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REPUBLICA PORTUGUESA

DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

33.ª SESSÃO

EM 28 DE JULHO DE 1911

SUMMARIO.- Antes da ordem do dia. Lida a acta, mandam para a mesa declarações de voto os Srs. Matos Cid, Helder Ribeiro e Antonio Maria da Silva. Approva-se a acta. - São concedidas licenças aos Srs. Correia Barreto, Albano Coutinho, Augusto José Vieira e Eduardo Abreu para se ausentarem da Assembleia durante alguns dias. - Dá-se conta do expediente. - São admittidos, em "segunda leitura" o projecto de lei do Sr. Joaquim Ribeiro, prescrevendo que nenhum funccionario de nomeação do Governo pode receber, como retribuição dos seus serviços, mais de 1:800$000 réis, no continente e ilhas adjacentes, e uma proposta do Sr. Miranda do Valle. - É approvada a ultima redacção de projecto de lei abrindo no Ministerio das Finanças um credito de 1.500:000$000 réis a favor dos Ministerios da Guerra e dos Estrangeiros. - O Sr. Lopes da Silva, em negocio urgente occupa-se da questão do azeite, a proposito de um comicio realizado em Almada, respondendo-lhe o Sr. Ministro do Fomento (Brito Camacho).- O Sr. Brandão de Vasconcellos, em negocio urgente, occupa-se dos logares destinados, na Assembleia, aos membros da imprensa, dando-lhe explicações o Sr. Presidente.- O Sr. Victorino Godinho, em negocio urgente, justifica uma proposta relativa a vencimentos de fuuccionarios publicos e accumulações.- O Sr. Bissaia Barreto participa a constituição da commissão de instrucção publica.- O Sr. Rodrigues de Azevedo realiza a sua interpellação sobre a questão das thermas de Caldellas, respondendo-lhe o Sr. Ministro do Fomento, a quem o interpellante replica, com autorização da Assembleia. - Mandam documentos para a mesa os Srs. França Borges, Silva Barreto, Santos Pousada, Antão de Carvalho, Baltasar Teixeira, Silva Cunha, Biscaia Barreto, Luis Rosette, Sá Pereira, Pires de Campos, Antonio Granjo, José Francisco Coelho, Fernão Botio Machado, Ramos da Costa, João Gonçalves e Rodrigo Fontinha.

Ordem do dia (continuação da discussão do projecto n.° 3, relativo á Constituição Politica). Sobre o n.° 20.° do artigo 5.° usam da palavra os Srs. Moura Pinto, Barbosa de Magalhães e José de Castro. É approvado o numero - Sobre o n.° 21.° usam da palavra os Srs. Alexandre Braga, José do Castro, Moura Pinto, Barbosa de Magalhães, Antonio Macieira, José Montez, Correia de Lemos, Aresta Branco e Affonso Costa, sendo approvada uma proposta de eliminação do Sr. Antonio Macieira. - Sobre o n.° 22.° usam da palavra os Srs. Matos Cid, Antonio Macieira, Machado de Serpa, Affonso Costa e Barbosa de Magalhães, sendo approvada uma proposta de eliminação do Sr. Matos Cid.- Sobre o n.° 23.° usam da palavra os Srs. Joaquim Pedro Martins e Matos Cid, sendo approvada uma proposta de eliminação d'este ultimo Sr. Deputado.- Sobre o n.° 24.° usa da palavra o Sr. Barbosa de Magalhães, sendo approvado o numero. - São approvados, sem discussão, os n.ºs 25.° e 26.° - Sobre o n.º 27.° usam da palavra os Srs. Moura Pinto, Antonio Macieira, Julio Martins, Germano Martins e Affonso Costa, sendo approvada uma proposta de eliminação do Sr. Julio Mar tins.- Sobre o n.° 28.° usam da palavra os Srs. Casimiro de Sá, Barbosa de Magalhães e Alexandre Braga, sendo approvada uma proposta de eliminação d'este ultimo Sr. Deputado.- Sobre o n.° 29.° usam da palavra os Sra. Alexandre Braga, Barbosa de Magalhães, Antonio Maria da Silva, Antonio Macieira. Moura Pinto, Artur Costa, Affonso Costa e Dantas Baracho, sendo rejeitado o numero e approvada uma proposta de substituição do Sr. Alexandre Braga, com um additamento do Sr. Artur Costa.- É approvado sem discussão o n.° 30.° - Sobre o n.° 31.° usam da palavra os Srs. Alexandre Braga, Antonio Macieira, Barbosa de Magalhães, Dantas Baracho e Affonso Costa, sendo rejeitado o numero e approvada uma proposta de substituição do Sr. Alexandre Braga.

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2 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Presidencia do Exmo. Sr. Anselmo Braamcamp Freire

Secretarios os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Affonso Henriques do Prado Castro e Lemos

Abertura da sessão - Ás 2 horas e 17 minutos da tarde.

Presentes - 170 Srs. Deputados.

São os seguintes: Abel Acacio de Almeida Botelho, Abilio Baeta das Neves Barreto, Achilles Gonçalves Fernandes, Adriano Augusto Pimenta, Adriano Gomes Ferreira Pimenta, Adriano Mendes de Vasconcellos, Affonso Augusto da Costa, Affonso Ferreira, Affonso Henriques do Prado Castro e Lemos, Alberto Carlos da Silveira, Alberto de Moura Pinto, Alberto Souto, Albino Pimenta de Aguiar, Alexandre Augusto de Barros, Alexandre Braga, Alfredo Balduino de Seabra Junior, Alfredo Botelho de Sousa, Alfredo Maria Ladeira, Alvaro Poppe, Amaro de Azevedo Gomes, Americo Olavo de Azevedo, Amilcar da Silva Ramada Curto, Annibal de Sousa Dias, Anselmo Braamcamp Freire, Anselmo Augusto da Costa Xavier, Antão Fernandes de Carvalho, Antonio Affonso Garcia da Costa, Antonio Alberto Charula Pessauha, Antonio Abilio Carvalho Moiirão, Antonio Aresta Branco, Antonio Augusto Cerqueira Coimbra, Antonio Barroso Pereira Victorino, Antonio Brandão de Vasconcellos, Antonio Caetano Celorico Gil, Antonio Caetano Macieira Junior, Antonio Joaquim Ferreira da Fonseca, Antonio França Borges, Antonio Joaquim Granjo, Antonio Joaquim de Sousa Junior, Antonio José Lourinho, Antonio Ladislau Parreira, Antonio Ladislau Piçarra, Antonio Maria de Azevedo Machado Santos, Antonio Maria da Cunha Marques da Costa, Antonio Maria da Silva, Antonio Maria da Silva Barreto, Antonio Padua Correia, Antonio Pires de Carvalho, Antonio Pires Pereira Junior, Antonio Ribeiro Seixas, Antonio dos Santos Pousada, Antonio da Silva e Cunha, Antonio Xavier Correia Barreto, Antonio Valente de Almeida, Artur Augusto da Costa, Artur Rovisco Garcia, Augusto Almeida Monjardino, Augusto José Vieira, Aureliano de Mira Fernandes, Baltasar de Almeida Teixeira, Bernardo Paes de Almeida, Carlos Antonio Calixto, Carlos Amaro de Miranda e Silva, Carlos Henrique da Silva M aia Pinto, Carlos Richter, Casimiro Rodrigues de Sá, Celestino Germano Paes de Almeida, Christovam Moniz, Domingos Tasso de Figueiredo, Eduardo de Almeida, Eduardo Pinto de Queiroz Montenegro, Emidio Guilherme Garcia Mendes, Evaristo Luis das Neves Ferreira de Carvalho, Ezequiel de Campos, Faustino da Fonseca, Fernando Baeta Bissaia Barreto Rosa, Fernão Botto Machado, Francisco Correia de Lemos, Francisco Cruz, Francisco Eusebio Lourenço Leão, Francisco José Pereira, Francisco Luis Tavares, Francisco Antonio Ochôa, Francisco de Salles Ramos da Costa, Francisco Teixeira de Qjueiroz, Gastão Rafael Rodrigues, Gaudencio Pires de Campos, Germano Lopes Martins, Helder Armando dos Santos Ribeiro, Henrique José Caldeira Queiroz, Henrique José dos Santos Cardoso, Inacio Magalhães Basto, João Barreira, João Carlos Nunes da Palma, João Carlos Rodrigues de Azevedo, João Duarte de Menezes, João Fiel Stockler, João Gonçalves, João Luis Ricardo, João Machado Ferreira Brandão, João Pereira Bastos, Joaquim Antonio de Mello Castro Ribeiro, Joaquim Brandão, Joaquim José Cerqueira da Rocha, Joaquim José de Oliveira, Joaquim Pedro Martins, Joaquim Ribeiro de Carvalho, Joaquim Theophilo Braga, Jorge Frederico Vellez Caroço, Jorge de Vasconcellos Nunes, José Affonso Palla, José Alfredo Mendes de Magalhães, José Antonio Arantes Pedroso Junior, José Barbosa, José de Carros Mendes de Abreu, José Bernardo Lopes da Silva, José Bessa de Carvalho, José Botelho de Carvalho Araujo, José Carlos da Maia, José de Castro, José Cordeiro Junior, José de Cupertino Ribeiro Junior, José Dias da Silva, José Estevam de Vasconcellos, José Francisco Coelho, José Jacinto Nunes, José Luis dos Santos Moita, José Machado de Serpa, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Padua, José Maria Pereira, José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães, José Mendes Cabeçadas Junior, José Miranda do Valle, José Montez, José Nunes da Mata, José Pereira da Costa Basto, José Relvas, José da Silva Ramos, José Thomás da Fonseca, José do Valle Matos Cid, Julio do Patrocinio Martins, Leão Magno Azedo, Luis Augusto Pinto de Mesquita Carvalho, Luis Fortunato da Fonseca, Luis Innocencio Ramos Pereira, Luis Maria Rosette, Manuel Alegre, Manuel de Arriaga, Manuel Pires Vaz Bravo Junior, Manuel de Brito Camacho, Manuel Goulart de Medeiros, Manuel Jorge Forbes de Bessa, Manuel José de Oliveira, Manuel José da Silva. Manuel Martins Cardoso, Manuel Rodrigues da Silva, Mariano Martins, Miguel de Abreu, Miguel Augusto Alves Ferreira, Narciso Alves da Cunha, Pedro Alfredo de Moraes Rosa, Pedro Amaral Botto Machado, Pedro Januario do Valle Sá Pereira, Philemon da Silveira Duarte de Almeida, Porfirio Coelho da Fonseca Magalhães, Ramiro Guedes, Ricardo Paes Gomes, Rodrigo Fernandes Fontinha, Sebastião Peres Rodrigues, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Severiano José da Silva, Sidonio Bernardino Cardoso da Silva Paes, Tiago Moreira Salles, Thomé José de Barros Queiroz, Tito Augusto de Moraes, Victor Hugo de Azevedo Coutinho, Victor José de Deua Macedo Pinto, Victorino Henrique Godinho, Victorino Maximo de Carvalho Guimarães.

Entraram durante a sessão os Srs.: Alfredo José Durão, Alvaro Xavier de Castro, Angelo Rodrigues da Fonseca, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Bernardino Luis Machado Guimarães, Carlos Olavo Correia de Azevedo, Innocencio Camacho Rodrigues.

Não compareceram á sessão os Srs.: Albano Coutinho, Alexandre José Botelho de Vasconcellos e Sá, Alfredo Djalme Martins de Azevedo, Alfredo Rodrigues Gaspar, Alvaro Nunes Ribeiro, Angelo Vaz, Antonio Amorim de Carvalho, Antonio Bernardino Roque, Antonio Candido de Almeida Leitão, Antonio Florido da Cunha Toscano, Antonio José de Almeida, Antonio de Paiva Gomes, Artur Augusto Duarte da Luz Almeida, Carlos Maria Pereira, Domingos Leite Pereira, Eduardo Abreu, Elisio Pinto de Almeida e Castro, Ernesto Carneiro Franco, Fernando da Cunha Macedo, Francisco Manuel Pereira Coelho, Francisco Xavier Esteves, Guilherme Nunes Godinho, Henrique de Sousa Monteiro, João José de Freitas, João José Luis Damas, Joaquim José de Sousa Fernandes, José Augusto Simas Machado, José Maria Cardoso, José Perdigão, José Tristao Paes de Figueiredo, Manuel José Fernandes Costa, Manuel de Sousa da Camara, Sebastião de Magalhães Lima, Thomás Antonio da Guarda Cabreira.

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SESSÃO N.° 33 DE 28 DE JULHO DE 1911 3

Procede-se á chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 179 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. Vae ler-se a acta da sessão anterior.

Foi lida.

O Sr. Matos Cid: - Mando para a mesa a seguinte

Declaração de voto

Declaro que votei contra a substituição proposta pelo Sr. Deputado Dr. Antonio Macieira, quando se discutiu a materia do n.° 19.° do artigo 5.° do projecto da Constituição. Em meu entender a indicação, taxativa, dos casos em que, sem culpa formada o cidadão pode ser preso, é perigosa e pode mais tarde dar logar a inconvenientes varios. Alem d'isso a inclusão nesses casos da quebra fraudulenta encontra-se já devidamente regulada e prescrita no artigo 202.° do Codigo do Processo Commercial.

Ali se declara que, desde que o jury declare provados quaesquer factos que constituam indicio de culpa ou fraude, o juiz por seu despacho indiciará o fallido e ordenará a sua prisão. Tem, por isso, o indicio de fraude de se verificar por decisão do jury unica entidade competente para sobre este assunto se pronunciar.

Votei pois a redacção dada por a commissão a este numero, substituindo apenas a palavra fiança pela palavra caução.

Lisboa, Sala das Sessões da Assembleia Nacional Constituinte, 28 de julho de 1911. = O Deputado pelo circulo 18r José do Valle de Matos Cid.

Para a acta.

O Sr. Helder Ribeiro: - Envio para a mesa a seguinte

Declaração de voto

Declaro que se estivesse presente á sessão em que se votou o artigo 3.°, do titulo 2.° do projecto de Constituição, teria votado pela conservação da ordem da Torre e Espada convenientemente refundida, e das medalhas especiaes para galardoar os feitos civicos e os actos militares.

Sala das Sessões, 28 de julho de 1911. = Helder Armando dos Santos Ribeiro.

Para a acta.

O Sr. Antonio Maria da Silva: - Mando para a mesa a seguinte

Declaração de voto acêrca do n.° 13.° do artigo 5.° do projecto de Constituição

É prohibida a formação a qualquer associação religiosa, sendo apenas permittido o exercicio individual do culto ou a organização para o mesmo fim de quaesquer associações de caracter administrativo e economico noa termos expressos na lei da separação do Estado das Igrejas.

Sala das Sessões, 27 de julho de 1911. = O Deputado, Antonio Maria da Silva.

Para a acta.

Approva-se a acta.

O Sr. Presidente: - Consulto a Assembleia sobre os pedidos de licença:

Exmo. Sr. - A fim de ir ao norte do país visitar as tropas que se encontram na fronteira solicito da Assembleia Nacional Constituinte a dispensa de comparecer durante oito dias ás suas sessões.

Lisboa e Sala das Sessões da Assembleia Nacional Constituinte, em 28 de julho de 1911.

