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DO DIARIO DO GOVERNO.

44.ª SESSÃO, EM 7 DE SETEMBRO DE 1840.

(Presidencia do Sr. Duque de Palmella.)

Aberta a Sessão pela uma hora e meia da tarde, e verificou-se a presença de 46 Srs. Senadores.

Lida a Acta da precedente Sessão, ficou approvada.

Mencionou-se a seguinte correspondencia:

1.° Um Officio da Presidencia da Camara dos Deputados, que acompanhava uma Mensagem da mesma incluindo um Projecto de Lei sobre ser concedido o prazo de dous annos aos credores do Estado, por dividas contrahidas até 31 de Julho de 1833, para requererem a liquidação dos seus creditos. — Passou á Commissão de Fazenda.

2.º Outro dito da dita, acompanhando outra dita que incluia um Projecto de Lei sobre a designação da Força de Terra para o anno economico de 1840 a 1841. — Foi remmettido á Commissão de Guerra.

3.º Outro dito da dita, que acompanhava outra dita incluindo um Projecto de Lei sobre a designação da Força de Mar para o referido anno economico. — Mandou-se á Commissão de Marinha.

Teve segunda leitura o Projecto de Lei do Sr. Serpa Saraiva, sobre o melhoramento das cadêas publicas do Reino (V. Appenso ao Diario N.° 260, a pag. 71.) Foi admittido e enviou-se á Commissão de Administração.

O Sr. Presidente: — A primeira parte da Ordem do dia é a votação da Proposta do Sr. Conde de Linhares sobre o Parecer da Commissão de Guerra ácerca dos primeiros dez Artigos do Projecto de Regulamento Militar do Sr. General Zagallo.

O Sr. General Zagallo: — Sr. Presidente, quando na ultima Sessão se apresentou no principio da discussão do Parecer da Commissão de Guerra N.° 19 o seu adiamento sine die, adiamento insolito, certamente alguns ou uma grande parte dos membros desta Casa se retiraram, talvez espantados, por ser a primeira vez que nella appareceu uma proposição de tal natureza; porque um adiamento sine die, sem se ter discutido o objecto a que elle diz respeito; é uma rejeição […], para que o seu author não tem direito algum. Que um objecto se rejeita depois da discussão, entendo, mas que se rejeite antes de ser discutido, isso é inaudito, e nunca visto nesta Camara: e não sou eu só que caracteriso assim um adiamento sine die, já um membro della com razão lhe chamou incurial; cujas honras da primazia estavam reservadas para o illustre Senador, que o apresentou. Mas, Sr. Presidente, este procedimento tem a particularidade de revelar a pouca lealdade com que é praticado; demonstrando ao mesmo tempo uma especie de cobardia que não póde jámais deixar de ser notada.

Sr. Presidente, uma discussão é como uma batalha, antes da qual se dispõem tambem as guardas avançadas, reservas, etc. etc.; a Commissão de Guerra é a guarda avançada do Corpo que deve combater nesta questão; e esta Casa é o campo da batalha; ora, o illustre author do adiamento pertencendo áquella guarda avançada, desertou della aos primeiros tiros; e não contento com esta deslealdade e fraqueza, fugiu para o campo, e nelle intenta evitar o combate, para cumulo da sua cobardia; é justamente no momento de se dar a batalha, que elle quer persuadir aos seus companheiros de arruas, que commettam uma cobardia igual á sua!!

S. Ex.ª principiou por dizer que era preciso adiar este objecto porque não sabia os fundamentos em que a proposta se baseava; e em vez de procurar instruir-se pela discussão, se quizesse proceder com lealdade, recorreu á authoridade do Sr. Ministro da Guerra perguntando-lhe se convinha em que o Projecto se discutisse: que procedimento, Sr. Presidente, que inaudito procedimento de um Representante da Nação!! Se S. Ex.ª perguntasse a opinião do Sr. Ministro sobre o Projecto em questão, mas no acto da discussão, assim cumpria o seu dever, mas antes della, é querer obrigar a Camara a dar um voto sem conhecimento do objecto de que se tracta. E se este objecto fosse de pequena monta, mas, Sr. Presidente, tracta-se nada menos, que da organisação de um Exercito, que é a base da sua disciplina, da sua administração, e da diminuição das suas despezas, como já disse em outra Sessão: e que devo eu concluir das fortes diligencias que se fazem, para se evitar a discussão de tão trancendente assumpto? E sem duvida o desejo de conservar as sinecuras, as despezas immensas que se fazem no actual estado do Exercito, composto de fracções com grandes Estados-maiores, e em desproporção á sua força; quando, se houvesse zelo pelo bem publico, e pelo do mesmo Exercito, deveriamos cuidar em concentrar a sua força em um numero de corpos proporcionado a ella, para conseguir ao mesmo tempo a sua boa administração, a sua disciplina, e a economia das suas despezas: isto são principios que nenhum militar intelligente da materia póde negar. Mas isto não se quer, Sr. Presidente, e para que? Eu já aqui o disse, mas é necessario repeti-lo, infandum Regina jubes renovare dolorem.... é para que a Cella, mais pesada do que aquella que causa as matadoras; que o Sr. Ministro da Guerra disse que curavam os Conselhos de administração da Cavallaria, continue a carregar no lombo dos pobres militares, e dos contribuintes que os sustentam!

Quiz-se fundamentar tambem o adiamento proposto na fixação da força de vinte e quatro mil homens que se votaram na outra Casa; mas que desgraçado fundamento, Sr. Presidente! Pois a fixação da força, que annualmente deve ser sustentada pelo Estado, póde nunca influir sobre os quadros permanentes, que a organisação determina? Se aquella força fosse superior á destes quadros, ainda poderia haver algum indicio de razão; mas sendo inferior, e cabendo nelles por consequencia como póde avançar-se de boa fé que tal fixação se oppõe á discussão da organisação do Exercito? Quem se vale de taes argumentos, bem mostra a fraqueza da causa que defende; pois todos sabem (mesmo os que não são militares), que não é o grande numero de bayo-

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APPENSO AO N.º 261

netas que contém os quadros de um Exercito, que influe sobre as suas despezas constantes, porque aquellas se diminuem tanto quanto se quer; o que não acontece ao numero de Officiaes, que só póde diminuir pelas suas vacaturas.

Argumentou-se tambem com a suppressão dos Corpos de segurança publica, sustentando que ella se oppunha á discussão do meu Projecto; mas ouvindo eu dizer ao Sr. Ministro dos Negocios do Reino que esses Corpos não ficavam comprehendidos no quadro do Exercito, então tomo póde influir a organisação deste naquelles? De duas uma, ou elles hão de ter uma organisação militar ou não; no segundo caso é claro, que nenhuma relação póde haver entre uma e outra organisação; e no primeiro (cuja opinião eu partilho, assim como o Sr. Ministro do Reino), então, com razão mais forte deve estar organisado o Exercito, para que quando se organisarem os Corpos de segurança publica, os daquelle sirvam de modêlo para estes. E com effeito se estes Corpos não forem organisados militarmente, e com a força necessaria para lhes dar a sua indispensavel disciplina, elles produzirão os mesmos resultados, que mostrarão aquelles, que se pertendem supprimir, como tambem já disse n'outra Sessão.

Já se vê, Sr. Presidente, que as razões que se tem produzido para adiar o meu Projecto, tem de razão sómente o nome, sendo forçadas a figurar como taes á mingoa de razões.

Sr. Presidente, quando eu tive a honra de apresentar nesta Camara a meu Projecto, disse logo que eu não era infallivel, que acceitaria todas as emendas que se julgassem necessarias, e a prova disto são aquellas que a Commissão lhe fez, e parte das quaes foram propostas por mim mesmo; ora, se eu admitti, ás emendas que fez a Commissão, se estou prompto a admittir todas as que a Camara julgar conveniente, qual ha de ser a razão por que se ha de fugir da discussão? Aqui ha cousa occulta, á vista de tanto receio de entrar neste combate!! Nem se diga que a Sessão está muito adiantada, e que temos a discutir muitas propostas, da outra Camara; porque a isso respondo eu não só, que ha muito que o Projecto podia ter sido discutido, mas tambem que é preciso darmos á outra Casa Projectos nossos, não só para que se occupe com elles, em vez de se entreter com outros que nós não poderemos discutir por falta de tempo, visto que as Camaras se hão de fechar simultaneamente; mas tambem para que, por esse facto se conheça, que esta Camara tem tanto a iniciativa como a outra, e se não diga que, a Camara dos Senadores, é um Tribunal de revisão, como a ter agora tem acontecido, contra o que a Constituição determina, expressamente.

