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DIARIO DO GOVERNO.

Extracto da Sessão de 16 de Novembro de 1840.

(Presidencia do Sr. C. de Mello.)

Pela uma hora e meia se procedeu á chamada, e se acharam presentes 19 Srs. Senadores.

O Sr. Secretario Machado participou á Camara, que S. Ex» o Sr. D. de Palmella mandára recado, que só mais tarde poderia vir assistir é Sessão.

Em seguida fez a leitura da Acta da Sessão antecedente, e foi approvada.

Deu depois conta do expediente o qual teve o destino competente.

Achando-se então a Camara em numero legal se passou á

ordem do dia,

Continua a discussão do Projecto de Reforma Judiciaria.

Art. 14.º Nas causas summarias, a nas causas fiscaes não haverá intervenção de Jurados.

§. unico. Tambem não haverá intervenção de Jurados nas demais causas civeis, se a prova dos factos fôr sé por documentos, ou por testemunhas tiradas por Carta de Inquirição; e em todo o caso em que alguma das partes nelles não consinta, com tanto que assim o declare antes d’aberta a Audiencia Geral, em que tiver de ser julgada a causa. Estas disposições são extensivas ás causas pendentes, sem Sentença final em primeira Instancia.

O artigo foi approvado sem discussão.

O Sr. Caldeira disse que tinha querido oppôr-se ao artigo pela generalidade em que esta concebido, porém posto que votara contra elle.

não pedíra a palavra, por conhecer o desejo d Camara, que por vezes tem manifestado de não demorar á Projecto de que passe como veio. Declarou porém que quanto ao §. animado pela divisão que houve sobre elle na Commissão onde quatro de seus membros tinham votado pelo e quatro pela sua eliminação, não podia 4 -este respeito deixar de motivar o seu voto. Disse que da Carta Constitucional dimanava o principio de entrarem os Jurados nas causas crimes e citeis, Que á Senhor D. Pedro, de saudosa memoria, que foi grande por todos Os principios, tinha, já a sua gloria estabelecida pela dadiva da Carta, e pelo estabelecimento do Jury, estabelecimento luminoso; e que era para admirar que miseros legisladores quizessem derrubar um tão bello estabelecimento, allegando-se varios motivos, taes como o de não estar a Nação ainda preparada para tanto, e abusos que tinham havido: que tambem a Inglaterra quando alli ha tantos seculos se estabeleceram os Jurados nas causas civeis, não estavam mais preparados do que a Nação Portugueza esta agora; que se havia abusos, se remediassem: que admittia que não houvessem Jurados quando ambas as partes nisso concordassem, mas não pelo mero desejo de uma só das partes, o que dava causa a abusos. Citou a este respeito e leu uma passagem das obras Jurisconsulto inglez Blackstone ácerca dos Jurados nas causas civeis, clamando contra serem estas causas entregues só aos Magistrados, que nunca olharam para o bem de muitos: que entre nó é costume deitar abaixo as Leis quando as não sabemos emendar. Terminou, votando contra a ultima parte do §.

O Sr. M. D. Leitão disse que a Commissão tinha seguido a opinião do Sr. Caldeira, contra a liberdade concedida a um dos litigantes de excluir, quando lhe parecesse, o Jury. Citou o artigo da Constituição que diz, que haverá Jurados nas caudas civeis e crimes, e mostrou que esta parte do §, era contra a Constituição, e que a Lei não tinha poder para derrogar aquelle artigo da Lei fundamental: disse que a Lei podia limitar os casos em que deva intervir o Jury; mas não podia nesses casos, que ella designar, deixar ao arbitrio de uma, das partes o excluir o Jury contra a vontade da outra parte; que se isso fosse, o artigo da Constituição não seria um preceito obrigatorio. Disse que a Lei fundamental dá o direito a ambas as partes para não serem privados dos Jurados nos casos que a Lei determinar; que por tanto se uma das partes tem direito a não ser distrahida do Juizo por Jurados nesses casos, é visto, que a outra parte a não póde privar desse direito a seu arbitrio. Terminou votando contra o §.

