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REPUBLICA PORTUGUESA

DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

47.ª SESSÃO

(NOCTURNA)

EM 14 DE AGOSTO DE 1911

SUMMARIO. - Aberta a sessão procede-se á chamada. - Leitura da acta que é approvada. - Prosegue a discussão, na especialidade, do projecto de lei n.° 3 (Constituição). Usam da palavra os Srs. Bernardino Roque, João de Menezes, Jacinto Nunes, Ministro da Justiça (Affonso Costa), Alfredo de Magalhães, Germano Martins, Moura Pinto, Egas Moniz, João de Freitas, Barbosa de Magalhães, Celestino de Almeida, Alexandre de Barros, Estevam de Vasconcellos, José Barbosa, Peres Rodrigues, Goulart de Medeiros, Ministro das Finanças (José Relvas) e Eduardo de Almeida, votando-se os artigos 40.°, 41.°, 42.° e 43.°, ficando suspensa a discussão do parte do artigo 44.° para a sessão seguinte. -Varios Srs. Deputados mandam para a mesa declarações de voto.

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2 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Presidencia do Exmo. Sr. Anselmo Braamcamp Freire

Secretarios os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Henriques do Prado Castro e Lemos

Abertura da sessão. - Ás 9 horas e 35 minutos da noite.

Presentes - 162 Srs. Deputados.

São os seguintes Srs.: - Abilio Baeta das Neves Bar reto, Achilles Gonçalves Fernandes, Adriano Augusto Pimenta, Adriano Gomes Ferreira Pimenta, Adriano Mendes de Vasconcellos, Affonso Augusto da Costa Affonso Ferreira, Affonso Henriques do Prado Castro Lemos, Albano Coutinho, Alberto de Moura Pinto, Albino Pimenta de Aguiar, Alexandre Augusto de Barros, Alfredo Botelho de Sousa, Alfredo Djalme Martins de Azevedo, Alfredo José Durão, Alfredo Maria Ladeira Alfredo Rodrigues Gaspar, Alvaro Poppe, Alvaro Xavier de Castro, Amaro de Azevedo Gomes, Americo Olavo d'Azevedo, Amilcar da Silva Ramada Curto, Angelo Vaz Anibal de Sousa Dias, Anselmo Braamcamp Freire, An tonio Albino Carvalho Mourão, Antonio Amorim de Carvalho, Antonio Aresta Branco, Antonio Barroso Pereir Victorino, Antonio Bernardino Roque, Antonio Brandão de Vasconcellos, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Caetano Celorico Gil, Antonio Caetano Macieira Junior, Antonio Candido de Almeida Leitão Antonio Joaquim de Sousa Junior, Antonio José Lourinho, Antonio Ladislau Parreira, Antonio Ladislau Piçarra, Antonio Maria da Cunha Marques da Costa, Antonio Maria da Silva, Antonio Maria da Silva Barreto Antonio Padua Correia, Antonio de Paiva Gomes, Antonio Pires de Carvalho, Antonio Pires Pereira Junior, Antonio Ribeiro Seixas, Antonio dos Santos Pousada, Antonio Xavier Correia Barreto, Antonio Valente de Almeida, Artur Augusto da Costa, Artur Rovisco Garcia, Augusto Almeida Monjardino, Augusto José Vieira, Aureliano de Mira Fernandes, Baltasar de Almeida Teixeira, Bernardo Paes de Almeida, Carlos Amaro de Miranda e Silva, Carlos Henrique da Silva Maia Pinto, Carlos Olavo Correia de Azevedo, Carlos Richter, Casiiniro Rodrigues de Sá, Celestino Germano Paes de Almeida, Christovam Moniz, Domingos Leite Pereira, Domingos Tasso de Figueiredo, Eduardo de Almeida, Eduardo Pinto de Queiroz Montenegro, Elisio Pinto de Almeida e Castro, Evaristo Luis das Neves Ferreira de Carvalho, Ezequiel de Campos, Faustino da Fonseca, Fernando Baeta Bissaia Barreto Rosa, Francisco Correia de Lemos, Francisco Cruz, Francisco Eusebio Lourenço Leão, Francisco José Pereira, Francisco Luis Tavares, Francisco de Salles Ramos da Costa, Francisco Teixeira de Queiroz, Francisco Xavier Esteves, Gaudencio Pires de Campos, Germano Lopes Martins, Guilherme Nunes Godinho, Helder Armando dos Santos Ribeiro, Henrique José Caldeira Queiroz, Henrique de Sousa Monteiro, Innocencio Camacho Rodrigues, João Barreira, João Carlos Rodrigues de Azevedo, João Duarte de Menezes, João Fiel Stockler, João José de Freitas, João José Luis Damas, João Luis Ricardo, João Machado Ferreira Brandão, João Pereira Bastos, Joaquim Antonio de Mello Castro Ribeiro, Joaquim José Cerqueira da Rocha, Joaquim José de Oliveira, Joaquim José de Sousa Fernandes, Joaquim Ribeiro de Carvalho, Jorge Frederico Vellez Caroço, Jorge de Vasconcellos Nunes, José Affonso Palla, José Alfredo Mendes de Magalhães, José Antonio Arantes Pedroso Junior, José Barbosa, José de Barros Mendes de Abreu, José Bernardo Lopes da Silva, José Bessa de Carvalho, José Botelho de Carvalho Araujo, José Carlos da Maia, José de Castro, José de Cupertino Ribeiro Junior, José Estevam de Vasconcellos, José Francisco Coelho, José Jacinto Nunes, José Luis dos Santos Moita, José Maria Cardoso, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Padua, José Maria Pereira, José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães, José Miranda do Valle, José Nunes da Mata, José Pereira da Costa Basto, José Relvas, José da Silva Ramos, José Thomás da Fonseca, José Tristão Paes de Figueiredo, Julio do Patrocinio Martins, Luis Maria Rosette, Manuel Alegre, Manuel de Arriaga, Manuel de Brito Camacho, Manuel Goulart de Medeiros, Manuel Jorge Forbes de Bessa, Manuel José Fernandes Costa, Manuel José de Oliveira, Manuel Martins Cardoso, Manuel Pires Vaz Bravo Junior, Manuel Rodrigues da Silva, Manuel de SOUSA da Camara, Mariano Martins, Miguel Augusto Alves Ferreira, Narciso Alves da Cunha, Pedro Alfredo de Moraes Rosa, Pedro Amaral Botto Machado, Pedro Januario do Valle Sá Pereira, Philemon da Silveira Duarte de Almeida, Porfirio Coelho da Fonseca Magalhães, Ricardo Paes Gomes, Sebastião Peres Rodrigues, Severiano José da Silva, Sidonio Bernardino Cardoso da Silva Paes, Thomás Antonio da Guarda Cabreira, Thomé José de barros Queiroz, Tiago Moreira Salles, Tito Augusto de Moraes, Victorino Henriques Godinho e Victorino Maximo de Carvalho Guimarães.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Abel Accacio de Almeida Botelho, Alberto Carlos da Silveira, Anselmo Augusto da Costa Xavier, Antonio França Borges, Antonio Joaquim Ferreira da Fonseca, Antonio José de Almeida, Carlos Antonio Calixto, Emidio Guilherme Garcia Mendes e Gastão Rafael Rodrigues.

