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SESSÃO N.° 21 DE 14 DE JULHO DE 1911 3

Sendo 2 horas e 20 minutos da tarde e verificando-se a presença de 166 Srs. Deputados, o Sr. Presidente abriu a sessão.

Leu-se a acta da sessão anterior e foi approvada.

Foi lido o seguinte

EXPEDIENTE

Officios

Da Secretaria Geral do Ministerio das Finanças, remettendo, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado Jorge de Vasconcellos Nunes, nota do numero de contribuintes e de predios inscritos nas matrizes prediaes do anno de 1909, por districtos.

Para a Secretaria.

Do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, communicando, em resposta ao requerimento do Sr. Deputado Julio do Patrocinio Martins, que nenhum funccionario dependente d'aquelle Ministerio é Deputado á actual Assembleia Nacional Constituinte.

Para a Secretaria.

Do Sr. Deputado Adriano Augusto Pimenta, justificando as suas faltas ás sessões desde 10 do corrente, por motivo de doença, e pedindo licença de alguns dias até completo restabelecimento.

Para a Secretaria.

Concedida a licença.

Do Sr. Deputado Ramiro Guedes, justificando as suas faltas ás sessões, e pedindo licença de alguns dias para se ausentar da Camara.

Para a Secretaria.

Concedida a licença.

Das associações maritimas, pedindo que um manifesto relativo aos casos anormaes que se deram em Alcochete no dia 2 de julho corrente, com descarregadores de mar e terra, que acompanhava impresso o officio, fosse distribuido pelos Srs. Deputados.

Para a Secretaria.

Teve segunda leitura o projecto de lei sobre a remodelação e reducção de preço do chamado "Diario do Governo".

Senhores Deputados á Constituinte r Uma das mais insignes personalidades da Espanha contemporanea, Joaquim Costa, jurisconsulto, homem de letras, republicano prestigioso, caracter brilhantissimo, e em tudo documento glorioso da grande evolução humana em busca da perfeição, ao publicar, ha annos, o seu esplendido livro la Ignorancia del Derecho, abriu-o com o capitulo titulado Ignorancia de las leges, que começa assim:

"É sabido que um dos mais firmes sustentaculos das sociedades civilizadas vem sendo, desde ha mais de dois mil annos, uma presunção juris et de jure, que constitue um verdadeiro escarneo e a maior tyrannia que jamais se tem exercido na historia: essa base, esse cimento das sociedades humanas é o que se encerra nestes dois conhecidos aphorismos, herdados dos antigos romanistas:

1.° A ninguem é permittido ignorar as leis (nemini licet ignorare jus);

2.° Como consequencia, presume-se que todo o mundo as conhece, pelo que, ainda que se averigue que alguem as ignorava, o obrigam como se effectivamente as conhecesse (nemo jus ignorare censetur, ignorantia legis neminem excusat).

Esta presunção mantem-se, apesar de se saber que é contraria á realidade das cousas; sabendo-se que é uma ficção, sabendo-se que é uma falsidade, e sabendo-se:

1.° Que ninguem conhece todo o direito, de que só uma insignificante minoria de homens sabe uma parte, e não grande, das leis vigentes, num momento dado;

2.° Que é impossivel que a maioria, e ainda aquella mesma minoria, as conheça todas; e

3.° Que a presunção conforme a verdade dos factos, e conforme, portanto, á razão, á justiça e á lógica, seria cabalmente a inversa, isto é, que ninguem conhece as leis, desde que não se prove o contrario.

Não faltam escritores que reconhecem a falsidade e o con venci onalismo d'aquella presunção, a cada passo desmentida pela realidade; pensam, porem, como Ambrosoli, e como o nosso Vicente e Caravantes, que uma tal ficção é absolutamente necessaria para a conservação da ordem social. De maneira que a ordem social nas nações modernas não pode assentar sobre a verdade: necessita de uma abstracção, necessita de um artificio gigante, monstruoso, que condemna os homens a caminharem ás cegas pelo mundo, e que os condemna a regerem a sua vida por criterios que lhes são, e fatalmente hão de ser-lhes ignorados".

Se eu não tivesse outros argumentos para o relatorio e justificação de motivos do projecto de lei que vou ter a honra de submetter á vossa lucida e esclarecida apreciação, evidentemente me bastariam os que do grande jurisconsulto e parlamentar, ha pouco fallecido, ahi ficam reproduzidos.

Mas eu tenho muitos outros, e começarei a enunciá-los por meio de uma pergunta:

Qual era, na gloriosa alvorada de 5 de outubro, o numero preciso das leis vigentes em Portugal?

Não ha jurisconsulto, parlamentar, ou ministro, que com exacção possa responder a esta singela pergunta.

E, todavia, por uma ficção admiravel, suppõe-se, ou faz-se suppor, que todos sabem as leis, a cuja ignorancia ninguem, em defesa, pode soccorrer se.

Alem de não haver o tempo material indispensavel para as ler, e muito menos para as profundar, tão pouco ao certo se lhes sabe o numero, tal foi a consequencia fatal e inevitavel do cahos do poder monarehico e da sua legomaniti - a filha dilecta de taes legiferos e fazedores de leis.

Conhecer as leis pela leitura do Diario do Governo? Santa simplicitas! O Diario do Governo é tão incommodo pelo formato e pelos volumes, mesmo semestraes; são tão grossos, tão compridos e tão largos, que eu nem desejo esse, nem maior castigo aos Srs. Deputados, que, albergados num minusculo quarto de hotel, tenham de arruma-lo ... sobre o proprio leito.

Nada, pois, se perderia em reduzir esse cetáceo antidiluviano ao formato do Diario das Sessões da Assembleia Nacional Constituinte, e em expungi-lo de muita materia, que sem proveito e sem utilidade o torna volumoso. Ficaria d'esse modo reduzido ao formato da Folha Official da Republica Francesa. De resto, seria um formato mais adequado á consulta de volume.

As actas das sessões das Camaras legislativas teem sido demasiadamente lacónicas, e só tarde appareciam - quando appareciam- publicadas.

Quanto ao Diario das Sessões tinha o defeito contrario: - o de ser extremamente prolixo.

Difficilmente n'elle se deparava o util e o importante.

Alguns discursos não eram sequer a reproducção exacta das notas tachygraphicas, sendo por vezes alterados para mais ou para menos, consoante a veleidade dos oradores.