O Sr. Serpa Machado disse que combateria só os argumentos dos Srs. Caldeira e Leitão, dizendo que as vistas da Lei são restringir os Jurados nas causas civeis; que por tanto mostrando-se que elles não convêm em muitos casos, esta provado que se podera restringir sempre que se julgar não convirem. Mostrou que nisto se não exorbitava da Constituição, nem da Carta, logo que houvessem casos em que os Jurados não conviessem. Observou que na Europa só Inglaterra admitte os Jurados no civel, e na America nos Estados Unidos, porque nas outras partes, só são admittidos nas causas crimes. Ponderou que o processo dos Jurados nas causas civeis tem produzido graves prejuizos, que seria longo narrar, e que por isso convinha restringir os casos de intervenção de Jurados o mais possivel, para nos não affastarmos do principio da Lei fundamental, porque o não podemos destruir; porém que talvez não tarde que isso se venha a fazer; mostrou que disto se deduzia que haveria melhor administração de Justiça, e se evitariam muitos e graves prejuizos.

O Sr. Visconde de Laborim expondo a doutrina do §. 1.º do Art. 123 da Constituição,

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fez vêr com varios, e energicos argumentos, que o unico do Art. 14 do Projecto de Lei, que esta em discussão, não lhe era opposto, assim na primeira parte como na segunda, e ampliação desta; pois que, consignando o q princípio da existencia dos jurados nas Causas Cíveis, o fazia da única maneira, pela qual se combinava o preceito fundamental com a attenção, que deveriam merecer os clamores geraes dos povos contra uma similhante instituição em taes Causas, e disse, com enthusiasmo, que, se não fosse a cega obediencia, que elle orador prestava áquelle primeiro citado artigo, nem assim mesmo a queria; e que, segundo a sua opinião, ella só deveria ter logar por ora nas Causas de Commercio, que considerava Civeis por natureza, nas de Liberdade de Imprensa aos termos da ultima Lei, e nas Crimes; e nestas só por occasião da sentença; e que tempo virá que esta excellente planta mereça em nosso terreno mais ampla, e geral cultura, e por estas razões, votou a favor do artigo.

O Sr. Caldeira combateu os argumentos do Sr. Serpa Machado, e corroborou Suas primeiras idéas, dizendo que se ha defeitos nas Leis, que se emendem, mas não se derroguem: que isto é dar direito á parte que conta cem o voto do Juiz, para recusar os jurados contra a vontade e talvez com prejuiso da outra parte. O Sr. Leitão disse que o que havia a provar era se por este §. se offendia ou não o artigo da Constituição.

O Sr.s Serpa Saraiva ponderou que a Constituição diz que haverá jurados, porém que não obriga antes dava ampla authorisação para restringir mais eu menos os casos em que os póde haver: que por tanto, não se excluindo todos, Se não offende o artigo da Constituição, e que não via como se possa offender aqui, quando não offende, segundo o art. 14 já approvado nas Causas sumarias e fiscaes, aquellas do maior interesse para o Estado; é estas em que se não póde suprimir as partes essenciaes réo processo: a que succederia, se o jury, como querem alguns Srs., fosse indispensavel regra constitucional. Concluiu que na Commissão tinha adoptado o artigo que agora tambem o approvava, até porque a triste experiencia tem mostrado os pessimos resultados, que restabelecimento do jury tem produzido entre nós.

Os Srs. Serpa Machado Cordeiro Feyo, e Leitão déram algumas explicações, é o Caldeira, mandou para á Mesa a seguinte emenda. = Quando a prova fôr de documentos, ou de testemunhas tiradas por carta de inquirição, não haverá jurados, consentindo ambas as partes.

O Sr. Barão de Renduffe depois de haver dado algumas explicações sobre a questão incidental de ordem, tractou largamente da materia, fazendo vêr que os argumentos unicos que os illustres Senadores os Srs. Leitão é Caldeira haviam produzido produzido, e muitas Vezes repetido, eram que a disposição do se encontrava com a doutrina do § I.° do art. 123 da Constituição, e que a circumstancia de poder uma das partes recusar a interferencia - dos jurados fazia com que mais se não podesse dar o caso de termos jurados em processos Civeis. Pelo que respeita ao primeiro argumento mostrou que a Constituição não estabelece a these geral = haverá jurados no Civel e Crime = e que este argumento é mui fraco para deduzir delle consequencias, porque se torna n'uma interpretação do […], contraria ás regras, de hermeneutica e mesmo da gramática, porque o §. Diz = haverá jurados assim no Civel come no Crime, nos casos e pelo modo que a que a Lei determinar: a Lei pois é que ha de determinar: os casos e o modo em que tem de haver jurados, porque a Constituição, não obstante o muito que se esforçou o Sr. Leitão, não fez mais do que indicar esta instituição que a Lei regulamentar applicará como convier. Accrescentou, que se a Constituição fosse preceptiva se maravilhava eu então que os illustres Senadores não tivessem combatido a disposição anterior, já sanccionada pela qual excluimos o Jurado nas Causas summarias e fiscaes, e é certo que a Constituição as não exceptua, porque é certo que á Constituição as não estabelecendo regra alguma geral menos podia indicar as excepções que portanto bem votam o Senado, e os illustres opponentes no §. Em discussão, porque o artigo constitucional o que diz é = que a Lei determinará os casos e o modo em que tem de haver jurado no Civel e no Crime = Que em quanto ao 2.º argumento elle é tão secundario que eis illustres Senadores não se oppondo á disposição do §. antecedente sancionaram o principio que nas