Não compareceram á sessão os Srs.: - Alberto Souto, Alexandre Braga, Alexandre José Botelho de Vasconcellos e Sá, Alfredo Balduino de Seabra Junior, Alvaro Nunes Ribeiro, Angelo Rodrigues da Fonseca, Antão Fernandes de Carvalho, Antonio Affonso Garcia da Costa, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio Augusto Cerqueira Coimbra, Antonio Florido da Cunha Toscano, Antonio Joaquim Granjo, Antonio Maria de Azevedo Machado Santos, Antonio da Silva e Cunha, Artur Augusto Duarte da Luz Almeida, Bernardino Luis Machado Guimarães, Carlos Maria Pereira, Eduardo Abreu, Ernesto Carneiro Franco, Fernando da Cunha Macedo, Fernão Botto Machado, Francisco Antonio Ochôa, Francisco Manuel Pereira Coelho, Henrique José dos Santos Cardoso, Inacio Magalhães Basto, João Carlos Nunes da Palma, JoSo Gonçalves, Joaquim Brandão, Joaquim Pedro Martins, Joaquim Theophilo Braga, José Augusto Simas Machado, José Cordeiro Junior, José Dias da Silva, José Machado de Serpa, José Mendes Cabeçadas Junior, José Montez, José Perdigão, José do Valle Matos Cid, Leão Magno Azedo, Luis Augusto Pinto de Mesquita Carvalho, Luis Fortunato da Fonseca, Luis innocencio Ramos Pereira, Manuel José da Silva, Miguel de Abreu, Ramiro Guedes, Rodrigo Fernandes Fontinha, Sebastião de Magalhães Lima, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Victor Hugo de Azevedo Coutinho e Victor José de Deus Macedo Pinto.

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SESSÃO N.° 47 DE 14 DE AGOSTO DE 1911 3

O Governo estava representado peles Srs. Ministros da Justiça, Guerra e Marinha.

O Sr. Presidente: - Vae proceder-se á chamada.

Procede-se á chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 102 Srs. Deputados. Está aberta a sessão.

Vae ler-se a acta da sessão diurna.

É lida a acta.

O Sr. Presidente: - Está em discussão. Se ninguem pede a palavra, considera-se approvada.

Foi approvada.

O Sr. Presidente: - Não ha expediente. Vae entrar-se na ordem da noite - continuação da discussão, na especialidade, do projecto da Constituição.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 40.°

Lê-se na mesa.

É o seguinte:

"Art. 40.° Todos os actos do Presidente da Republica deverão ser referendados, pelo menos, pelo Ministro competente. Os actos do Presidente da Republica não referendados, pelo menos, pelo competente Ministro, são mulos em pleno direito, não poderão ter execução e ninguem lhes deverá obediencia".