Saude e Fraternidade. - Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Nacional Constituinte - Antonio Xavier Correia Barreto.

Foi concedida.

Lisboa, 28 de julho de 1911. - Exmo. Sr. - Solicito da Assembleia Nacional Constituinte, da digna presidencia de V. Exa. que me sejam relevadas as duas faltas que dei por motivo de incommodo de saude, e que me seja concedida licença para ausentar-me por cinco dias para tratar de negocios da minha casa de Mogofores, que estão pedindo a minha assistencia immediata.

Sou com a mais alta consideração de V. Exa., criado muito respeitador e obrigado. = Albano Coutinho, Deputado por Aveiro.

Foi concedida.

Exmo. Sr. - Tendo necessidade de me ausentar de Lisboa, para tratar da minha abalada saude, venho rogar a V. Exa. se digne consultar a Assembleia Constituinte sobre se me permitte uma ausencia de trinta dias a contar de 1 de agosto.

Sala das Sessões, 27 de julho de 1911. = O Deputado, Augusto José Vieira.

Foi concedida.

Braga. - Apresentando meus respeitos pedia por bem justificado motivo licença para estar ausente durante dez sessões. = Eduardo Abreu.

Foi concedida.

O Sr. Presidente: - Vão dar-se conta do expediente. Leu-se na mesa o seguinte

EXPEDIENTE

Telegrammas

Alcochete, em 27. - Presidencia da Assembleia Constituinte - Lisboa. - A Camara Municipal de Alcochete congratula-se com Assembleia Constituinte da Nação Portuguesa pela reassunção do eminente estadista Dr. Affonso Costa ao alto cargo de Ministro da Justiça. = O Presidente da Camara, Fortunato Freire Gomes.

Para a Secretaria.

Alhandra. - Presidente Assembleia Nacional Constituinte. - Por delegação povo republicano desta villa saude Dr. Affonso Costa, seu restabelecimento, felicito essa Camara e país haver reassumido logar tão digno e inteligentemente desempenhado. = Venancio.

Para a Secretaria.

Anadia. - Camara Anadia, em sua sessão de hoje sabendo transferencia do Porto para este concelho chefe fiscal dos impostos José Duarte Vicente das Neves, antigo cacique, rancoroso perseguidor partido republicano, vem perante V. Exa. protestar contra tal transferencia, e resolveu por unanimidade pedir a V. Exa. se digne dar conhecimento á Camara dos dignos- representantes do povo e ao Exmo. Ministro das Finanças que tal transferencia, a manter-se, provocaria graves consequencias e seria a maior das afrontas ao partido republicano e aos brios do povo d'este concelho. - Antonio de Oliveira, Presidente da Camara.

Para a Secretaria.

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4 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Segundas leituras

O Sr. Presidente: - Está sobre a mesa um projecto, que já foi publicado no Diario do Governo, apresentado pelo Sr. Deputado Joaquim Ribeiro respectivamente a accumulações.

É o seguinte:

Projecto de lei

Attendendo a que numa Republica democratica não se deve admittir a exaggerada desproporção de ordenados dos seus funccionarios;

Attendendo mais a que o país, alem da necessidade absoluta que tem de restringir a burocracia ao que for absolutamente indispensavel, não pode consentir que se dêem aos seus funccionarios ordenados que permitiam o fausto, mas sim que se lhes pague justa e o mais equitativamente possivel;

Attendendo tambem a que as circunstancias financeiras do país exigem uma rigorosa economia dos dinheiros publicos:

A Assembleia Nacional Constituinte decreta a lei seguinte:

Artigo 1.° Nenhum funccionario de nomeação do Governo pode receber como retribuição dos seus serviços mais de 1:800$000 réis no continente e ilhas adjacentes.

§ 1.° Nesta quantia estão incluidos os ordenados, vencimentos de categoria, gratificações, etc., etc.

§ 2.° A accumulação de qualquer emprego, ou empregos, não dá direito a um vencimento superior a essa quantia.

Art. 2.° Pode, porem, recebera mais e até o terço d'essa quantia todo o funccionario que tiver mais de vinte annos de bom e effectivo serviço, em logares de elevada representação social.

§ 1.° Nenhum funccionario pode porem ser reformado com mais de 1:800$000 réis annuaes.

Art. 3.fl Os funccionarios de nomeação do Governo, e que sejam pagos por companhias ou outras entidades e que recebam mais do que o estipulado no artigo 1.° do presente decreto, serão collectados com uma contribuição igual ao excedente d'essa quantia.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das Sessões, em 26 de julho de 1911. = Joaquim Ribeiro, Deputado pelo circulo n.° 33.

Foi admittido e enviado á commissão de accumulações.

Teve segunda leitura a proposta do Sr. Deputado José Miranda do Valle, que foi admittida e enviada á commissão de obras publicas.

O Sr. Presidente: - Vae ser posta á votação da Assembleia a ultima redacção do projecto de lei n.° 14, abrindo no Ministerio das Finanças um credito de réis 1.500:000$000 a favor dos Ministerios da Guerra e dos Estrangeiros.

Leu-se na mesa.

Consultada a Assembleia, foi approvada.

O Sr. Presidente: - Vae proceder-se aos trabalhos antes da ordem do dia.

O Sr. Lopes da Silva: - Peço a palavra para um negocio urgente.

O Sr. Brandão de Vasconcellos: - Peço a palavra para um negocio urgente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes da Silva pediu a palavra para um negocio urgente.

O assunto d'esse negocio urgente é relativo a um comicio que houve, hontem, em Almada sobre o preço do azeite.

Os Srs. Deputados que admittem a urgencia tenham a bondade de se levantar.

Vozes: - Ora! Ora! Não pode ser! Está rejeitado!

O Sr. Presidente: - Está rejeitada a urgencia.

Um Sr. Deputado: - A Assembleia não sabe o que está a votar!

Vozes: - Sabe, sabe.

O Sr. Lopes da Silva: - É necessaria e urgente uma solução immediata á guerra dos açambarcadores dos generos alimenticios! A Assembleia deve considerar urgente este assunto!

Vozes: - E a tyrania burguesa!

Não consentimos que se expolie o povo!

Estamos aqui para defender os seus interesses!

O Sr. Presidente: - Vou consultar, de novo, a Assembleia. Os Srs. Deputados que admittem a urgencia tenham a bondade de se levantar.

Está approvada. Tem, portanto, a palavra o Sr. Lopes da Silva.

O Sr. Lopes da Silva: - Ora ainda bem. Agradeço á Assembleia, em nome do povo, a resolução que acaba de tomar concedendo-me a palavra.

Venho dizer á Assembleia e, em especial, ao Governo, que assisti hontem em Almada a um comicio cheio de energia e de enthusiasmo.

O povo está cheio de justiça e de razão. Deseja não levantar uma questão entre a agricultura nacional e a economia publica; mas, sim, uma guerra sem tréguas aos exploradores dos generos alimenticios, que abusivamente, teem açambarcado todos os generos de primeira necessidade, em manifesto prejuizo da alimentação publica e dos cofres nacionaes. (Apoiados).

E necessario que esta questão se ponha absolutamente clara e precisa.

Isto não é tentar prejudicar os interesses da agricultura: é defender os interesses do consumidor contra a forma menos correcta como a ganancia do açambarcador de generos alimenticios está procedendo depois da proclamação, da Republica (Apoiados).

E preciso que todos saibam, principalmente os membros do Governo, que os unicos conspiradores-se os ha - são os açambarcadores, que estão levantando uma porfiada guerra contra o povo. (Apoiados).

O povo reclama por todo o país; e o Governo sabe muito bem que elle tem muita razão nas suas reclamações. (Apoiados).

A Assembleia Nacional Constituinte, representante do povo, conhece, de sobejo, quaes as difficuldades que ha na alimentação publica, que é hoje um dos maiores problemas que dizem respeito á vida portuguesa.

Se o problema politico é coisa difficil e que importa resolver urgentemente, não menos carece de resolução o problema economico, - resolução tão pronta e immediata como a d'aquelle.

Eu disse noutro dia, nesta Assembleia, que, se o Governo não desse immediatas providencias, o povo tinha direito de invadir as casas d'esses exploradores.

Vozes: - Ordem, ordem! Não pode ser!

O Orador: - Isto não é uma guerra entre o povo e o

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SESSÃO N.° 33 DE 28 DE JULHO DE 1911 5

capitalista: é guerra entre o povo e o explorador da alimentação publica.

Vozes: - Não é tal!

O Orador: - V. Exas. teem tanta responsabilidade como eu na defesa dos interesses d'aquelles que estão sendo espoliados.

A Assembleia Nacional Constituinte tem o dever de attender ás instantes reclamações de todo o ponto justas que o povo faz.

O Governo deve fazer justiça, da a quem doer. (Apoiados).

V. Exa., Sr. Presidente, tem recebido reclamações de differentes camaras municipaes do país, em que se diz que o azeite se está vendendo entre 400 e 550 réis o litro.

O que se quer é que os generos alimenticios sejam fornecidos em condições de preço compativeis com as forças de cada um.

Não se quer levantar difficuldades á agricultura nacional; - antes pelo contrario o que se quer é defende la.

No projecto que ha dias apresentei dizia eu que o Governo devia permittir, apenas, a entrada do azeite em quantidade necessaria para resolver a crise. Como não quero cansar mais a Assembleia, volto agora a pedir a V. Exa. e a Assembleia que resolvam o assunto com a urgencia que o caso requer e como pede o povo.

Terminando, mando para a mesa a moção que foi lida e approvada no comicio realizado em Almada, com toda a energia e civismo.

O Sr. Ministro do Fomento (Brito Camacho): - Sr. Presidente: - prevendo que o Sr. Deputado Lopes da Silva mais uma vez trataria a questão do azeite, muni-me com alguns elementos de informação para responder a S. Exa. Antes de S. Exa. pedir providencias energicas para evitar a subida de preço do azeite já eu sabia qual era o preço por que elle se vendia no mercado, - e devo dizer que é mais facil pedir informações do que recebê-las.

Neste momento sou informado de que o preço do azeite nos centros de onde nós podemos importá-lo é menor do que já foi, - o que não quer dizer que, decretada a importação, elle não suba immediatamente de preço, a ponto de não ser possivel entregá-lo aqui barato ao consumo.

Eu não sei se o açambarcamento é feito pelos productores ou se é feito pelos intermediarios; mas a minha opinião é que ha azeite armazenado suficiente para satisfazer ás necessidades da população até a proxima colheita.

O que é preciso é adoptar providencias energicas e efficazes, em beneficio de todos, - principalmente do consumidor e do lavrador.

O Governo procura, e não começou a fazê-lo agora, a melhor forma de remediar o mal.

De modo que o povo de Almada não tinha o direito, por emquanto, de reclamar pela forma violenta, nas palavras, bem entendido, por que o fez.

O Governo está informado de que ha muito tempo estão junto da fronteira alguns cascos de óleos esperando que o Governo lhes dê livre entrada, vindo aqui entrar no consumo como azeite do melhor e pelo melhor preço.

Esteja tranquillo o Sr. Deputado que as providencia; não se farão esperar, tomando-se todas as cautelas para que só aproveitem a quem devem aproveitar e não a desalmados especuladores.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Brandão de Vasconcellos pediu a palavra para um negocio urgente, qual o de tratar dos logares destinados aos Srs. jornalistas.

Os Srs. Deputados que consideram este assunto urgente, tenham a bondade de levantar-se.

Foi approvado.

O Sr. Brandão de Vasconcellos: - Pedi a palavra para um negocio urgente, qual é o de tratar dos logares ocupados pelos Srs. jornalistas nesta Assembleia.

Ha muito tempo que foi pedido um logar melhor do que aquelle em que os membros da imprensa estão; mas creio que essa reclamação ainda não chegou á Presidencia.

Os interessados reclamaram simplesmente perante a secretaria; a secretaria prometteu-lhes um logar melhor para futuro, uma d'estas partes da sala que foi classificada com o nome de Morgue.

Eu pertenço a este logar e, francamente, diga-se de passagem, desejava não estar aqui em exposição.

Em todo o caso, emquanto elles não vêem para aqui, pedia que se lhes destinasse outro logar, porque de ali não ouvem, por causa das condições acusticas da sala, que, como V. Exa. sabe, são pessimas, - tão más que eu, ha dias, quasi ia brigando com um collega por se me afigurar que elle estava dizendo precisamente o contrario do que, na verdade, dizia!

Ha ali aquella galeria (apontando para a tribuna á direita da presidencia) onde poucas vezes está gente, que lhes poderia, talvez, ser destinada.

Apresento este alvitre; - comtudo a Assembleia determinará.

Todos vêem que estão muito distantes os representantes da imprensa. Devem estar mais proximos da mesa para ouvir o que aqui se passa e poderem transmitti-lo com exactidão.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Esta galeria é destinada para as senhoras dos membros da mesa e dos Srs. Ministros, - e entendo que se deve manter essa regalia.

Os Srs. jornalistas podiam, talvez, ir para a galeria seguinte, cuja primeira ella lhes seria reservada.

O Sr. Brandão de Vasconcellos: - No caso de não poderem ir para aquella galeria então que vão para a que V. Exa. indica, e de ali virão para aqui quando nós de aqui sairmos.

O Sr. Padua Correia: - D'este lado, Sr. Presidente, ainda se ouve peor que ali.

Não seria possivel accomodarem-se os jornalistas junto da mesa dos Srs. tachygraphos?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Victorino Godinho pediu a palavra para um negocio urgente. Esse negocio urgente é a apresentação de uma proposta que se relaciona com a questão das accumulações.

Os Srs. Deputados que approvam a urgencia tenham a bondade de se levantar.

Foi approvada a urgencia.

O Sr. Victorino Godinho: - Sr. Presidente: - ha seguramente quinze dias que tenho aqui na carteira uma proposta que tencionava apresentar e que era seguida de umas bases para a apresentação de um projecto de lei que se refere á accumulação de empregos publicos. V. Exa. sabe que uma das condições sine qua non do progresso de uma Nação é a disciplina da sociedade que a constitue; um dos factores principaes d'essa disciplina social que é necessaria em qualquer Nação ou sociedade, é evidentemente a justiça e igualdade que se deve distribuir a todos, seja a quem for, e pelo que se refere ao funccionalismo, seja qual for o Ministerio em que esses funccionarios desempenhem os seus serviços.

Sabem, todos muito bem que entre os funccionarios dos diversos Ministerios não ha a equivalencia necessaria, em hierarchia e vencimentos, dando-se o facto de os funccionarios não occuparem por vezes o logar que deviam occupar.

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6 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Esta desigualdade torna-se mais manifesta se olharmos ao que se passa dentro dos proprios Ministerios.

