejudicialmente. — O Sr. Mello e Carvalho, a meu ver, formou argumentos para depois os combater, argumentos que não se podem tirar da doutrina deste paragrapho, que é muito simples e muito clara: todos sabem o que é o recurso de revista, o seu processo e effeitos. — Agora só resta responder ao argumento de ser decidido pelos supplentes do Tribunal: não póde commetter-se aos mesmos vogaes do Tribunal porque elles são só, segundo o Artigo 1.°, os seis que I hão de votar em cada um dos negocios, e votando elles na decizão de que se recorreu, não podiam reformar a sua propria decizão, o que seria contra os principios geralmente conhecidos, e como o Tribunal se não divide em secções como ha em França, aonde a decizão de uma secção vai a outra para se emendar na

conformidade do provimento dado ao recurso, necessariamente se havia de dar algum remedio, e não ha outro senão o de formar para este caso uma secção com os supplentes.

Já que estou fallando nesta materia, responderei ao Sr. Serpa Machado, sobre o reparo que S. Ex.ª fez de que estes supplentes, sendo Juizes inferiores em graduação, leriam menos confiança: este argumento não quer dizer nada, porque os Funccionarios Publicos só tem a consideração que a Lei lhes dá, e neste caso, a Lei que manda formar uma secção dos supplentes, investe estes da confiança e consideração necessaria; de mais nisto não se faz jurisprudencia nova; é a mesma que regula a Justiça ordinaria, aonde, quando o Supremo Tribunal concede a revista, manda que a causa vá a outro Juiz, ou a outra Relação; isto está na ordem natural; nada mais a este respeito direi; porque mais nada é necessario.

Diz o Sr. Mello e Carvalho que o Supremo Tribunal não conhece do fundo da questão: isto está claro, em se dizendo que é recurso de revista está dito tudo, já se sabe que não é para conhecer do fundo da questão, é sobre se ha offensa de Lei ou transgressão de formulas; e até o recurso em tal caso seria incompetente para Juizes tomarem conhecimento de contas.

O Sr. Serpa Machado, quiz mostrar que este Projecto era anomalo; entre outras muitas razões eu fiz nota das seguintes: era anomalo por isso que não se parecia Com os Tribunaes Judiciaes, e uma das razões foi porque os seus membros não eram vitalicios; outra por não haver duas instancias; o Poder Judiciario de que tracta a Constituição, é aquelle que toma conhecimento das questões entre particulares; p então a Constituição dá-lhes a garantia dos seus Juizes serem vitalicios mas nem por isso aquelles que tem de julgar outros casos por não serem vitalicios são anómalos: ninguem dirá que o Tribunal de Justiça dos Senadores é anomalo, por isso que os seus membros não são vitalicios: assim como tambem se sabe que deste Tribunal, não ha recurso algum nem duas instancias; é um Tribunal de excepção reconhecido pela Constituição por utilidade publica: no mesmo caso está o Tribunal de Contas reconhecido lamberá pela Constituição, e é um Tribunal de excepção, e privativo para julgar as contas do Estado em primeira e ultima instancia; creando-se por tanto outro Tribunal de Contas para conhecer do recurso interposto daquelle violava-se a Constituição. Neste Tribunal o Procurador da Fazenda está presente, as partes tambem o estão, discutem-se avaliam-se os documentos e prova-se, e julgando-se afinal as contas com pleno conhecimento e audiencia das partes, não póde haver receio senão aquelle que ha em todas as couzas humanas: seria talvez bom que houvesse duas instancias, entretanto as despezas, e imcommodos que se fariam não eram compensadas pela utilidade que d'ahi resultaria; mas dizendo a Constituição que haja um Tribunal de Contas, e não que haja dous; póde tirar-se a conclusão de que o Tribunal regulamentado por este Projecto não é anomalo. — Disse tambem o nobre Senador que a reforma Judiciaria faz differença nas causas de Fazenda; que ha nellas dous meios de execução do systema que teve em vista a reforma Judiciaria não se póde argumentar para o systema que aqui se vai estabelecer. Por este systema a conta é ajustada com audiencia das partes, e com defeza; — no systema antigo de Fazenda a que se refere a reforma Judiciaria, não ha defeza, ha uma conta que se lira dos livros fiscaes, e que se manda aos Tribunaes para executar, sem a parte ser ouvida; pois as Leis davam a essa conta força de sentença com execução aparelhada. O actual systema é outro; nelle é ouvida aparte, ha uma sentença dada, com audiencia della; e quando o exator, depois de ter dado as suas contas, acha que se lhe não fez justiça Já tem o recurso; recorre ao mesmo Tribunal para lha reparar. — O Sr. Serpa Machado, tambem fallou a respeito da não suspensão da execução; isso é doutrina corrente, nas execuções de Fazenda não ha recurso algum que as suspenda, é da natureza, e da essencia das causas de Fazenda que se não suspendam as execuções por nenhum dos recursos que se interponham.

Concluirei dizendo aos illustres Senadores que este artigo foi já muito debatido neste logar, e que tal como está redigido, é o resultado de todas as discussões que houve a este

21

Página 86

86

APPENSO AO N.º 261

respeito na passada Legislatura, discussões alias minuciosas e encaminhadas com muito conhecimento de causa. (Apoiados.)

O Sr. Mello e Carvalho: — Reconhece o nobre Senador que este artigo é insufficiente, e recorre-se para o Regulamento... (sinto muito que o Sr. Pereira de Magalhães se retirasse, porque pertendia mostrar-lhe, que no meu entender labora em um equivoco.) Diz o artigo que para cumprimento das decizões dos recursos formarão os substitutos do Tribunal uma secção especial. Ora todos sabem que uma cousa é dar cumprimento a uma determinação qualquer, e outra cousa é julgar. Cumprir uma decizão superior importa necessidade; julgar um objecto controvertido importa liberdade; uma cousa differente da outra mal se compadece no mesmo sujeito. Consequentemente se a Commissão entende que o Supremo Tribunal de Justiça póde conceder Revistas, não em contas, mas sómente quando houver erro de direito, remettendo então o processo ao mesmo Tribunal de Contas, para ser cumprida a decizão pelos substitutos formando-se em secção especial, segue-se que elles não tem mais que fazer senão cumprir; mas o que se pertende é que elles julguem; pelo que parece-me que este artigo ha de offerecer duvidas na sua execução pratica. Conviria muito que fosse redigido de outra fórma mais clara, preciza e juridica, a fim de que na sua applicação não encontre os embaraços a que fica sujeito passando como está.

O Sr. Lopes Rocha: — Eu não só não acho bôa a redacção do paragrapho, mas considero-a deficiente; propoz-se uma emenda em differentes artigos, e eu mal a pude comprehender: o objecto é de muita transcendencia, e eu não estou habilitado, para votar, nem sobre o paragrapho, nem sobre a emenda; e pediria á Camara que esta materia ficasse addiada para outra Sessão, que se mandasse imprimir a emenda do Sr. Mello e Carvalho para todos votarem com conhecimento de causa; e mesmo, se quizessem que a emenda vá a Commissão para reconsiderar o paragrapho, mão me opunha a isso; porque eu confesso que, a pezar de ser esta a minha profissão, não julgo conveniente que se decida de surpreza a grande questão — se o Supremo Tribunal de Justiça deve remetter a outro Tribunal o feito para ver a questão, ou elle mesmo a dicidir em ultima instancia. Portanto, repito o meu requerimento; que fique addiada esta materia, e que se mande imprimir a emenda do Sr. Mello e Carvalho; para que depois se discuta, podendo entre tanto tomar della conhecimento a respectiva Commissão.

O Sr. Vellez Caldeira: — Eu opponho-me a similhante additamento, e não é porque eu approve o Artigo 18.°, pelo contrario, eu fallei muito nesta questão na Sessão de 1839, e tambem me oppuz á sua doutrina, por entender que não póde haver logar nenhum a tal recurso de revista, e é o que ainda hoje eu continuarei a impugnar. — Sr. Presidente, considere-se como se quizer, o que o Tribunal de Contas faz é rever contas, e emittir a sua opinião sobre contas, mas não dá sentenças, porque julgar uma conta é termo de contabilidade, e não póde destas palavras inferir-se que esse julgamento seja uma sentença: as resoluções do Tribunal sobre uma conta, querem dizer, que essa conta está ou não corrente; se os encontros são ou não admissiveis; se as reclamações por parte da Fazenda ou do responsavel são ou não são exactas etc. Dizer-se como argumento em contrario que as contas nas outras Repartições não são tractadas com audiencia da parte, nada prova, porque não é possivel (que Repartição alguma possa devidamente cerrar qualquer conta sem ouvir uma e outra parte, isto é, sem ouvir o que ha a favor da Repartição e o que se allega contra pelo interessado na liquidação ou que nella interveio. Por consequencia, digo que neste caso não póde nunca haver logar ao recurso de revista: quando o Tribunal de Contas tiver definitivamente julgado uma conta, esta deve ser relachada ao Poder Judiciario, e executada como outra qualquer; e neste sentido e que eu (quando em outra Sessão se discutio esta materia) tinha apresentado uma Proposta nos seguintes termos: (lêu.) = As resoluções do Tribunal terão execução nos termos das Leis vigentes. = Por tanto, quando nessa conta a parte entender, que se offende alguma Lei, ou que ha alguma nullidade, ella irá deduzir em embargos a materia que julgar conveniente e esta questão correrá perante os Tribunaes civeis, e então desses Tribunaes é que ha de haver a appellação e o recurso de revista, quando lhe competir segundo as Lais. Opponho-me por tanto ao additamento, e quando elle se decidir mandarei para a Mesa a minha emenda.

O Sr. Lopes Rocha: — O Sr. Vellez Caldeira rejeita o additamento, pela razão, de ter tambem rejeitado o paragrapho, pois não póde conceder que deste julgamento de contas feito pelo Tribunal dellas, possa haver revista. Venceu-se, Sr. Presidente, já no Artigo 15.º que este Tribunal julgasse as contas; venceu-se que este Tribunal tinha authoridade para condemnar ou no todo da divida e alcance do responsavel, por uma só vez ou para admittir o pagamento a prazos; e não sei que se possa dizer que isto não é uma sentença. Agora perguntarei eu quando o Tribunal julga assim não póde commetter nullidades, e não póde julgar contra direito expresso? Parece-me que sim: e se elle o póde fazer, porque razão se ha de negar o recurso de revista tanto ao Procurador da Fazenda como aos interessados? É possivel que o Tribunal julgando commetta nullidades, porque não observasse a Lei; e todas as vezes que se póde commetter nullidades por se não observar a Lei, a Legislação concede o recurso de revista; por tanto tambem neste caso digo que se deve conceder. Este argumento não destroe a questão do additamento; e por esta consideração insisto eu que elle seja proposto á Camara que podera dicidir como quizer.