Sr. Presidente, dêem os outros esse escandalo ao publico, é não o faccionemos nós com as nossas decisões, deixando de discutir os nossos Projectos, com o futil fundamento de que outros vem da outra Casa, quando nós temos igual direito. Não desacreditemos o Systema Representativo, despresando deste modo a Constituição: ah! Sr. Presidente, já era tempo de acabar com tantos despotismos, como os que eu tenho visto praticar, e com bastante sentimento o digo, em muito maior, numero depois que se estabeleceu o Systema Constitucional, que eu só reconheço pelo nome, e por algumas formulas!!

É tempo de acabar, Sr. Presidente, porque provavelmente estou fallando em vão; mas um adiamento sine die, é incurial, e não póde deixar de ser muitissimo censurado pelo publico, em attenção agrave materia, sobre que elle versa; muito embora a Camara rejeitasse o Parecer da Commissão, mas depois, de discutido, e não sem conhecimento de causa: eu chamo a attenção da Camara, sobre este facto, para que pese as consequencias que delle podem resultar, ás quaes por certo a Camara não terá forças para remediar, quando voltar ao acôrdo que hoje se pertende despresar. A Camara fará o que entender por melhor, mas eu sou mui zeloso do seu credito, para consentir no passo errado, a que o illustre Author do adiamento, e os que é apoiam, pertendem conduzi-la.

O Sr. Presidente: — Não quiz interromper o illustre Senador, porque em fim tem um sentimento bem natural de que ainda se não tractasse o seu Projecto, que repetidas vezes foi dado para ordem do dia nesta Sessão. Em quanto ao adiamento proposto, entendo que está nas fórmas parlamentares de todos os Paizes;

sine die quer dizer durante a Sessão actual, podendo depois ser novamente apresentado o Projecto, se assim parecer ao illustre Senador. Por tanto, a discussão não póde hoje continuar senão sobre a ordem, porque a materia, ou a Proposta do Sr. Conde de Linhares, essa já foi tractada na Sessão antecedente.

O Sr. General Zagallo: — Pedi a palavra sobre a Ordem para mostrar que a discussão é sobre o adiamento; porque quando se tractou de votar se a materia estava discutida já não havia numero.

O Sr. Presidente: — A questão que o illustre Senador levanta é uma questão differente daquella de que se começou a tractar, quer dizer, se a Camara, não estando em numero, podia ou não decidir sobre objectos unicamente da sua regulação interna. Não póde certamente fazer Leis, nem votar em questões cujos resultados tenham de sahir para fóra do seu recinto, mas, relativamente á fórma das discussões, ao menos não está decidido que não possa deliberar. — Na ultima Sessão tinha-se fechado o debate do adiamento, e não depende de mim torna-lo hoje a abrir, sem que a Camara o resolva, porque sempre se considerou que qualquer discussão se podia julgar sufficiente ainda quando o Senado já não estivesse em numero. (Apoiados.)

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Se a Camara não estava em numero não podia fechar uma discussão, nem votar sobre o adiamento. Mesmo na Presidencia de V. Ex.ª o anno passado, houve uma votação duvidosa, que se vereficou no dia seguinte; e em summa se o Senado não estava em numero não podia votar.

O Sr. Presidente: — O contrario se tem j feito a maior parte das vezes, sem que eu entre agora na questão se essa pratica é ou não abusiva; póde-se ressucitar hoje a questão, se a Camara consentir, entre tanto o facto é que ella tinha sido fechada.

O Sr. Conde de Linhares: — Quando pedi este adiamento fundei-me no Artigo 65 do Regimento que diz: (leu.) Tal é pois a minha authoridade, é além disto, a pratica seguida em todos os Corpos Legislativos de adiar os negocios quando assim possa convir, sendo o modo proposto de sine die um delles, e de certo não um dos menos polidos: é a maneira de adiar um negocio para, mais opportuna occasião, sem com tudo o rejeitar — é finalmente pedir que não seja dado para ordem do dia, até nova deliberação; e tal foi a minha intenção pedindo este adiamento.

Assás expliquei pois as razões deste meu requerimento, que se podem todas resumir em não ser opportuno tractar agora de uma nova organisação do Exercito; que a ser necessaria deve ser meditada sobre investigações mais elaboradas, relativamente aos defeitos ou inconvenientes que possam notar-se na actual. — O (illustre Senador author do Projecto, offerece sem duvida um, que é, muito bem. combinado mas as minhas observações versam sobre o não ter demonstrado sufficientemente, o porque se deva preferir o seu Projecto, ao systema que actualmente se acha em execução. Diz que é mais economico, para o provar devera S. Ex. ter apresentado a comparação numerica entre os dous, (trabalho que eu teria emprehendido se o tempo me não minguára) e que julgo em todo o caso indispensavel; eu o teria feito sem duvida se o illustre Senador não me privara de o fazer, insistindo em promover com todo o, vigor o andamento deste negocio, e desta sorte tornando-me então impossivel este dever.

O illustre Senador acusa-me vehementemente de não ter estudado esta materia, julgo que para poder provar o contrario, basta-me referir S. Ex.ª ao meu voto separado que se acha impresso, e na mão de todo o Senado. Solicita porém o parecer neste negocio do Sr. Ministro da Guerra, que de certo dezejo ouvir, convencido que ninguem melhor do que o Ministerio póde emittir uma opinião ponderosa, sobre a necessidade, ou não necessidade de se tractar desta materia.

Se o illustre Senador tivesse provado erros inconvenientes que se fazem, existir no systema actualmente seguido, então entendo muito bem que podessemos formar desde já um juiso a este respeito, mas isto não teve logar — S. Ex.ª precedeo é verdade de uma introdução o seu projecto, mas nessa introdução não se acha mais do que a opinião individual do illustre Senador. Para aplicar as idéas do illustre membro é necessario demonstrar mais do que a bondade dellas, é necessario provar os motivos da preferencia. Ora esta preferencia é que estou longe de pensar se tenha demonstrado tanto na introdução como no mesmo corpo do projecto; mais julgo, seja-me permettido dize-lo, ter feito neste sentido comparando os dous systemas par a par, e referindo-os aos principios geraes que regulam estas materias. — Devo accrescentar que não dou outra importancia, a este negocio, senão aquella que resulta de ser um que occupa actualmente esta Camara; certamente nenhuma prevenção nem interesse particular, a minha posição estranha ao exercito, me torna a este respeito perfeitamente independente, nada tenho que pertender de favoravel debaixo de tal ou qual organisação que o reja, por tanto se exigo mais provas para se alterar o estabelecimento, é unicamente no interesse da causa publica, e é este que me faz por agora julgar intempestiva a discussão em referencia aos dados que a Camara tem para bem julgar esta materia. S. Ex.ª ponderou a falta de apoio da parte de cinco membros desta Camara, e que exige o nosso Regimento, omissão de que na verdade me tornei culpado por falta de lembrança, mas que creio facilmente se poderá suprir se cinco membros desta Camara julgarem a proposito fazer-me essa honra apoiando a minha proposta: motivo porque requeiro novamente a V. Ex.ª, Sr. Presidente, a queira pôr em votação, caso se verifique não se ter o outro dia podido attender por falta de sufficiente numero de membros para a votar.

É lealmente que eu desejo se tracte esta questão do adiamento que proponho, eu nem sustento que já se haja votado, nem lhe quero dar mais força do que aquella que resulta da minha opinião particular quanto ao illustre Senador não haver assás justificado os motivos que devem decidir a Camara a discutir o seu projecto. Quanto a formula de que me servi para propôr o adiamento, admittido pelo nosso Regimento, creio que nada tem em si de indecoroza para o illustre membro proponente, que respeito, e por tanto que possa offender o seu amor proprio.

O Sr. Presidente: — Para não perdermos muito tempo sobre questões inuteis, continuará a discussão do adiamento, se não ha quem reclame contra, isso, (Pausa.)