Entre os funccionarios da Guerra, Marinha, Finanças ou qualquer outro não existe correlação alguma, havendo grande disparidade entre a sua categoria e vencimentos. Este ponto afigura-se de capital importancia, e antes de se approvar um projecto de lei sobre accumulações ou sobre vencimentos a funccionarios, parecia-me que se deviam rever todos os vencimentos dos funccionarios, de forma a fazer desapparecer esta desigualdade que se dá entre todos os funccionarios dos diversos Ministerios. Chamo a attenção da Camara para o seguinte: Um bacharel em direito acaba o seu curso e vae exercer a sua profissão, de delegado do Procurador da Republica, para uma comarca qualquer; pois esse funccionario vae desempenhar o cargo numas condições desgraçadas de vencimento, uns 27$000 ou 29,5000 réis, e V. Exas. sabem que é absolutamente impossivel manter assim a integridade do logar; um official, que acaba o seu curso da Escola do Exercito, vae para o regimento ganhar uns 35$000 réis por mês; por aqui se vê que não ha equiparação entre o bacharel e o official do exercito, que devia estar, proximamente, nas mesmas condições.

A desigualdade sobe de ponto quando comparamos os vencimentos dos funccionarios superiores com os dos pequenos funccionarios. Assim, por exemplo, vejo que um juiz, numa comarca qualquer, deve olhar com cubica para um chefe do pessoal menor, que ganha mais do que elle. Um porteiro ganha 600$000 réis.

Vejo, por exemplo, que um chefe do pessoal menor ganha 720$000 réis. Este chefe tem um logar que muitos que aqui estão invejariam; alem, do que estou convencido, que seria muito mais agradavel ser chefe do pessoal menor do que chefe de um partido politico. (Risos. Apoiados).

V. Exa. tem, por exemplo, um medico assistente do Hospital de Santa Martha; por desempenhar o seu serviço, onde gasta pelo menos quatro horas por dia, ganha 300$000 réis. Este medico está por esta forma pago como um curandeiro de aldeia.

Estes factos dão logar a que os funccionarios procurem outra occupação e não possam dedicar-se como devem ao exercicio do seu cargo.

Nestas condições, para obviar a todas estas injustiças e desigualdades, que devemos remediar agora, porque se não o fizermos neste principio de vida nova, nunca mais o faremos, mando para a mesa a minha proposta.

Proposta

Havendo manifesta desigualdade entre os vencimentos dos funccionarios publicos, de categoria equivalente, de pendentes dos diversos Ministerios, e até mesmo nos de um mesmo Ministerio;

Sendo da mais elementar justiça que á equivalencia de categoria dos funccionarios corresponda equivalencia nos seus vencimentos;

Parecendo-me indispensavel fazer uma revisão completa dos vencimentos do funccionalismo do Estado, antes de ser votado o orçamento;

Proponho:

1.° Que pela mesa seja nomeada uma commissão de onze membros com o fim de grupar em classes os funccionarios dos diversos Ministerios, figurando em cada classe os funccionarios de categoria equivalente;

2.° Que na composição d'esta commissão entre um funccionario, pelo menos, por cada Ministerio, e dois individuos, pelo menos, estranhos completamente ao funccionalismo;

3.º Que a commissão, ao elaborar este trabalho, ponha inteiramente de parte os vencimentos actuaes dos funccionarios e considere, entre outras, as seguintes bases:

a) Cursos, tirocinios ou outras habilitações exigidas para o desempenho do cargo;

b) Dificuldades e responsabilidades do exercicio do cargo;

c) Tempo de serviço;

d) Representação social a que são obrigados os funccionarios;

4.° Que a commissão só se occupe dos funccionarios que desempenham os seus cargos em Portugal e ilhas adjacentes;

5.° Que a commissão não classifique os funccionarios que constituem o chamado pessoal menor.

Sala das Sessões, 28 de julho de 1911. = Victorino Henriques Godinho, Deputado pelo circulo 29.

Para primeira leitura.

Tenho, como complemento d'esta proposta, as seguintes

Bases para a elaboração de um projecto de lei

1.ª Os funccionarios da mesma categoria, dos diversos Ministerios ou d'elles dependentes, perceberão iguaes vencimentos de categoria ou soldos.

2.ª A accumulação de empregos ou funoções em caso algum dará logar á accumulação de vencimentos de categoria ou soldos.

3.ª A gratificação de exercicio nunca poderá exceder dois terços do vencimento de categoria ou soldo. No caso de accumulação, a somma das gratificações de exercicio não poderá ser superior ao unico vencimento de categoria ou soldo que o funccionario receber.

4.ª Excepto os membros do poder executivo nenhum funccionario, poderá receber um vencimento de categoria ou soldo superior a 1:600$000 réis, liquido.

Sala das Sessões, em 28 de julho de 1911. = O Deputado, Victorino Henriques Godinho.

Para primeira leitura.

O Sr. Bissaia Barreto: - Mando para a mesa a seguinte

Participação

Commissão de instrucção publica. - Participo a V. Exa. que está installada esta commissão e que foi escolhido para Presidente o Sr. Monjardino e para Secretario o signatario. = Bissaia Barreto.

Para a Secretaria.

O Sr. Rodrigues de Azevedo: - Algumas considerações sobre o que seja a questão de Caldellas já conhecida por toda a gente, e que representa uma arbitrariedade praticada pelo poder executivo.

Espero que estas minhas palavras sejam attendidas pela Assembleia.

A Camara de Amares é proprietaria e usufrutuaria, desde tempos immemoriaes, das aguas thermaes de Caldellas. Attestam-no documentos officiaes exibtentes no archivo municipal.

Isto é do dominio da opinião publica, porquanto as pessoas mais velhas de Amares, attestam que as aguas de Caldellas foram sempre propriedade da Camara Municipal d'aquelle concelho.

O extracto de varias actas das sessões, começando no anno de 1840 até 1910, de onde consta com a maior clareza, que a partir de 1845 até 1910 a camara de Amares despendeu em melhorar a estancia thermal de Caldellas, quer em obras naquella estancia quer em vias de communicação que lhe dessem facil accesso, nada menos de 31:850$000 réis.

Sr. Presidente: - em face d'estes documentos parece-me não dever restar duvida a ninguem sobre o direito de

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SESSÃO N.° 33 DE 28 DE JULHO DE 1911 7

propriedade que a Camara Municipal de Amares tem sobre as aguas medicinaes de Caldellas.

Como a concorrencia áquellas aguas aumentasse consideravelmente, em 1888 resolveu-se fazer um novo balneario e para este fim fez-se o respectivo orçamento, pondo-se a sua construcção em praça por 1:050$000 réis em março de 1889. Nos meados do anno de 1889, o Sr. Visconde de Semelhe, enteio simplesmente Bernardo Barbosa, apresentou-se a requerer á camara que lhe fosse adjudicada a exploração das aguas de Caldollas, por um espaço de dezanove annos. Isto consta de documentos que se encontram no Ministerio do Fomento, que requeri ha vinte e cinco dias para fundamentar as minhas considera coes, mas que ainda me não chegaram.

Esse contrato de arrendamento foi feito em 20 de dezembro de 1889, no cartorio do escrivão Saldanha, e na escritura respectiva consta o seguinte: Bernardo Barbosa procederia a todas as obras, que constavam de uma planta apresentada pela camara, para um balneario novo que esta já tinha começado a executar e que o arrendatario completaria dentro de dois annos. A importancia d'estas obras constituia o preço de renda pelos dezanove annos.

Alem d'isto, o mesmo Bernardo Barbosa obrigava-se a entregar, no fim do prazo de dezanove annos, á camara de Amares, e tudo quanto constituia materia da sua exploração, como quaesquer obras a que porventura tivesse procedido no estabelecimento thermal para melhor que a planta, sem comtudo poder exigir qualquer indemnização á camara, - e a outras condições se obrigou tambem e que constam do mesmo contrato, algumas das quaes cumpriu, e outras não. O contrato de arrendamento dava ao visconde o direito de opção em futuros arrendamentos.

Em 1892, foi publicado o decreto de 30 de setembro, regulando a exploração das aguas medicinaes, e pelo artigo 61.° os proprietarios ou arrendatarios ficassem obrigados ao seguinte:

"Os individuos ou empresas (proprietarios ou arrendatarios) que actualmente exploram aguas minero-medicinaes e que para isso foram autorizados por leis ou licenças especiaes deverão dentro do prazo de tres meses contados da publicação d'este decreto na folha official, cumprir o preceituado nos n.ºs 1.°, 2.° e 3.° do artigo 5.° para poderem continuar no gozo de licenças que lhe tenham sido concedidas".

O § unico d'este artigo diz:

"Os que não tenham sido autorizados por leis ou licenças especiaes ficam obrigados no prazo ao cumprimento dos n.os 1.°, 2.°, 3.°, 4.° e 5.° do mesmo artigo 5.°".

Ora, o Visconde de Semelhe, para cumprir o artigo 61.°, requereu ao Governo em 3 de dezembro d'esse anno, autorização para continuar a explorar as aguas de Caldellas, fazendo acompanhar o seu requerimento da escritura de arrendamento. O Ministro das Obras Publicas de então, o Sr. Dr. Bernardino Machado por alvará de 2 de março de 1893, concedeu essa licença por tempo indefinido e illimitado. Claro está que esta concessão não podia ser por tempo indefinido e illimitado. Em todo o caso da parte do actual Ministro dos Estrangeiros não houve má fé, e apenas um equivoco, porquanto reclamando a camara de Amares contra o alvará, foi attendida: o honrado Ministro, reconhecendo o erro emendou-o, mandando por despacho de 19 de julho do mesmo anno, cassar o alvará de 2 de março e substitui-lo por outro em que as palavras "indefinidamente e por tempo illimitado", fossem substituidas por estas em "harmonia com o contrato de arrendamento".

O visconde, porem, não descansou. Em 1906 pediu ao Governo que confirmasse o alvará de 1892; houve um parecer da Procuradoria Geral da Coroa de 9 de fevereiro de 1906, contrario á pretensão do visconde, requerendo este ao Governo, em 13 do mesmo mês, que pusesse a concurso a exploração das aguas. Em 1908 voltou a pedir ao Governo que confirmasse o alvará de março de 1893. Foi confirmado esse alvará por decreto de 18 de setembro de 1908, que no seu n.° 2 manda que o visconde pague á camara a renda contratada, em vista do contrato de arrendamento de 1889, até que pelos tribunaes se prove que as aguas não pertencem á camara, etc.

Este decreto de 18 de setembro de 1908 é, nem mais, nem. menos, que uma prorogação, por tempo illimitado, de um arrendamento que a camara fez em 1889, por dezanove annos e que só ella podia prorogar.

Com que direito foi prorogado por tempo illimitado contrato de arrendamento pelo Governo?

Sr. Presidente: - isto é uma arbitrariedade. Espero que as minhas palavras encontrem eco nos membros d'esta Camara. Estou certo de que, se a Assembleia se conservar indifferente a todas estas irregularidades, se apossará amanhã de qualquer propriedade municipal o primeiro aventureiro que de tal se lembrar.

Desde 1889 até 1905 gastou a camara, com as thermas de Caldellas nada menos de 26 contos de réis.

Construiu o visconde um grande hotel que, na realidade, deu um certo desenvolvimento a esta estação thermal; comtudo, isto não é argumento de que se sirva, para se apoderar das aguas.

O hotel é propriedade sua, absolutamente independente do estabelecimento thermal; continue a explorá-lo, pois ninguem lhe contesta os seus direitos sobre elle.

No estabelecimento thermal ou em propriedades da Camara de Amares não dispendeu até hoje 5 réis seus.

O visconde intitula-se um benemerito, por ter construido o Hotel da Bella Vista, em Caldellas; ora, eu só poderei conformar-me com o epiteto quando for demonstrado ou estabelecido que a benemerencia consiste em explorar a humanidade, em lhe extorquir, pelos serviços prestados, o mais que se pode.

Consta-me que elle tem cobrado 400 réis e mais por cada banho no novo balneario, quando, pelo contrato de arrendamento, não podia cobrar mais de 160 ou 240 réis.

Antes do visconde tomar a exploração ninguem pagava pelas aguas destinadas ao uso interno: - não pagava senão o banho ao preço de 20 a 120 réis.

Nenhum imposto era cobrado para o uso das aguas, nem exigida a consulta medica. Cada doente seguia as prescrições do medico seu assistente.

A partir de 1887 começou a cobrar-se a importancia de 2$000 réis logo á entrada, sem prejuizo do pagamento de banhos e aguas, desde que sejam tomados por aquistas não hospedados no Hotel da Bella Vista, sendo o preço d'ellas exorbitante e quasi prohibitivo para os pobres ou mal remediados.

Entendo que as aguas medicinaes, poderosos agentes therapeuticos, nunca poderão constituir monopolio de ninguem, pois não deve fazer-se monopolio com a saude publica.

Quando noa attestados de pobreza não venha expresso que o portador é absolutamente pobre, tem sido este, durante a exploração pelo visconde, obrigado a pagar.

Dizem os amigos do visconde que essas aguas foram pertença do Convento do Rendufe.

Deveriam, antes de mais nada, apresentar a certidão do inventario dos bens d'esse convento, para provar esta affirmação.

Se essas aguas pertenciam áquelle convento, claro está que o Estado as deveria ter explorado, como mandam, os artigos 57.° do decreto do 1892 e § unico do artigo 1.° do regulamento de 1894.

Interrupção do Sr. Alexandre de Barros.

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8 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Orador: - Eu não me refiro a esse folheto, que é anonymo. Dirigem-se-me nelle alguns insultos, mas nem toda a gente me insulta. Para ver a boa fé com que está feita toda esta campanha contra mim, leio uma passagem, apenas, do folheto.

Entendia que era mais leal apresentar aqui esses documentos, porque a Camara não pode ir de porta em porta tratar de indagar quaes elles sejam.

São processos jesuiticos os que empregam para annullar a minha acção nesta Camara, defendendo os interesses dos povos de Amares.

O Sr. Presidente: - Faltam apenas dois minutos para a hora.

Vozes: - Fale, fale.

O Orador: - Eu termino. A Camara reclamou contra esse decreto arbitrario que fez em 1908 a concessão ao Visconde de Semelhe e mandou uma representação ao rei, assinada por todas as pessoas do concelho de Amares que sabiam escrever, mil e tantas pessoas, mas não foi attendida.

Mandou mais duas representações aos Governos, que succederam o da acalmação, com identicos resultados.

Proclamada a Republica, mandou uma representação ao Sr. Ministro do Fomento, assinada tambem por todas as Juntas de Parochia do concelho, recebendo como resposta, no dia 3 de julho, o seguinte:

"O Ministro, ouvida a Procuradoria Geral da Republica, com cujo parecer se conforma, julga improcedente a representação da camara".

Agora venho dirigir-me ao Sr. Ministro do Fomento, pedindo a S. Exa. que me diga como harmoniza as duas partes d'este parecer; a primeira parte em que se diz que a camara não reclamou a tempo em 1892, não cumprindo assim o disposto no artigo 61.°, e, a segunda parte, em que se diz que a venda feita pela Camara, em 17 de agosto de 1910, tinha liquidado todas as questões contra elle e o visconde.

O despacho ministerial de 19 de julho de 1893 não foi publicado no Diario do Governo e essa foi a primeira machada dada na lei.

Esse decreto diz no seu artigo 64.°, que todos os decretos, portarias, alvarás ou simples despachos ministeriaes deverão ser publicados na folha official.

Ora eu pergunto ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, que foi quem então deu esse despacho, a razão por que não foi publicado esse documento?

Em 2 de março de 1893 foi publicado o alvará dando licença para explorar por tempo illimitado, e em julho foi dado o despacho emendando esse alvará.