O Sr. Vellez Caldeira: — Quando se votou o Artigo 15.°, a cuja discussão eu não assisti, decidiu-se que o Tribunal havia de julgar as contas dos responsaveis: ora eu já disse que julgar é um termo de contabilidade... (O Sr. Lopes Rocha: — E condemnar?) Quer dizer que as contas estão ultimadas, e que tal é o resultado definitivo da conta. Mas quem é que ha de executar estas decizões do Tribunal? Aqui se diz neste artigo: (lêu.) E como ha de isto ser? Requerendo perante as authoridades civeis a execução dellas; nem pode haver outro modo. Porém se houver julgamento entra a Lei, ou alguma nullidade, quem diz que não ha de haver recurso? Sim Sr. ha de haver recurso o executado dedusira embargos; se lhos desprezarem, ou lhos não julgarem provados, fica-lhe o meio da appelação; e, se ainda lhe não fizerem justiça, interporá o recurso de revista. Sr. Presidente, o Artigo 18.° passou na outra Legislatura com tanta precipitação, que até se lhe tinha deixado ficar um termo Francez, como se nós precizassemos delle, e a nossa lingua fosse tão pobre que carecessemos dizer n'uma Lei se pourvoir en cassation, quando temos o termo legal interpor revista!

O Sr. Serpa Machado: — Sr. Presidente, eu tambem approvo, e julgo até de absoluta necessidade este additamento. Abissus abissum invocat: o Artigo 15.° que se approvou com a palavra condemnar, póde dar occasião a que se pense que o Tribunal póde condemnar não só as contas mas tambem as pessoas responsaveis por ellas. Eu suppunha que o exame do Tribunal de Contas era, nos termos da Constituição, para verificar e liquidar sómente as contas dos responsaveis á Fazenda, mas os authores deste Projecto deram-lhe a extensão do mesmo Tribunal poder condemnar aquelles que estiverem alcançados: ora, como esta disposição passou, e está em harmonia com este, é necessario que se possam oppôr embargos e lançar mão dos outros recursos judiciarios, já que não é possivel ter isso logar perante um Tribunal que não é propriamente judicial, e cujas decisões podem oppôr-se a muitos direitos particulares, os quaes, segundo o direito do Reino, não devem ser offendidos sem que ás partes fique livre o recorrerem de qualquer decisão que as prejudique. Por tanto, sustento a necessidade do additamento, e parece-me que a Commissão quererá considerar o methodo que apresentou o Sr. Carvalho e Mello relativamente á ordem do processo que convêm seguir; e nós, em objecto de tanta gravidade, não devemos precipitar-nos por não demorar mais uma Sessão esta Lei, que naturalmente não poderá passar já na Camara dos Deputados: é por tanto conveniente que daqui sáia obra a mais perfeita possivel, não só para nos não sujeitarmos a alguma emenda, que em certo modo menoscaba a gravidade do Senado, mas tambem porque quaisquer Projecto será tanto mais facilmente convertido em Lei quanto as suas disposições se approximarem a um estado de perfeição. Por tanto, concluirei sustentando o additamento, e significando á Camara a importancia de examinar este objecto antes de o decidir definitivamente.

O Sr. Visconde do Sobral: — A Commissão não poderá talvez desde já dar uma decisão sobre materia juridica tão importante, sem que cada um dos seus Membros possa pensar sobre ella: o Sr. Lopes Rocha propoz que o additamento do Sr. Mello e Carvalho se imprimisse; assim eu apoio o addiamento da questão para que novamente se considere, podendo entre tanto imprimir-se o additamento se á Camara parecer conveniente. (Apoiados.)

O Sr. L. J. Ribeiro: — Que a questão é grave e importante manifesta-o a discussão que tem havido; todavia, convêm que eu declare á Camara que este Artigo não foi originariamente da Commissão de Fazenda: quando na Sessão passada se discutia o Projecto para a creação do Tribunal de Contas, o Sr. Senador Pereira de Magalhães apresentou a doutrina de que se tracta, a qual foi approvada. A Commissão não tinha inserido cousa similhante no seu primitivo Projecto, por entender que com as disposições do Artigo 15.° estava tudo remediado, porque as decisões em que houvesse execuções, essas lá iriam para o fôro judicial, por que nem em todas as contas as ha de haver, mas sim, e principalmente no caso em que os devedores não queiram pagar: entretanto, o Sr. Pereira de Magalhães apresentou este Artigo como uma substituição, e a Camara admittio-o e adoptou-o. — É o que tinha a dizer.

O Sr. Miranda: — A questão deste Artigo torna-se complicada por considerações que mais se referem aos Tribunaes judiciarios do que ao Tribunal de Contas; e, por conseguinte, para evitar divergencias, eu pedirei que não só este Artigo mas todos os outros que se referem ao processo sejam remettidos ás duas Commissões de Fazenda e Legislação reunidas, para se combinarem todas as opiniões, a fim de chegar a um acordo, e para evitar que haja grande discussão em principios a respeito dos quaes todos nós de certo combinámos com pequena divergencia.

Julgando-se a materia sufficientemente discutida, o Sr. Presidente poz á votação o adiamento do Artigo 18.°, e foi approvado, resolvendo-se tambem que a substituição fosse mandada ás Commissões, como acabava de propôr o Sr. Miranda, e que se não imprimisse por ora.

Passou-se ao seguinte

Art. 19.° Fica authorisado o Governo para fazer o Regimento do Tribunal, o qual enviará á Camara dos Deputados na seguinte Sessão Ordinaria acompanhado das suas reflexões; e depois de discutido, e approvado pelas Cofies, só por ellas podera ser alterado.

Sobre este Artigo disse

O Sr. Serpa Machado: — Tambem desejava que a Commissão me esclarecesse sobre este artigo, dizendo se o Regimento de que aqui se tracta póde ser posto em execução depois de apresentado á Camara dos Deputados, ou se só depois de ficar approvado pelas Côrtes, porque isto faz grande differença: algum dos seus illustres membros dirá qual foi a intenção da Commissão, porque, segundo a redacção do Artigo parece que feito o Regimento do Tribunal, o Governo póde logo manda-lo pôr em execução. Em todo o caso seria conveniente tomar esta doutrina mais explicita, e para isso talvez a Commissão concordasse em redigir novamente este Artigo.

O Sr. Miranda: — Pelo Artigo se vê qual foi a intenção da Commissão. Uma vez que a Constituição manda crear este Tribunal é para entrar no exercicio das suas funcções, e uma vez que nellas entre é necessario que tenha um. Regimento ainda que provisorio: esta idéa talvez que não esteja aqui bem clara, entretanto como muitos dos Artigos do Projecto tem de ir á Commissão para os redigir, póde tambem ir este, para que desappareçam todas, as duvidas que póde haver no modo por que se acha redigido.

O Sr. L. J. Ribeiro: — Sr. Presidente, eu não julgo necessario que este Artigo volte á Commissão. — Ordinariamente os Regulamentos que se mandam fazer para a execução das Leis são encarregados ao Poder Executivo; porém a Commissão entendeu que, sendo este caso muito grave, era mais conveniente, lançar o Artigo nesta fórma, para que o Regimento do Tribunal tivesse execução provisoriamente até que as Côrtes se reunissem; nem vejo que d'ahi

Página 87

87

DIARIO DO GOVERNO.

possa resultar inconveniente algum: reunidas as Côrtes, o Governo apresentava o Regulamento, e ellas approvavam-no ou rejeitavam-no, e depois seguia-se o que conviesse. A adoptar se a doutrina contraria, então tanto importa fazer a Lei como não, porque em quanto não houver este Regulamento não póde ella ter execução: as minhas intenções, e creio que tambem as dos outros membros da Commissão, a respeito deste Artigo, foram que promulgada esta Lei, o Governo ficasse authorisado para fazer o Regimento do Tribunal, a fim de que elle podesse logo entrar em funcções. Consignou-se aqui esta doutrina por uma razão principal, e vem a ser que nesse Regimento é que se ha de designar o numero de Empregados do Tribunal, e os vencimentos que elles hão de ter; mas como o crear empregos e estabelecer-lhes ordenados é uma attribuição especial do Corpo Legislativo, não podia o Regimento ler execução, ao menos nesta parte, sem receber a approvação das Côrtes; e a não ser por esta razão, não vejo eu necessidade de que tal Regimento lhe fosse presente. Concluo, em visto do que acabo de dizer, que ha uma precisão absoluta de que o Regulamento do Tribunal de Contas seja submettido á approvação do Corpo Legislativo para o sanccionar na parte que contiver disposições relativas a Empregados e seus ordenados, porque emquanto ao mais acho não seria necessario.

O Sr. Serpa Machado: — Apesar daquellas reflexões mais me convenço da necessidade de que o Artigo volte á Commissão; porque, se o Regulamento esta dentro dos attributos do Governo, para que se exíge a approvação especial das Côrtes? E se ha de ser confirmado por estas é porque involve alguma medida Legislativa que não póde ser posta em execução antes de approvada pelo Corpo Legislativo. Em ambos os casos eu supponho de absoluta necessidade que o Artigo volte á Commissão, e se declare bem o que se quer. Quando se tractar da questão, eu darei as razões por que julgo necessario que o Regulamento do Tribunal não seja posto em execução sem que passe em ambas as Camaras feito Lei; visto que involve materia propriamente Legislativa: nem se diga que se tracta só de regular os Empregados publicos e seus ordenados, porque sobre estes pontos talvez se podesse dar um voto de confiança de que o Governo talvez não abusasse; mas considerado o Tribunal como judiciario (porque de facto o ha de ser) necessariamente aquelle Regulamento deve conter certas garantias para regular os meios de prevenir offensas dos direitos daquelles que ahi forem condemnados: ha de haver uma ordem de processo, e esta ordem de processo indispensavelmente involve materia Legislativa. Em fim como no Regulamento entram attribuições que só as Côrtes podem definir, é claro que elle se não deverá pôr em execução antes das Côrtes o approvarem nas suas diversas partes, e não só em uma dellas como se disse.