Causas summarias e fiscaes, mesmo quando ambas as partes o não quizessem, o Juiz sempre julgará do facto e do direito. Que em resposta ao que asseverou o Sr. Leitão de que adoptando-se o § cessava de existir jury no Civil, respondia a S. Ex.ª que as Causas Commerciaes são Civeis, e que continuam a ter jurados: que continuará a havello quando ambas as partes nisso convierem, e que isto terá

muitas vezes logar sobre tudo quando o Ministerio publico fôr parte, e que por ultimo como esta limitação é authorisada pela Constituição, reclamada pela dolorosa experiencia que o Paiz tem supportado, que não devemos ter receio de condescender com a vontade geral, e com a vontade dos proprios jurados, porque os homens que a Lei chama a este honroso onus não comparecem, e nem se inscrevem, e cota vergonha referia o que hoje lhe asseverára um Juiz mui conspicuo do capital, que derradeiramente se lhe apresentará ma audiencia Certidões de que jurados não compareciam porque estavam enfermos, ou tinham fallecido no Hospital — que se fosse possivel encontrar para cada uma das Comarcas juradas tão conspicuos como os do Commercio de Lisboa ou do Porto, que não obstante a grave difficuldade que existe em discriminar o fada do direito, em negocios civeis, e em estabelecer a raia que marque aonde um acaba, e outro começa que então, mas com custo, votaria por uma maior latitude; porém que sendo isto impossivel entende que grande serviço faz ao Paiz, e aos jurados em votar pelo §. tal qual veio no Projecto de Lei discutido na Camara dos Deputados, porque as importantes garantias sociaes consistem menos no jurado Civel, do que nos recursos, e sobre tudo na publicidade do processo, e que por tudo isto approvava a doutrina do §. em discussão.

O Sr. Ministro da Justiça combateu os argumentos produzidos Contra o paragrapho, e narrou alguns factos escandalosos acontecidos nas Provincias, onde descendentes de casas antigas têem sido desapossados dellas, pela intervenção dos Jurados nas causas civeis.

O Sr. Pereira de Magalhães disse que adoptava a emenda do Sr. Caldeira, e disse que o verdadeiro argumento versava sobre a justiça ou injustiça do paragrapho sobre não haver intervenção de Jurados só porque uma das Partes os não quer, que sé allega que póde uma das Partes ter subornado o Jury; e a outra sabe-lo e não querer os Jurados; mas que assentava ser mais fácil subornar um homem do que subornar doze.

O Sr. Ministro da Justiça disse que era mais facil comprar os Jurados do que o Juiz, porque este tem mais força para se livrar com coragem das ameaças, do que o Jurado que vê entre si o punhal que o póde ferir e não tem força para o repellir, e que demais da decisão do Jury não há appellação, quando do Juiz ha recurso, o que offerece muitas mais garantias.

O Sr. Amaral disse que não concordava com a segunda parte do artigo, onde diz que uma das Partes basta para fazer que não haja intervenção dos Jurados, o que é contra a Constituição, porque a Lei deve determinar os casos, é não os deixar á decisão de uma das Partes sem accôrdo com a outra.

Passando-se á votação se pôz o paragrapho a votos por partes, e foram successivamente approvadas, e foi rejeitada a emenda do Sr. Caldeira.

Entrou em discussão um novo artigo proposto pela Commissão, que diz assim:

Art. — Fica em inteiro vigor a Legislação anterior ao Decreto N.° 244 de 16 de Maio de 1832, relativa á cobrança dos alugueres e despejos de casas.

O Sr. B. de Renduffe disse que a Reforma Judiciaria provia nesta parte sobre despejos de casas, e bem assim ácerca dos alugueres; e que substituiu á penhora o aresto; e em verdade casos ha como de bemfeitorias, etc. que os inclinos tinham razão contra os senhorios, e que para estes casos senão deve fazer reviver Leis antigas, quando as derradeiras têem convenientemente providenciado: que submettia estas observações ao Senado sem se oppôr á adopção do artigo.

