O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

12 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Todas as ameaças são vãs e impotentes contra esta Assembleia e as suas deliberações. (Apoiados).

Tenho a certeza de que logo que esta Assembleia concluir a sua Constituição e eleger os seus poderes, ha de ter todo o apoio da Nação.

De resto, Sr. Presidente, tenho a dizer ao illustre Deputado que devemos estar plenamente satisfeitos com a manifestação do povo do Porto e com a retratação feita pelo jornal.

No entanto eu entendo que a policia e os tribunaes se devem occupar de esclarecer o caso.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Sá Pereira para realizar a sua interpellaçao ao Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Sá Pereira: - Começo por declarar a V. Exa., Sr. Presidente, e á Camara, que a minha interpellação dirigida ao Sr. Ministro da Justiça, por causa da maneira como está correndo o processo movido contra os implicados nas fallencias do Credito Predial, é uma questão da mais alta gravidade, para a qual chamo a attenção dos Srs. Deputados.

No tempo da monarchia os Deputados republicanos de então dirigiram justificadamerite as mais asperas censuras e os ataques mais violentos a todos os Governos por não fazerem punir es grandes criminosos. Os Deputados republicanos, acompanhados pela opinião publica, levantaram essa questão de ordem moral, e que a breve trecho se tornou um dos factores principaes para a queda da monarchia. Foi essa uma das questões mais escandalosas que se levantou, por isso que toda a gente, sabendo quem eram os criminosos, perguntava porque a justiça portuguesa não os punia como mereciam.

Hoje, Sr. Presidente, eu estou assistindo a tudo quanto ha de mais extraordinario, porquanto, proclamada a Republica, esses criminosos continuam em liberdade, por isso que, pronunciados pelo juizo da primeira instancia, foram depois despronunciados pela Relação de Lisboa. Nestas condições, eu peço ao Sr. Ministro da Justiça que me diga, se o souber, quaes os motivos de ordem especial que poderiam ter levado os juizes da Relação a despronunciarem os implicados nos roubos e falcatruas do Credito Predial, e, sobretudo, desejo que V. Exa. me explique como podem estar pronunciados empregados d'essa companhia, quando está demonstrado, com toda a evidencia dos factos, que esses empregados não podiam ter commettido esses delictos a não ser com a cumplicidade dos directores da mesma Companhia.

Foram pronunciados como culpados os Srs. José Bello, Pedro Quintella é Talone, e o mais grave é que o Tribunal da Relação manteve a pronuncia do Sr. Quintella, guarda-livros da Companhia, como tendo falsificado a sua escrita e ao mesmo tempo despronunciou o governador d'esse estabelecimento, quando não era de maneira nenhuma possivel que a escrita fosse falsificada, sem elle ter perfeito conhecimento.

Devo dizer, Sr. Presidente, que não tenho nenhuma má vontade contra o Sr. Ministro da Justiça, nem contra qualquer outro membro do Governo, porque, emquanto o Governo for aquelle que actualmente se senta naquellas .cadeiras, lembrar me-hei sempre que saiu da revolução e como tal é merecedor do nosso maior respeito.

Com a minha interpellação apenas tive em vista chamar a attenção do Governo para a maneira como está procedendo a justiça em Portugal.

O Sr. Ministro da Justiça sabe bem, que os juizes que despronunciaram o Sr. José Luciano, como implicado nos crimes do Credito Predial, são os mesmos juizes, ou per 1 tencem á mesma escola, d'aquelles que sanccionaram as

eleições da Azambuja e do Peral. Esses juizes são os mesmos que estiveram sempre ao serviço da monarchia contra as exigencias da opinião publica; os mesmos que validaram a eleição do Sr. José Bello no tribunal de verificação de poderes, quando esse candidato não estava ao abrigo da lei eleitoral de então.

É verdadeiramente assombroso, Sr. Presidente, que a justiça portuguesa se não lembre, que houve em Lisboa um jornal republicano, e dos mais bem redigidos, que demonstrou ter sido parte do descaminho de dinheiros da Companhia do Credito Predial para comprar votos com o proposito de falsificar a representação nacional!

Eu pergunto se esses juizes são os que podem merecer, porventura, a confiança do Governo e a confiança do Pais!

Devo dizer á Camara e a S. Exa. o Sr. Ministro da Justiça, com toda a sinceridade, que não posso admittir, sem o mais vehemente protesto, interpretando o sentir da opinião publica, que a Republica consinta que esses juizes continuem praticando actos incorrectos.

Eu quero que o poder judicial tenha toda a sua liberdade de acção, e é isso que me vae responder o Sr. Ministro, affirmando que o poder judicial é independente e, desde que assim é, nada tem que ver com as suas resoluções. Mas, V. Exas. sabem bem que, exactamente por alguns d'esses juizes não offerecerem absoluta confiança ao Governo, este, em determinada altura, os transferiu para as nossas possessões.

Sr. Ministro da Justiça! É necessario que os principaes culpados no descalabro do Credito Predial não deixem de ser punidos.

Estou convencido de que uma das causas que mais contribuiram para que o Sr. José Luciano fosse despronunciado, foi ainda a influencia de amigos, antepondo-se á razão da justiça.

Não pode ser!

Sr. Ministro da Justiça! Peço a V. Exa. que não deixe de punir severamente os juizes que não sejam honestos e os traga convenientemente vigiados.

Desejo, Sr. Presidente, que V. Exa. me conceda depois a palavra para replicar ao Sr. Ministro.

O Sr. Ministro interino da Justiça (Bernardino Machado): - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Como está chegada a hora de se entrar na ordem do dia, só poderei conceder a palavra ao Sr. Ministro da Justiça, depois de consultar a Camara e esta dar o seu consentimento para que S. Exa. possa falar.

Consultada a Camara, foi esta de opinião que falasse o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro interino da Justiça (Bernardino Machado): - Sr. Presidente: direi apenas duas palavras para não prejudicar a ordem do dia.

Não é possivel, a proposito seja de que facto for, pôr em discussão toda a magistratura portuguesa. Não é possivel, até porque esta Constituinte sabe perfeitamente quanto temos podido confiar em toda a magistratura portuguesa.

Todas as investigações criminaes teem sido honradamente feitas, honrosamente para a magistratura e para o país.

Não devemos, por modo algum, abalar a magistratura, que é o fundamento absolutamente essencial á vida da nação.

Quanto ao facto especial, eu devo dizer que o Governo procedeu, conforme lhe competia, com todo o respeito, pela independencia do poder judicial. Nem podia ser outro o seu procedimento.