O Sr. Miranda: — Pelo que acabo de ouvir, temos ainda um velo á creação deste Tribunal; porque esta é a Lei aonde se prescrevem todas as disposições necessarias, mas não se póde pôr em execução sem haver todos os Regulamentos: todavia fazer depender esta Lei de outra Lei, isso fará com que nunca tenhamos um Tribunal de Contas. Eu não creio que o Regulamento a que se alludiu seja indispensavel para a execução desta, aonde tudo é regulamentado, e entendo que o Governo, em quanto senão reunem as Côrtes, póde estabelecer o Tribunal, e fazer os Regulamentos necessarios, apresentando-os depois ás Côrtes para serem approvados; mas nunca se póde entender que o Tribunal se não possa crear sem fazer o Regulamento, de outra sorte o Regulamento não seria um Regulamento, mas uma nova Lei: eu sou de voto que esta materia volte á Commissão, porque o que se quer importa em que esta Lei senão poderá executar sem um Regulamento approvado pelas Côrtes, e isto é que eu não posso admittir: ha de haver, póde haver casos imprevistos, mas á medida que forem apparecendo difficuldades ou embaraços, estes se irão remediando, nem póde deixar de acontecer quando pela primeira vez se cria um Tribunal, cujas attribuições são tão complicadas, e tão difficil o desempenho de suas obrigações.

Não se offerecendo outra observação resolveu-se que o Artigo 19.° voltasse a Commissão de Fazenda.

Teve depois a palavra sobre a ordem, e disse

O Sr. Pereira de Magalhães: — Eu não estava presente quando se tomou a resolução do Artigo 18.°, e tinha uma emenda para propôr que tambem póde ir á Commissão. — O Governo nas suas Propostas tem promettido que ha de haver um Tribunal Superior Administrativo, e então o recurso deve ser para este Tribunal; esta materia já aqui se tractou, mas como não havia este Tribunal deu-se o recurso para o Supremo de Justiça: por isso eu proponho este additamento que mando para a Mesa, a fim de ser remettido á Commissão; é como segue:

«Depois das palavras = Tribunal de Justiça = accrescente-se = provisoriamente. = Pereira de Magalhães.»

O Sr. Miranda: — Eu pela minha parte adopto-o, e creio que os meus collegas não terão duvida em o adoptar igualmente.

Foi remettido a Commissão de Fazenda.

Entrou em discussão o seguinte

Parecer.

Senhores: — A Commissão de Guerra, examinando o Projecto de Regulamento para a Organisação, e Administração do Exercito, e reconhecendo com o seu autor a necessidade de effectuar, quanto antes, a reforma da actual organisação do mesmo Exercito, afim de a pôr em harmonia não só com as necessidades do serviço, e da disciplina militar, mas tambem com a economia da Fazenda publica, é de Parecer que os primeiros dez Artigos do mencionado Projecto sejam approvados com as seguintes alterações.

1.ª Augmentar-se-ha um Capellão em cada Regimento de Cavalleria, Infanteria, e Caçadores.

2.ª O § 2.° do Artigo 8.º será do modo seguinte:

As alterações, que houverem de soffrer os quadros dos Corpos do Exercito no pé de paz, quando os fundos, que as Côrtes annualmente decretarem para a Repartição da Guerra, não forem sufficientes para lhe pagar pontualmente, serão effectuados por meio de licenceamento, ou pela conservação das vacaturas, que então houverem, ou por ambos os meios, quando o primeiro não fôr bastante.

3.ª O § 2.º do dito Artigo passará a ser 3.º; e o 3.° do mesmo Artigo será supprimido.

4.ª O § 1.º do Artigo 9.° conterá o seguinte:

Os Generaes em tempo de paz serão empregados no Supremo Conselho de Justiça Militar, nos Commandos das Divisões Militares, nos Governos das Praças, que por Lei lhes competirem, e nas Commissões, que o Serviço publico exigir; não sendo aquelles empregos occupados por Officiaes de menor graducção, senão quando não houverem Generaes idoneos para elles; excepto os do Supremo Conselho de Justiça Militar, que sempre serão exercidos pelos Generaes mais graduados.

5.ª O § 1.° do sobredito Artigo passará a ser 2.°, seguindo os outros a numeração, que lhes competir.

6.ª No § 3.° do Artigo 10.º se accrescentará á palavra = disciplina = as seguintes = sempre que as circumstancias o permittirem =; e depois da segunda palavra = semana = se dirá = e o tempo que ha de durar esta determinação; advertindo, etc. etc.

A Commissão é tambem de parecer que, depois de discutidos os Artigos referidos com as alterações, que ficam mencionadas, volte a ella o que se vencer, a fim de o redigir em fórma de Projecto de Lei, e apresenta-lo a

Camara, para ter a sua ultima approvação. = Sala da Commissão 11 de Julho de 1810. Visconde de Semodães = Barão d’Argamassa = Conde de Mello = Barão d’Almeidinha = Bernardo Antonio Zagallo.

N.B. Os Artigos a que se refere este Parecer são os seguintes:

Artigo 1.°

Da Classificação dos Corpos, e Estabelecimentos Militares.

Todos os Corpos e Estabelecimentos Militares, são classificados em quatro Secções distinctas do modo seguinte:

Secção 1.ª

Estado Maior General,

Corpo de Estado Maior,

Corpo de Engenheria,

Corpo de Artilheria,

Arma de Cavalleria,

Arma de Infanteria,

Inspecção Geral,

Thesouraria Militar,

E Commissariado.

Secção 2.ª

Praças com accesso,

Secretarias,

Estabelecimentos Scientifico-Militares,

Arsenal do Exercito, e Fabrica da polvora,

E Corpo Thelegrafico.

Secção 3.ª

Todos os Officiaes que sairem, ou tiverem saido da effectividade do serviço por algum dos motivos, que constituem as classes seguintes, declarados nas ordens do Exercito.

1.º Classe: Os Officiaes que tendo concluido qualquer Commissão de Serviço activo, estão em estado de passar á 1.ª Secção.

2.ª Classe: Aquelles que não podendo servir na 1.ª Secção, devem passar á segunda.

3.ª Classe: Os que tendo sido julgados incapazes do Serviço da 1.ª e 2.ª Secções, esperam vacatura, para entrar em qualquer Praça sem accesso.

4.ª Classe: Os que sairem da effectividade do Serviço para correcção.

Secção 4.º

Veteranos,

Praças, Castellos, etc.: e quaesquer Empregos, a quem não compete accesso.

Artigo 2.°

Da composição do Estado Maior General.

O Estado-maior General se compõe de

Marechaes de Exercito.... 2

Tenentes Generaes....... 10

Marechaes de Campo...... 12

Brigadeiros............. 13

Somma... 42

Artigo 3.º

Da composição do Corpo de Estado Maior.

O Corpo de Estado Maior constará de um —

Pé de paz. Pé de guerra.

Chefe (comprehendido no Estado Maior General).

Coroneis............ 2...... 4

Tenentes Coroneis... 2...... 4

Majores............. 2...... 4

Capitaes............ 10..... 20

Tenentes............ 20..... 40

Somma.. 36 72

Página 88

88

APPENSO AO N.º 261

Artigo 4.º

Da composição do Corpo de Engenheria

O Corpo de Engenheria consta de um Estado Maior, e um Batalhão de Sapadores, compostos da força seguinte:

Estado Maior do Corpo.

[Ver diário original]

Estado Maior e Menor do Batalhão.

[Ver diário original]

Seis Companhias.

[Ver diário original]

Artigo 5.°

Da Organisação, e composição do Corpo de Artilheria.

§ 1.° A Artilheria se constituirá em um só Corpo commandado por um Official General, com a denominação de Commandante Geral de Artilheria, e composto de um Estado Maior, quatro Baterias, a Cavallo, doze montadas, doze montadas, e dezeseis de posição; tendo cada uma destas especies de Baterias a sua numeração, e fardamento particular, e constando cada Bateria de quatro bocas de fogo,

§ 2.º Em tempo de paz haverão sómente os Cavallos, Muares, Ferradores, e Alveitares, correspondentes a uma das Baterias a Cavallo, o a duas das montadas; cujos Alveitares, Ferradores, Cavallos, e Muares, estarão no Quartel permanente do Estado Maior, a fim de que as outras Baterias da mesma especie, alternando com aquellas, vão alli instruir-se, e inspeccionar-se de modo, que em tempo de guerra se achem todas com a instrucção, e pratica necessaria para o serviço desta Arma.

Composição do Corpo de Artilheria.

Estado Maior, e Menor do Corpos

[Ver diário original]

Quatro Baterias a Cavallo.

[Ver diário original]

Doze Baterias montadas.

[Ver diário original]

Dezeseis Baterias de posição.

[Ver diário original]

Artigo 6.°

Da organisação, e composição de Cavallaria.

§ 1.° A Cavalleria se organisará em seis Regimentos de quatro Esquadrões cada um, e estes de duas Companhias; devendo ficar em deposito o quarto Esquadrão dos Regimentos, que sairem dos seus Quarteis permanentes em qualquer época. Dous destes Regimentos serão de Lanceiros, e quatro de Caçadores a Cavallo; tendo cada uma destas especies de Cavalleria a sua numeração, e uniforme particular.

§ 2.° Ao Esquadrão de deposito de cada Regimento pertence um Picador e um Ajudante de Cirurgia, quando o Regimento respectivo sair do seu Quartel permanente em tempo de paz: e em tempo de guerra terá o mesmo Esquadrão além daquelles, um Major, um Ajudante, um Sargento Ajudante, um Sargento Quartel-Mestre, um Alveitar, um Cabo de Trombetas.

Página 89

89

DO DIARIO DO GOVERNO.

Composição de um Regimento de Cavalleria.

[Ver diário original]

Artigo 7.º

Da organisação, e composição de Infanteria.