O Sr. Presidente: - Está em discussão. Tem a palavra o Sr. Bernardino Roque.

O Sr. Bernardino Roque: - Sr. Presidente: as redundancias são sempre desnecessarias, e, tanto mais, quando se trata de uma Constituição.

Aqui ha, a meu ver, uma redundancia que é inteiramente desnecessaria. Por isso mando para a mesa a seguinte

Emenda

Proponho que onde se diz no segundo periodo aos actos do Presidente da Republica não referendados pelo menos pelo Ministro" seja substituido por "não o sendo" ou por "se o não forem".

Lisboa, 14 de agosto de 1911. = O Deputado, A. Bernardino Roque.

O Sr. João de Menezes: - Isso é apenas uma questão de redacção.

O Orador: - Apresento, portanto, uma proposta de substituição que define melhor a redacção do segundo periodo, a qual mando para a mesa.

Lida na mesa, e consultada a Assembleia foi admittida a substituição do Sr. Bernardino Roque.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais ninguem inscrito vae votar-se.

Vae ler-se a proposta do Sr. Deputado Bernardino Roque.

Lê-se na mesa.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que a approvam tenham a bondade de se levantar.

Foi approvada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 40.°, sem prejuizo, claro, da substituição já approvada.

Lido na mesa e consultada a Assembleia, foi approvado.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 41.°

Lê-se na mesa.

É o seguinte:

"Art. 41.° Os Ministros não podem accumular o exercicio de outro emprego ou funcção publica, nem ser eleitos para a Presidencia da Republica, ou para o Congresso.

§ 1.° O membro do Congresso que acceitar o cargo de Ministro perderá o mandato.

§ 2.° Applicam-se aos Ministros as prohibições e outras disposições enumeradas no artigo 18.° e seu paragrapho."

Varios Srs. Deputados pedem a palavra.

O Sr. Presidente: - Tenho inscrito os Srs. João de Menezes, por parte da commissão, Caldeira Queiroz e João de Freitas.

Tem a palavra o Sr. João de Menezes.

O Sr. João de Menezes: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte proposta de substituição do artigo 41.° e seu § 1.°

Leu.

Proposta de substituição

Art. 41.° Os Ministros não poderão accumular o exercicio de outro emprego ou funcção publica, nem ser eleitos para a Presidencia da Republica se não tiverem deixado de exercer o seu cargo dentro dos seis meses anteriores a esta eleição.

§ 1.° Os membros do Congresso que acceitarem o cargo de Ministro não perderão o mandato de Deputado ou Senador.

§ 2.° Conserva-se o que está no texto. = João de Menezes

A primeira parte da emenda contem-se, precisamente, como V. Exa. sabe, na exposição que eu fiz dentro da minha moção approvada já por esta Assembleia. A segunda parte, que se refere ao § 1.° tenho a explicar o seguinte: desde o momento em que se definiu a orientação de que a Republica é parlamentar, evidentemente que não é permittida a accumulação das funcções de Ministro com as de Deputado.

Quanto ao § 2.° está claro que se mantem.

Vozes: - Votos, votos!

Lida na mesa, e consultada a Assembleia, foi admitida a proposta de substituição do Sr. João de Menezes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. João de Freitas.

O Sr. João de Freitas: - Sr. Presidente: havia pedido a palavra para propor a eliminação do paragrapho 1.°; como, porem, a minha proposta está contida na apresentada pelo Sr. deputado João de Menezes, desisto da palavra.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Alvaro Poppe.

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36 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

O Sr. Alvaro Poppe: - Sr. Presidente: tencionava, tambem apresentar uma proposta de emenda ao § 1.° do artigo 41.°. Estou, porem, plenamente de acordo com a emenda apresentada pelo Sr. João de Menezes, e, por isso desisto igualmente da palavra.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Jacinto Nunes.

O Sr. Jacintho Nunes: - Sr. Presidente: seja qual for a opinião da Assembleia, a minha é esta : o Ministro não pode accumular as suas funcções com as de Deputado. Julgo essas funcções absolutamente iucompativeis, porque não pode ser juiz e parte ao mesmo tempo!

Alem de que, seria isso é a confusão de poderes: poder legislativo e poder executivo, o que não se entendia.

O Sr. Germano Martins (interrompendo): - E V. Exa. não é Presidente e vereador ao mesmo tempo!?.

O Orador: - Isso não é argumento! Ahi não ha confusão de poderes!

Em todo o caso a minha opinião fica, e faço a minha declaração de voto.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Não ha mais ninguem inscrito.

Como está sobre a mesa uma substituição, se a Assembleia autoriza, ponho primeiramente á votação essa substituição.

Assim, se resolveu.

Lê-se, em seguida, na mesa a substituição do Sr. João de Menezes e consultada a Assembleia foi approvada, ficando prejudicado o artigo.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 42.°.

Lê-se na mesa. É o seguinte:

Art. 42.° Cada Ministro é responsavel politica, civil e criminalmente pelos actos que legalizar ou praticar.

