14 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE
O Sr. Matos Cid: - Sr. Presidente: - pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta de emenda; mas como essa proposta é perfeitamente idêntica á que acaba de ser enviada pelo Sr. Antonio ladeira, desisto.
O Sr. José Montez: - Devo lembrar á Camara, que nós estamos a discutir o que se consigna no n.° 42.°: a garantia do habeas corpus. Nestas condições, desde que isto está fixado no projecto de Constituição e sobre este principio a Camara tem de manifestar-se e fixar os principios sobre que o assunto deve assentar, eu entendo que não podem ser eliminados o n.° 21.° e seus paragraphos, tal como foi proposto pelo Sr. Antonio Macieira.
Mando, por isso, para a mesa a seguinte
Proposta
Proponho que se faça em conjunto a discussão dos n.ºs 21.° e 22.° do artigo 5.ª = O Deputado, José Montes.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Correia de Lemos: - Sr. Presidente: - o que se acha contido neste numero e nos seus paragraphos tem indubitavelmente um alto valor. Indiscutivelmente, estão aqui os principios mais sublimes que sobre o assunto se podem apresentar. Legislou-se, pode-se dizer, como se o regime não tivesse mudado; suppondo que os republicanos amanhã podem estar por baixo.
E assim que eu entendo as cousas; é assim que se deve sempre legislar. Só assim se consegue ser verdadeiramente justo. As questões de momento podem levar a muita cousa que se desvie dos verdadeiros principios. Devemos, primeiro que tudo não nos afastarmos das regras da justiça.
Penso, portanto, que a Camara fará bem em conservar este na sua substancia e até na sua forma. Vejo a Camara propensa a discutir de uma maneira demasiado miuda as disposições do projecto; não lh'o levo a mal, porque nisso prova o seu escrupulo, mas tudo tem medida.
A justa proporção é uma cousa que nunca deve perder-se de vista.
Eu julgo que se não tem attendido a este principio fundamental. Não ha duvida nenhuma de que neste numero e seus paragraphos se consignam verdadeiras garantias.
O Sr. Dr. Alexandre Braga chamou-lhes disposição de processo, e afinal, Sr. Presidente, e Srs. Deputados, as grandes injustiças sociaes teem vindo de se não observarem no processo as regras da justiça.
Um processo bem organizado pode muito contra uma lei penal mal purificada. Innumeros individuos que teem sido victimas das injustiças sociaes clamam bem alto para que não haja hesitações em proclamar este principio.
Estão aqui effectivamente leis de processo, mas estão verdadeiras garantias individuaes que é indispensavel conservar na integra para que depois os juizes saibam, na applicação da garantia do habeas corpus, aquillo a que teem de ater-se.
Por consequencia, não nos envergonhemos de consignar aqui leis de processo como estas que nobilitam quem as decretou e o povo para quem se decretaram. (Apoiados).
Ser moderado é a primeira qualidade de um estadista, - e, sem duvida, que esta lei foi feita para tratar tanto os republicanos como para tratar os inimigos e os que não são affectos á Republica.
E necessario que na Republica haja justiça perfeita, completa, para que o pois possa viver tranquillo e todos possam acolher-se a elle com confiança.
Castigue-se severamente aquelle que conspirou, mas, averigue-se, de uma maneira radical, de que forma conspirou. Seja-se então muito severo, estimo-o, mas que se seja acima de tudo justo, - e a Camara seja justa na apreciação da doutrina d'este artigo e seus numeros.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: - Vou consultar a Camara sobre se admitte a questão previa do Sr. José Montez.
Consultada a Assembleia, resolveu negativamente.
O Sr. Aresta Branco: -Sr. Presidente: - pedi a palavra para fazer considerações quasi analogas ás que fez o Sr. Barbosa de Magalhães sobre a materia expendida neste n.° 21.°, principalmente no que diz respeito ao numero de horas em que deve ser entregue o delinquente ao poder judicial.
Eu tive occasião, a proposito d'estas vinte e quatro horas, de que aqui se fala, de consultar o Sr. Ministro da Justiça, e S. Exa. disse-me, que, effectivamente, ha comarcas onde é absolutamente impraticavel poder-se entregar o delinquente, em vinte e quatro horas ao poder judicial.
Ha comarcas onde isto se não pode fazer e eu vou apontá-las.
Grandola, por exemplo, é um concelho que faz parte da comarca de Alcacer do Sal. A sede do concelho dista quasi 60 kilometros da sede da comarca.
Veja V. Exa. e veja a Camara em que afflições se podem encontrar algumas autoridades administrativas, aliás honestas, com vontade de fazer justiça e garantir o que aqui está, para em vinte e quatro horas entregarem os presos ao poder judicial.
Almodovar é uma comarca que tem algumas freguezias tão distantes que em dois dias não se chega á sede da comarca.
As disposições d'este artigo são humanas, são democraticas e garantem ao individuo a maxima liberdade; mas tem estes defeitos que acabo de apontar. Houve a infelicidade de o Sr. Ministro da Justiça adoecer, porque se assim não fosse, provavelmente a reforma judicial já estaria feita.
Mas como as comarcas ainda são o que são, parece-me que a Camara não devia rejeitar o prazo de quarenta e oito horas para as autoridades administrativas entregarem os delinquentes ao poder judicial.
Se a resolução que a Assembleia tomou é de tal ordem que eu não posso repetir essa proposta, não a farei; mas parece-me que deve reconsiderar, a não ser que o Sr. Ministro da Justiça nos proponha uma reforma em que garanta comarcas pequenas, onde nas vinte e quatro horas se possa fazer isto. Peço, pois, á Assembleia que considere a proposta como merece.
Eu tive a infelicidade de ser governador civil de um districto e, como procuro sempre em todos os campos cumprir o meu dever, ordenei ás autoridades minhas subordinadas, que inquirissem, absolutamente, o indispensavel para dar alguma luz ao poder judicial, a fim de remetterem immediatamente os presos a juizo. Elias faziam isso; pois nas vinte e quatro horas não chegava o delinquente á sede da comarca!
Feitas estas considerações e admittida a proposta do Sr. Barbosa de Magalhães, eu apenas a vim reforçar. Se ella não tivesse sido admittida, eu faria uma nova proposta que submetteria á approvação da Assembleia.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Moura Pinto.
O Sr. Moura Pinto: - Desisto da palavra.
O Sr. Affonso Costa: - Sr. Presidente: pedi a palavra porque tenho pelo illustre Deputado toda a consideração, e desejo dar-lhe uma explicação. Foi da minha iniciativa o decreto de 14 de outubro feito a poucos dias da Revolução que implantou a Republica. Nesse decreto introduzi todos os principios, á excepção do habeas corpus, que se encontram dentro do projecto da Constituição.