§ 1.º A Infanteria se organisará em dezeseis Regimentos de Infanteria de Linha, e oito de Caçadores, com dez companhias cada um; sendo uma daquellas de Granadeiros duas de Caçadores, e as mais de Fusileiros; e tendo os Regimentos de Caçadores numeração differente dos de Infanteria de Linha.

§ 2.° A segunda companhia de Caçadores e setima de Fusileiros de cada Regimento de Infanteria, e a nona e decima de Caçadores, serão destinadas para deposito, a fim de ficarem nos quarteis permanentes daquelles Regimentos, que delles sairem em tempo de paz, sendo commandadas pelo Capitão mais antigo. E em tempo de guerra o serão por um Maior, tendo por estado menor um Ajudante, um dito de Cirurgia, um Sargento Ajudante, um Sargento Quartel Mestre, e um Cabo de cornetas ou tambores.

Composição de um Regimento de Infanteria, ou Caçadores.

[Ver diário original]

Artigo 8.°

Da Força do Exercito, Divisões, e Brigadas, e seus Estados Maiores.

§ 1.° Da organisação, e composição dos Corpos das diversas Armas, resulta para o Exercito a força seguinte:

[Ver diário original]

§ 2.° O pé de guerra se verificará sómente naquella parte do Exercito, que as circumstancias de campanha exigirem; podendo augmentar-se o numero de homens e cavallos, das Companhias e Esquadrões de deposito dos Corpos que marcharem para a campanha, além do que determinam os respectivos quadros, segundo os mesmos Corpos precisarem; e devendo escolher-se para as ditas Companhias e Esquadrões, os Officiaes e Officiaes Inferiores mais capazes de desempenhar os interessantes fins, para que são destinados.

§ 3.º Abonar-se-ha a cada Regimento de Cavallaria, Infanteria, e Caçadores, a quantia de quatro centos e oitenta réis para offerta de cada Missa, que se lhes disser nos Domingos e dias Sanctos de guarda, em vez do soldo que se pagava aos Capelães dos Corpos do Exercito, que por este Regulamento são supprimidos.

§ 4.° O Exercito se comporá de quatro Divisões de Infanteria, duas Ligeiras, e uma de Cavalleria; sendo aquellas formadas de duas Brigadas de dous Regimentos cada uma, esta de tres Brigadas tambem de dous Regimentos. A primeira destas Brigadas será de Lanceiros, e as outras de Caçadores a Cavallo.

§ 5.° A cada Divisão pertencerá o numero de Baterias, que as circumstancias exigirem, na occasião em que aquellas se formarem; sendo então nomeado um Official Superior do Estado Maior de Artilheria, para commandar as Baterias de cada Divisão: e um Coronel ou General, para commandar toda a Artilheria, que entrar em campanha, segundo a sua força. Na mesma conformidade se unirá a este Corpo de Exercito a força de Sapadores, e o numero de Engenheiros, que as circumstancia demandarem.

§ 6.º O Estado Maior de qualquer Corpo de Exercito se compõe de um Chefe, um Ajudante General, um Quartel Mestre General, e o numero de Assistentes dos ultimos, que se julgar preciso, segundo a força do mesmo Corpo. O Commandante em Chefe deste terá o numero de Ajudantes de Ordens e de Campo, que as circumstancias necessitarem.

§ 7.° O Estado Maior de cada Devisão de Exercito comprehenderá um Chefe, um Assistente do Ajudante General, outro do Quartel Mestre General, um Ajudante de Ordens, e outro de Campo.

§ 8.° O Estado Maior de uma Brigada se comporá de um Ajudante de Ordens, e outro de Campo.

§ 9.º O Chefe de Estado Maior de um Corpo de Exercito (que não constará de menos de duas Divisões em força) será de graduação immediatamente inferior á do Commandante em Chefe do mesmo Corpo, sempre que fôr possivel; na mesma relação estarão o Ajudante General e Quartel Mestre General, a respeito daquelle; e os Assistentes relativamente a estes. Os Chefes dos Estados Maiores das Divisões serão Officiaes Superiores, guardando os seus Assistentes para com elles, a mesma relação que vem de prescrever-se.

10.° Os Ajudantes de Ordens e de Campo dos Generaes em qualquer emprego (excepto no de Commandante em Chefe de um Corpo de Exercito) não poderão ter patente superior á de Capitão.

§ 11.° Aos Officiaes do Corpo de Estado Maior competem os Empregos dos differentes Estados Maiores, com preferencia a quaesquer outros; e só quando aquelles não forem sufficientes; se poderão nomear para Ajudantes de Ordens ou de Campo, dentre os Officiaes da 1.ª Classe da 3.ª Secção, aquelles Capitães ou Subalternos, que forem propostos pelos Generaes, que os precisarem, sem comtudo mudarem de uniforme, á excepção do chapéo armado, que poderão trazer durante esta Commissão, os que usarem de farda comprida. E só em caso muito urgente se poderá dispensar das fileiras Official algum para prehencher as funcções de Ajudante de Ordens ou de Campo; devendo então executar o mesmo, que vem de prescrever aos outros Officiaes na mesma Commissão.

§ 12.° Os Officiaes do Estado Maior de Artilheria são os unicos habeis para Ajudantes de Ordens ou de Campo do Commandante da Artilheria do Corpo de Exercito, quando elle se formar; devendo o seu Estado Maior corresponder ao de Divisão, se a força de Artilheria fôr de duas Baterias.

Artigo 9.°

Das Divisões e sub-Divisões Militares, e dos Commandos dos Corpos de Engenheria, e Artilheria, e outras Commissões.

§ 1.° O Estado Maior da primeira Divisão Militar será composto de um Chefe, um Assistente, um Ajudante de Ordens, outro de Campo, um Secretario, e um Amanuense.

§ 2.° Os Estados Maiores da 3.ª e 7.ª Divisões Militares, constarão de um Chefe, um Secretario, um Amanuense, e um Ajudante de Campo.

§ 3.º Os Estados Maiores das outras Divisões Militares sé comporão de um Chefe, um Archivista, e um Ajudante de Campo.

§ 4.° As sub-Divisões Militares serão commandadas pelo Commandante de Corpo mais graduado, que existir em cada uma dellas, sem que por isso se augmente o seu vencimento e Estado Maior.

§ 5.° Quando os Commandantes das Divisões e sub-Divisões Militares, concorrerem com os Administradores Geraes, e de Conselho, aquelles tomarão o primeiro logar a respeito de todos; os Administradores Geraes sobre os outros; e os Commandantes das sub-Divisões Militares, relativamente aos ultimos. Mas quando aquellas Authoridades Administrativas forem Militares, observar-se-ha então o que a este respeito determina a disciplina militar.

§ 6.° O Estado Maior do Commando do Corpo de Engenheria constará de um Chefe, um Ajudante de Campo, e um Secretario, extrahidos do Estado Maior do mesmo Corpo.

Página 90

90

APPENSO AO N.º 261

§ 7.º O Estado Maior do Corpo de Artilheria compor-se-ha de um Chefe, e um Ajudante de Campo, nomeados d'entre os Officiaes do Estado Maior do dito Corpo.

§ 8.° Os Generaes empregados nos Governos de Praças, terão um Ajudante de Campo; e os que forem encarregados de Commissões activas, terão um ou dous, em quanto ellas durarem, conforme a natureza das mesmas Commissões.

Artigo 10.°

Da collocação dos Corvos e seus exercicios.

§ 1.° Lisboa será o quartel permanente do Estado Maior General, dos Corpos do Estado Maior e de Engenheria, e do Estado Maior, de Artilheria; distribuindo-se pelas Divisões Militares a força de Sapadores, que exigirem as obras, que nellas se houverem de fazer; e collocando-se as Baterias nos logares mais convenientes ao serviço, que tiverem a desempenhar.

§ 2.° Aos Regimentos de Infanteria e Cavallaria, se determinarão os seus quarteis permanentes de modo, que possa combinar-se o serviço com a commodidade dos habitantes e da tropa, e sua subsistencia.

§ 3.º Cada Cor o lerá dous exercicios por semana, para a conservação da sua disciplina; mas se algum precisar de mais, o Chefe o representará ao Commandante da respectiva Divisão Militar, o qual determinará o numero de exercicios, que o dito Corpo deverá ter por semana, e o tempo que hão durar; advertindo porém que elles nunca deverão ter logar em dias successivos, nem quando o Corpo estiver sobrecarregado de serviço.

§ 4.º Haverá cada anno um Campo de instrucção, composto das tropas que o Governo julgar conveniente, devendo para isso reunir-se os Corpos na sua maior força possivel. A época e o local, serão tambem escolhidos pelo Governo de modo, que a agricultura não padeça.