Os Ministros serão julgados, nos crimes de responsabilidade, pela autoridade competente para q julgamento do Presidente da Republica.

O Sr. Presidente: - Está em discussão. Tem a palavra o sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (Affonso Costa): - Sr. Presidente: desde 14 de outubro de 1910, isto é, nove dias após a proclamação da Republica, que não ha tribunaes especiaes para nenhuma cathegoria de individuos dentro do territorio da Republica.

Estamos nós, os Ministros, sujeitos aos tribunaes ordinarios como qualquer outro cidadão, seja qual for a posição que occupe.

O que é preciso é que o poder judicial, seja um poder judicial verdadeiro, para que, perante os tribunaes de primeira ou segunda instancia, o terreno seja igual e honroso para todo o innocente, e deprimente para todo o culpado.

Mando, por isso, para a mesa uma emenda, que é a seguinte:

Leu.

Emenda

Proponho que na 2.ª alinea as palavras "pela autoridade competente, etc." sejam substituidas pelas seguintes : "pelos tribunaes ordinarios". = O Deputado, Affonso Costa.

Tenho dito. (Apoiados).

O orador não reviu.

Lida na mesa a proposta da emenda do Sr. Ministro da Justiça, e consultada a Assembleia, foi admittida.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Alfredo de Magalhães.

O Sr. Alfredo de Magalhães: - Sr. Presidente: perfilho inteiramente a doutrina do Sr. Ministro da Justiça, e desisto, portanto, da palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Germano Martins.

O Sr. Germano Martins: - Eu não perfilho, Sr. Presidente, a doutrina do Sr. Ministro da Justiça. Já disse aqui, na sessão d'esta manha, que não posso de modo algum acceitar que os Ministros sejam pela mesma maneira pronunciados como qualquer outro cidadão. Estava assim encontrado o meio de poder affastar-se os Ministros do exercicio das suas funcções.

Manifestei esta minha opinião esta manhã, e sustento-a exactamente agora.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Moura Pinto.

O Sr. Moura Pinto: - Sr. Presidente: eu entendo que a doutrina do Sr. Dr. Affonso Costa é a grande doutrina; é a doutrina ideal. Effectivamente, Sr. Presidente, os Ministros são simples cidadãos, e como taes deveriam ser julgados pelos tribunaes ordinarios. (Apoiados).

Mas não é menos verdade tambem que os Ministros no nosso país, por mais que façam mudar a face das cousas, hão de ter sempre, como Ministros, caracteristicas especiaes, e os crimes, mesmo, teem tambem caracteristicas especiaes, e são, na sua maior parte, crimes de natureza politica. Ora, um Ministro que é preso pelo poder judicial fica inhibido de exercer as suas funcções, e se no dia seguinte se reconhecer que está em condições de voltar a occupar o seu logar, resulta d'isto uma verdadeira trapalhada que o povo não pode ver com bons olhos.

No meu entender os Ministros não podem ir até onde vão os criminosos vulgares, porque só esse simples facto seria o bastante para os desprestigiar. (Apoiados).

Eu não quero a protecção dos Ministros, mas entendo que elles teem a sua dignidade propria.

Acho muito mais simples que, sendo o poder legislativo o depositario da confiança da Nação, seja esse poder quem aprecie os actos do poder executivo.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Egas Moniz.

O Sr. Egas Moniz: - Sr. Presidente: quando se tratou da generalidade, defendi a ideia de acabar com todos os tribunaes de excepção, no que estava de acordo com os meus principios, aliás concretizados ha pouco na emenda do Sr. Affonso Costa. Mas o que quero agora, se acaso se determinar que os Ministros sejam julgados pelos tribunaes ordinarios, e que o mesmo succeda ao Presidente da Republica, sem o que não havia harmonia nem concordancia. (Muitos apoiados).

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. João de Freitas.

O Sr. João de Freitas: - Sr. Presidente: a approvação da emenda do Sr. Affonso Costa implica logicamente a condemnação do Alto Tribunal da Republica, es-

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tabelecido no artigo 54.°, instituição que eu considero dever ser mantida na Constituição, (não apoiados) porque, tratando-se de crimes praticados pelos Ministros ou pelo Presidente da Republica, não são os tribunaes communs ou mais competentes para julgar nesses casos. (Não apoiados).

Por isso mesmo artigo 54.° institue o Alto Tribunal da Republica. Não é, com certeza, um jury formado, como os que se formam nos tribunaes communs, o mais competente para julgar, em materia de facto, dos delictos praticados pelos Ministros, porque isso demanda de conhecimentos especiaes e só os Deputados ou Senadores podem conhecer. (Não apoiados).

Portanto, eu entendo que deve ser mantida a instituição do Alto Tribunal da Republica para conhecer dos delictos praticados pelos Ministros e pelo Presidente da Republica, no exercicio dos seus cargos. Deve, pois, ser rejeitada a emenda do Sr. Affonso Costa, porque esta conduz, não só á condemnação do Alto Tribunal da Republica, mas á unica consequencia verdadeira - a completa irresponsabilidade ministerial. (Não apoiados).