O Sr. Miranda: — Sr. Presidente, apoiar igualmente o adiamento, não digo sine die, que não tem a verdadeira intelligencia que lhe quiz dar o meu nobre collega, author da proposta, porque a expressão sine die é de um estylo estrangeiro, e não tem entre nós a accepção determinada que se lhe dá no Parlamento de Inglaterra, e significando o mesmo não, é com tudo usada entre nós; adiar indefinidamente ou adiar sine die, importa o mesmo que ficar a discussão do Projecto para outra occasião, e neste sentido se deve entender a proposta do adiamento.

Eu sou de voto que se adie o Projecto; e primeiro que tudo direi, que qualquer membro desta Camara está authorisado para fazer esta moção, pelas razões que se tem expendido, e por outras que ainda se poderiam accrescentar; não é o illustre Senador que propôz o adiamento quem o leva a effeito, mas sim a Camara, e não é o primeiro Projecto que tem sido adiado. Mas o nobre author do Projecto invectivou esta Camara em tal generalidade que abarca todos os Senadores, taxando-os de unia especie de cobardia por entender que se não queria entrar na questão: vejo-me obrigado a dizer alguma cousa sobre este ponto, para que senão liga que voto sem consciencia ou antes, que esse é o sentido da expressão, sem conhecimento da materia; todos nós votamos com esta consciencia, e quem não está instruido na materia procura illustrar-se com aquellas pessoas em cuja experiencia e saber póde ter confiança; por tanto é sem razão nenhuma o dizer-se ou dar a entender: que esta Camara vota sem consciencia: eu apoio o adiamento com toda a minha consciencia, e vou dar as razões em que firmo a minha convicção.

A primeira de todas, é que este Projecto não é o de uma Lei ordinaria formado em um pequeno numero de Artigos, ainda que sobre materia mais ou menos, grave; é um Regulamento militar que toca no que é relativo ao Exercito, e á organisação de todas as suas. Repartições, e que abarca (por assim dizer) todo o complexo da organisação e administração militar, ainda além de outros pontos. Sr. Presidente, um Projecto tão amplo e de uma natureza tão professional e technica; em Camara

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alguma Legislativa se tracta sem previamente se mandar organisar uma Commissão de peritos que sobre elle dê o seu voto; nem um tal Projecto podia apparecer em qualquer das Camaras para entrar em discussão sem que a par delle fosse apresentado o voto de todos os Generaes das diversas armas do Exercito, a fim de illustrar os Membros da Camara para então poderem todos votar conscienciosamente: isto é o que se pratica em toda a parte, não se apresenta um Codigo, um Projecto de natureza technica e especial sem se nomear uma Commissão externa, ou sem chamar ã Commissão da respectiva Camara pessoas de capacidade especial que estejam no caso de dar todas as explicações e informações sobre o assumpto. — A organisação do Exercito, Sr. Presidente, tal qual está.... eu não sou militar, entretanto não sou de todo leigo na materia, na minha melhor idade servi tempo bastante, e posso ainda manifestar a minha opinião, ao menos pelo que toca á arma de Cavallaria. O Exercito tal qual está organisado póde ter disciplina, e com organisação (que actualmente tem) podem tambem fazer-se todas as economias que se podem desejar, e eu não julgo impossiveis. O systema actual póde ter impei feições, mas o que tenho notado em todas as organisações, é que ordinariamente se emendam alguns defeitos, mas fazem-se outros em contrario, sobre tudo pelo que respeita á organisação dos Corpos. Dizendo alguma cousa pelo que toca á da Cavallaria, não posso conformar-me com o illustre author do Projecto que em Portugal haja Esquadrões de deposito, ou antes de mandriões, que de nada servem em tempo de paz, e só no tempo de guerra podem ter alguma conveniencia. — A razão que deu sobre a utilidade das Companhias de deposito na Inglaterra para ficarem tomando conta dos trastes e utensilios do Regimento, ninguem por certo lhe dará muito peso. — Nem eu me faço cargo de responder a argumentos especiaes, entro na questão em geral, debaixo de um ponto de vista mais amplo. Este Projecto é tão complicado e tão extenso que seria necessario submette-lo ao exame de Officiaes de todas as armas para satisfazer ás diversas opiniões; e não se lisongeio o meu illustre collega de que todos partilhem as idéas que no mesmo Projecto estão exaradas: tenho fallado com muitos Generaes instruidos, que dizem que este plano comprehende cousas boas, mas outras que senão podem adoptar por involverem graves defeitos; isto, tem sido affirmado por Generaes e Officiaes muito illustrados: por consequencia não é muito de admirar que entre nós haja divergencia na materia, quando entre Officiaes instruidos, e de grandes graduações reina a mesma divergencia, e reinando ella, será util e de absoluta necessidade approvar esta organisação? Quem ouvir o nobre Senador julgará que o nosso Exercito é um Exercito de Beduinos, que se acha em completa desorganisação; mas não acontece assim, o Exercito, tem uma organisação, podera talvez dar-se-lhe outra melhor; mas, como bem disse o Sr. Conde de Linhares, com a actual póde ter toda a disciplina. As causas da falta ou relaxação della não vem dos defeitos da organisação; qualquer que fosse essa organisação hoje em dia, e depois dos acontecimentos que tem havido, necessariamente teria o mesmo resultado. (Apoiados.) Eis aqui, Sr. Presidente, por que a importancia deste Projecto causa algum susto a muitos dos Membros desta Camara; não é por cobardia que elles receiam entrar no combate, mas porque para combater senão julgam habilitados: — isto não é cobardia, chama-se prudencia, como a daquelle que se retira da presença do inimigo quando não tem forças para entrar em combate; a uma retirada neste caso ninguem chamou cobardia prudencia sim; ao contrario chama-se loucura.