O Sr. Pereira de Magalhães disse que se estava, na Reforma Judiciaria, não prejudicava estar aqui tambem.

O Sr. B. de Renduffe disse que assim era a respeito de despejos, mas não ácerca de cobranças: que, os proprietarios tinham já Bastantes garantias na Reforma Judiciaria, sem quo seja necessario recorrer agora a, um assento antigo: que estas dividas não devem ser tão privilegiadas como uma divida commercial.

O Sr. Serpa Machado orou contra a emenda; dizendo que aquella materia devia ficar para ser tractada em outra occasião.

Sendo posto a votos o novo artigo foi approvado.

Art. 15.º O Governo regulará os mezes em que as audiencias geraes devem principiar nas diversas Comarca, tendo em vista a commodidade dos povos, e a estação do anno que em cada uma dellas é mais propria para esse serviço

Art. 16.º São abolidas as multas estabelecidas nos artigos 285 §. 1.°, e 438 §. 5.º da 1.ª Parte do Decreto de 13 de Janeiro de 1837. O exequente litigando em embargos de terceira, ainda que decaia, não será sujeito á multa designada no artigo 411 do sobredito Decreto.

O artigo 15.º foi aprovado sem discussão.

Passou-se ao artigo 16.º

O Sr. V. de Laborim, oppondo-se ao artigo 16.º do Projecto de Lei em discussão, disse em um extenso e minucioso discurso, que não podia convir em que fossem abolidas as multas consignadas nos artigos 285 §. 1.º, e 438 §. 5.º, e 411 da 2.º Parta. Da Reforma Judiciaria, porque, no seu entender, similhante deliberação abria uma porta franca ao dólo dos embargantes de terceiro, mui trevial nas execuções que as multas que elle orador queria ver de todo extinctas, eram a das acções, porque estas se oppunham á liberdade que cada um deveria ter de punir pelo que reputava seu; mas para se descriminar a innocencia da culpa, que era da, opinião que aquellas, e festas, sim tivessem logar, posem só quando se podesse provar dólo, e que uma tal condemnação deveria ser feita por despacho do Juiz, legalmente motivado; e neste sentido mandou para a Mesa a sua emenda.

O Sr. Lopes Rocha offereceu um additamento.

Algumas observações se fizeram, cujo resultado era mostrar a necessidade de que tudo isto fosse remettido á Commissão.

Sendo consultada a Camara decidiu que o artigo e emenda fossem remettidos á Commissão.

Art. 17.º Fita extincta a prévia inquirição de testemunhas na entrada de dia em casa de qualquer Cidadão para a prisão dos indiciados que se presumem nella acolhidos, e para a busca e apprehensão dos papeis, e mais provas materiaes do crime; porém antes de ser ordenada a entrada se formará um auto especial com a declaração de todos os motivos, e razões de suspeita, que Constarem em Juizo.

Foi approvado sem discussão.

Art. 18.º Fica por ora suspensa a ratificação de pronuncia em todos os crimes: assim o Ministerio Publico, como as Partes querelantes, e Réos indiciados poderão aggravar do despacho de pronuncia para; a Relação do Districto, devendo o aggravo ser interposto dentro em cinco dias da data da intimação do mesmo despacho. Estes aggravos serão de petição nas Comarcas das sédes das Relações.

O Sr. Caldeira, por parte da Commissão, offereceu um additamento a este artigo, declarando que se oppunha á materia do artigo na parte em que suspende a ratificação de pronuncia em todos os casos crimes. O additamento diz assim = e os aggravos de instrumento neste caso terão á effeito suspensivo.

O Sr. Ministro dá Justiça, para provar a necessidade desta medida, leu um periodo do relatorio do Procurador da Corôa a este respeito: mostrou, depois a grande differença que havia entre o grande Jury inglez e o nosso.

O Sr. Leitão disse que se não oppunha ao artigo, com tanto que o aggravo de instrumento se declarasse ter effeito suspensivo na fórma do additamento.

Sendo posto á votação o artigo foi approvado, salvo o additamento: depois o additamento foi approvado.

§. unico. A disposição deste artigo não altera a Legislação especial dos crimes commettidos pela imprensa.

Foi approvado sem discussão.

O Sr. Presidente disse que a primeira parte da ordem do dia seria a nomeação da Mesa; porém tendo muitos Srs. dito que podia ficar essa nomeação adiada indifinidamente, a Camara depois de consultada assim, o determinou.

Deu então para ordem do dia a continuação da de hoje, e levantou a Sessão depois das quatro horas e um quarto.

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