Ora contra essa irresponsabilidade nos insurgimos nós no tempo da monarchia.

O orador não reviu.

O Sr. Affonso Gosta: - Eu nunca suppus que a apresentação da minha simples emenda pudesse suscitar discussão.

Entendo, Sr. Presidente, que um Ministro é um cidadão como outro qualquer, e que pode praticar actos que tenham de ser julgados pelo poder judicial.

Eu chego a ter pena de ver apresentar medidas é fazer considerações democratas como os Srs. Moura Pinto e João de Freitas. Não só as medidas reaccionarias d'este Sr. Deputado...

O Sr. João de Freitas: - V. Exa. chama-lhes reaccionarias?

O Orador: - Como o veto, por exemplo.

V. Exa. apresenta medidas que eu acho perigosas. É ao poder judicial que os Ministros devem ser entregues. Quem é que ha de defender a lei constitucional, quem é que ha de defender a propria lei ordinaria senão o poder judicial? Se não for assim nós não fazemos uma Republica.

Então os Ministros não podem praticar um crime de qualquer natureza, ou seja com os dinheiros publicos, ou seja uma offensa ao direito da Constituição? Podem perfeitamente ser chamados aos tribunaes communs, e não precisar de tribunaes especiaes para os julgarem. (Apoiados).

Nós desde 14 de outubro que não temos um tribunal de excepção. E essa garantia é a do povo, de todo o cidadão. E perante os tribunaes que nós todos nos sentimos dignificados pela perfeita igualdade ante a justiça unica. (Muitos apoiados).

Nós não precisamos senão dos tribunaes communs, da lei commum igual para todos. Desde 14 de outubro ainda ninguem chamou nenhum dos Ministros aos tribunaes, mas se houvesse algum monarchico, algum homem atrabiliario que chamasse qualquer de nós aos tribunaes, tinha que ver que nenhum dos Ministros da Republica se sentia mal dentro dos tribunaes communs, porque só os criminosos podem sentir-se affrontados.

O Sr. João de Freitas: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Não podemos fazer diálogos. Quando os tribunaes portugueses começarem a declarar nas suas sentenças que a lei de tal não se pode cumprir, que ataca a Constituição, então teremos occasião de fazer a applicação d'esse preceito.

O Sr. Ministro das Finanças fez a proposta da criação do Conselho Superior da Administração Financeira do Estado, e pensou em dar-lhe a maior autonomia para lhe dar as maiores responsabilidades. A responsabilidade d'esses homens entregou a aos tribunaes ordinarios. Ficou isso escrito na carta organica do Conselho.

Demos esse exemplo, dando força ao poder judicial. (Muitos apoiados).

Podemos assim avaliar do progresso da Republica pelo seu acto de julgar sem olhar a pessoas e não ver senão actos delictuosos.

Porque o que se torna necessario é não confundir o que é caracteristicamente delictuoso.

O que se pergunta é se o acto delictuoso do Ministro tem uma natureza diversa de um acto delictuoso de um cidadão vulgar d'este país.

Porque é que o acto praticado pelo Ministro ha de differir do acto de qualquer outro cidadão?

E porque é que instituindo-se a divisão dos poderes, como meio de responsabilizar todos os delinquentes, se hesita em dar o primeiro reconhecimento de força ao poder judicial?

Pois então ha de instituir-se um alto tribunal, saido da politica, saido das Camaras, e que não tem, evidentemente, mais autonomia e energia para lançar um voto de censura, nem mais respeito pela lei, que tem o poder judicial independente?!

Se se quer fazer uma Republica democratica, uma Republica do povo, porque foi elle quem a fez, colloquem-se todos os poderes no mesmo pé de igualdade. (Muitos apoiados).

Sr. Presidente, defender a igualdade perante a lei só pode fazê-lo o poder judicial, o qual tem de ser organizado como um poder forte, inabalavel. Se assim não se fizer tambem não se faz a Republica.

No caso presente não se trata só das responsabilidades politicas; trata-se do delicto, do crime, como, por exemplo, o desvio dos dinheiros publicos, a offensa á Constituição, e tambem os proprios delictos communs, pois não se me afigura que o Ministro possa ser sagrado e inviolavel, incapaz de praticar crimes. (Apoiados).

Quer-se a igualdade para se entregar um Ministro ao poder judicial, como qualquer outro cidadão. Essa igualdade é a garantia, a defesa do povo, porque perante os tribunaes todos são dignificados.

Dê-se ao poder judicial, por assim dizer, a guarda da Constituição e da Republica. É do poder judicial que todos devem fiar a tranquillidade do país; é d'elle que se deve fiar o progresso e a manutenção da Republica, pela sua independencia e pela indeclinavel obrigação que tem de não ver deante de si senão actos delictuosos.

Supponho eu, Sr. Presidente, que d'esta Constituição sairá, na verdade uma formula bem fortemente democratica entregando os delictos dos Ministros aos tribunaes communs. (Apoiados).