Além disto, Sr. Presidente, as economias ostentadas neste Projecto não estão demonstradas; quer-se entrar na discussão dos seus Artigos cujos fundamentos não estão desenvolvidos senão em as concepções do seu Author; não em o Relatorio nem em o Projecto, porque nem em um nem outro se acha uma só conta por onde possamos apreciar essas economias. Quando o li, enchi-me de satisfação, porque entendi que o meu nobre collega tinha a peito, como eu, a extincção do Commissariado, levando a effeito as administrações regimentaes, e nada de Commissariado em tempo de paz: esta idéa sustentei eu de 1820 até 1823 nas Côrtes das necessidades: — nada de Commissariado em tempo de paz, administrações regimentaes, e estas administrações sejam commettidas não só as pequenas massas, (e importancia de soldos) prets, pão, mas tambem as grandes, como ferragens para a Cavallaria, etc. etc, em fim tudo que é despeza regimental, porque então o Governo sabe de antemão quanto lhe custa cada Regimento, cada Esquadrão, cada Companhia, até cada Soldado, e deste modo tem um meio rapido de verificar as contas, isto é, pela simples inspecção dos mappas da força; este o verdadeiro systema de economia. Tambem não entra em outras economias, para que de uma vez desappareçam do Exercito milhares de sinecuras. Por tanto, Sr. Presidente, o Projecto está muito longe de apresentar aquella economia de contos de réis que eu esperava: apresentaes de nove contos, ou dezanove; mas isso nem merece o nome de economia em relação á despeza de um Exercito, quando aliás ella se póde fazer de centenares de contos; só com a extincção do Commissariado póde o Thesouro poupar nada menos que duzentos contos, e eu o provarei em tempo. Se me opponho á discussão immediata do Projecto não é certamente porque eu não queira economias; não julgo que mereça o trabalho de se discutir por que não vejo nelle economias; repito que não apresenta economias, pelo menos, não ai vejo provadas; não fallo em uma outra parte, em um outro ramo, porque dessas em todos os Projectos as ha, maiores ou menores: mas das economias capitaes, dessas de que tanto carecemos, e que hão de avultar no Thesouro, dessas não vejo que aqui se tracte. Além de que este Projecto devia ser discutido e examinando o estado actual do Exercito, mostrando por algarismos a despeza actual comparada com aquella que devia haver depois, para deste modo verem todos a differença entre o systema em pratica e aquelle que se propõe: mas nada disto traz o Projecto. O illustre General author do Projecto falla segundo a sua convicção, persuadiu-se de que os motivos da sua convicção eram os mesmos de nossas convicções, que nos eram communs, que nos eram conhecidos, e por isso não se dignou de as desenvolver; e eis-aqui o motivo porque a discussão do Projecto em geral assusta e assombra a Camara, tendo-se dado para Ordem do dia como um Projecto ordinario, sem mais informações, e sem ao menos se ter ouvido o voto de outros Generaes de fóra da Camara; eu exigiria mesmo que este Projecto não entrasse em discussão sem primeiro se ouvir uma Commissão de peritos ou espertos, composta de Officiaes das diversas armas, exigiria que se ouvissem todas as opiniões; não é mui de leve que se ha de fazer uma alteração no Exercito. Eu iria com o meu assentimento in verba magistri, se visse resultados das opiniões dos entendidos de todas as armas, cujas opiniões eu desejaria ver em harmonia; mas nunca accederei sem exame ás palavras de um só mestre. Além destas, Sr. Presidente, ha ainda outra razão que obriga a Camara a adiar este Projecto; não é possivel discuti-lo nem n'um mez, só sendo (de correira e sem exame), porque assim até n'uma hora, mas repito; não é de corrida que se ha de approvar, e então um mez nem dous talvez chegariam para a sua discussão; nem nós devemos suppôr que estamos omito distantes da época em que devem findar os trabalhos desta Camara, nem podemos desconhecer que ha outras Leis reclamadas pela necessidade, e reclamadas pelos Povos, muitas das quaes já estão nesta Camara, e outras se vão discutindo na outra: e, como havemos de po-las de parte para começar a tractar de um Projecto tão complicado? Eis aqui outra razão por que me parece que a Camara, ou a maior parte della, está inclinada a adiar este Projecto; no pouco tempo que resta, ha muitas Leis a discutir; ainda se não tractou do Orçamento, aonde podem vir muitas das questões de economia do Exercito...... (O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Onde está elle?) Cada um de nós o tem em sua Casa, lá o póde estudar, lá póde fazer as emendas que quizer, se vir que ha excesso de despezas, se vir que não ha economias, se vir quantas sinecuras ha no Exercito; (Apoiados.) pela minha parte, para então me reservo. (O Sr. General Zagallo: — Apoiadissimo.) Então se quizerem que se destaque do Orçamento uma Lei ou outra especial, vamos a ella, eu não me opponho, com tanto que d'ahi resultem verdadeiras economias para o Exercito; se assentar que se devem destacar algumas verbas para entrarem em discussão especial, por mais complexas que sejam eu anuirei e apoiarei de todo o meu coração uma tal proposta. Eis-aqui, Sr. Presidente, porque entendo eu que o Projecto é muito extenso e nisto convirá o nobre Senador, e ainda não appareceu um Parecer sobre todo elle porque para haver uma discussão geral, era preciso um Parecer sobre o seu todo; lemos só um sobre o assumpto de um Capellão, e outras providencias isoladas: não é assim, uma Commissão deve dar o seu Parecer acêrca de qualquer objecto que se lhe commetta tendo em consideração a totalidade delle, deve-o dar sobre o todo (sur l'emsemble —, como dizem os Francezes) do Projecto. Ora o Parecer, da Commissão é extremamente limitado, não é um Parecer discutido, arrazoado em que se mostrem as vantagens da organisação, proposta sobre a actual, se alguma parte delle se poderá substituir, quaes as emendas que se lhe devam fazer, ou quaes aquellas de que carece o Projecto. Isto ainda eu não vi, nem a Camara tem um documento que a possa dirigir sobre a materia. Por tanto não havendo propriamente um Parecer sobre este Projecto, aliás tão importante não deixará de convir o meu nobre collega que sendo o Projecto tão complicado como é (primeira razão) não havendo as informações necessarias para illustração dos membros desta Camara (segunda razão) é que sendo o tempo que teremos de Sessão muito limitado, e havendo Leis de summa importancia, a que devemos dar summa applicação (terceira razão) não ha logar nenhum nem tempo para tractar deste Projecto. Mas ainda ha outra razão (é a quarta) e vem a ser que as economias, que é o que ha de mais importante, no Projecto, póde-se tractar dellas na occasião em que se discutir o Orçamento, e então se apresentarão algumas emendas relativamente ao Orçamento, não para se votar com elle. mas para fazer uma Lei regulamentar ad hoc; para isso concorro eu, e ha de achar-se todo o meu apoio.

Sr. Presidente, quem se exprime como eu me acabo de exprimir, parece-me que tem alguma consciencia dos motivos porque vota, e que o faz com consciencia quando vota pelo adiamento; desejo com tudo que se supprima a expressão sine die que acho redundante. Não digo que se não tracte a materia, mas reserve-se para quando estiver mais esclarecida a materia tendo-se obtido informações ácerca della, em outra Sessão porque nesta é impossivel.

O Sr. Conde de Villa Real: — Eu pedi a palavra sobre a ordem, porque quando entrei nesta Camara ouvi que estava fallando o Sr. Zagallo sobre a questão do adiamento; e por isso julgo dever dizer que é verdade que esta questão não estava votada mas a materia julgou-se discutida, e que nem na occasião da votação, nem depois foi impugnada por ninguem essa decisão.

O Sr. Presidente: — Faltavam dous ou tres Membros desta Camara, que tinham sahido depois de começar a discussão, e que por tanto a si mesmos devem imputar alguma irregularidade que a este respeito se désse.

O Sr. General Zagallo: — Sahissem elles do modo que sahissem, isso não sanava a votação.

O Sr. Presidente: — Mas em certo modo impõe uma responsabilidade a quem sahio.

O Sr. Conde de Villa Real: — Eu não entro agora na questão do merecimento do Projecto do Sr. Zagallo, comparando-o com a organisação que hoje existe no Exercito, porque só se tracta da questão de o adiar para a seguinte Sessão. Já em outra Sessão dei algumas razões pelas quaes mostrei que votava pelo adiamento, e muitas outras poderia ainda accressentar para mostrar a inopportunidade de entrar hoje nessa discussão, como muito bem disse o illustre Senador que ha pouco fallou. Em quanto a economias, entendo que ellas se podem igualmente fazer debaixo do systema que existe, e com elle póde chegar a occasião de cada um de nós praticamente mostrar o seu dezejo de fazer economias; tambem nessa occasião poderei mostrar as idéas que tenho a este respeito. Agora lembrarei ao illustre Senador que propoz o adiamento que supprima as palavras = sine die = substituindo-as por indifinidamente. Agora pedirei a V. Ex.ª queira consultar a Camara para saber se julga que a materia está sufficientemente discutida.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - (Sobre a ordem) uma vez que continue o systema de suffocar todas as discussões, eu não pedirei mais a palavra sem perguntar primeiro, se a Camara me quererá fazer a honra de me ouvir: a razão sei eu, e por isso não dou satis-

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fações. Eu pedi a palavra; dous oradores fallaram, e quando ma locava a mim pediu-se que se julgasse a materia discutida! Não terlio duvida, porque depois darei uma explicação (Vozes: — Falle. Falle.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Não me decido pelo adiamento, porque me parece que elle foi trazido por uma maneira que o seu mesmo author se tivesse attendido, como costuma, a considerações de delicadeza não o teria proposto. Apresentou-se um Projecto: S. Ex.ª não julgou tão indifferente a sua materia que não pedisse que se esperasse que S. Ex.ª apresentasse outro. Esperou-se, e S. Ex.ª apresentou o seu voto em separado: pedio-se tambem que o Projecto do Sr. Zagallo não entrasse em discussão sem que esse voto se imprimisse e assim -acconteceu; chegou por fim o dia em que o Projecto do Sr. Zagallo devia entrar em discussão: e o que seria mais proprio? Entrar na discussão o Projecto, e o voto, ou emenda do Sr. Conde de Linhares parasse poder julgar que mais conviria: parece-me que o amor proprio mesmo de ambos os illustres Senadores se achava empenhado nesta discussão; eu entendo, mas não sei exprimir o melindre que esta obrigação impunha. Era por tanto, mais curial que entrasse em discussão toda esta materia para que o Senado podesse avaliar o que convem fazer.