Esse despacho demonstra a boa fé do Sr. Bernardino Machado. S. Exa. reconheceu que se tinha enganado ou que o tinham enganado, que não devia ter feito uma concessão por tempo illimitado, e emendou a mão, dizendo: seja passado novo alvará em harmonia com o contrato do arrendamento.

Esse despacho, porem, não foi publicado.

O Sr. Ministro não tem a responsabilidade d'isso, mas os funccionarios que os rodeavam.

Porque razão não foi publicado esse despacho?

O Ministro mandou-o publicar?

Se mandou, porque não foi publicado?

Não sei dar a explicação. O que se vê, é que não foi publicado no Diario do Governo contra o manifestamente expresso na lei.

Pergunto ao Sr. Ministro do Fomento, como é que se harmoniza a primeira parte do parecer da Procuradoria Geral da Republica, de 4 de maio de 1911, com a segunda parte?

De duas, uma: ou a Camara Municipal era obrigada a cumprir o preceituado no artigo 61.° e não o fez e, nesse caso, as aguas passavam para a posse do Estado e a venda de 1910 não tinha razão de ser, ou a camara não perdeu o seu direito por não ser obrigada ao cumprimento do referido artigo 61.°, e nesse caso não sei a que proposito venha o dizer-se que ella não se habilitou a tempo.

Para a camara perder os seus direitos, devia ter incorrido na pena imposta pelo artigo 62.°, devendo neste caso ser julgado o abandono pelos tribunaes ordinarios, como manda o artigo 46.° Então a propriedade das aguas passava para o Estado.

A lei manda que, depois de julgadas abandonadas as aguas minero-medicinaes, sejam postas a concurso, e no caso de ficarem desertos duas vezes esses concursos, serão declaradas livres na folha official.

Ora ellas não foram postas a concurso, nem foram declaradas livres na folha official, nem se attendeu a nenhuma formalidade:-procedeu-se em tudo contrariamente ao que manda a lei.

Espero que o Sr. Ministro me explique a razão por que vem a Procuradoria Geral da Republica declarar no seu parecer que a camara não se habilitou a tempo.

Parece que isto é um berbicacho ao qual a Procuradoria se pretendeu agarrar...

O Sr. Presidente: - Lembro a V. Exa. que já passaram cinco minutos da hora.

Vozes: - Fale, fale.

O Orador: - Depois do Visconde ter feito varias tentativas para que a Camara ficasse calada, em face do decreto de 1908, veio offerecer uma renda annual de 300$000 réis e foi aumentando até 17 contos de réis por uma só vez.

Na vespera da eleição em 1910, foi o presidente da camara chamado a Braga, e foi-lhe dito: "você ou liquida isto, ou dissolve-se a camara e nomeia-se uma commissão administrativa, que venderá as aguas por qualquer preço".

Alem d'isso foram feitas imposições pessoaes ao mesmo presidente, como posso provar com documentos que aqui tenho.

Eu era então vereador.

Dez ou doze dias antes das eleições feitas por Teixeira de Sousa, foi convocada uma sessão extraordinaria da camara, sessão na qual foi votada a venda por 17 contos de réis. Eu, como vereador lavrei o meu protesto chamando-lhes "ladrões", o que foi consignado na acta que elles assinaram.

Foi isto no dia 13 de agosto.

Tres dias depois foi lavrada a escritura, depois de approvada a deliberação da Camara pela tutela.

Este contrato de venda foi feito á porta fechada, assistindo unicamente os caciques de Teixeira de Sousa, - e, facto curioso, o administrador do concelho assistiu a esta sessão, tomando assento ao lado do presidente e entrando na discussão.

Foi a primeira e ultima vez, que assistiu ás sessões da Camara. As conveniencias da politica caciqueira, impunham a venda das aguas de Caldellas.

Ha vinte cinco dias que pedi pelo Ministerio do Fomento varios documentos, que não me foram ainda entregues, apesar de, para a copia d'esses documentos, não serem necessarias muitas horas de trabalho.

Agora devo chamar a attenção da Assembleia para um outro facto.

Quando o Directorio andou em missão de propaganda pelo norte do país, indo a Caldellas realizar um comicio, foi prohibido por um filho do Visconde de Semelhe de realizar esse comicio no parque das thermas, tendo de fazê-lo na estrada, sob um sol ardentissimo.

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SESSÃO N.° 33 DE 28 DE JULHO DE 1911 9

Termino, Sr. Presidente, por aqui as minhas considerações, pedindo que V. Exa. fique encarregado de nomear uma commissão de estudo a todo esse processo.

Aguardo uma resposta do Sr. Ministro do Fomento.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Rodrigues de Azevedo pediu para se consultar a camara no sentido de a mesa ficar encarregada de nomear uma commissão para tratar d'este assunto.

Os Srs. Deputados que approvam esta proposta tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O Sr. Ministro do Fomento (Brito Camacho): - Sr. Presidente: - tendo o Sr. Deputado Azevedo Rodrigues terminado o seu discurso por propor uma commissão que estude este processo e traga á Camara o respectivo relatorio, e tendo-se a Camara pronunciado no sentido de nomear essa commissão, o que tenho a dizer, em resposta a S. Exa. reduz-se a bem pouca cousa.

S. Exa. disse que não lhe foram entregues os documentos que pedira.

O processo é muito volumoso, - e eu já tinha dito a S. Exa. que no Ministerio do Fomento em qualquer dia e a qualquer hora, S. Exa. podia consulta Io, tomando conhecimento de todas e de cada uma das suas peças.

Tenho aqui o processo e trouxe-o para que o illustre Deputado, querendo, pudesse fazer leitura á Assembleia de algumas passagens que julgasse convenientes para a sua argumentação.

Mas S. Exa. conhece-o muito bem, porque no Ministerio o examinou com todo o vagar.

Não é possivel enviar todos os documentos que os Srs. Deputados pedem, pois, como já tenho dito, o pessoal é pouco e eu fujo quanto possivel a dar trabalhos extraordinarios, porque as economias impõem-se.

Isto pelo que diz respeito á falta de documentos, - o que de forma nenhuma prejudicou o discurso do Sr. Deputado, ou diminuiu o valor da sua demonstração.

Sr. Presidente: - eu encontrei este processo chegando ao Ministerio, e o que fiz naturalmente foi mandá-lo para a Procuradoria da Republica; e porque nella tenho a maior confiança, não hesitei em conformar-me com o seu parecer, sem me dar ao inutil trabalho de, por minha vez, estudar o processo em cada uma das suas peças.

Sr. Presidente: - o Sr. Deputado fez uma referencia ao Sr. Bernardino Machado quando Ministro das Obras Publicas, e fê-la, como de justiça, resalvando a honorabilidade do actual Ministro dos Negocios dos Estrangeiros.

Havia uma lei reguladora da materia, e o despacho do Ministro, que, para mais, não chegou a ser publicado no Diario do Governo, não poderia derogá-la.

E isto o que sei sobre o assunto; mas o Sr. Bernardino Machado, se assim o julgar conveniente, dirá o que se lhe offerecer.

Visto que vae ser nomeada uma commissão parlamentar, dispenso-me de fazer referencia ás peças do processo.

O discurso de S. Exa. o Sr. Deputado Rodrigues de Azevedo foi bastante explicito para levar á Assembleia, sequer, ao menos, a suspeita de que no processo alguma cousa haverá de menos claro, ou menos correcto que convenha examinar, para os devidos effeitos.

Procurar definir o que são irregularidades e o que sejam crimes, visto que de crimos falou o Sr. Deputado, é positivamente o papel da commissão que se vae nomear.

Não temos, agora, mais do que aguardar o seu parecer, e depois a justiça dirá o que ha a fazer: se remediar uma falta, se castigar um crime.

Devo ainda dizer, como esclarecimento, que este processo já teve duas ou tres sentenças passadas em julgado.

Tenho dito.

O Sr. Rodrigues de Azevedo: - Peço a palavra para replicar ao Sr. Ministro do Fomento.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que autorizam o Sr. Rodrigues de Azevedo a usar, novamente, da palavra queiram levantar-se.

A Assembleia resolveu affirmativamente. Tem V. Exa. a palavra.

O Sr. Rodrigues de Azevedo: - Como o Sr. Ministro do Fomento, na resposta que me deu, pareceu tomar como offensivas as palavras proferidas, quando me referi a ter-se S. Exa. conformado com o parecer da Procuradoria Geral da Republica, tenho a dizer que S. Exa. as interpretou mal, porquanto sou da mesma opinião do Sr. Ministro.

Eu não quis irrogar censura a S. Exa.; tambem a não quis irrogar á Procuradoria Geral da Republica. O que disse foi que não se tinha attendido bem a todas as peças do processo.

Com relação a ter o poder judicial intervindo, por mais de uma vez, nesta questão, o facto é verdadeiro; simplesmente o que não houve foi julgamento final, porque as sentenças da primeira instancia foram anulladas pela Relação.

Explicou, tambem, o Sr. Ministro que o despacho official não foi publicado no Diario do Governo, porque não podia um despacho alterar um alvará. Assim será; mas o que eu disse foi que é necessario resolver esta questão como de direito, porque a camara municipal de Amares não pode viver sem a receita que lhe provem das thermas de Caldellas.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Vae entrar-se na ordem do dia. Os Srs. Deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa, podem fazê-lo.

O Sr. Padua Correia: - V. Exa. diz-me se ha sobre a mesa alguma proposta com respeito a esta interpellação?

O Sr. Presidente: - Ha, apenas, uma proposta verbal do Sr. Rodrigues de Azevedo, para a nomeação de uma commissão.

O Sr. Padua Correia: - Então, antes de passarmos á ordem do dia, nos termos dos artigos 135.°, 136.° e 137.° do regimento, temos de approvar essa proposta.

O Sr. Presidente: - A proposta foi para que a commissão fosse nomeada pela mesa.

O Sr. Padua Correia: - Então proponho a V. Exa. que nomeie essa commissão antes de se entrar na ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Afigura-se-me não haver urgencia para essa commissão ser nomeada já. Na proxima segunda-feira apresentarei os nomes dos Srs. Deputados que hão de compor essa commissão.

O Sr. França Borges: - Mando para a mesa o seguinte:

A Camara Municipal de Sobral do Monte Agraço, concelho que faz parte do circulo que tenho a honra de representar nesta Assembleia, enviou-me hontem o seguinte telegramma:

Sobral do Monte Agraço, 27, ás 3 e 37 tarde.

A Camara Municipal do Sobral do Monte Agraço, reu-

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10 DIARIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

nida em sessão ordinaria resolve dar-lhe conhecimento do seu protesto contra o decreto de 25 de maio, não se representando no collegio eleitoral que elle mandou convocar e exarando na acta sua formal reprovação contra o mesmo decreto, por o julgar attentatorio das regalias municipaes e deprimente e vexatorio para os bons portugueses que procuram ver traduzidas em boas leis as aspirações dos que trabalharam para a emancipação da Patria e completa autonomia dos municipios. Salvo o devido respeito, lembra esta camara que nem o feroz ditador fez semelhante imposição ás camaras municipaes. Queira communicar o nosso protesto á Assembleia Constituinte. = O Presidente da Camara, Manuel da Costa.

Sala da Assembleia Nacional Constituinte, em 28 de julho de 1911. = O Deputado, Antonio Franca Borges.

Para a Secretaria.

O Sr. Silva Barreto: - Mando para a mesa a seguinte

Nota de interpellação

Desejo interpellar o Exmo. Sr. Ministro do Interior acêrca da politica geral do districto de Leiria, e especialmente dos concelhos de Pedrogam e Figueiró dos Vinhos, concelho do circulo n.° 29, por que fui proclamado Deputado ás Constituintes. Aguardo me seja marcado o dia.

Sala das Sessões, 28 de julho de 1911. = O Deputado, Antonio Maria da Silva Barreto.

Mandou-se expedir.

O Sr. Santos Pousada: - Apresento o seguinte

Requerimento

Requeiro que pelo Ministerio do Interior me sejam fornecidos os seguintes esclarecimentos:

1.° Nota do tempo em que funccionou a repartição das construcções escolares.

2.° Relação de todo o pessoal effectivo e adventicio, .contendo nomes, categorias e ordenados ou salarios de cada empregado.

3.° Relação da quantidade, qualidade e custo do material, mobiliario e instrumentos adquiridos para os trabalhos technicos, na mesma repartição.

4.° Despesas do pessoal, em viagem e moradia, occupado em inspeccionar os edificios em construcção, contendo nomes d'esses empregados e tempo da inspecção por localidades.

5.° Relação das escolas construidas, modelo Adães Bermudes, por localidades e typo empregado.

6.° Copia de cada um dos typos adoptados e premiados pelo Governo.

7.° Relação das importancias despendidas com a construcção de cada um d'esses edificios.

8.° Relação dos terrenos offerecidos pelo Estado, pelas camaras municipaes, juntas de parochia ou por outras collectividades ou entidades officiaes ou particulares.

9.° Nota das areas de terrenos occupados para cada uma das escolas, comprehendendo o espaço livre e o da edificação.

10.° Importancia despendida na aquisição de terrenos para edificios escolares e localidades onde foram adquiridos.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional Constituinte, 27 de julho de 1911. = O Deputado, Antonio dos Santos Pousada.

Mandou-se expedir.

O Sr. Antão de Carvalho: - Envio para a mesa as seguintes

Notas de interpellação

Desejo interpellar o Sr. Ministro da Justiça acêrca da acção da magistratura judicial e do Ministerio Publico nos tribunaes e em especial na comarca da Regua.

Sala das sessões da Assembleia Constituinte, 28 de julho de 1911. = O Deputado, Antão de Carvalho.

Desejo interpellar o Sr. Ministro do Fomento acêrca da fiscalização dos productos agricolas e especialmente dos vinhos.

Sala das sessões da Assembleia Nacional Constituinte, 28 de julho de 1911. = O Deputado, Antão de Carvalho.

Mandaram-se expedir.

O Sr. Baltasar Teixeira: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio das Finanças, me seja enviada uma nota de todos os empregados d'elle dependentes que actualmente estão fora dos seus logares, com a designação das commissões que exercem e dos abonos de vencimentos que teem.

Sala das sessões, em 28 de julho de 1911. = O Deputado pelo circulo n.° 40, Baltasar de Almeida Teixeira.

Mandou-se expedir.

O Sr. Antonio da Silva Cunha: - Apresento o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio das Finanças, me seja fornecida nota do numero de titulos ou acções da Sociedade do Palacio de Cristal Portuense, pertencente ao Estado, bem como o numero dos mesmos titulos.

Sala das sessões, 28 de julho de 1911. - O Deputado, Antonio da Silva Cunha.

Mandou-se expedir.

O Sr. Bissaia Barreto: - Mando para a mesa os seguintes

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministerio do Fomento, me sejam enviados os regulamentos dos:

a) Institutos Industriaes;

b) Escolas Industriaes e Commerciaes;

c) Programmas dos mesmos estabelecimentos de ensino;

d) O relatorio de Antonio J. Amorim;

e) Regulamentos de officinas;

f) Programmas das mesmas. = O Secretario da commissão de instrucção, Bissaia Barreto.

Requeiro que, pelo Ministerio do Interior, me seja enviada copia de toda a legislação sobre o ensino secundario, publicada desde 1895.