Pelo que diz respeito ao Presidente da Republica não prejudiquemos votações, e votemos, como quer o Sr. Egas Moniz, separadamente.

Ao menos deixemos para os Ministros essa formula democratica igualitaria dos tribunaes communs.

Façamos desde já essa obra democratica. E uma conquista que não se perderá em relação aos Ministros.

A unica garantia dos criminosos é esse jury que o Sr. João de Freitas disse que tinha incapacidade e ignorancia.

O Sr. João de Freitas: - Não falei em ignorancia.

O Orador: - Durante toda a evolução da propaganda

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do desenvolvimento dos principios republicanos só se encontram sustentaculo para a verdadeira justiça, no jury.

Apoiados.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Te, a palavra o Sr. Barbosa de Magalhães.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Sr. Presidente, meia duzia de palavras apenas, porque me parece que a camara lucrou já com a opinião manifestada no excellente discurso que o Sr. Ministro da Justiça acaba de proferir.

Fiquei convencido que vamos estabelecer um principio liberal que é absolutamente necessario manter na Constituição. Embora a instituição do alto tribunal da Republica fosse effectivamente uma cousa nova, original, que mostra o cuidado com que a commissão tratou o assunto, a verdade é que ella não pode merecer a minha approvação porque representa em todos os seus pontos, absolutamente um ponto de vista completamente inadmissivel sob o aspecto democratico.

Tenho ouvido aqui sustentar que ha, pela redacção deste artigo, confusão de poderes.

A meu ver, a unica maneira de estabelecer eficazmente a responsabilidade ministerial é remettendo os ministros pelos crimes de responsabilidade, como pelos crimes communs, para os tribunaes ordinarios. E, se os crimes praticados, quer pelos Deputados, quer pelos Senadores, são julgados pelo poder judicial, não me parece que haja razão de especie alguma para exceptuar o Presidente da Republica.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Alfredo de Magalhães.

O Sr. Alfredo de Magalhães: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: não proferirei mais de meia duzia de palavras para dizer, que continuo a manter a mesma opinião que ha pouco expressei professando a doutrina do Sr. Ministro da Justiça.

Interrupção do Sr. João de Freitas.

V. Exa. interrompe-me para dizer o quê?

Uma voz: - É apoiado.

O Orador: - Ah! obrigado.

Devo dizer em resposta ao Sr. João de Freitas que as suas considerações são improcedentes, porque se referem ao poder judicial e instituição do jury.

Neste, como noutros pontos da Constituição, mantenho ainda a mesma opinião de que nós do que carecemos é de instituições democraticas, para que a Republica não possa seguir no mesmo regime das instituições monarchicas.

Tanto o poder judicial como o jury enfermam do vicio de origem e o que é necessario é reformar a sagrada instituição do jury, tratando de dar ao poder judiciario duas condições de livre exercicio: a sua perfeita independencia e a sua alta instrucção.

De resto, desde que se está numa Republica igualitaria não se comprehende por que se ha de fazer uma excepção para os Ministros.

Allega o Sr. João de Freitas a incompetencia do jury para julgar os Ministros, mas essa mesma incompetencia elle demonstra em julgar os crimes communs.

Desde que estamos a fazer uma Republica Democratica, não se comprehende que, sendo os Ministros cidadãos perfeitamente como os outros individuos, não incorram nas mesmas penas, nas mesmas responsabilidades dos delictos communs a que o Sr. João de Freitas alludiu.

Mas o que urge é que o jury seja constituido por pessoas com competencia afim de resolver justamente. Desapparecerá então toda a repugnancia de entregar os Ministros ao poder judicial, desde que elle não seja organizado com independencia e saber.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. João de Freitas.

O Sr. João de Freitas: - Sr. Presidente: o Sr. Ministro da Justiça, no seu discurso de ha pouco, increpou-me por ter apresentado medidas reaccionarias e nomeadamente a proposta relativa á instituição do veto. Ora o Sr. Ministro da Justiça não ligou maior importancia a essa minha proposta, porque se S. Exa. lhe tivesse prestado attenção não podia, de modo algum, fazer-me tal accusação, porque então seria levado a accusar de reaccionarias a Constituição Norte Americana, a Constituição Brasileira e até a Constituição Francesa.

Accusar-me de ter uma orientação reaccionaria, somente por ter defendido e sustentado não com o brilho oratorio de S. Exa., mas como podia e sabia numa disposição que se encontra nessas constituições, será tudo menos fazer justiça ás intenções de quem apresentou essa emenda.

Deixando de parte estas considerações e passando á discussão do artigo 42.° eu continuo a sustentar, apesar das razões adduzidas pelo Sr. Ministro da Justiça, a necessidade de manter-se o Alto Tribunal da Republica. Não se trnta de nenhum tribunal de excepção, mas de um tribunal commum, superior na escala hierarchica da magistratura, o qual fica tendo competencia para julgar os actos delictuosos dos Ministros.