Alguem disse que o Sr. Zagallo não demonstrava a utilidade do seu Projecto; mas qual é modo de o demonstrar, se não discutindo? É discutindo e combatendo, que isso se consegue, mas isso é o que se não quer fazer, porque se quer affastar o Projecto. As regras fixas embaração a outro illustre Senador, que disse que o Projecto não devia ter vindo aqui sem ter sido approvado, fóra desta Casa por alguma Commissão; não entendo, mas então a iniciativa desta Camara, ou a prerogativa do Senador desapparecia. — Disse-se tambem que era bom consultar o Ministro da Guerra: concordo; mas não ha razão decisiva, porque o Ministro da Guerra póde ser interessado em conservar a actual organisação. — S. Ex.ª o Sr. Miranda declarou-se contra os Esquadrões de rezerva, mas tem muitos, e dignos adversarios com quem combater em toda a Europa, Hoje mesmo existem -em França. A ordenança Franceza de 92 que é a mais conhecida tem sido alterada muitas vezes, e reformada. Em Inglaterra acontece o mesario. — Tambem se disse: — não tractemos deste objecto porque a Sessão está adiantada: não sei que dados pode haver para suppôr isto, se olharmos para os objectos de Fazenda está em principio. Por agora, tem-se tractado de muitos objectos de interesse particular, individual: mas de interesse nacional pouco. Não sei por tanto, como se diz que a Sessão está no fim... (O Sr. Miranda - Eu disse que presumia.) Eu entendo que a Sessão está no principio, porque o mais importante della devia ser a Fazenda Publica, de que ainda se não tractou. Teremos mais votos de confiança; porque este e o modo de governar em Portugal! Parece-me que a materia devia entrar em discussão e o adiamento antes della não me parece proprio.

O Sr. Presidente: — Passo a consultar a Camara porque assim o manda o Regimento, mas previno os Srs. Senadores, para que o saibam bem, que ainda estão inscriptos os Srs. Zagallo, Conde de Linhares, e Miranda: os que Julgarem a materia sufficientemente discutida queiram levantar-se. — Resolveu que o estava, O Sr. Conde de Linhares: — Eu adopto a emenda do Sr. Conde de Villa Real para que o adiamento seja indefinido.

O Sr. Presidente: — Eu dezejo cumprir os deveres que a Camara me impoz: em quanto um Projecto está sobre a Mesa compete ao Presidente da-lo para ordem do dia quando o julga conveniente; a respeito deste mesmo Projecto, tenho eu feito repetidas diligencias para que a Camara o tomasse em consideração, e discutisse e não tem dependido de mim, mas de circumstancias alheias á minha vontade que elle se não tenha discutido: se o adiamento que voa propôr fosse pura e simplesmente feito para instrucção da Camara (ainda que muitos dos seus membros a não precisam) poderia depender de mim que este Projecto voltasse á discussão passado algum tempo; mas nos Parlamentos de Inglaterra e França quando qualquer assumpto é adiado entende-se durante a Sessão: não sei se a Camara assim o entenderá, mas dezejo sabe-lo...

O Sr. Lopes Rocha: — No Regimento ha dous adiamentos, util indefinido, outro temporario a respeito do indefinido diz o Artigo 66 o seguinte; — O Projecto, ou Proposta adiado indefinidamente, não póde tornar a ser tractado durante todo o periodo da Sessão annual etc. — Parece-me que estamos neste caso (Apoiados.)

O Sr. Presidente poz então a votos a Proposta do Sr. Conde de Linhares e foi approvada: ficou por tanto adiado indefinidamente o Projecto de Lei, mandado pela Commissão de Guerra que comprehendia os primeiros 10 Artigos do Regulamento do Sr. Zagallo.

O Sr. Conde de Linhares: — Pedi a palavra para uma explicação. — Não fiz proposição nenhuma nova, demonstrei sómente que o systema actual era susceptivel de um augmento com bastante economia, caso fosse necessario dar-lhe maior desenvolvimento. Não se deve pois confundir uma consequencia que deduzi, do que existe, com uma proposição nova; nem a este respeito emiti uma opinião, quanto a dever-se dar este desenvolvimento.

O Sr. General Zagallo: — (Para explicação.) Senti muito que me não tocasse a palavra para dizer, que o Sr. Miranda está em uma contradicção, quando quer o systema dos Conselhos Administrativos, para supprir ao fornecimento do Exercito, pertendendo por isso acabar com o Commissariado; e não quer as circumstancias precisas para se poder levar a effeito esse systema de administração: não direi mais nada a este respeito. — Quanto porem ao voto em separado do Sr. Conde de Linhares, sinto muito que elle não entrasse em discussão porque eu provaria a immensidade de contradições de que está recheado!

O Sr. Conde Linhares: — S. Ex.ª tem pena, e tinta, e póde escrever; eu levanto a luva, e tambem tenho pena e tinta para lhe responder

O Sr. Miranda: — (Para explicação.) Não ha as contradicções que se querem imaginar; quanto ao mais que eu disse o illustre Senador tem as suas razões, e eu tenho as minhas, mas não quero chamar aos outros contradictorios; eu sei combinar as minhas idéas, que facil é combina-las, o ponto é te-las exactas e precisas.

O Sr. Duque da Terceira: — Não sei se se entendeu como eu tinha votado, porque se procedia á votação no momento em que entrei para evitar qualquer equivoco, declaro que votei contra o adiamento.

Proseguindo a ordem do dia, foi lido o seguinte

Parecer.

A Commissão d'Administração Publica examinou o Projecto N.° 24 vindo da Camara dos Deputados, para authorisar a Camara Municipal do Concelho de Tavira, a contrair um Emprestimo até á quantia de 3:000$000 réis, a fim de levar a effeito o desentupimento do Rio da mesma Cidade; e, convencida a Commissão da utilidade geral, que resultará da realisação deste Projecto, é de parecer que seja approvado pelo Senado. = Sala da Commissão em 27 d'Agosto de 1840. = Barão de Renduffe, Relator = Felix Pereira de Magalhães = Manoel Gonçalves de Miranda. Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo 1.° Fica authorisada a Camara Municipal do Concelho de Tavira, para contrair um Emprestimo até á quantia de tres contos de réis, a fim de levar a effeito o desentupimento do Rio da mencionada Cidade, hypothecario os rendimentos actuaes do Municipio, e o producto da contribuição, que julgar mais opportuna nos termos da faculdade, que lhe compete pelo Artigo 82.º §. 3.º N.° 3.º do Codigo Administrativo. = Palacio das Côrtes em 22 de Agosto de 1840. = João de Sousa Pinto de Magalhães, Presidente = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario = José Avellino da Silva e Motta, Deputado Secretario.

Foi approvado sem discussão.

Leu-se depois este

Parecer.

A Commissão de Administração Publica examinou o Projecto de Lei remettido da Camara dos Deputados, para que seja confirmado o Contracto feito entre o Governo, e Manoel Rodrigues Teixeira Pena, para a construcção de uma Ponte no Rio Sadão, e daquelle, exame reconhecendo quanto, para aquelle Districto, seja vantajoso o mesmo Contracto, e não só para aquelle, como para os outros Districtos confinantes, ao mesmo tempo que os Impostos estabelecidos mui pouco pesam em relação á vantagem resultante; é de parecer que o mesmo contracto seja confirmado, approvando-se o Projecto, que delle tracta. = Casa da Commissão 28 de Agosto de 1840. = Barão de Renduffe, Relator = Felix Pereira de Magalhães = Manoel Gonçalves de Miranda.

Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo 1.º É concedida a Manoel Rodrigues Teixeira Pena licença para construir á sua custa, e em terreno seu, uma Ponte de madeira sobre o Rio = Sadão = junto ao Porto de S. Bento, no Districto de Alcacer do Sal, segundo a planta approvada pelo Governo.

§ Unico. Esta Ponte será com tudo construida de modo que deixe livre completamente a navegação do Rio abaixo, e acima, como actualmente acontece aos barcos, que nelle navegam.

Art. 2.° É livre igualmente a passagem do Rio no logar da Ponte, em barcos de particulares.

Art. 3.º É authorisado o Emprezario, pelo tempo de quarenta annos, a receber dos passageiros, que transitarem pela Ponte, os direitos de transito, que vão marcados na Tabella junta, que faz parte desta Lei.

Art. 4.º São isentos de pagamento destes direitos = os Expressos do Governo = os Conductores das Mallas do Correio =, e os Militares em serviço.

Art. 5.° É obrigado o Emprezario a conservar sempre a Ponte no melhor estado de segurança, e comodidade para os passageiros, debaixo da fiscalisação da Authoridade designada pelo Governo.

Art. 6.° A concessão feita por esta Lei ao referido Emprezario cessará, logo que elle faltar ao cumprimento de alguma das condições do Contracto, que para este fim deverá celebrar com o Governo; qual Contracto deverá estar impresso, e á vista dos passageiros para conhecimento das suas estipulações.