Lisboa, 29 de julho de 1911. = Bissaia Barreto.

Mandaram-se expedir.

O Sr. Luis Rosette: - Apresento o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio das Finanças, 4.ª Repartição de Impostos, me sejam fornecidos os seguintes documentos:

1.°

Nota de todos os empregados de fiscalização, sua situação, nomeação, promoções e castigos.

2.°

Nota dos empregados licenceados até esta data espe-

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SESSÃO N.° 33 DE 28 DE JULHO DE 1911 11

cialmente, e elementos que os justificam, prazo das licenças se são ou não com vencimentos.

Camara dos Deputados, em 20 de julho de 1911. = O Deputado, Luis Rosette.

Mandou-se expedir.

O Sr. Sá Pereira: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio do Fomento, me sejam enviados com urgencia os seguintes documentos:

1.° Relação de todos os agrónomos contratados ou provisorios existentes no 1.° de outubro de 1910;

2.° Relação dos agrónomos contratados ou provisorios admittidos desde o 1.° de outubro até 18 de junho de 1911; comprehendendo:

a) Vencimentos e gratificações mensaes;

b) Motivo que justificou a sua admissão;

3.° Nota das vagas existentes no quadro dos agrónomos desde 5 de outubro até 19 de junho e indicação dos funccionarios que preencheram essas vagas.

Lisboa, em 28 de julho de 1911. = O Deputado, Pedro Januario do Valle Sá Pereira.

Mandou-se expedir.

O Sr. Pires de Campos: - Mando para a mesa a seguinte

Nota de interpellação

Desejo interpellar o Sr. Ministro do Interior, sobre a nomeação de Abel Antonio Grillo para sub-inspector primario nas Caldas da Rainha. = O Deputado, Pires de Campos.

Sala das Sessões da Constituinte, 28 de julho de 1911.

Mandou-se expedir.

O Sr. Antonio Granjo: - Apresento os seguintes

Requerimentos

Requeiro pelo Ministerio da Guerra:

1.° Nota de todos os terrenos pertencentes ao Ministerio da Guerra, que foram vendidos desde 5 de outubro de 1910, até hoje, especificando-se se foram ou não vendidos em hasta publica, e quando se cumpriram as disposições legaes, as quantias que esses terrenos produziram, a superficie d'esses terrenos, o destino que teve o producto da venda.

2.° Copia de quaesquer projectos e contra projectos, propostas e contra-propostas apresentadas na commissão de reorganização do exercito, nomeada em outubro de 1910, e bem assim das actas das respectivas sessões.

3.° Copia dos relatorios do coronel de infantaria André Bastos sobre o capitão Antonio Gualberto da Fonseca Antunes, quando commandante da 4.ª companhia da guarda fiscal (Chaves) e sobre o capitão de infantaria 19 Jorge Camacho, que fugiu para a Galliza e foi já demittido.

Pelo Ministerio do Fomento:

Nota das representações das Camaras de Chaves e Boticas e quaesquer outras sobre a conclusão ou prolongamento do Caminho de Ferro da Régua a Chaves e nota do estado actual dos estudos d'esse prolongamento ou conclusão.

Sala das Sessões, 28 de julho de 1911. = O Deputado, Antonio Granjo.

Mandou-se expedir.

Requeiro que pelo Ministerio da Justiça se me mande uma copia da representação ou representações, queixa ou queixas que nesse Ministerio existam contra o actual delegado do procurador da Republica na comarca de Montalegre.

Sala das sessões, em 28 de julho de 1911. - O Deputado, Antonio Granjo.

Mandou-se expedir.

O Sr. José Francisco Coelho: - Envio para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que me seja enviada nota, nomes e quantias, dos particulares que receberam adeantamentos até 5 de outubro de 1910.

Lisboa, 28 de junho de 1911. = O Deputado pelo circulo n.° 13, José Francisco Coelho.

Mandou-se expedir.

O Sr. Fernão Botto Machado: - Apresento um projecto de lei acêrca do seguro obrigatorio para todos os trabalhadores de um e outro sexo.

A publicar no "Diario do Governo".

O Sr. Ramos da Costa: - Apresenta um projecto de lei para que seja destinado a Palacio do Trabalho o edificio da incompleta igreja de Santa Engracia, situada no Campo de Santa Clara, 1.° bairro da Cidade de Lisboa.

A publicar no "Diario do Governo".

O Sr. João Gonçalves: - Mando para a mesa um projecto de lei para que todo o tempo passado pelos delinquentes alienados em manicomios seja contado na duração da pena.

Mando igualmente para a mesa outro projecto para que todo o condemnado que no acto do crime tiver menos de dezoito annos ou mais de sessenta annos, ou que prove defeito physico que o inhabilite para aprender uma profissão, não poderá ser submettido ao regime cellular.

A publicar no "Diario do Governo".

O Sr. Rodrigo Pontinha: - Apresento um projecto de lei para que seja mantida a disposição legal que permitte aos funccionarios publicos o pagamento dos respectivos direitos de mercê em quarenta e oito prestações mensaes.

A publicar no "Diario do Governo".

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.º 3 (Constituição Politica)

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o n.° 20.° ao artigo 5.°

Leu-se na mesa. É o seguinte:

20.° A excepção do flagrante delicto, a prisão mais poderá executar-se senão por ordem escrita da autoridade competente e em conformidade com expressa disposição da lei.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Moura Pinto: - Pedi a palavra para propor o seguinte additamento ao numero em discussão:

"Proponho que ao n.° 20.p do artigo 5.° se acrescente:

Devendo o detido ser immediatamente entregue em

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12 DIARIO DA ASSEMPLLIA NACIONAL CONSTITUINTE

juizo se a prisão não tiver sido ordenada pela autoridade judicial. = O Deputado, Moura Pinto".

No n.° 20.° não se consigna o prazo que o detido pode estar preso á ordem da autoridade administrativa. O meu additamento tem em vista limitar esse prazo ou aquelle que um preso pode estar debaixo de custodia.

Leu se na mesa a proposta de additamento e foi admittida.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Pedi a palavra era virtude do additamento do Sr. Moura Pinto.

Esse additamento limita o tempo que um preso pode estar sob custodia antes de ser entregue ao poder judicial.

Conformo-me com essa limitação de tempo, e tinha até já uma emenda para apresentar, - mas parece-me que ella melhor cabimento teria se fosse em substituição do n.° 21.°, ou que, e talvez o Sr. Moura Pinto concorde com isso, o additamento fique constituindo outro numero, porque o n.° 21.° refere-se a outro assunto.

Portanto, se S. Exa. concordasse com essa doutrina, quanto a limitação do prazo de prisão preventiva, o additamento ficava sobre a mesa para ser discutido conjuntamente com o n.° 21.° e não como additamento ao n.° 20.°

S. Exa. não reviu.

O Sr. Moura Pinto: - Concordo.

O Sr. José de Castro: - Parece-me desnecessario tratar d'este assunto, por quanto no n.° 21.° está tratada a materia. Nelle se estabelecem, precisamente, as condições em que pode fazer-se essa prisão.

Por consequencia não ha razão para estar a aumentar com mais palavras o numero juntando-lhe materia igual á do n.° 21.°

Esta é a minha opinião.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o n.° 20.° para se votar.

Lido o numero, foi approvado, sendo rejeitado o additamento proposto pelo Sr. Moura Pinto.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Pedi a palavra para accentuar que a votação da Assembleia, rejeitando o additamento do Sr. Moura Pinto, impede que a materia d'esse additamento seja tratada a proposito do n.° 21.°

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o n.° 21.° Leu-se, na mesa. É o seguinte:

21.° Em todos os casos e em todas as comarcas do territorio da Republica será feito o primeiro interrogatorio dos arguidos que estiverem detidos, em presença de advogado constituido ou officioso, dentro das primeiras vinte e quatro horas improrogavelmente, a contar do momento da prisão, ficando sujeitos ás respectivas responsabilidades penaes, que serão logo effectivadas de officio, os funccionarios de qualquer categoria, que contribuirem para se infringir esta disposição, quer demorando a entrega dos detidos ao poder judicial, a qual deve ser feita, em regra, em acto seguido á prisão ou no maximo prazo de vinte e quatro horas, quer obstando, sob qualquer pretexto, a que se faça o interrogatorio, que é obrigação judicial preferente a todas as outras.

§ 1.° No interrogatorio deve o juiz averiguar, discriminadamente, todos os caracteres do detido que ao detido possa ser imputado, a fim de o mandar, immediatamente, em liberdade mediante termo de identidade gratuito e sem sêllo, se lhe couber processo de policia correccional, ou para lhe admittir fiança e declarar o montante d'esta, tambem immediatamente, se só delicto imputado couber processo correccional ou processo de querella em que tenha de applicar-se pena maior não fixa.

§ 2.° Nos delictos por abuso de liberdade de imprensa nunca será permittida o detenção previa, mas somente o interrogatorio do arguido, para que este logo deduza, querendo, a sua defesa e offereça as suas provas, conforme se determinará na respectiva lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Alexandre Braga.

O Sr. Alexandre Braga: - Sr. Presidente: - a simples leitura basta para vermos que nestas disposições se incluem preceitos que dizem, apenas, respeito á forma de processo.

Esses preceitos não devem ser da Constituição.

Dentro de uma Constituição deve, apenas, consignar-se a garantia referente a direitos fundamentaes.

Para brevidade da discussão e sendo certo que não posso neste momento discutir já a materia dos paragraphos d'este n.° 21.° e a dos numeros seguintes até o n.° 25.°, inclusive, contendo todos elles disposições que são da forma de processo, eu proponho uma emenda ao referido n.° 21.°, em que se consubstancia não só a doutrina d'este numero, mas as dos n.ºs 22.°, 23.°, 24.° e 25.°

Essa emenda é a seguinte:

Emenda ao n.° 21.° do artigo 6.°

Nos feitos crimes aos detidos serão asseguradas, alem das demais da lei, as seguintes garantias:

- instrucção contraditoria, com intervenção de advogado do arguido em todos os actos do processo;

- realização do interrogatorio no prazo improrogavel de vinte e quatro horas a contar da primeira detenção;

- lançamento nos autos do despacho de pronuncia dentro do prazo de oito dias, a contar da entrega ao poder judicial, prazo que só poderá ser prorogado, pelo tempo maximo de mais oito dias, por virtude de diligencias requeridas pelo detido;

- livre communicação, excepto antes da pronuncia quando arguidos de crimes para que a lei expressamente admitta a incommunicabilidade, a qual não poderá, porem, prolongar-se por mais de quarenta e oito horas, e sendo-lhes sempre permittido falar, pelo menos uma hora em cada dia, com seus pães ou tutores, filhos, cônjuge e irmãos sobre assuntos diversos do da culpa e sempre em presença da autoridade. = O Deputado, Alexandre Braga.

Como V. Exa. vê, Sr. Presidente, esta emenda abrange as disposições não só do n.° 21.°eseusparagraphos, como as dos numeros que se lhes seguem, até o n.° 25.° inclusive, expurgando d'elles todos os preceitos que são meramente da forma de processo e que não devem entrar numa Constituição.

A funcção reguladora da forma por que se hão de tornar effectivos os direitos garantidos na Constituição, cabe necessariamente, a leis posteriores.

Não é na propria Constituição que se devem inserir preceitos reguladores de processo e que não fazem parte integrante dos direitos essenciaes que a Constituição tende a assegurar.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta de emenda apresentada pelo Sr. Alexandre Braga.

Foi lida na mesa.

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SESSÃO N.° 33 DE 28 DE JULHO DE 1911 13

Os Srs. Deputados que admittem esta proposta de emenda, queiram levantar se.

Está admittida.

O Sr. José de Castro: - Pedi a palavra para declarar, por parte da commissão, que concordo, absolutamente com a substituição apresentada. Essa substituição corresponde ao pensamento da commissão.

Desde que se consigne o essencial, é inutil pôr mais palavras.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Alexandre Braga: - Apenas duas palavras Peço que na proposta ha pouco apresentada, me seja permittido substituir as palavras marido e mulher por conjuges.

O Sr. Presidente: - A camara autoriza?

Vozes: - Sim senhor, sim senhor.

O Sr. Presidente: - Fica, pois, feita a emenda. Tem a palavra o Sr. Moura Pinto.

O Sr. Moura Pinto: - Mando para a mesa uma proposta tendente a simplificar o n.° 21.° É a seguinte:

Para evitar repetições inuteis e por conveniencia de collocação na sequencia das materias proponho que o n.° 21.° seja redigido da seguinte forma:

N.° 21.° "É garantida a instrucção contraditoria em todos os feitos crimes, devendo fazer-se o primeiro interrogatorio dos arguidos dentro das 24 horas contadas da sua entrega em juizo". - O Deputado, Moura Pinto.

No n.° 21, allude-se á instrucção contraditoria e só em um numero posterior se diz que é mantida a instrucção contraditoria. Primeiro deve dizer-se que se mantem a instrucção contraditoria.

De resto, a proposta do Sr. Alexandre Braga, envolve outros numeros que ainda não estão em discussão e que dizem respeito a materia bem distincta; - por exemplo o que se refere á incommunicabilidade dos detidos, que é assunto bem diverso da instrucção contraditoria.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta de substituição apresentada pelo Sr. Moura Pinto.

Foi lida na mesa.

Os Srs. Deputados que admittem esta proposta queiram levantar-se. Não está admittida. Tem a palavra o Sr. Barbosa de Magalhães.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - A forma bastante desenvolvida, talvez, mesmo, um pouco confusa, como está redigido o n.° 21.° do artigo 5.°, dá a impressão de que elle deveria ser supprimido; porque a verdade é que contem materia, que é puramente de processo, não devendo, portanto, figurar numa Constituição.

Por este artigo, trata-se de restringir a acção da autoridade, para conservar detidos por mais de vinte e quatro horas, os individuos que, por virtude de qualquer circunstancia, muitas vezes de ordem politica, caiam sob a sua alçada. Ora, entende o orador, que se deve fixar na Constituição o prazo maximo que o individuo deve estar preso á ordem da autoridade administrativa, ou o prazo dentro do qual a autoridade deve fazer entrega d'elle ao poder judicial.

Por isso proponho a seguinte

Emenda

Proponho que o n.° 21.° seja substituido pelo seguinte:

"Os presos pelas autoridades administrativas, militares ou policiaes, ou a ellas entregues por qualquer do povo, serão postos á disposição do poder judicial no prazo maximo de quarenta e oito horas".

Lisboa, 27 de julho de 1911. = O Deputado, Barbosa de Magalhães.

O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas.

O Sr. Alexandre Braga: - Está em discussão a materia. Isto simplifica-se muito mais ficando eliminados os outros numeros.

Lida na mesa, foi admittida a proposta do Sr. Barbosa de Magalhães.

O Sr. Antonio Macieira: - Sr. Presidente: - o Sr. Alexandre Braga propôs uma substituição ao n.° 21 e seus paragraphos, e juntamente aos n.ºs 22.°, 23.°, 24.° e 25.° Parece-me, em vista da resolução da Camara, de que as discussões incidissem sobre cada um dos numeros em separado, que esta emenda não pode ser assim posta á discussão - tanto mais que me parece que ella soffre exactamente dos mesmos defeitos que se encontram no n.° 21.° do projecto.