Eu peço a V. Exa. que me diga onde vae organizar um jury com capacidade especial, superior á que deve ter o Deputado ou Senador para apreciar em materia de facto.

De resto, organizando este tribunal, combina - se assim o respeito que se deve ter pelos tribunaes ordinarios communs, porque fica o tribunal commum, Supremo Tribunal de Justiça, o mais elevado na escala hierarchica da organização judicial, e fica só aquelle para julgar estes delictos e com um jury, que nesta materia especial, deve ter conhecimento inais autorizado, mais vasto para julgar com conhecimento de causa estes delictos especiaes.

As razões invocadas pelo Sr. Ministro da Justiça e pelo Sr. Alfredo de Magalhães não me convenceram.

Disseram S. Exas. que as razões que invoquei são improcedentes, mas não o demonstraram, e eu creio ter demonstrado que d'esta fornia se combina o systerna de julgamento nas republicas parlamentas, da francesa, em que o Senado, constituido em Supremo Tribunal de Justiça, tem competencia para apreciar os delictos paaticados pelo Presidente da Republica e Ministros do Estado com o respeito pelos Tribunaes Ordinarios, confiando ao Supremo Tribunal de Justiça competencia especial para julgar estes crimes em materia de direito; e para materia de facto com um jury especial que pode ser formado por Deputados e Senadores ou por Senadores conforme o artigo 54.

As razões que invocaram não me convenceram; sustento por isso a necessidade de se manter o artigo 42.° como está e o artigo 54.°, se se eliminar a 3.ª parte do artigo 42. Entendo que esta instituição é uma das mais salutares contidas no projecto que se discute.

Tenho dito.

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SESSÃO N.° 47 DE 14 DE AGOSTO DE 1911 7

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Germano Martins.

O Sr. Germano Martins: - Pedi a palavra para responder a um argumento do Sr. Barbosa de Magalhães.

Já se votou aqui que Deputado ou Senador algum poderá ser preso ou processado, emquanto for valido o seu mandato, sem previa licença da Camara; o Ministro, que não é Deputado nem Senador, fica em peores circunstancias do que aquelles.

Como já disse a V. Exa., não me importa que o Ministro seja julgado pelos tribunaes ordinarios, por isso mando para a mesa a seguinte

Proposta

Substituição da 2.ª parte do artigo 42.°:

"Os Ministros serão pronunciados pelo Supremo Tribunal de Justiça e julgados pelos tribunaes ordinarios". = O Deputado, Germano Martins.

Lida na mesa, foi admittida.

O Supremo Tribunal de Justiça é o tribunal mais alto da hierarchia judicial, e portanto, deve reconhecer-se-lhe a competencia, filha da sua larga experiencia, para julgar se o Ministro deve ou não ser pronunciado.

Devo dizer que se para a pronuncia basta um simples indicio, o Ministro que não é Senador ou Deputado, pode ser afastado do seu logar por um simples indicio.

Ora isto não pode ser, porque amanha quem se quisesse vingar de um Ministro, apresentava duas ou tres testemunhas para arranjar indicio sufficiente para pronunciar esse Ministro.

Quero que se deem todas as garantias ao Ministro, se a pronuncia for levada a effeito deve ser com todas as circunstancias da verdade.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro da Justiça pede para falar novamente.

Segundo o disposto no Regimento, não pode falar mais de duas vezes sobre o mesmo assunto, e S. Exa. já falou duas vezes.

No entanto, se a Camara consente que S. Exa. fale mais uma vez queira manisfestar-se levantando-se.

Vozes: - Fale, fale.

O Sr. Presidente: - Tem S. Exa. a palavra.

O Sr. Affonso Costa: - Agradeço á Camara a sua condescendencia de me deixar usar novamente da palavra e prometto não abusar da sua benevolencia.

A Camara labora num equivoco acêrca do tribunal commum, porque, pelo texto do artigo do projecto, os crimes communs dos Ministros iam para o tribunal commum e só não iam pelos crimes de responsabilidade; logo, não imaginem que o Ministro que dá uma bofetada se livra de ir para a Boa Hora como qualquer cidadão.

O que está estabelecido para a generalidade dos cidadãos, é o que se ha de adoptar para todos.

Entregar a um tribunal especial crimes, que realmente por esse tribunal serão só vistos com extrema benevolencia ou então com extremo rigor, é que é um grande perigo. (Apoiados).

Pode haver, parece-me, tres escalas em relação a julgamento de Ministros: uma, entregando todos os crimes communs e especiaes ou de responsabilidade aos tribunaes communs, e é a minha opinião; outra, nada entregando aos tribunaes communs e salvando o Ministro dos embaraços de tribunaes communs, mediante a instituição ou de um alto tribunal, ou da prerogativa de serem pronunciados pelo Supremo Tribunal de Justiça proposta pelo Sr. Germano Martins; e finalmente a outra entregando ao tribunal especial os crimes tambem especiaes.

Este ultimo é peor que todos os outros.

Justamente o crime que é preciso arrancar ao tribunal especial, é o que lhe vão entregar.