Obteve a palavra sobre a ordem, e disse

O Sr. Conde de Linhares: — Admittindo se este Parecer á discussão, a Camara toma a iniciativa para propôr um novo Projecto de organisação para o Exercito; ora esta medida nem parece urgente pelo Relatorio do Sr. Ministro da Guerra, nem tão pouco o illustre Senador que o propõe tem a par justificado perante á Camara a necessidade de se dar um tal passo; então penso a proposito pedir ao Sr. Ministro da Guerra queira dizer se assim o pensa, e caso que a opinião do Ministerio não seja tal, que nos induza a convir na necessidade, proponho que este Projecto seja adiado Sine die.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Sr. Presidente, justamente neste momento acaba de passar na outra Camara a Lei da força; isto é, fixou-se qual é a força que deve haver, e esta deverá ser fixada igualmente nesta Camara: a que alli se fixou foi em relação ás organisações que existem. Ainda que o plano do Sr. General Zagallo possa ser muito conveniente, e por outra parte muito aproveitada, ha certamente alguma parte delle em que eu não concordo; e então como o seu plano fórma um todo, é necessario descer a miudezas que não podem adoptar-se na presente Sessão, visto achar-se tão adiantada, porque haveria muito a dizer, e temos materias mais importantes a concluir. Eu desejo concordar com os desejos de S. Ex.ª e de todos os meus collegas para estabelecer definitivamente aquillo que fôr melhor, mas este exame ha de necessariamente involver uma discussão muito prolongada, e muito pouco proveito se tiraria della actualmente; sendo certo que o modo como passou a força é segundo a Proposta do Governo em relação aos quadros que existem, ou ao que fórma presentemente a organisação do Exercito; e por tanto entendo que a votação que acaba de ter logar na outra Camara, de alguma maneira, transtorna o plano do Sr. General Zagallo; não pelo que respeita ao numero de praça, porque eu como Membro do Governo reputo indispensavel, e entendo que não póde haver menos força, e nessa parte creio que estamos concordes eu e S. Ex.ª O plano do Sr. General Zagallo reduz-se a alterar muitas das nossas organisações, e isto não póde caber no tempo que temos para continuar a Sessão: por tanto parece-me que tendo nós muitos objectos importantes a tractar, que precisam ser decididos immediatamente, sendo este complicadíssimo, e dependendo de graves debates, muito pouco ganharia a Camara em o pôr agora em discussão, e que apenas poderá tractar-se em Outra Sessão. Se nesse meio tempo o Governo (que deseja como o Illustre Senador, melhor organisação do Exercito) achar que é indispensável algumas das reformas propostas por S. Ex.ª, elle não hesitará em o dizer ao Corpo Legislativo. Eu não entendo que tudo quanto se comprehende no plano de S. Ex.ª seja o melhor; mas acho que no caso de se poder aproveitar alguma parte delle, seria muito melhor reservado para outra Sessão porque o espaço de tempo que temos para tractar desse assumpto é limitadissimo, e urge que chegue para outros objectos de maior interesse publico. Por tanto o Governo não entende que se possa por agora tractar do piano do illustre General, e torno a repetir que muito pouco proveito se póde tirar de incetar esta discussão, que em certo modo vai encontrar a designação da força que acaba de ser votada na outra Camara, que são 34 mil homens, combinados por certa fórma que não está em harmonia tom o que se propõe no Projecto de Regulamento, posto que deseja não ha duvida que essa força seja ainda menor do que aquella que as circumstancias actuaes demandam.

O Sr. General Zagallo: — Sr. Presidente, ha muito tempo que eu estou convencido de que havia uma força determinada para arredar desta Camara a discussão do Projecto para a organisação do Exercito, que já não é meu, mas sim da Commissão de Guerra que o approvou. Na Legislatura passada já eu tinha apresentado um Projecto similhante; sendo para admirar, que depois de elle ser muito conhecido nesta Camara, o illustre Senador que abriu a discussão apoiasse o seu adiamento na falta de conhecimento dos motivos que deviam haver para que se reformasse a mencionada organisação do Exercito, e ainda que S. Ex.ª teve muitos meios de adquirir os conhecimentos que confessa ignorar, comtudo desprezou sempre as occasiões que teve para isso; por quanto no Relatorio do meu Projecto de Regulamento, que o illustre Senador deve possuir, existem as razões em que se fundam as alterações que nelle proponho; mas S. Ex.ª não quiz -dar-lhe attenção, achando mais cómodo affirmar, que tal desenvolvimento não existe, só porque o desconhece, sem todavia o demonstrar. Porém S. Ex.ª ainda fez mais, desertou da Commissão de Guerra a que pertence, e aonde podia adquirir os conhecimentos necessarios para entrar na discussão do Projecto em questão, indo lá uma só vez. (O Sr. Conde de Linhares: — Peço que se mandem vir as Actas, e vêr-se-ha que fui mais vezes.) O Orador: — Uma só vez, depois que se começou a discutir o dito Projecto, não querendo mais illustrar-nos com as suas luzes; e agora vem dizer que nem elle, nem a Camara tem fundamentos bastantes para entrar na questão! Mas a Camara deve estar assás informada, e S. Ex.ª se o não está, é porque não quiz.

Agora, pelo que pertence ao que diz o Sr. Ministro da Guerra, sinto muito que S. Ex.ª confunda a fixação da força effectiva, com os quadros de uma organisação; não haverá militar algum certamente, que possa confundir similhantes objectos, porque os quadros que resultam da organisação de um Exercito, nada tem com a força que se deve pagar annualmente; por quanto, ainda que esta houvesse de fixar-se em vinte e quatro mil homens, isso não contradiz a que determinar a Lei da organisação, que lhe póde dar cem mil homens de quadro, e entretanto não se pagar annualmente, se não a dezoito ou a vinte e quatro, como as Côrtes acharem conveniente; por tanto admira-me realmente que S. Ex.ª tornasse por motivo para apoiar o adiamento, a decisão que acabou de se tomar na outra Camara da fixação da força, a qual póde variar todos os annos, sendo irrisorio que a da organisação, isto é, os quadros permanentes do Exercito estivessem a variar continuamente; em consequencia a razão que S. Ex.ª dá, não é sufficiente porque nós não podemos tractar da organisação independentemente da fixação da força, que a Constituição determina annualmente.

Disse mais S. Ex.ª que é muito tarde para se entrar na discussão do meu Projecto, e tambem eu digo que não é muito cedo; mas a culpa não é minha, é de quem tem demorado a discussão do Parecer da Commissão, que não é desconhecido a S. Ex.ª, por ter comparecido na mesma Commissão, aonde, sendo-lhe presentes as alterações que se tinham adoptado, S. Ex.ª apenas fez algumas reflexões sobre a Cavallaria, mas como o Parecer já estava assignado, conveio S. Ex.ª em fazer as mesmas reflexões no acto da discussão, relativa áquella arma; sendo muito para admirar que S. Ex.ª mudando de opinião, venha agora servir se de razões tão futeis, para evitar a discussão de um Projecto, que elle não póde combater na Commissão!

Sr. Presidente, a organisação de um Exercito é a base principal em que se funda a sua disciplina, a sua administração, e a economia das suas despezas: agora é necessario demonstrar se a organisação actual preenche estes tres principios, porque todos elles são essencialmente precisos para que um Exercito cumpra os fins para que é formado.

Em quanto á disciplina, temos a Infanteria organisada em Batalhões, com dous Officiaes superiores sómente, quando a Cavallaria e a Artilheria estão organisados em Regimentos com tres Officiaes superiores cada um; o que, além de ser odioso para aquella arma, não lhe fornece os meios necessarios de disciplina, que para estes se julgou preciso. Além disto similhante organisação é irregular, porque o Batalhão sempre foi unidade de manobra, e não de administração, visto que tem uma força proximamente determinada, que não póde alterar se sensivelmente; o que não acontece á do Regimento, que póde ser tão grande, como se quizer. Ora para que a disciplina se possa manter, é necessario que haja em os Corpos de Infanteria o numero de Officiaes superiores, que se julgou preciso para os de Cavallaria e Artilhe ria, e ainda com mais forte razão, porque ordinariamente são compostos de maior força que os destas armas. Logo a organisação actual de Infanteria, não só não é regular com a das outras armas, mas tambem não póde preencher o objecto geral da disciplina, que não se entende só a respeito da manobra, mas sim relativamente a todas as partes que constituem os diversos deveres dos militares.

Em quanto á administração, os Corpos de Infanteria não dão hoje as garantias necessarias, porque alguns delles tem um Official superior sómente, o qual em adoecendo ou pedindo licença, deixa o Corpo sem Officiaes superiores, e apenas commandado por um Capitão; e se elles são necessarios em todas as armas, muito mais precisa delles a Infanteria, em virtude da maior força dos seus Corpos; e se o não são supprimam se então em todas as armas, conseguindo-se ao menos essa economia; mas eu penso que ninguem será desta opinião, logo a contraria é a que se deve adoptar.

A actual organisação da Infanteria não preenche o fim da disciplina ainda pelo motivo de ser a força muito dividida, o que se consegue pela minha proposta, que a concentra em 24 Regimentos de dez Companhias cada um, ficando duas para deposito, quando elle marchar; de que resulta ao mesmo tempo uma grande economia na suppressão de seis Estados-Maiores e menores, preenchendo-se assim todos os fins, a que se propõe uma boa organisação, como disse.

A organisação da Cavallaria não é alterada no meu Projecto, e apenas se lhe diminuo dous Regimentos, augmentando um Esquadrão para deposito aos que actualmente existem; porque não se podendo conseguir o numero de cavallos precisos para os oito Regimentos, convém mais á disciplina a sua concentração, do que dispersa-los em muitos Corpos de pequena força, os quaes ficam inhabilitados de fazer um exercicio, apenas se lhe destaca o mais pequeno numero de soldados; conseguindo-se pelo modo proposto a conservação da mesma força em estado de poder disciplinar-se, e com a economia de dez a onze contos de réis, em virtude da suppressão dos dous Estados-Maiores e menores. Por tanto, esta suppressão é muito conveniente, não só para a conservação da disciplina, mas tambem para se effectuar a dita economia, que é objecto attendivel em todos os tempos, maxime naquelle em que nos achamos.

A Artilheria, Sr. Presidente, está organisada de modo que tem duas Terceiras Secções; a geral do Exercito com a tarifa de 1790, para onde se mandam os réprobos, e a outra particular, denominada Grande Estado-Maior, para onde vão os protegidos, vencendo pela tarifa de 1814. Um Estado-Maior que comprehende debaixo das suas ordens outros Estados-Maiores é uma excrecencia. Eu sei perfeitamente que á intenção do author da organisação da Artilheria com um Estado-Maior e quatro Regimentos, não tinha por fim o augmento das despezas, nem a formação de uma sinecura, e sim comprehender nesse Estado-Maior todos os Officiaes dos Trens e Arsenaes a fim de lhes

Página 91

91

DO DIARIO DO GOVERNO.

dar um centro: deste modo podia ainda relevar-se o dito Estado-Maior, não só em virtude da centralisação dos Officiaes da arma, mas tambem para melhor se inspeccionar o material das Praças, deixando a administração dos Corpos aos seus chefes particulares: mas não se fez assim: o Estado-Maior converteu-se pela maior parte em uma sinecura, e os Officiaes dos Trens ficaram de fóra! Eis aqui, Sr. Presidente, uma das muitas razões, por que as despezas do Exercito tem subido a um ponto que não tem relação alguma com a sua força. Uma de duas, ou hajam Estados-Maiores Regimentaes, ou Estado-Maior do Como; porém hoje a organisação mais regular da Artilheria; nos Exercitos de unia força muitissimo superior á do nosso consiste em um só Corpo, composto de um Estado-Maior com o numero de Officiaes superiores necessarios para dar accesso aos Officiaes das baterias, e fazerem o serviço que lhes compete, tanto em tempo de paz como no de guerra. Deste modo as baterias de que a arma se compõe, sendo administrados pelos respectivos chefes, estão debaixo da inspecção do Estado-Maior, sendo absolutamente desnecessarios os dos maiores regimentaes; cada bateria tem a contabilidade, administração, disciplina, e uniformes, relativos á sua especie; o que não é irregular em um grande Corpo; mas um Regimento com uma batei ia a Cavallo, e outra a pé, aquella com farda de Cavallaria, e esta com a de Infanteria, é uma irregularidade muito grande! E para cumulo da maior irregularidade que apresenta a actual organisação desta arma, é a existencia de baterias, que não pertencem aos Regimentos, em quanto estão destacadas; isto é que nunca se viu em organisação alguma desta arma! Pensavam que deste modo fugiam do inconveniente de estar um Regimento seis mezes e mais sem saber das suas baterias destacadas, e cairam na grande desordem que resulta á contabilidade dos mesmos Regimentos com as entradas e saídas daquellas baterias, por occasião de serem rendidos; quando pela contrario na organisação que propuz, cada Commandante de bateria, marche para onde fôr, responde constantemente pela contabilidade della, e não tem corpo nenhum particular que espere pelas contas daquella para dar a sua. E se a isto acrescentarmos a grande despeza que se economisa na suppressão dos quatro Estados-Maiores regimentaes, ninguem de boa fé dirá que a minha proposta não só não deve ser adiada, mas que é forçoso que seja discutida.