Por outro lado, o Sr. Barbosa de Magalhães apresentou um acrescentamento, a que eu chamarei uma substituição do n.° 21.°, que constitue um principio inteiramente novo e uma nova forma de redacção que deve inserir-se no final d'estes numeros, quando se tratar de todos os principios que devem ser consignados neste artigo da Constituição.

O n.° 21.° e paragraphos constituem materia de direito adjectivo, materia regulamentar, propria do Codigo do processo ou lei de processo; são, em ultima analyse, o desenvolvimento da doutrina que se encontra no n.° 25.°, que estabelece o principio constitucionalmente indispensavel, da instrucção contraditoria.

O que é necessario affirmar é que na Constituição se iniciou o principio da instrucção publica e contraditoria, que até a promulgação do decreto do Governo que a estabeleceu, não existia em Portugal.

A forma de levar a effeito a regulamentação é assunto de longa ponderação e ha de constar de leis especiaes, sobre as quaes a Camara tem de preparar-se, e muito, em vista da sua alta importancia.

A proposta do Sr. Alexandre Braga, envolve, como disse já, os n.ºs 22.° e 23.° e entendo que sobre este assunto ha tres pontos que devem conservar-se inteiramente distinctos.

O primeiro é a affirmação pura e simples da instrucção publica e contraditoria. Essa affirmação já está feita; - são, portanto inuteis o n.° 21.° e seus paragrapbos. O segundo é a da incommunicabilidade para fixar o prazo, e o terceiro o da conservação em custodia.

Nestas condições, eu pedi a palavra para justificar a. eliminação do artigo 21.° e seus paragraphos. Não voto a proposta do Sr. Alexandre Braga, porque, alem do mais, envolve materia que é inteiramente distincta, a que respeita á incommunicabilidade, conservação em custodia; como entendo que a proposta do Sr. Barbosa de Magalhães não deve ser considerada uma substituição, mas sim principio novo, e como tal em separado deve ser posta á votação.

Nestes termos, mando para a mesa a minha proposta de eliminação, pura e simples, do artigo 21.° e seus paragraphos.

Leu-se na mesa, sendo admittida.

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14 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

O Sr. Matos Cid: - Sr. Presidente: - pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta de emenda; mas como essa proposta é perfeitamente idêntica á que acaba de ser enviada pelo Sr. Antonio ladeira, desisto.

O Sr. José Montez: - Devo lembrar á Camara, que nós estamos a discutir o que se consigna no n.° 42.°: a garantia do habeas corpus. Nestas condições, desde que isto está fixado no projecto de Constituição e sobre este principio a Camara tem de manifestar-se e fixar os principios sobre que o assunto deve assentar, eu entendo que não podem ser eliminados o n.° 21.° e seus paragraphos, tal como foi proposto pelo Sr. Antonio Macieira.

Mando, por isso, para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que se faça em conjunto a discussão dos n.ºs 21.° e 22.° do artigo 5.ª = O Deputado, José Montes.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Correia de Lemos: - Sr. Presidente: - o que se acha contido neste numero e nos seus paragraphos tem indubitavelmente um alto valor. Indiscutivelmente, estão aqui os principios mais sublimes que sobre o assunto se podem apresentar. Legislou-se, pode-se dizer, como se o regime não tivesse mudado; suppondo que os republicanos amanhã podem estar por baixo.

E assim que eu entendo as cousas; é assim que se deve sempre legislar. Só assim se consegue ser verdadeiramente justo. As questões de momento podem levar a muita cousa que se desvie dos verdadeiros principios. Devemos, primeiro que tudo não nos afastarmos das regras da justiça.

Penso, portanto, que a Camara fará bem em conservar este na sua substancia e até na sua forma. Vejo a Camara propensa a discutir de uma maneira demasiado miuda as disposições do projecto; não lh'o levo a mal, porque nisso prova o seu escrupulo, mas tudo tem medida.

A justa proporção é uma cousa que nunca deve perder-se de vista.

Eu julgo que se não tem attendido a este principio fundamental. Não ha duvida nenhuma de que neste numero e seus paragraphos se consignam verdadeiras garantias.

O Sr. Dr. Alexandre Braga chamou-lhes disposição de processo, e afinal, Sr. Presidente, e Srs. Deputados, as grandes injustiças sociaes teem vindo de se não observarem no processo as regras da justiça.

Um processo bem organizado pode muito contra uma lei penal mal purificada. Innumeros individuos que teem sido victimas das injustiças sociaes clamam bem alto para que não haja hesitações em proclamar este principio.

Estão aqui effectivamente leis de processo, mas estão verdadeiras garantias individuaes que é indispensavel conservar na integra para que depois os juizes saibam, na applicação da garantia do habeas corpus, aquillo a que teem de ater-se.

Por consequencia, não nos envergonhemos de consignar aqui leis de processo como estas que nobilitam quem as decretou e o povo para quem se decretaram. (Apoiados).

Ser moderado é a primeira qualidade de um estadista, - e, sem duvida, que esta lei foi feita para tratar tanto os republicanos como para tratar os inimigos e os que não são affectos á Republica.

E necessario que na Republica haja justiça perfeita, completa, para que o pois possa viver tranquillo e todos possam acolher-se a elle com confiança.

Castigue-se severamente aquelle que conspirou, mas, averigue-se, de uma maneira radical, de que forma conspirou. Seja-se então muito severo, estimo-o, mas que se seja acima de tudo justo, - e a Camara seja justa na apreciação da doutrina d'este artigo e seus numeros.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Vou consultar a Camara sobre se admitte a questão previa do Sr. José Montez.

Consultada a Assembleia, resolveu negativamente.

O Sr. Aresta Branco: -Sr. Presidente: - pedi a palavra para fazer considerações quasi analogas ás que fez o Sr. Barbosa de Magalhães sobre a materia expendida neste n.° 21.°, principalmente no que diz respeito ao numero de horas em que deve ser entregue o delinquente ao poder judicial.

Eu tive occasião, a proposito d'estas vinte e quatro horas, de que aqui se fala, de consultar o Sr. Ministro da Justiça, e S. Exa. disse-me, que, effectivamente, ha comarcas onde é absolutamente impraticavel poder-se entregar o delinquente, em vinte e quatro horas ao poder judicial.

Ha comarcas onde isto se não pode fazer e eu vou apontá-las.

Grandola, por exemplo, é um concelho que faz parte da comarca de Alcacer do Sal. A sede do concelho dista quasi 60 kilometros da sede da comarca.

Veja V. Exa. e veja a Camara em que afflições se podem encontrar algumas autoridades administrativas, aliás honestas, com vontade de fazer justiça e garantir o que aqui está, para em vinte e quatro horas entregarem os presos ao poder judicial.

Almodovar é uma comarca que tem algumas freguezias tão distantes que em dois dias não se chega á sede da comarca.

As disposições d'este artigo são humanas, são democraticas e garantem ao individuo a maxima liberdade; mas tem estes defeitos que acabo de apontar. Houve a infelicidade de o Sr. Ministro da Justiça adoecer, porque se assim não fosse, provavelmente a reforma judicial já estaria feita.

Mas como as comarcas ainda são o que são, parece-me que a Camara não devia rejeitar o prazo de quarenta e oito horas para as autoridades administrativas entregarem os delinquentes ao poder judicial.

Se a resolução que a Assembleia tomou é de tal ordem que eu não posso repetir essa proposta, não a farei; mas parece-me que deve reconsiderar, a não ser que o Sr. Ministro da Justiça nos proponha uma reforma em que garanta comarcas pequenas, onde nas vinte e quatro horas se possa fazer isto. Peço, pois, á Assembleia que considere a proposta como merece.

Eu tive a infelicidade de ser governador civil de um districto e, como procuro sempre em todos os campos cumprir o meu dever, ordenei ás autoridades minhas subordinadas, que inquirissem, absolutamente, o indispensavel para dar alguma luz ao poder judicial, a fim de remetterem immediatamente os presos a juizo. Elias faziam isso; pois nas vinte e quatro horas não chegava o delinquente á sede da comarca!

Feitas estas considerações e admittida a proposta do Sr. Barbosa de Magalhães, eu apenas a vim reforçar. Se ella não tivesse sido admittida, eu faria uma nova proposta que submetteria á approvação da Assembleia.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Moura Pinto.

O Sr. Moura Pinto: - Desisto da palavra.

O Sr. Affonso Costa: - Sr. Presidente: pedi a palavra porque tenho pelo illustre Deputado toda a consideração, e desejo dar-lhe uma explicação. Foi da minha iniciativa o decreto de 14 de outubro feito a poucos dias da Revolução que implantou a Republica. Nesse decreto introduzi todos os principios, á excepção do habeas corpus, que se encontram dentro do projecto da Constituição.

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SESSÃO N.° 33 DE 28 DE JULHO DE 1911 15

Sobre o principio do habeas corpus, que está neste projecto, tinha eu já, de collaboração com um illustre Deputado que não vejo presente, preparado as bases para fazer um decreto, regulamentando-o de maneira a ficar na legislação portuguesa, como conquista da Revolução, antes mesmo da reunião da Assembleia Nacional Constituinte. A minha doença, porem, impediu-me de realizar essa parte do meu programma, como me impediu de tratar da emancipação da mulher em materia de direito civil, em que trabalhava tambem de collaboração com o Sr. Alexandre Braga, e da reforma judiciaria. Eu creio que o mais adequado ás circunstancias é eliminar-se o n.° 21. A doutrina contida neste numero é toda materia de processo.

Desde que as nossas comarcas não são iguaes, o decreto de 14 de outubro estabeleceu que o detido, em regra, teria de ser presente ao juiz dentro de 12 horas. Mas diz em regra justamente para obtemperar ás reclamações que já ouvi por parte de alguns deputados.

Ora numa Constituição não se pode escrever em regra.

Bastantes provas temos dado, desde que a Republica se implantou, do nosso zelo pelas garantias individuaes.

A instrucção contraditoria sendo um principio de direito novo e uma garantia constitucional, deve ficar na Constituição. O resto não é necessario; disse o nosso collega, e muito bem, que é possivel que não haja tempo de levar o preso ao juiz. Nesse caso as autoridades administrativas conservarão o menos tempo possivel os presos em seu poder. E isso se acautelará, não porque as autoridades administrativas da Republica possam fazer o que fizeram as da monarchia, mas porque é preciso estabelecer, nessa parte, quanto possivel, a distincção entre a autoridade administrativa e a judicial. Isso, porem, não é materia para agora. A Republica procurará estabelecer juizes de instrucção em todas as comarcas do país, funccionando separadamente das entidades que realizam as funcções do julgamento.

A funcção da autoridade administrativa limitar-se-ha, neste caso, a deter o individuo até o levar á mão do juiz. Não lhe damos, desde esta hora, nenhuma intervenção acêrca do facto de que o individuo é accusado.

Não nos esqueçamos de que homens de bem podiam ser accusados, durante a monarchia, de suppostos delictos e soffreram affrontas e vexames causados, em grande parte, por prisões d'esta ordem. Hoje, na Republica, são só accusados os criminosos, - e criminosos não são verdadeiramente dignos de poderem soccorrer-se de disposições constitucionaes para se furtarem á sancção das suas responsabilidades.

É preciso, pelo contrario, que dentro da Constituição fique acautelada a hypothese de que haja demora na instrucção dos processos em juizo para que, passados oito dias depois da prisão, não possam ter liberdade accusados que devem ficar sob custodia até o julgamento, porque, d'esse modo, a Republica seria illudida com os seus proprios principios.

Hoje que a Republica está consolidada mas tem de defender-se, é preciso evitar que os grandes malfeitores, aquelles que atacam a propriedade particular, aquelles que fazem notas falsas, etc., por todas as formas, possam escapar, pela instrucção do processo se ella não for devidamente acautelada.

Isto não é falar como reaccionario. Parece-me que quem redigiu o decreto de 14 de outubro tem autoridade para pedir á Camara um momento de reflexão. (Apoiados).

Deixamos tudo quanto, porventura, possa embaraçar o caminho da Republica.

O principio da instrucção contraditoria é sufficiente para assegurar que a justiça em Portugal corresponderá, sempre, aos principios apregoados e defendidos por todos nós, os propagandistas do novo regime, no tocante á garantia de defesa dos accusados.

Inscrevamos o priucipio da instrucção contraditoria que é o bastante, e façamos uma obra clara, profunda e perfeita, até que um dia, numa outra reforma, se introduzam novos principios de garantia de defesa para os accusados, o que aliás me não parece necessario.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Alexandre Braga: - Concordando com as considerações feitas pelo Sr. Affonso Costa, peço licença para retirar a parte da minha proposta que não diz respeito á garantia da instrucção contraditoria.

O Sr. Presidente: - Vou consultar a Assembleia sobre se permitte que o Sr. Alexandre Braga retire a parte da sua proposta que não diz respeito á instrucção contraditoria.

Consultada a Assembleia, resolveu affirmativamente.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais ninguem inscrito, vae passar-se á votação.

Vae ler-se a proposta de eliminação do Sr. Antonio Macieira.

Lida na mesa, foi approvada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o n.° 22.° do artigo 5.°:

Leu-se na mesa. É o seguinte:

22.° A incommunicabilidade dos detidos só pode ordenar-se antes da pronuncia e quando ao crime corresponder pena maior fixa, não excedendo nunca a quarenta e oito horas, contadas desde o momento em que é ordenada pelo juiz, e não obstando a que o detido communique, durante uma hora, pelo menos em cada dia, com seus pães, filhos, mulher, marido e irmãos sobre assuntos diversos dos da culpa e sempre na presença da autoridade.

O Sr. Matos Cid: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta tendente á suppressão do n.° 22.°

Depois das palavras do Sr. Affonso Costa, em que S. Exa. se affirmou, como sempre, um espirito accentuadamente juridico, entendo que o que eu dissesse sobre o assunto seria um corollario d'aquillo que S. Exa. disse.

A minha proposta é a seguinte:

Proponho a suppressão do n.° 22.° do projecto em discussão.

Lisboa, Sala das Sessões da Assembleia Nacional, em 28 de julho de 1911. = O Deputado pelo circulo n.° 18, José do Valle de Matos Cid.

Foi admittida.

O Sr. Antonio Macieira: - Sr. Presidente:- não desejo na Constituição o n.° 22 tal como está redigido, nem tão pouco que elle seja eliminado. A eliminação não deve ser approvada, porque elle contem um principio fundamental, e verdadeiramente constitucional, que evita que a liberdade do cidadão esteja ao arbitrio de qualquer autoridade; mas d'ahi a admittir o n.° 22, tal como está redigido, vae uma grande differença.

A lei francesa de 1897, sobre instrucção contraditoria determina que a incommunicabilidade dos detidos não pode ir alem de dez dias, prazo renovavel apenas uma vez por circunstancias imperiosas, e incommunicabilidade que não prohibe as relações do advogado com o seu cliente.

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16 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

A instrucção contraditoria não está ainda bem observada entre nós; não pode dizer-se ainda que resultados apreciaveis dará, porque representa uma nova reivindicação, cujas consequencias praticas são desconhecidas.

Entendo que da lei francesa de 1897 podemos trazer para a nossa Constituição o principio da incommunicabilidade fixada num prazo nunca inferior a oito dias, e só por circunstancias espectaes, podendo ir até o dobro.