Art. 7.º Fica revogada qualquer Legislação em contrario. = Palacio das Côrtes em 22 de Agosto de 1840. = João de Sousa Pinto de Magalhães, Presidente = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario = José Avellino da Silva e Malta, Deputado Secretario.

Tabella dos direitos de transito, que devem pagar os passageiros, que transitarem pela Ponte, que em virtude da Lei, desta data, é authorisado a construir sobre o Rio Sadão, Manoel Rodrigues Teixeira Pena.

Por cada pessoa — vinte réis 20 réis.

Por cada cavalgadura — quarenta réis 40 réis.

Por cada carro, ou carreta — sessenta réis 60 réis

Por cada boi, ou vaca— trinta réis 30 réis

Por cada ovelha, carneiro, cabra, porco, maior ou menor — dez réis 10 réis Palacio das Côrtes em 22 de Agosto de 1840. = João de Sousa Pinto de Magalhães, Presidente = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario = José Avelino da Silva e Malta, Deputado Secretario.

Sem discussão se approvou o Projecto na sua generalidade, e bem assim os Artigos 1.°, 2.º, 3.°, 4.º e 5.º

Relativamente ao 6.°, disse

O Sr. Conde de Villa Real: — Como o emprehendedor deve fazer um Contracto com o Governo, nessa occasião é que se ha de determinar a largura da Ponte, e fixar-se tudo quanto é relativo á sua construcção e solidez, para que seja approvado pela Camara dos Deputados e pelo Senado. — Nesta intelligencia approvo a Artigo.

O Sr. Barão de Renduffe: — Devo informar o illustre Senador que o Contracto já está feito, e a Ponte construida; o Governo fez isto pela authorisação que tinha, achou com quem tractar, e vem aqui receber Sancção desta Camara tendo já obtido a da outra: o Contracto está celebrado com todas as solemnidades legaes, e com muito razoaveis condições, por tanto é negocio já feito, e concluido, e seria contrario ao serviço publico, e á boa fé dos Contractos, (quando senão aponta dólo ou lesão) deixar de o confirmar na sua integra.

O Sr. Conde de Villa Real: — Esta explicação deixa-me completamente satisfeito.

Sem mais discussão foi o Artigo 6.º approvado, e sem que houvesse alguma ácerca delle se approvou tambem o 7.º

Sobre a Tabella annexa ao Projecto, disse

O Sr. Conde de Linhares: — O que se deve aqui attender é, pelo que respeita ás propriedades contiguas a ponte, pois a pagarem segundo este artigo os lavradores visinhos, seria o mesmo que impor-lhes um tributo oneroso. Acho bem quanto ao que é relativo a estrada geral,

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com tanto que nisto se não comprehendam os proprietarios, dentro de um limite razoavel, e que não devem pagar mais de uma vez por dia, sendo possivel que tenham de passar mais vezes, como acontece quando os gados fazem este caminho para o pasto, ou para beberem agoa. Neste sentido proporia uma emenda á Tabella, e a mandarei para a Mesa se parecer admissivel.

O Sr. Barão de Renduffe: — Eu opponho-me a emendas nesta Tabella, porque sobre ella é que se fez o contracto, que o Corpo Legislativo authorisou o Governo a levar a pleno effeito, e não é possivel retirar-lhe agora alguma das condições delle sem que nisto convenha o interessado: em segundo logar, não comprehendo tambem o como quereria o illustre Senador ir alterar ou diminuir o que já se pagava quando havia a barca; e então se o proprietario da barca antiga é senhor da nova ponte, se a passagem pela ponte custa o mesmo que a passagem perigosa e incommoda que antigamente havia, e se de mais a mais fica livre a

quaisquer emprehendedor o estabelecer barcos e passagem, e se não ha em nada disto previlegio ou monopolio, parecia-me que com esta explicação ficará satisfeito o illustre Senador e que a Camara não deverá hesitar na adopção plena desta confirmação d'um contracto contra o qual não existem reclamações, nem se aponta alguma circumstancia que se me afigure attendivel.

O Sr. Conde de Linhares: — Estou satisfeito com a explicação, posto que saiba que em algumas partes se passa mais de uma vez pela mesma paga.

O Sr. Miranda: — Se esta ponte fosse feita em uma estrada publica eu não approvaria esta tarifa que aqui está; por exemplo um carro, que senão diz se e carregado, ou não, 60 rs. e um homem 20 rs.; mas esta ponte não está no mesmo caso é uma ponte isolada, e por tanto não militam aquellas razões, que para outra terra, e outras circumstancias. — Quanto ao argumento de approvar-se aqui porque é contracto já feito, nisto não me conformo eu com o illustre Relator: eu approvei o Projecto e approvo a Tabella porque o Constructor da ponte andou com zelo neste negocio, e dá todas as garantias; por consequencia eu approvo o contracto vendo que é bem succedido, e que não teve a sorte da ponte do Douro e outras empresas. Não tenho duvida em votar pela Tabella, apesar de alguma apparente discordancia.

O Sr. General Zagallo: — Eu pedi a palavra, não para impugnar esta Tabella, ainda que me parece que os seus preços são alguma cousa excessivos; mas como se deixa a liberdade a cada um de passar pela ponte ou deixar de passar, sou de opinião que se approvem quaesquer preços sempre que houver tal condição, porque estou convencido que estes estabelecimentos se não podem effeituar, nem sustentar, sem que as pessoas ou Companhias que os emprehendem, sejam animadas pelo interesse, que de qualquer outra maneira, que produza o mesmo fim, a que todos tendem, por ser a mola real que tudo move; do contrario ninguem se abalançará a cousa nenhuma, e o publico ficará privado dos commodos de que precisa. Eu levantei-me pois simplesmente para rectificar uma expressão do illustre Relator da Commissão quando disse que este negocio estava findo, porque estando contractado e approvado pelo Governo não podia ser aqui alterado. Sr. Presidente, é contra isto que eu fallo: de duas uma; ou os contractos devem ser presentes ás Côrtes só para serem approvados, ou para se lhe fazerem emendas, ou serem rejeitados, se tanto fôr preciso; se elles são mandados ao Corpo Legislativo, é porque precisam da sua sancção, podendo cada uma das Camaras fazer-lhes as alterações que julgarem convenientes; e se as Côrtes não tem authoridade para lhe introduzirem qualquer emenda, nesse caso não ha necessidade nenhuma de lhe serem apresentados os contractos concluidos com o Governo. Por tanto, aquelle principio do illustre Senador não me serve, nem me posso conformar com elle; e tanto que se eu julgasse necessaria alguma emenda ao Projecto em questão, havia de propo-lo nesta discussão, e a Camara, se entendesse que ella era justa, havia de approva-la, sem attenção áquelle principio, que é insustentavel.

O Sr. Barão de Renduffe: — Os principios que estabeleceu o illustre Senador são aquelles que eu professo, e professamos todos; por consequencia, sei que todas as vezes que se concede ao Governo authorisação para fazer alguma cousa, e se lhe ordena que remetta depois os papeis relativos a qualquer contracto que resultasse dessa authorisação, entende-se que o Poder Legislativo póde então entrar no exame de todas as circumstancias desse contracto, para ver se o Governo exorbitou da authorisação que lhe havia dado. Ora, o Corpo Legislativo o que disse ao Governo foi, que mandasse fazer a ponte por quem a fizesse mais vantajosamente para o serviço publico, e com a paga de passagem que fosse rasoavel e não lesiva para nenhum dos interessados, e o Governo dá conta que quem mais barata a faz é o proprietario dos terrenos adjacentes, que se obrigou a construi-la com a condição de alli se não pagar mais do que aquillo mesmo que até agora se era obrigado a pagar na barca que elle possuia: o Governo aceitou esta condição, impondo-lhe outra, isto é, que a toda a gente fosse livre o collocar alli uma barca, se isso podesse convir a alguem: por consequencia, existindo o correctivo do artigo 2.°, pelo qual é livre a paisagem do rio no logar da ponte em barcos de particulares, torna-se desnecessario alterar a Tabella, porque o serviço da ponte como esta mesma Tabella, é sem questão de uma grande vantagem para o publico que agora com mais segurança e brevidade, e a toda a hora do dia e noite atravessa o rio pelo mesmo preço porque o passava na barca; em quanto que sem a ponte e Tabella, e reduzido ao serviço da barca tinha mais incommodo e muitas vezes tinha de esperar que alli estivesse o homem que a conduz etc. Por tanto, era debaixo deste sentido que me parecia pouco conveniente entrar agora na questão do preço da tabella.