Direi, Sr. Presidente, alguma cousa tambem sobre a divisão do Exercito em Secções. O Regulamento de 1834 determina que elle seja dividido em quatro Secções, e eu convenho nesta divisão; mas determinando aquella Lei, que as promoções da Segunda e Terceira Secções fossem feitas dentro década uma, e não havendo quadros na maior parte das Repartições daquella, e não os podendo haver nesta, seguiu-se que taes promoções não podiam verificar-se conforme a Lei ordenava. E o que fez o Governo em tal caso? Aquelles Officiaes a quem quiz favorecer foram promovidos com os que estavam em serviço activo, e áquelles a quem não quiz attender, respondeu que só podiam ser promovidos dentro da respectiva Secção; fazendo deste modo justiça de mais a uns, e nenhuma a outros. Sr. Presidente, e querer-se-ha que isto continue assim? Será conveniente que haja uma infinidade de Officiaes na Terceira Secção, como hoje existem? E para que, Sr. Presidente? Para haver um asylo de protegidos e de réprobos; sendo aquelles os que não tem necessidade do soldo para viverem, mas que sempre querem um beneficio simples (e fazem muito bem, visto que lh'o consentem) vencendo soldo e antiguidade sem trabalhar, e ficando sempre habilitados para entrar nas promoções, em que não são os ultimos. Mas não acontece assim aos outros, a quem faz falta a differença do soldo de effectividade; os quaes são mandados para a Terceira Secção por motivos desconhecidos, indo para alli soffrer uma pena sem processo, e a penas em virtude de uma Ordem do Exercito! E quer-se que isto continue assim? E será isto bom, Sr. Presidente? E por certo para aquelles que disso se aproveitam, mas eu declaro bem alto e bom som, que o reprovo por injusto, e immensamente prejudicial á Nação, por ser a causa principal de se augmentar cada dia este grande numero de Officiaes que temos sem fazerem serviço. E qual seria, Sr. Presidente, o meio de evitar tão pernicioso mal? É estabelecer os quadros em todas as Secções em que ha accesso, e determinar que na Terceira Secção se separem as classes dos Officiaes que para lá vão, a fim de que os Officiaes que nella entram, por terem concluido uma Commissão, não sejam confundidos com os que não estão capazes de serviço activo, ou para lá vão por correcção; mas isto não se quer, porque as sinecuras, e as arbitrariedades são mais cómodas!!

Em fim, Sr. Presidente, a organisação que eu proponho de Regimentos de dez Companhias para a Infanteria, e de quatro Esquadrões para a Cavallaria, sendo duas daquelles, e um destes para deposito, é, além das razões que tenho ponderado, muito vantajosa, porque só com ella se póde estabelecer o systema dos fornecimentos por massas; cujo systema não tem sido possivel até agora pôr-se em pratica, por que a actual organisação não fornece meios para isso. E prova evidente do que avanço o Regulamento feito no Porto, para pagar a dinheiro a mobilia dos quarteis, e sua manutenção, que nunca se póde levar a effeito, por falta dos Corpos de deposito, que são os unicos que podem tornar permanentes os quarteis, e constante a responsabilidade da sua mobilia; tornando-se tambem desnecessarios os caserneiros, e effectuando-se outras muitas economias que é desnecessario enumerar.

Resumindo, Sr. Presidente, devo declarar que a suppressão dos quatro Estados-Maiores e menores dos Regimentos de Artilheria, que proponho, produz uma economia de 16 contos de réis annuaes; com a suppressão de dous Corpos na Cavallaria se economisam 10 a 11 contos de réis; e com a dos seis Regimentos de Infanteria 20 contos; o que perfaz um total de mais de 46 contos de réis, deduzidos do Orçamento com o único auxilio da mais simples operação Arithmetica. Deve notar-se que neste calculo não entram muitas outras economias que haviam de resultar dessa malfadada Proposta de organisação para o Exercito, como são as gratificações dos Directores das Escólas dos Corpos supprimidos, a manutenção dos utencilios dos quarteis etc, etc.

Sobre o Estado-Maior General tambem é necessario dizer duas palavras: o Regulamento de 1834 estabelece o quadro de dous Marechaes d'Exercito, dez Tenentes Generaes, e trinta Marechaes de Campo e Brigadeiros; deixando ao arbitrio do Governo fazer trinta Marechaes de Campo, e nenhum Brigadeiro, ou trinta Brigadeiros e nenhum Marechal de Campo; porque a Lei lh'o faculta. E será isto bom, Sr. Presidente? Se houver um Ministro da Guerra (eu não a tudo ao actual, fallo em geral) muito amigo de promoções elevará todos os Brigadeiros a Marechaes de Campo, eternisando os Coronéis no mesmo posto; e se houver outro Ministro mesquinho em promoções, preencherá o quadro com trinta Brigadeiros, que marcharão no mesmo terreno por toda a vida! E querer-se-ha que isto continue? Parece que sim, porque é muito bom, mas para quem disso tira proveito, e não para os militares em geral, e muito menos para os actuaes Brigadeiros e Marechaes de Campo graduados, que tem passado pelo desgosto de verem ha tres annos unicamente tres Marechaes de Campo effectivos, quando se apresentam quatorze no Orçamento! Eu deixo isto á consideração da Camara, e do publico, a fim de tirarem deste facto, e dos que deixo referidos, as inducções que elles exigem.

Embora, Sr. Presidente, a Camara adie finalmente o meu Projecto para a eternidade; ella fará nisso talvez o seu dever, mas eu tambem estou certo que tenho cumprido o meu; a Nação nos julgará a todos!! As verdades que tenho pronunciado são claras e patentes a todas as comprehenções (menos daquelles que as não quizerem vêr); em consequencia não serão precisas mais provas, para cada um ser julgado, o Supremo Tribunal da opinião publica nos Sentenceará....

O Sr. Conde de Linhares: — Reputo-me imparcial tractando deste objecto, por ser hoje inteiramente estranho ao Exercito; e de certo não aspirar a nenhuma das suas promoções, tendo definitivamente sahido do seu quadro. — O motivo pois que me excita a obstar ao progresso deste Projecto, e de emittir a minha opinião para que não seja admittido á discussão, é que existindo uma organisação, quer seja boa quer seja defeituosa, esta se não deve alterar sem que primeiro se tenham reconhecido estes defeitos e a necessidade de os emendar. Eu apresentei á Camara um trabalho comparativo, e por elle tenho mostrado que a differença do Projecto, e do que existe não motiva a alteração, e por tanto não tractarei agora desta materia reservando-a para quando se tractarem os diversos Artigos, se a Camara resolver de os tractar.

Ora repito, e desejo que se perceba que eu não faço duvida sobre a bondade do Projecto offerecido, e que não pertendo depreciar o seu merecimento, a minha objecção é inteiramente dirigida á opportunidade da Sua applicação, versa pois unicamente sobre este objecto a minha opposição, e não me persuado que devamos agora tractar de mudar a organisação do Exercito, quando o Sr. Ministro da! Guerra, a não julga necessaria, e quando as vantagens de economia não parecem ser de natureza a provocar immediatamente Uma tal medida. Claro está que diminuindo alguns Corpos, se obtem necessariamente uma diminuição de despeza, mas se o illustre Senador queria mais efficazmente demonstrar economia então teria sido necessario que fosse mais explicito nos seus calculos, -eram numeros que devia oppôr a numeros, e de certo então poderia victoriosamente provar a superioridade do seu Projecto. Certamente reconheço que eu teria igualmente contrahido o dever de apresentar estes calculos, se o limitado tempo, em que emprehendi este trabalho, e a idéa que na sua fórma actual se não admittiria este Projecto, me não dispersuadissem por agora de continuar este trabalho, aperfeiçoando-o com a comparação numerica de um e outro: trabalho, que estou prompto a seguir se assim o parecer á Camara, mas que julgo com mais propriedade deveria ser feito por uma Commissão, se a Camara se decidir ã occupar-se desta materia.

Pelo que pertence ao systema em geral de organisação que convenha estabelecer para o nosso Exercito, direi que penso ser antes necessario augmenta-lo do que diminui-lo; o que está em execução é de certo susceptivel de se prestar corri economia a este augmento, caso se prove assim dever ser, e se fôr mister no decurso desta discussão eu o provarei. Por entanto não sou de parecer que a Camara se occupe desta materia, e quando o venha a fazer então uma Commissão deve largamente preparar este trabalho. — Vou pois mandar para a Mesa um requerimento que julgo a proposito fazer á Camara que é: (leu.)