Em vinte e quatro horas não é possivel em certos casos proceder á necessaria investigação. O principio liberal não pode tambem ser levado ao ponto de tolher a acção da justiça.

É necessario ser bom, mas não tanto que a bondade sirva de égide ou protecção para malfeitores.

Proponho, pelo que venho de expor, a seguinte emenda ao numero que se discute.

Proposta de emenda

Proponho que o n.° 22.° do artigo 5.° passe para depois d'aquelle que tem agora o n.° 23.°, com a seguinte redacção:

"A incommunicabilidade dos detidos só pode ser ordenada antes da pronuncia, e não poderá exceder o prazo de oito dias; todavia, os detidos serão autorizados a communicar durante uma hora, pelo menos, em cada dia, com seus pães, filhos, mulher, marido e irmãos, e sempre em presença da autoridade.

§ unico. O detido poderá sempre communicar com o seu advogado constituido ou officioso dentro das horas regulamentares".

A isto se deve acrescentar umas palavras que não pus, porque já estavam comprehendidas numa outra emenda minha, mas que não foi admittida.

São as seguintes, que devem intercalar-se entre as palavras e dias" e "todavia": "o qual poderá ser renovado apenas por igual prazo nos casos especiaes que a lei determinar".

Foi admittida.

O Sr. Machado de Serpa: - Vota pela eliminação do numero. Desde que a Assembleia votou a eliminação de algumas garantias individuaes, não ha razão para não votar a eliminação de outras, ainda que lamenta o facto, porque a verdade é que desapparecem da Constituição os verdadeiros direitos individuaes.

O discurso será publicado na integra guando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas.

O Sr. Affonso Costa: - A Camara sabe bem o que a respeito de incommunicabilidade se deve ao antigo regime.

Felizmente passaram os tempos mais agitados da Republica sem se praticarem violencias de qualquer especie. Foi este o pensamento a que se subordinaram todos os bons republicanos.

Entendo que deve ser eliminado o numero em discussão e o seguinte.

As garantias individuaes ir-se-hão estabelecendo em leis ordinarias, de harmonia com as circunstancias da vida do povo.

E' necessario não inscrever na Constituição compromissos que possam amanhã embaraçar a Republica na sua defesa contra aquelles que a atacarem.

Não desçamos a minuciosidades como a da elevação a dezaseis dos dito dias de incommunicabilidade, que podem prejudicar a acção da Republica, - sem isto querer dizer que a Republica se arreceie do que quer que seja.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Vê com magoa que desaparece da Constituição o principio que se estabelecia no n.° 21.° embora, nisto se afaste da opinião do Sr. Affonso Costa.

A eliminação n'esse principio pode levar á eliminação de todos os outros.

O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas.

O Sr. Antonio Macieira: - Em virtude da resposta do Sr. Ministro da Justiça, peço licença para retirar da minha proposta as palavras pelas quaes se eleva a dezaseis os oito dias de incommunicabilidade.

O Sr. Affonso Costa: - Não foi o Ministro da Justiça quem falou. Foi o Deputado Affonso Costa.

O Sr. Antonio Macieira (concluindo): - Sim, senhor, foi o Sr. Deputado Affonso Costa.

O Sr. Presidente: - Consulto a Camara sobre se consente que o Sr. Antonio Macieira rectifique a sua proposta nos termos por S. Exa. expressos.

Foi concedido.

Posta á votação a proposta de eliminação apresentada pelo Sr. Matos Cid, foi approvada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o n.° 23.°

Leu-se na mesa. É o seguinte:

23.° Ninguem será conservado em custodia por mais de oito dias, contados do momento da primitiva detenção, salvo se o respectivo despacho não puder ser dado dentro d'esse prazo, em consequencia de diligencias judiciaes requeridas pelo preso, devendo, porem, ainda neste caso, fundamentar-se, expressamente, a prolongação da prisão preventiva, que, improrogavelmente, terminará ao cabo de um novo periodo de oito dias, o mais tardar.

O Sr. Joaquim Pedro Martins: - Pedi a palavra para fazer algumas singelas declarações.

Não tenho duvida nenhuma sobre a sorte d'este numero: a sorte de garrote que tiveram os anteriores. Lamento, entretanto, que desappareçam da Constituição as garantias individuaes.

O Sr. Ministro da Justiça, não querendo que essas garantias fiquem na Constituição, parece renegar a sua propria obra, pois não deseja que fique no Codigo fundamental o que elle consignou nos seus decretos.

Segundo as razões apresentadas pelo Sr. Affonso Costa devem eliminar-se da Constituição todos os direitos individuaes, mas, não sendo elles insertos na Constituição, não ficam perfeitamente garantidos: qualquer lei ordinaria os poderá inutilizar.

Faço, por causa d'este numero, a minha declaração de voto. Acompanho o illustre Deputado o Sr. Barbosa de Magalhães nas considerações que fez, que acho justissimas.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Matos Cid: - Sr. Presidente: - mando para a mesa uma proposta para a supressão do n.° 23.° do artigo 5.° E a seguinte:

Proponho a suppressão do n.° 23.° do artigo 5.° do projecto em discussão.

Lisboa e Sala das Sessões da Assembleia Nacional Constituinte, em 28 de julho de 1911. = O Deputado pelo circulo n.° 18, José do Valle de Matos Cid.

Foi admittida e, seguidamente, approvada.

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SESSÃO N.° 33 DE 28 DE JULHO DE 1911 17

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o n.° 24.° do artigo 5.°

Leu-se na mesa. É o seguinte:

24.° Não haverá prisão por falta de pagamento de custas ou sellos.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Não sei se este artigo tambem irá por agua abaixo. Se não for, tambem proponho uma substituição.

Concordo, absolutamente, com o principio; desejo que elle fique aqui consignado; mas o numero está mal redigido. E a má redacção d'este numero é que tem feito esta hecatombe toda.

Quer dizer, um individuo era condemnado, num processo eivei ou crime, nas custas e sellos do processo, não tinha por onde pagar, ia pagar com os ossos na cadeia. Uma lei da Republica, acabou com isto e muito bem. Felicito o Sr. Dr. Affonso Costa por essa lei. Mas, peço que isto fique bem redigido.

E uma questão de redacção que proponho, a seguinte:

Proponho que o n.° 24.° se substitua por este:

"Ninguem poderá ser preso por falta de pagamento de custas e sellos em que tenha sido condemnado. = Barbosa de Magalhães.

Foi admittida.

O Sr. Presidente: - Como não ha mais ninguem inscrito vae votar-se.

Leu-se o n.° 24.° do artigo 5.°

Foi approvado, ficando, por consequencia, rejeitada a substituição proposta pelo sr. Barbosa de Magalhães.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o n.° 25.° do artigo 5.°

Leu-se na mesa. É o seguinte:

25.° A instrucção dos feitos crimes será contraditoria, assegurando aos arguidos, antes e depois da formação da culpa, todas as garantias da defesa.

Não havendo nenhum Sr. Deputado que se inscrevesse, foi approvado sem discussão.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o n.° 26.° do artigo 5.°

Leu-se na mesa. É o seguinte:

26.° Ninguem será sentenciado senão pela autoridade competente, por virtude da lei anterior e na forma por ella prescrita.

Não havendo nenhum £r. Deputado que, se inscrevesse, foi approvado sem discussão.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o n.° 27.° do artigo 5.°

Leu-se na mesa. É o seguinte:

27.° E mantida, em toda a sua plenitude, a independencia do Poder Judicial. Nenhuma autoridade poderá avocar as causas pendentes, sustá-las ou fazer reviver os processos findos.

O Sr. Moura Pinto: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta, eliminando o numero em discussão. Essa proposta é a seguinte:

Proponho a eliminação do n.° 27.°, do artigo 5.° = O Deputado, Moura Pinto.

Foi admittida.

O Sr. Antonio Macieira: - Talvez fosse desnecessario pedir a palavra. Todavia sempre direi que me parece que este artigo deve passar para a secção 3.ª, que trata do poder judicial.

Nestes termos proponho a eliminação do artigo, isto é a suppressão d'elle no logar onde se encontra, e a sua transferencia para logar mais adequado, a secção relativa ao poder judicial.

O Sr. Julio Martins: - Limito-me a mandar para a mesa uma proposta, que é concebida nos seguintes termos:

Proponho a eliminação do n.° 21.° = Julio Martins.

Foi admittida.

O Sr. Germano Martins: - Mando tambem para a mesa uma proposta:

Proponho a eliminação do n.° 27.°, neste logar. = O Deputado, Germano Martins.

Foi admittida.

O Sr. Affonso Costa: - Pedi a palavra para dizer que me parece que este numero deve ser supprimido, a fim de os poderes ficarem em perfeita igualdade.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Não ha mais ninguem inscrito. Vae votar-se.

Foi approvada a proposta de eliminação apresentada pelo Sr. Julio Martins.

O Sr. Presidente: -Vae ler-se, para entrar em discussão, o n.° 28.° do artigo 5.°

Leu-se na mesa. É o seguinte:

23. A excepção das causas que por sua natureza deverem pertencer a juizos especiaes, não haverá foro privilegiado.

O Sr. Affonso Costa: - Esta é de Mr. de La Pallisse.

Veio da carta constitucional!

O Sr. Casimiro Rodrigues de Sá: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta de substituição

Proponho a seguinte substituição ao n.° 28.° do artigo 5.°: "São extinctos todos os juizos especiaes do crime e todos os foros privilegiados. Os accusados e delinquentes de qualquer categoria ficam sujeitos á jurisdição do poder judicial ordinario que, sem distincções, a todos julgará". - O Deputado, Casimiro Rodrigues de Sá.

Não foi admittida.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o n.° 28.° passe para o titulo IV, secção

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18 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

III, sendo esta apreciada e discutida. = O Deputaedo, Barbosa de Magalhães.

Foi admittida.

O Sr. Afibnso Costa: - Não ha na mesa nenhuma proposta de eliminação?

O Sr. Presidente: - Não senhor.

O Sr. Affonso Costa: - Então formula-o eu.

O Sr. Alexandre Braga: - O numero em discussão é tendente a affirmar a existencia de juizos especiaes.

Se elles existem, sendo a Constituição silenciosa sobre o assunto, ficarão reconhecidos.

Proponho, portanto, a eliminação do numero nos seguintes termos:

Proponho a eliminação do n.° 28.° do artigo 5.° = O Deputado, Alexandre Braga.

Foi admittida.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Não ha mais ninguem inscrito. Vae votar-se.

Os Srs. Deputados que approvam a eliminação do n.° 28.° tenham a bondade de se levantar.

Foi approvada.

Vae entrar em discussão o n.° 29.° do artigo 5.°

Leu-se na mesa. E o seguinte:

29.° Fica abolida a pena de morte.

O Sr. Alexandre Braga: - A forma como está redigido este numero dá a entender que se trata de uma innovação, quando é certo que a pena de morte foi, de ha muito, abolida para os crimes civis, e ultimamente a promulgação do Codigo de Justiça Militar aboliu-a para os militares.

Parece-me, pois, que a redacção do numero deve ser a seguinte, que consta da minha

Proposta de emenda

Proponho que o n.° 29.° do artigo 5.° seja substituido da seguinte forma:

"29.° Em nenhum caso poderá ser restabelecida a pena de morte".=O Deputado, Alexandre Braga.

Foi admittida.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Sr. Presidente: concordo com a proposta mandada para a mesa pelo Sr. Alexandre Braga, mas apresento o seguinte

Additamento

Proponho que ao n.° 29.° se acrescentem as palavras "não haverá penas corporaes perpetuas ou de duração illimitada". = O Deputado, Barbosa de Magalhães.

Foi admittida.

O Sr. Antonio Maria da Silva: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta de emenda

"29.° Em nenhum caso deve ser restabelecida a pena de morte, e em todos os casos deve ser abolida a de prisão maior cellular".

Sala das Sessões, em 27 de julho de 1911. = O Deputado, Antonio Maria da Silva.

Não foi admittida.

O Sr. Antonio Macieira: - Sr. Presidente: - pedi a palavra para declarar a V. Exa. e á Camara que acceito a redacção do numero tal como está, com o addita-mento apresentado pelo Sr. Barbosa de Magalhães. Não acceito a emenda proposta pelo Sr. Alexandre Braga, porque julgo não ficar, por ella, estabelecido o principio.

O Sr. Moura Pinto: - Sr. Presidente: - proponho que a redacção do n.° 29.° seja a seguinte:

"É mantida a abolição da pena de morte e de todas as penas perpetuas". = O Deputado, Alberto de Moura Pinto.

Não foi admittida.

O Sr. Artur Costa: - Sr. Presidente: - o que queria dizer já foi dito. Por isso dispenso-me de produzir considerações.

Nestas condições, limito-me a mandar para a mesa a seguinte:

Proposta

Acrescentar á emenda do Sr. Alexandre Braga. Não poderão ser restabelecidas penas perpetuas e corporaes ou de duração illimitada. = Artur Costa.

Foi admittida.

O Sr. Affonso Costa: - Sr. Presidente: - pedi a palavra quando o Sr. Antonio Macieira se referiu á abolição da pena de morte, e para que não ficasse na Constituição prohibido o seu restabelecimento.

Eu julgo que o estabelecer na Constituição a prohibição do restabelecimento da pena de morte é um dos mais bellos gestos que as Constituintes podem ter, sendo até um titulo de gloria.

Referir-me-hei, tambem, ás considerações feitas pelo Sr. Antonio Maria da Silva, relativamente á extincção da pena maior cellular.

Tambem concordo em que aquelle estabelecimento, tal como se encontra é mais uma fabrica de loucos do que de regeneração.

O systema cellular precisa de grandes modificações, como tambem do transformação carece a Penitenciaria.

Entendo que os reclusos, passado determinado tempo, devem ser transferidos para colonias agricolas ou para escolas industriaes.

Este problema se não fosse a minha doença já estaria realizado, porquanto neste sentido tencionava promulgar um decreto.

Agora será presente á Camara uma proposta remodelando todo o systema penitenciario, para o que conto com a collaboração do director e do sub-director da Penitenciaria de Lisboa, os Srs. Alfredo de Magalhães e João Gonçalves.

Fiz estudos acêrca da transformação d'aquelle instituto, e os esforços do Ministro da Justiça que me vier substituir certamente darão realização ao facto.

Nenhuma reclamação é mais justa do que esta.

Quanto ás penas de intimidação, não approvo que sejam abolidas, para casos determinados na lei.

Tenho dito.

S. Exa. não reviu.

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SESSÃO N.° 33 DE 28 DE JULHO DE 1911 19

O Sr. Sebastião Baracho: - Sr. Presidente: - quando versei a questão na generalidade fiz ver á Assembleia que a pena de morte já não existia em Portugal, no foro militar.

No Codigo Complementar, que tem a data de 16 de março de 1911, ficou ella abolida.

Mandei, então, uma proposta em que, absolutamente, abolia a pena de morte.

A commissão acceitou essa minha proposta, trazendo agora o parecer complementar que está em discussão, em que essa disposição tem sido redigida por varias formas até a que diz não poder ser restabelecida a pena de morte nem pena alguma corporal perpetua.

Entendo, realmente, que assim deve ser.