O Sr. Visconde de Porto Côvo: — Sr. Presidente, eu pedi a palavra para reflectir que não póde já ter logar discussão alguma sobre esta materia. Toda a Camara approvou o artigo 3.° que diz: (leu.) Logo está implicitamente votado o preço marcado na Tabella, e para que havemos de perder o tempo com reflexões que já vem fóra da occasião propria. — Em quanto a vir o contracto á Camara, é sempre necessaria essa formalidade, porque sem isso, e se a Camara o não approvasse, não poderia elle obrigar as duas partes. — Portanto peço a V. Ex.ª, que proponha á Camara se a materia está discutida, porque não póde continuar a discussão visto que se approvou o artigo 3.º de que faz parte a Tabella.

O Sr. Presidente: — Eu quero sómente notar ao illustre Senador que nesta Camara sempre foi pratica approvarem-se as Tabellas á parte, não obstante estarem já approvados os artigos a que ellas se referem (Apoiado.)

O Sr. Visconde de Porto Côvo: — Ha discussão sobre a Tabella, mas não fóra de tempo, porque nem todas as Tabellas vem inseridas no artigo da Lei como esta de que se tracta.

O Sr. Vellez Caldeira: - Sr. Presidente, V. Ex. disse tudo quanto se podia dizer a este respeito, e tambem o que eu queria dizer; isto é, que pela approvação do Artigo senão podia reputar approvada a Tabella: isto seria contrario a todas as praticas parlamentares, e a todos os exemplos desta Camara, e mesmo ao que S. Ex.ª o Sr. Visconde de Porto Côvo praticou o anno passado na discussão de differentes Tabellas de Projectos que aqui se apresentaram. Approvado o Artigo 3.°, era necessario que se estabelecessem os preços a que ella se refere, por isso que esta Tabella fica fazendo parte da Lei.

O Sr. Miranda: — Pedi a palavra, não para fallar na questão, mas para não deixar intacto e sem resposta um principio, que ha pouco ouvi estabelecer. Ouvi imittir a opinião de que o Contracto estava feito pelo Governo, e que por tanto não tinha logar a alteração desta Tabella: não posso admittir esta idéa. Se o meu illustre collega reflectir ha de ser da minha opinião: estes direitos de passagem são verdadeiros impostos, e fazendo esta condição parte integrante do Contracto, é claro que elle não póde ser effectuado neste ponto, sem approvação das Camaras; se por exemplo se houvesse de fazer uma estrada com o estabelecimento de barreiras, e de quanto se havia de pagar nellas, por ventura podia o Governo taxar estas cotas de passagem sem a approvação das Camaras? Não, Sr. Presidente, elle fez um Contracto, mas a condicção do imposto, dá-lhe um caracter provisional, que o torna dependente do voto do Corpo Legislativo: é isto o que se pratica em todos os Paizes onde existe Governo Representativo. Pedi a palavra simplesmente para não deixar passar aquelle principio, porque se passasse sem observação, poderia vir algum Ministro que se quizesse aproveitar delle em prejuizo das garantias do Povo Portuguez.

O Sr. Vellez Caldeira: — Sr. Presidente, eu não posso deixar de dizer que acho excessiva a Tabella, nem posso deixar de pugnar pelos direitos dos que pertenderem aproveitar-se da passagem. Primeiramente, nós não podemos prescindir da discussão desta materia; é para isso que ella cá veio, e se a Camara a não podesse discutir era escusado que lha remettessem. Agora digo que acho um preço excessivo na taxa como aqui está: (leu.) Não se diga que se deve attender a que este homem há-de estabelecer a Ponte no seu terreno e á sua custa, porque por isso tambem elle tem a vantagem de não haver outra Ponte naquelle sitio: a concessão de poder haver barcas naquelle ponto torna-se illusoria, parque o terreno, de um lado e do outro, é todo deste homem, e sendo aquelle ponto o mais commodo para a passagem do Rio, ninguem podera usar de tal concessão, porque ninguem quererá estabelecer uma barca em sitio que não é seu, e em que não fica a passagem facil: se é pois verdade que o proprietario faz a despeza da ponte á sua custa, tambem é certo que arrecadará este imposto por quarenta annos; sendo por tanto manifestas as vantagens que deste privilegio tirará. Entendo por tanto que esta taxa é excessiva, por que lealmente dez réis por cada cabeça de gado miudo, é uma taxa que senão paga em passagem alguma.

O Sr. Barão do Tojal: — Sr. Presidente, eu não estou ao facto do local, mas parece-me que isto é uma travessia particular por onde provavelmente não ha de haver muito movimento ou passagem; e neste caso considero que os direitos das barreiras são até moderados, por quanto o que á primeira vista aqui parece alguma cousa mais pesado, são os dez réis por cada ovelha, carneiro, cabra ou porco. Ora foi sempre admittido por todos os architectos de pontes, que nada ha mais violento ou mais experimenta uma ponte qualquer do que são os rebanhos: e fallando eu com o architecto que foz a celebre ponte de Menai, perto de Banger, em Galles, que é a maior ponte de suspensão que eu creio existe em todo o Universo, e perguntando-lhe eu, se um carro puchado por oito cavallos com o peso d'uma carga de cinco toneladas poderia abalar aquella ponte, respondeu-lhe elle, que nada a experimentava tanto como um rebanho de carneiros; e sempre ouvi dizer que rebanhos de gado abalavam uma ponte mais do que qualquer peso concentrado e regular. O correctivo porém está no proprio Artigo; e se eu pelo transito de cem carneiros não quizer pagar dez tostões, posso ir affectar um barco e pagarei o que ajustar, que ha de ser muito mais. Por consequencia não vejo na Tabella exorbitancia nenhuma; ao contrario acho que o individuo que se propoz a esta empreza parece que foi mais influido pelo espirito de patriotismo do que de interesses particulares; não vejo tão pouco que elle não fosse senhor de fazer aponte, visto que a construcção foi feita sobre a sua mesma propriedade com gasto de materiaes, ferramentas, e dinheiro seu.

Todavia é-lhe necessario vir impetrar um acto legislativo para o authorisar a perceber estes direitos, mas nisto não ha privilegio exclusivo, e em todo o mundo seria isto livre; por tanto estes direitos considero eu muito commodos: em Inglaterra para qualquer empreza particular, ou companhia construir uma ponte, é sempre necessario que obtenha um acto do Parlamento para authorisar a percepção dos impostos de barreira que em taes casos são geralmente muito fortes, mas porque? Porque se se aggregarem meia duzia de individuos, ou mil, para qualquer empreza particular, não sendo munidos de um acto do Parlamento qualquer membro dessa Sociedade póde ser processado como proprietario exclusivo da empreza, pelas dividas de toda a Companhia, e póde até ser mettido n'uma cadêa: e por isso ninguem quer entrar em uma empreza publica ou particular, como accionista, em quanto não obtem um acto do Parlamento, que a incorpore legalmente, então os membros da companhia não são individualmente incommodados, porque só póde ser processado o seu Secretario: eis-aqui a principal razão porque se vai buscar a sancção do Parlamento, além da que precisasse para a precepção dos direitos de barreira. Todavia acho muito proprio em these que os Corpos Legislativos authorisem estas

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APPENSO AO N.º 261 DO DIARIO DO GOVERNO.

emprezas, e oxalá que houvesse particulares entre nós que quizessem fazer o mesmo que este benemerito Cidadão. Voto-lhe a Tabella com todo o meu coração. (Apoiados.)

Não havendo quem mais pedisse a palavra, foi a Tabella posta á votação e ficou approvada.

Leu-se então o seguinte Parecer.

A Commissão de Administração Publica examinou o Projecto N.º 26, vindo da Camara dos Deputados, para habilitar a Camara do Concelho de Ponta Delgada, na Ilha de São Miguel, e da Horta na Ilha do Fayal a contrahirem, a primeira um emprestimo de 16:000$000 réis em moeda insulana, e a segunda um de 1;200$000 réis na mesma moeda, a fim de poderem construir mercados publicos, e vencida a Commissão da vantagem local que resulta da existencia de taes Estabelecimentos, é de parecer que Projecto seja approvado pelo Senado.