Accrescentarei algumas palavras para me justificar sobre a accusação que se me fez de não ter comparecido na Commissão de Guerra de que sou membro; aqui tenho na mão a prova do contrario nas das actas da Commissão em que estou assignado; (O orador mostra um livro.) ora como depois fui de opinião diversa relativamente a este Projecto, julguei dever fazer Voto em separado, e offerecer ao juizo dos membros desta Camara as minhas opiniões dissidentes para servirem de comparação Com as emittidas pela Commissão; e por tanto deixei então de concorrer á Commissão quando se tractava deste negocio, e se faltei mais ou foi por embaraço de doença, ou por ignorar as reuniões, ou finalmente por estar presente em outras Commissões de que igualmente sou membro.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Sr. Presidente, o illustre General declarou á Camara que sentia que, tendo eu comparecido na Commissão de Guerra, tendo-se tractado tantas vezes da discussão deste Projecto, fosse só agora a occasião em que declarasse que elle não devia ser discutido. Sr. Presidente, é um facto que eu fui á Commissão, mas eu apenas lá pude ir uma unica vez, e nessa mesma occasião annunciei a S. Ex.ª que alguns pontos havia no seu plano em que estimaria que viessemos a concordar, e nos quaes não estavamos muito distantes.

O illustre General acha que é uma razão de muito pouca monta aquella que eu dei, isto é, o ler-se já marcado na outra Camara a força que deve haver para o serviço do Paiz, e diz que isto não tem relação com a questão de que agora se tracta; mas permitta-me S. Ex.ª que eu diga que sou de uma opinião differente; e eu podia trazer muitas razões para o provar, entretanto direi muito pouco para que se convença de que quando eu o disse, era porque realmente estava na convicção de que assim era. Sr. Presidente, não se tracta unicamente de fazer um plano para o Exercito, que se tenha pelo melhor; desgradaçamente as circumstancias publicas são taes, que quando se tracta de qualquer objecto de serviço elle está sempre em relação com muitos outros: tracta-se de economia, e S. Ex.ª olha para

Página 92

92

APPENSO AO N.° 261

essa economia pelo lado puramente militar, mas o Governo vê-se na necessidade de a seguir sim, mas segundo as differentes conveniencias publicas, lista adoptada uma Guarda de segurança publica, que devia ter certa força que não tem, e se a tivesse talvez que ao Exercito se podesse dar uma outra organisação; mas, não sendo assim é necessario que os diversos Corpos occupem maior numero de pontos do Reino, para que a força militar esteja mais subdividida, sem que a sua disciplina se destrua: esse é um dos motivos essenciaes que obrigou a Commissão de Guerra da outra Camara, e o Ministerio a convir nas ideas que a este respeito hoje foram expendidas na mesma Camara, que não estando completa a força de segurança publica convinha que os seus encargos fossem desempenhados por parte do Exercito como força de policia. Disse S. Ex.ª que a cifra da força não é que decide da sua organisação, e que deve procurar-se a melhor possivel, qualquer que seja essa cifra. Mas, Sr. Presidente, a melhor organisação possivel, se olharmos a outras circumstancias, póde ser muito differente daquella que se consigna no Projecto; mas quando assim não fosse, ha uma razão mais forte do que todas, e é o pouco tempo que resta na presente Sessão para examinar este assumpto com a attenção que merece. É preciso nós não fazermos uma illusão: o patriotismo dos membros do Senado os traz a fazer todos os sacrificios, e já agora seria demasiadamente pesado, para muitos, uma prolongação de Sessão, além do que restrictamente pedem as circumstancias do Paiz: ora, no espaço de tempo que ainda resta desta Sessão, sabe o illustre General e a Camara inteira, que ainda se tem a tractar objectos de uma importancia tal, que torna necessario callarem-se todos os outros diante dessas discussões, e destes primeiro que todos os que são relativos ás finanças e á segurança do Paiz. E quando nós temos inevitavelmente de tractar da segurança do Paiz seria essa a occasião de discutir com sangue frio necessario qual será a melhor organisação do Exercito para o tempo de paz? Parece-me que não. E debaixo deste ponto de vista, é que eu disse que me não parecia esta a occasião conveniente nem opportuna para tractar desta discussão. Já declarei muito francamente (assim como tambem o disse S. Ex.ª na Commissão com igual franqueza) que, concordando em alguns pontos do seu plano, em muitos delles não estavamos de acôrdo; isto necessariamente ha de trazer uma discussão. Eu não estava tractando, nem se quer da generalidade do Projecto; agora alguma cousa direi sobre elle, ao que não posso escusar-me vista a defeza (e muito justa, porque é o seu author) que S. Ex.ª fez, ainda que o meu desejo seria poupar o tempo á Camara para tractarmos de alguma cousa util: não é na occasião como acaba desgraçadamente de, apparecer em que um official ousa manchar a honra do Exercito Portuguez que se poderá tractar deste objecto; ha muitos outros deveres a cujo desempenho sou chamado agora com a devida assiduidade, e S. Ex.ª me fará a honra e a justiça de accreditar, que não é falta de vontade de entrar nesta discussão que faz que eu julgue dever retardar-se, mas sim para se regular bem o serviço, pois que eu desejo tambem que haja o melhor que possa ser.

Sr. Presidente, torno a dizer, nestas circumstancias, tendo-se fixado a força do Exercito, e devendo ser muito extensa essa discussão, a meu vêr seria ociosa; todavia não posso deixar de dizer por esta occasião, e já que S. Ex.ª alludiu á arma de Artilheria, que esta é talvez uma daquellas partes do seu plano em que eu menos concordo; não é porque eu seja official de Artilheiro, nem querendo negar o talento a S. Ex.ª mas é necessario deixar certas especialidades áquelles que tem mais direito a poder tracta-las. — A Commissão do Ministerio da Guerra não só não concorda, mas escreveu contra a organisação proposta pelo illustre Senador, deseja ser ouvida, e apressa-se a mandar aos membros desta e da outra Camara a sua opinião; e Ex.ª que deseja o bem do Paiz será o primeiro a acommodar-se áquillo que fôr melhor. Seria sufficiente esta razão para S. Ex.ª accreditar que eu tenho fundamentos plausiveis para sustentar que não seria conveniente entrar agora em tal discussão. Quanto á Infanteria, Sr. Presidente, disse o illustre General que não é possivel haver administração existindo ella formada em Batalhões; permitta-me que a este respeito eu seja tambem de uma opinião diversa. S. Ex.ª ha de ter encontrado muitos militares esclarecidos, os quaes escreveram que a Infanteria muitas vezes se organisára deste modo; e é certo que os Batalhões podem ter a mesma administração que os Regimentos. Pelo que respeita á Cavallaria onde ha tres officiaes superiores se julgou que por este motivo se crearam nesses Corpos os Conselhos de administração: S. Ex.ª labora n'uma equivocação, por quanto na Cavallaria não se acham estabelecidas as administrações, como S. Ex.ª, deseja, para os fardamentos, e todos os mais objectos, que até se acham já designados n'um Decreto especial, as administrações que hoje existem são as que sempre houve, isto é, para a ferragem, para tractar, (permitta-se-me a expressão) de curar as mataduras, do concerto de arreios das arreatas, etc. não são as administrações para fornecer os Corpos. Conseguintemente, não é porque não haja os officiaes superiores precisos, que os conselhos de administração se não tem creado na Infanteria, mas sim porque esse systema, aliás de grande utilidade (no. que eu concordo com S. Ex.ª) encontra ainda muitos tropeços, que é preciso affastar.

Pelo que respeita á Terceira Secção do Exercito, disse tambem o illustre General que havia duas Terceiras Secções: permitta-se-me que diga a S. Ex.ª que não profundou essa materia. O Estado-maior do Exercito (a que chamou Secção) foi creada desde o principio para collocar officiaes de primeira ordem, para accudirem aos objectos que lhe cumpre, e a Terceira Secção sabe S. Ex.ª que é composta de outros officiaes que por circumstancias especiaes não podem estar nos Corpos a que pertenciam ou se acham temporariamente incapazes de serviço activo. A respeito da Artilheria, como os estudos desta arma são proprios da sua profissão, e inteiramente particulares por isso, ella tem um Estado-maior privativo, para dirigir os objectos que lhe pertencem, e um Corpo arregimentado; e os mais officiaes estão todos como os outros. Que nisto não haja a maior regularidade, convenho com S. Ex.ª e o digo mesmo no meu Relatorio; ha differentes ramos que é absolutamente necessario remediar, mas para isso é preciso tempo, e não é agora no fim de uma Sessão que isso se possa fazer.

O Sr. Presidente: — Eu peço licença para observar que, o que está em discussão é o adiamento proposto pelo Sr. Conde de Linhares. — Tem havido tantos contratempos para se tractar deste objecto, que era justo se satisfizesse o illustre Author do Projecto, deixando que elle expozesse as suas opiniões a este respeito: entretanto, não posso deixar de repetir que a discussão actualmente deve versar sobre o adiamento.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Tendo o illustre Senador Author do Projecto, fallado sobre alguns pontos do seu Projecto, e tendo-o feito de modo que poderia causar no Exercito uma impressão desfavoravel, por se entender que eu não teria tão bons desejos como S. Ex.ª quiz tambem apresentar algumas breves razões por parte do Governo, e peço ainda desculpa a V. Ex.ª e á Camara para dizer ainda algumas palavras mais. (Apoiados.)

Sr. Presidente, eu já me referi ás circumstancias extraordinarias em que estâmos, e essa era uma das razões porque deviamos merecer ao illustre General uma opinião mais favoravel; os muitos afazeres do serviço era tambem um dos motivos que embaraçavam entrar-se agora n'uma discussão sobre objecto cujo exame ha de levar necessariamente muito tempo: e refiro-me pois a essas circumstancias.