Apoiados do Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça, com o seu muito saber e alto criterio que possue, acabou de pôr a questão como ella devia ser posta, - e eu não tenho senão que me felicitar por isso, que ha de dar brilho e credito á Republica e ao país.

Apoiados do Sr. Ministro da Justiça. S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Não ha mais ninguem inscrito. Vae votar-se.

Leu-se na mesa o n.° 29.° do artigo 5.° Foi rejeitado.

Vae ser lido, para se votar o additamento...

O Sr. Affonso Costa: - Não se pode votar um additamento, sem se votar a substituição do numero.

Não podemos additar uma cousa ao que não existe, visto que o n.° 29 foi rejeitado.

O Sr. Presidente: - Fundo-me no artigo 124.° do Regimento.

O Sr. Affonso Costa: - A proposta do Sr. Deputado Alexandre Braga é uma emenda; deve ser votada antes.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - É uma emenda. Invoco o artigo 101.° do Regimento.

A proposta do Sr. Deputado Alexandre Braga não contem disposição contraria ao que ao n.° 29.° estabelece. (Apoiados).

É uma emenda. Tem que ser votada em primeiro logar.

O Sr. Artur Costa: - Desejava que a minha proposta fosse votada depois da do Sr. Deputado Alexandre Braga. É um additamento.

O Sr. Presidente: - Se a camara entende que a proposta do Sr. Deputado Alexandre Braga é uma emenda, não faço questão por isso; mas o Regimento define emendas as propostas que conservam o texto.

Nesta não se conserva nada o texto.

O Sr. Affonso Costa: - Voto-a, salva a redacção.

Parecia-me que se lhe poderia dar uma redacção melhor.

O que ha é mais de uma proposta com o mesmo pensamento.

Pode-se dividir em duas partes.

Essas penas já foram abolidas pela Republica; não foi precisa a Constituição para as abolir.

Foram abolidas as penas perpetuas, o que é importante para nós, porque a Republica não precisou da Constituição para abolir essas leis.

S. Exa. não reviu.

Lida na mesa a proposta do Sr. Deputado Alexandre Braga foi approvada.

Foram lidas na mesa as propostas de additamento dos Srs. Deputados Barbosa de Magalhães e Artur Costa, sendo a primeira rejeitada e a segunda approvada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o n.° 30.° do artigo 5.°

Leu-se na mesa. E o seguinte:

30.° Nenhuma pena passará da pessoa do delinquente. Portanto, não haverá em caso algum confiscação de bens, nem a infamia do réu se transmittirá aos parentes, em qualquer grau que seja.

Foi approvado sem discussão.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se para entrar em discussão o n.° 31.° do artigo 5.° Leu-se na mesa. E o seguinte:

31.° Os processos criminaes findos poderão ser revistos, em qualquer tempo, em beneficio dos condemnados, e, segundo o caso, pelo Supremo Tribunal de Justiça ou pelo Supremo Tribunal Militar, para reformar ou confirmar a sentença.

§ 1.° Uma lei especial determinará os casos e a forma da revisão, que poderá ser requerida pelo condemnado, por qualquer do povo, ou, ex-officio, pelo Procurador Geral da Republica e pelo competente magistrado do Ministerio Publico, junto do Supremo Tribunal Militar.

§ 2.° Na revisão não podem ser aggravadas as penas da sentença revista.

O Sr. Alexandre Braga: - Sr. Presidente: - concordo absolutamente com o n.° 31.° e seus paragraphos; mas entendo não ser este o logar proprio para inserir essas disposições. Por isso apresento a seguinte

Proposta

Proponho que o n.° 31.° e seus paragraphos do artigo 5.° seja substituido pelo seguinte:

"É assegurado exclusivamente em beneficio do condem nado o direito de revisão de todas as sentenças condemnatorias.

§ unico. Leis especiaes determinarão os casos e forma de revisão". = O Deputado, Alexandre Braga.

Na minha proposta, incluem-se todas as garantias favoraveis ao accusado, como estão comprehendidas no n.° 31.° e seus paragraphos, pois diz-se que a revisão só pode ser feita exclusivamente em beneficio do condemnado. Fica, assim, estabelecida a impossibilidade das penas serem aggravadas por meio da revisão.

Quanto aos casos e forma de revisão, entendo melhor não inseri-los na Constituição, visto não ser esse o logar proprio. Devem deixar-se para uma lei especial os casos e a forma em que a revisão pode ser feita.

S. Exa. não reviu.

Leu-se na mesa a emenda do Sr. Alexandre Braga, sendo admittida.

O Sr. Antonio Macieira: - Sr. Presidente: - pedia palavra para mandar para a mesa um projecto de emenda que consiste no seguinte:

Proponho que o n.° 31.° do artigo 5.° e seu § 1.° sejam substituidos pelo seguinte:

"N.° 31.° É admittida a revisão dos processos criminaes findos, nos termos da lei".

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20 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Visto declarar-se que é admittida a revisão, eu proponho que o § 2.° passe para 1.° e se acrescente o seguinte a este ultimo:

"§ 2.° Todo o cidadão tem direito de ser indemnizado pela parte accusadora, e, não a havendo, pelo Estado, quando em processo de revisão se provar que foi condemnado injustamente, sendo o quantitativo de indemnização fixado pelo tribunal de revisão".

O n.° 47.° do artigo 5.° estabelece o seguinte: Todo o cidadão, tem o direito de ser indemnizado pelo Estado todas" as vezes que haja sido preso ou processado criminalmente e venha a provar-se a sua innocencia completa.

Este numero, que eu agora não posso discutir, e ao qual apenas me referirei para provar a necessidade da minha substituição, estabelece um principio muitissimo perigoso, por isso que diz: "quando venha a provar-se a sua innocencia completa". Não sei o que seja a chamada innocencia completa e como ella rigorosamente se pode apurar. Este numero deve ser eliminado. Estou certo de que a Camara o porá de parte.

Todavia, o que se não comprehende é que aquelle que tenha sido condemnado injustamente não possa ter uma indemnização, em primeiro logar pela parte accusadora, visto que foi ella que lhe moveu o processo criminal, e em segundo logar pelo Estado, caso não haja parte accusadora. Não se comprehende que um desgraçado que esteve injustamente preso na Penitenciaria ou em qualquer outra cadeia, que vem cá para fora com a saude perdida e um tanto desqualificado, porque difficilmente se rehabilita aos olhos do publico aquelle que já soffreu a pena, e que saia nestas circunstancias, não tendo, ao menos, uma indemnização do sacrificio e da injustiça de que foi victima. Eu entendo que neste numero em que se trata do principio da revisão, que deve ser feita nos termos da lei, se deve estabelecer o principio justo, humano, moral, inteiramente moral de que, provado em processo de revisão, que foi injustamente accusado, tem direito a uma indemnização, a qual deve ser paga pela parte accusadora, se a houver, e caso a não haja, pelo Estado.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - A minha proposta é uma proposta intermedia entre o numero do projecto e a proposta do Sr. Alexandre Braga. No projecto contem-se materia de processo, ao passo que a proposta do Sr. Alexandre Braga é reduzida de mais, e não consigna todos os direitos que devem ser expressos na Constituição.

A minha proposta é a seguinte:

Proponho que o n.° 31.° seja assim redigido:

"Os processos criminaes findos poderão ser revistos em qualquer tempo, em beneficio dos condemnados e a requerimento d'estes, ou de qualquer do povo, ou do respectivo magistrado do Ministerio Publico, não podendo na revisão ser aggravadas as penas da sentença revista".

Eliminando-se consequentemente os paragraphos d'esse artigo. = O Deputado, Barbosa de Magalhães.

Quanto á proposta do Sr. Macieira, julgo-a descabida aqui, visto que o direito de indemnização, a ter de se consignar, e eu entendo que sim. não deve só ser consignado no caso da revisão, mas sempre que haja accusação injusta. Esse direito, porem, deve ser discutido com toda a amplitude a proposito do n.° 47.° e não nesta altura.

S. Exa. não reviu.

Lida na mesa a proposta do Sr. Antonio Macieira, não foi admittida.

O Sr. Antonio Macieira: - Peço a contra-prova.

Procedeu-se á contra-prova. A proposta foi admittida.

Lida na mesa a proposta do Sr. Barbosa de Magalhães, foi admittida.

O Sr. Sebastião Baracho: - Pedi a palavra porque a materia que diz respeito a este numero foi, tambem, por mim versada quando discuti o projecto na generalidade, e apresentei uma emenda que a commissão acceitou.

Agora essa emenda tem experimentado varias transformações ; mas antes de manifestar qual d'essas transformações prefiro, V. Exa. faz-me a fineza de mandar ler a proposta do Sr. Alexandre Braga.

Leu-se na mesa.

O Orador: - Estou, perfeitamente, de acordo com a emenda do Sr. Alexandre Braga; mas, sou tambem de parecer que o additamento proposto para que as penas não sejam aggravadas, como consta do paragrapho d'este numero, deve ser igualmente tomado em consideração.

Quis exprimir o meu parecer, visto ter versado a questão na generalidade.

Desejaria que ficasse bem accentuado que a revisão não é só para o foro civil: é tambem para o militar. E desejo que não sejam aggravadas as penas.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Alexandre Braga: - Pedi a palavra para responder ás considerações feitas pelo Sr. Barbosa de Magalhães.

A minha proposta inclue tudo quanto no projecto diz respeito á affirmação de principios que nós queremos aqui consignar, isto é, ao direito de revisão de sentença condemnatoria em beneficio do accusado.

Eu entendo que a redacção a dar ás disposições constitucionaes deve ser a mais resumida possivel, evitando sempre toda a expressão pleonastica e todas as redundancias.

Desde o momento em que se affirma que a revisão do processo só pode fazer se em beneficio do condemnado, implicitamente, se affirma que não pode nunca ser aggravada a pena que, de tal modo, nunca seria allivio mas, ao contrario, prejuizo para elle.

Acho, portanto, desnecessario estarmos a repetir as mesmas ideias por palavras diversas.

Quanto á necessidade de precisar as entidades que tenham legitimidade para fazer a revisão, isso cabe ao processo; não é materia para ficar consignada, como principio, na Constituição.

O principio é que ha revisão; o processo determinará quaes as pessoas legitimas para fazerem essa revisão.

Creio ter demonstrado que é dispensavel incluir no projecto a determinação das pessoas consideradas legitimas para requerer a revisão.

As leis especiaes o devem determinar, estabelecendo a forma d'essa revisão.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Entendo que é uma garantia individual ficar consignado na Constituição quaes as pessoas que podem requerer a revisão; isso, a meu ver, não é materia do processo.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Affonso Costa: - Sr. Presidente: - pedi a palavra a V. Exa. principalmente por causa das considerações que produziu o Sr. Antonio Macieira.

S. Exa., referindo-se ao n.° 47.°, propôs que a indemnização ao accusado se dê, tanto no caso de revisão ser feita pelas autoridades como a requerimento do reu.

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SESSÃO N.° 33 DE 28 DE JULHO DE 1911 21

No decreto de 18 de novembro de 1910, o Governo Provisorio estabeleceu o preceito da indemnização ás victimas da justiça, como é da moderna orientação juridica.

Quando o accusado estiver na cadeia vinte, trinta ou sessenta dias, e se provar por accordão que esteve injustamente preso, a victima tem direito a indemnização.

Não podia deixar de estabelecer-se este principio em materia criminal no nosso país, quando é essa a tendencia de outras nações, como a America do Norte, a França, etc.

A Republica deve dar, a todo o que for condemnado injustamente uma indemnização.

Mas, se o individuo condemnado injustamente deve merecer a sympathia do legislador, pelo facto de haver revisão não pode essa indemnização ser mais forte.

O Sr. Antonio Macieira propunha que a indemnização ao accusado fosse, em caso de revisão, dada pela parte accusadora quando a houvesse e no caso contrario pelo Estado, mas que a indemnização fosse superior nos processos de revisão á dos outros processos. Estou certo que a Assembleia não acompanhará S. Exa. neste desejo.

Não concordo com a doutrina apresentada pelo Sr. Antonio Macieira.

O principio da indemnização ao accusado é legitimo.

Deve-se dar a todos os accusados injustamente o direito de serem indemnizados.

O adjectivo completa é desnecessario. Certamente que só no caso do accusado ter sido injustamente condemnado, é que recebe indemnização.

Entendo que a proposta do Sr. Alexandre Braga satisfaz a aspiração da Assembleia. Quando se fizer a lei especial da revisão, então se indicarão as entidades que podem requerer a revisão.

Estou de accordo em que o principio da revisão fique como materia constitucional, e que sirva de beneficio ao accusado, não sendo em caso nenhum aggravada a pena.

A revisão deve ser feita de forma que os bens vão para a mulher, para os filhos, para os parentes mais próximos de maneira que fique na familia.

O que é preciso é regulamentar a lei. A lei de revisão tem de ser regulamentada.

Estamos de acordo, todos, como disse, em que a revisão constituo materia constitucional.

Sr. Presidente: - não posso deixar de exprimir a minha satisfação por ver como até, os meus collegas, que não são jurisconsultos, seguem e acompanham com interesse estas questões de jurisprudencia.

É bonito ver discutir com tanto cuidado, com tanto zelo. Isto realmente prova que todos desejam fazer uma Constituição digna da Republica. E consolador tal facto.

O tempo que se tem levado a discutir os direitos individuaes, pode-se dizer que frutificará: cada minuto gasto nesta discussão representa annos e annos de prosperidade e de paz para a nossa Republica.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Artur Costa.

O Sr. Artur Costa: - Desisto da palavra.

O Sr. Presidente: - Não está mais ninguem inscrito. Vae votar-se.

Foi posta á votação a proposta de emenda do Sr. Alexandre Braga, sendo approvada.

O Sr. Presidente: - A proxima sessão é na segunda-feira, 31 do corrente, á hora regimental, sendo a ordem dos trabalhos:

Antes da ordem do dia:

Discussão sobre a crise que afflige o operariado de construcção da região das pedreiras de Cintra.

Interpellação do Sr. Egas Moniz ao Sr. Ministro da Marinha.

Idem do Sr. Manuel José da Silva ao Sr. Ministro do Interior.

Idem do Sr. Sá Pereira ao Sr. Ministro da Marinha.

Na ordem do dia continua a discussão, na especialidade, do projecto de lei n.° 3.° (Constituição).

Está encerrada a sessão.

Eram 6 horas e quarenta e cinco minutos da tarde.

Documentos mandados para a mesa nesta sessão

Representações

1.ª Da Commissão promotora do Comicio de Almada protestando contra a carestia do azeite, e pedindo immediatas medidas para o barateamento d'este genero.

Foi enviada á commissão de agricultura.

2.ª Da Camara Municipal do Concelho de Oeiras, pedindo que seja regulamentado o jogo no nosso país ou pelo menos nas estancias balneares e de campo.

Foi enviado á commissão de legislação.

3.ª Da Commissão Republicana Administrativa do municipio de Cintra, pedindo a regulamentação do jogo, nas praias, estações thermaes e de verão, incluindo nesse numero as villas de Cintra, Collares e Bellas, e as povoações de Queluz e Praia das Maçãs.

Foi enviada a commissão de legislação.

O REDACTOR = Mello Barreto.

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