Sala da Commissão em 28 de Agosto de 1840. = Barão de Renduffe, Relator. = Felix Pereira de Magalhães. = Manoel Gonçalves de Miranda.

Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo 1.º É authorisada a Camara Municipal da Cidade de Ponta Delgada, na Ilha de São Miguel, para contrahir o emprestimo de dezeseis contos de réis em moeda insulana, para construir um mercado publico na mesma Cidade.

Art. 2.° Para o mesmo fim é authorisada a Camara Municipal da Cidade da Horta, na Ilha do Fayal, a contrahir o emprestimo de um conto e duzentos mil réis na mesma moeda.

Art. 3.° Estes emprestimos e seus juros serão amortizados pelos rendimentos dos mercados; podendo com tudo as Camaras empregar para o mesmo objecto o excedente da sua receita ordinaria, quando o houver.

Art. 4.° Fica revogada a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes em 22 de Agosto de 1840. = João de Sousa Pinto de Magalhães, Presidente. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario. = José Avellino da Silva e Motta, Deputado Secretario.

Dispensada a discussão na generalidade, foi lido o Artigo 1.°, e disse

O Sr. Barão de Renduffe: — Este primeiro Artigo do Projecto, é consequencia de uma Representação que fez a Camara da Cidade de Ponta Delgada, assignada pelos seus membros e pelos notaveis da Terra, pedindo authorisação ao Corpo Legislativo para construir um mercado: informou o Administrador Geral ouvindo todas as Authoridades secundarias, e depois informou tambem o Governo, dizendo que convinha inteiramente no pedido para que aquella Camara requer authorisação. Por consequencia supponho que não poderá haver discussão alguma importante a este respeito. (Apoiados.)

Approvou-se o Artigo 1.º

Leu-se o 2.°, e teve a palavra

O Sr. Barão de Renduffe: — Do mesmo modo a Camara Municipal da Cidade da Horta, representou ao Corpo Legislativo a necessidade de levantar este emprestimo, a fim de construir um mercado publico; e o Governo informa que está no caso de merecer das Côrtes a authorisação que pede.

Approvou-se o Artigo 3.°, e bem assim o 3.º e 4.°

Passou-se ao seguinte

Parecer.

Foi presente á Commissão de Administração Publica o Projecto de Lei, enviado pela Camara dos Deputados, para que ao Governo se conceda um credito extraordinario de 9:000$000 para serem igualmente repartidos pelos Districtos de Ponta Delgada, Angra do Heroismo, e Horta, no Archipelago dos Açôres, e exclusivamente applicados a reparar os estragos nos mesmos Districtos, acontecidos pela tempestade de 5 de Dezembro de 1839; e, tendo a Commissão examinado o referido Projecto, é de parecer que elle seja adoptado.

Casa da Commissão 28 de Agosto de 1840. = Barão de Renduffe, Relator. = Felix Pereira de Magalhães. = Manoel Gonçalves de Miranda.

Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo unico. É concedido ao Governo um credito extraordinario de nove contos de réis para serem igualmente repartidos pelos Districtos de Ponta Delgada, Angra do Heroismo, e Horta, no Archipelago dos Açôres, e exclusivamente applicados a reparar os estragos, que nas Obras Publicas daquelles Districtos tiver occasionado a tempestade do dia 5 de Dezembro de 1839.

§ 1.º Este credito extraordinario será tomado na devida contemplação na somma, que na futura Lei do Orçamento se ha de votar para as Obras Publicas de cada um dos referidos Districtos Administrativos.

§ 2.° O Governo apresentará ás Côrtes na proxima Sessão Ordinaria uma conta circumstanciada dos estragos causados, reparos feitos, e sommas dispendidas em cada um dos tres Districtos mencionados.

Palacio das Côrtes em 22 de Agosto de 1840. = João de Sousa Pinto de Magalhães, Presidente. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario. = José Avellino da Silva e Motta, Deputado Secretario.

Dispensou-se a discussão na generalidade.

Leu-se o Artigo 1.°, sobre o qual disse

O Sr. Barão de Renduffe: — Suponho que o Senado quererá ter conhecimento dos fundamentos deste pedido. É uma proposta do Sr. Ministro dos Negocios do Reino apresentada na Camara dos Deputados, em cujo preambulo diz o seguinte: (leu, e proseguio.) Por consequencia é de notoriedade publica a necessidade de auxiliar aquellas terras com meios extraordinarios, afim de se repararem obras publicas que foram estragadas por causas sobrenaturaes: e na verdade nenhuma terra deve merecer mais attenção e solicitude do Corpo Legislativo do que o archipelago dos Açores, que tantos serviços prestou á causa da Liberdade, e que soffreu extraordinariamente em resultado desta grande tempestade. As Camaras Municipaes respectivas, e com especialidade a de S. Miguel, acha-se sobrecarregada com a sua avultada despeza permanente, e com a de uma quantidade de obras de grande interesse, como estradas, e outras que lhe absorvem os rendimentos de que ella poderia dispor, mas ainda quando muitos tivesse não locava á Camara Municipal reparar estas obras porque não são propriamente de municipio, mas do serviço publico do Estado.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Sr. Presidente, eu approvo a medida proposta, porque nos ficaria mal não a approvarmos; mas eu queria que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino tractasse tambem de reparar com igual zelo os estragos que, há seis annos, existem em Campolide, ao Arco do Cégo etc. e cujos proprietarios ainda não foram indemnisados de suas perdas. (Apoiados.)

Não havendo quem pedisse a palavra approvou-se o Artigo I. e seguidamente os §§ 1.º e 2.°

Leu-se mais este

Parecer.

A Commissão d'Administração Publica examinou o Projecto de Lei N.º 37 vindo da Camara dos Deputados sobre Proposta do Governo para ser autorizada a Camara Municipal da Cidade da Horta a contrahir um emprestimo até á quantia de tres contos de réis, em moeda insulana, exclusivamente applicados á reedificação dos Edificios da Casa da Camara, Roda de Expostos, e Cadêa publica; e, observando que a adopção do Projecto é de reconhecida utilidade local, a Commissão entende que deve ser approvado. = Sala da Commissão em 2 de Setembro de 1840. = Barão de Renduffe, Relator. = Manoel Gonçalves de Miranda = Felix Pereira de Magalhães. Projecto de Lei (a que se refere o Parecer.)

Artigo 1.º É authorisada a Camara Municipal da Cidade da Horta para contrahir um Empréstimo até á quantia de tres contos de réis, em moeda insulana, com exclusiva applicação á reedificação do Edificio da Casa da Camara, Roda dos Expostos, e Cadêa Publica.

Art. 2.° Para o pagamento dos juros, e amortisação d'este Emprestimo poderá a Camara Municipal hypothecar o excedente da receita sobre as despezas ordinarias do Municipio.

Art. 3.° Fica revogada a Legislação em contrario. = Palacio das Côrtes em 29 d'Agosto de 1810. = João de Souza Pinto de Magalhães, Presidente. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Secretario = João Antonio Lobo de Moura, Deputado Secretario.

Tendo-se dispensado a discussão na generalidade, leu-se o Artigo 1.°, e disse

O Sr. Vellez Caldeira: — Desejava que o illustre Relator da Commissão dissesse se estava verificada a necessidade desta authorisação.

O Sr. Barão de Renduffe: — Creio que tenho respondido ao illustre Senador com o Parecer da Commissão: isto era uma necessidade local; e ha todas as informações necessarias que manifestam a necessidade de se construir um Paço do Concelho, visto que as Sessões da Camara se estão celebrando em uma casa emprestada: do mesmo modo as tres obras para que se pede a aplicação desse emprestimo, isso vem tudo justificado com os documentos que foram presentes á Commissão, e que vieram da outra Casa com o Projecto de Lei que está em discussão.

Não se produzindo outra observação approvou-se o Artigo 1.°, e logo depois o 2.º e 3.º foram approvados sem debate.

O Sr. Presidente deu para ordem do dia a discussão dos Pareceres respectivos aos seguintes Projectos de Lei: — sobre os Empregados Publicos jubilados, aposentados ou reformados podérem accumular meio vencimento de novos Empregos; conceder diversos Bens Nacionaes a certas Corporações; e considerar como membros do Magisterio Publico, os Lentes da antiga Academia de Marinha da Cidade do Porto (todos da Camara dos Deputados:) fechou esta Sessão pelas tres horas e meia.

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