Sr. Presidente, o Governo recebeu hoje pelo Correio de todos os pontos do Reino, donde era possivel vir pela posta, que havia socego e ordem; — mas para que a Camara possa fazer uma idéa do que occorre no Paiz direi alguma cousa mais. Houve noticias de Almeida até 30 de Agosto, o Regimento 13 estava em quietação, o General Padua, Commandante da 3.º Divisão, era esperado alli a todos os momentos e tinha-se communicado com o Commandante da 2.ª Divisão Militar, que está em Vizeu, para que fizesse reunir o Regimento 9, o que se tinha effectuado. Tencionava marchar sobre Coimbra, para daquelle ponto impôr aos revoltosos: havia confiança em todos os pontos donde se podem ter noticias de que a authoridade do Governo havia continuar a ser obedecida, e todos concorriam para acabar quanto antes aquelle horroroso attentado. Do Porto temos noticias telegraphicas de poucas horas, e por ellas consta que em Vizeu e Lamego e outras terras reinava a ordem, e o socego. O Commandante da 7.ª Divisão Militar, escreveu referindo um acontecimento que não era de esperar: um destacamento d'uns trinta homens que tinha sahido de Marvão, e se dirigia para os revoltosos voltou sobre Portalegre, e tendo-se retirado as authoridades (porque não tinham força) alli entrou na Cidade; mas naquelle tempo já um destacamento do Regimento 20, de muito maior força, e commandado por um Official muito bravo e digno, se dispunha a entrar em Portalegre, aonde contava dispersar aquella força: as authoridades de Portalegre, como disse, tinham-se retirado para Aronche; mas o Commandante daquella Divisão, com o zelo e actividade que lhe cumpria, fez mais; apenas teve a primeira noticia, formou uma pequena columna movel, que tractava demandar naquella direcção, e marchou elle mesmo sobre Portalegre, tendo-se posto em communicação com Abrantes; e todos os pontos daquellas immediações se achavam em quietação. Do Sul e Béja escrevem as authoridades; e o Commandante da Sub-divisão Militar, dizendo que reinava alli perfeita tranquilidade e ordem. — Do fóco da rebellião (de Castello Branco) consta que se haviam retirado uns poucos, que se dirigiam ás Mouriscas, tendo feito um grande deposito de bestas, creio que para fugirem quando fossem atacados, o que não tardará, porque as forças do Governo deviam continuar a marchar; amanhã teremos noticias mais exactas; e espero que a revolução alli principiada alli acabe. (Apoiados.)

O Sr. Conde de Villa Real: — Não entrarei em discussão sobre o Projecto porque não é esta a occasião. O Projecto tem algumas cousas que eu prefiro á organisação actual, mas não se segue por isso que seja este o momento opportuno para o examinar particularmente: tendo a certeza de que elle não póde passar em Lei com brevidade. Já se tem alterado tantas vezes a organisação do Exercito, que será conveniente não adoptar uma nova, sem que seja combinada com toda a organisação militar do paiz, como foi em certo modo o Regulamento de 1816, visto que era fundado sobre a base do que existia, posto que já anteriormente tinha havido mudanças da organisação especial da Tropa de Linha. Na Ilha Terceira modificou-se este Regulamento, mas as circumstancias eram tão extraordinarias, e os embaraços tão grandes que era preciso tirar o partido possivel de todos os elementos que alli se tinham reunido, e não póde deixar de se reconhecer que muito utilmente se occuparam todos os Officiaes na boa organisação e disciplina dos differentes Corpos, como o provou os distinctos serviços que prestaram. A elles se deve sem duvida o triumpho da nossa Causa. Decretou-se porém em 1834 uma nova organisação do Exercito: mas já em 1837 se alterou aquella para outra que a não melhorou segundo penso, pelo contrario. Não alludo á disciplina particular de cada um dos Batalhões, porque tendo bons Officiaes, e sendo bons os soldados, como são; os Batalhões cada um de per si não deixa nada a desejar. Mas a organisação do Exercito em geral não me parece a mais conveniente para todo o serviço que delle se póde exigir. Com tudo não julgo que devamos por isso entrar na discussão de um novo Projecto de Regulamento, contra o qual não direi que haja prevenções, mas que devendo produzir mudanças deixa a opinião dos Officiaes um pouco duvidosa, ou póde inspirar-lhe algum receio a esse respeito. Quereria que quando se tractar do Regulamento que fixe a organisação do Exercito se tome em consideração toda a organisação militar do Paiz, para que se determine em todos os objectos connexos com a segurança interna, e a defeza externa do Paiz o que parecer mais conveniente. Não julgo que só porque uma idéa parcial parece boa a algumas pessoas se deva logo adoptar, como se fez a respeito das Guardas de segurança que alguns julgaram deverem ser muito uteis para a segurança interna do Reino, e que não preenchem esse firo, nem poderão coadjuvar o Exercito na defeza externa do Reino. Devemos procurar neste momento em que existem tantas difficuldades e embaraços, tanto pelo que toca ao interior como ao exterior completar o Exercito, sem fazer nelle uma mudança cuja duração seja duvidosa, porque não é claro que seja a que mais convém, attendendo a todas as circumstancias do Paiz. Por isso voto pelo

Página 93

93

DO DIARIO DO GOVERNO.

adiamento deste Projecto. Só pediria ao Autor da Proposta do adiamento que retirasse a expressão = sine die =, e a substituisse por outra.

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira: — Quero limitar-me a dizer algumas palavras sobre o Projecto do illustre Senador; não quanto ao merecimento delle; eu estimaria que o Projecto se discutisse, ou na presente Sessão, ou no principio da proxima; porque o Projecto contém objectos de alta importancia; declaro tambem que concordo com algumas idéas do nobre Senador, mas que me separo de outras, quanto á organisação da Infanteria: emquanto á Cavallaria e Artilheria concordarei. Dizendo estas poucas palavras concluo que voto para que o Projecto seja discutido, em um dia proximo, ou quando não nos primeiros dias da proxima Sessão.

O Sr. General Zagallo: — O Sr. Ministro da Guerra disse que a difficuldade que encontrava na discussão do Parecer da Commissão, era a decisão que se acabou de tomar na outra Camara, relativamente á Guarda de Segurança; mas seja qualquer que fôr a organisação que se dê aos Corpos militares, ella nunca poderá influir na dos Corpos de Segurança Publica; porque se esta houver de ser feita (como eu entendo) similhantemente á dos Corpos do Exercito, convém que a desses já esteja concluida, para a daquelles a imitarem; e senão, nesse caso a organisação do Exercito como lhe não serve de modêlo, póde ser a que se quizer.

Entretanto, Sr. Presidente, é preciso observar, que o máu effeito que têem produzido os nossos Corpos de Segurança, provém principalmente de não terem uma boa organisação militar; cuja opinião já tambem o Sr. Ministro do Reino me fez soar nos ouvidos na outra Casa, por occasião de se discutir alli afixação da força do Exercito; nem isso admirou aos verdadeiros militares, que prophetisaram o máu effeito que as ditas Guardas haviam de produzir, apenas foram creadas, em fracções sem nexo, e sem um centro, onde fossem aprender a disciplina, e donde dimanasse a authoridade que a podesse fazer effectiva. Em quanto á organisação que propuz para a Artilheria, disse S. Ex.ª que não sendo eu déssa arma talvez não tivesse todos os conhecimentos necessarios......

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Eu fui mal ouvido do illustre Senador; eu disse que não sendo eu Official de Artilheria, não podia ter uma voz superior á Commissão que está no Ministerio da Guerra, aliás composta de Officiaes dignos de todas as armas, a qual tinha feito os seus trabalhos, que o illustre General será tambem o primeiro, a querer vêr.

O Sr. General Zagallo: — Bem; mas sempre é necessario que eu diga á Camara, que não sou tão orgulhoso que me abalançasse a fazer um Projecto de organisação para as armas em que não tive exercicio (faltando-me sómente a de Cavallaria, sem ter consultado os melhores entendedores dessas armas. Quando eu disse que o author do Projecto de organisação da Artilheria com um grande Estado Maior, teve vistas differentes das que se executaram, foi um facto que o mesmo author me referio, na occasião em que o consultei sobre o meu Projecto, queixando-se de haverem alterado o grande Estado Maior que propozera, com o grande numero de officiaes supranumerarios que lhe incluiram, e deixando de fóra os officiaes dos Trens, que lhe deviam pertencer; em cuja occasião conveio comigo, em que a organisação da Artilheria devia voltar ao que foi, isto é, a Regimentos sem grande Estado Maior, ou com este e sem aquelles, como se acha organisada a Artilheria dos Exercitos mais regulares.

Quanto á Commissão do Ministerio da Guerra, eu estimarei ser illustrado com as suas luzes; mas nem a Camara deve esperar por essa obra para dar ao Exercito a organisação de que precisa, nem essa obra ficará sem resposta se eu o julgar conveniente.

Disse mais S. Ex.ª que a Cavallaria teve sempre Conselhos de administração mas que elles apenas administravam as forragens, e cuidavam de curar as mataduras dos cavallos; o que me parece que não é exacto, porque as massas, que se davam aos Corpos de Cavallaria, eram applicados para outros objectos tambem. Entre tanto se aquelles conselhos eram capazes de administrar aquelles fundos, tambem o são para outros maiores, que comprehendam as forragens, o pão, a mobilia etc. o que não acontecerá aos Batalhões de Infanteria, que não têem o numero de officiaes superiores necessario como os de Cavallaria, para darem á Fazenda Nacional as garantias, que tão grandes fundos exigem. Em uma palavra, ou querem ou não estabelecer o systema das massas; no primeiro caso é necessario, que os Corpos tenham o numero de Officiaes suficiente para dar as garantias necessarias á Fazenda Publica; e no segundo ficaremos privados de um systema, que tantas vantagens tem produzido nos Exercitos, em que elle se acha estabelecido.

O Sr. Presidente: — A hora deu ha muito tempo, e como a Camara se não acha já em numero legal, a votação da proposta do Sr. Conde de Linhares fica reservada para a seguinte Sessão.

Segundo acaba de me participar o respectivo Camarista, Sua Magestade designou as seis horas da tarde de hoje para receber a deputação encarregada de apresentar alguns Decretos das Côrtes á Sancção Real; ficam por tanto prevenidos os Srs. Senadores que se acham nomeados.

A Ordem do Dia para a Sessão de Segunda-feira (7 do corrente) é a votação sobre a proposta do Sr. Conde de Linhares; sendo negativa continuará a discussão do Parecer da Commissão de Guerra sobre alguns Artigos do Projecto de Regulamento do Sr. Zagallo, e no caso de ser affirmativa, tractar-se-ha dos Pareceres relativos aos Projectos de Lei, da Camara dos Deputados sobre — authorisar a Camara de Tavira a contrahir um emprestimo— authorisar a construcção de uma ponte no Rio Sadão — authorisar as Camaras de Ponta-Delgada e da Horta a contrahirem emprestimos para a construcção de mercados — e conceder um credito para reparar os estragos da tempestade nos Açôres. — Está fechada a Sessão.

Eram quatro horas e tres quartos.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×