Um individuo que praticou esse delicto especial, tendo um alto tribunal que pode ser dominado por correntes politicas terá a sua absolvição plena! (Apoiados).

Façamos uma obra sã; desde que os Ministros não tenham de rasgar a sua sobrecasaca para subir ao Tribunal da Boa Hora... não perdem nada do seu primor indo ao tribunal defender-se de crimes communs.

Nós, na Republica, não podemos admittir, por hypotheses, que se pratiquem crimes d'esta ordem, os ataques á Constituição e aos dinheiros publicos, porque isso foi possivel aos Ministros reaccionarios e despoticos.

Nesse alto tribunal onde ha amigos ou adversarios, é de prever a paixão partidaria; e então podia dar-se a possibilidade d'este facto monstruoso: os innocentes serem condemnados; os delinquentes absolvidos. Ao passo que indo para o tribunal commum, serão ahi pronunciados mas poderão recorrer para a Relação e, se ainda não bastar, para o Supremo Tribunal.

Eu insisto por esta doutrina que me parece fundamental.

Agora as minhas desculpas por ter falado mais do que devia.

Parecia-me que tinha o direito de falar tres veses e tantas vezes quantas fossem precisas; agora V. Exa. fez bem porque, mesmo que o Regimento o permittisse, sem a Camara dar sinal de licença, eu não usava da palavra.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Celestino de Almeida.

O Sr. Celestino de Almeida: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta de additamento e emenda ao artigo 42.° que diz o seguinte:

Additamento

Artigo 42.° (bis). A responsabilidade Ministerial politica é individual.

§ 1.° A responsabilidade Ministerial collectiva tem logar perante uma interpellação sobre a politica geral do Ministerio, a que se segue votação de censura por dois terços da Camara.

§ 2.° A responsabilidade Ministerial collectiva tem ainda logar em face de uma votação do Congresso, sobre assunto de ordem financeira, que impossibilita a vida normal do Governo.

O Deputado, Celestino de Almeida.

Sr. Presidente: nós estamos presentemente a discutir o projecto na especialidade e por artigos, não entro por isso em pormenores. Nestas condições limito-me a mandar para a mesa a minha proposta.

Foi admittida.

O Sr. Presidente: - Sobre a primeira parte do artigo não ha sobre a mesa nenhuma proposta de substituição; acho portanto conveniente submettê-lo á votação da Camara. (Apoiados).

Foi approvado.

Seguidamente lê-se na mesa, sendo approvada a proposta do Sr. Affonso Costa.

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8 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

O Sr. Presidente: - Vae fazer-se a contraprova em virtude de a ter requerido um Sr. Deputado.

Fez-se a contraprova, sendo approvada.

É lida a proporia do Sr. Germano Martins, sendo rejeitada.

Leu-se tambem na mesa, sendo rejeitada, a proposta de emenda do Sr. Celestino de Almeida.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. João de Menezes.

O Sr. João de Menezes: - Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer uma observação. Os Ministros podem ser ou não Senadores ou Deputados?

Desde que se approvou ainda agora uma emenda dizendo que os Ministros que fossem Senadores ou Deputados não perdem o mandato legislativo, e desde que elles não perdem esse mandato conservam, por isso, as prerogativas consignadas no artigo 15.°, ficam existindo Ministros privilegiados, os que sendo Senadores ou Deputados não podem ser processados criminalmente sem previa licença da Camara, e os que não pertencendo ao poder legislativo não gozam d'essa prerogativa.

Era isto que eu queria dizer, e mais nada.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais ninguem inscrito, vae votar-se. Devo observar que acêrca do artigo 42.° não ha sobre a mesa propostas de emenda ou substituição; todas as propostas apresentadas se referem ao segundo periodo. Julgo por isso conveniente proceder-se á votação por periodos.

Consultada por isso a Camara assim se resolveu.

O Sr. Presidente: - Peço a attenção da Camara. Existe na mesa uma emenda do Sr. Germano Martins, que não foi submettida ainda á votação e diz respeito á pronuncia dos Ministros pelo Supremo Tribunal de Justiça. Como contem materia estranha ao artigo, pergunto á Camara se a devo ou não pôr á votação.

Assim se resolveu.

Posta a emenda a votação foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a emendado Sr. Celestino de Almeida.

Leu-se.

O Sr. Presidente: - Esta emenda tem de ser posta á votação por partes.

O Sr. Celestino de Almeida:-Em virtude da precipitação com que redigi o artigo, esqueceu-me pôr as palavras a responsabilidade ministerial, politica e individual. Por isso peço autorização á Assembleia para fazer essa modificação na minha proposta.

Na generalidade tratamos do assunto, mas na especialidade não nos occupamos d'elle.

Por isso peço autorização á Assembleia para fazer essa modificação na minha proposta.

Foi autorizada.

Submettida a proposta á votação, foi successivamente rejeitada em todas as suas partes.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o n.° 43.° do artigo.

É o seguinte:

N.° 43.° Nos primeiros quinze dias depois de constituida a Camara dos Deputados, os Ministros apresentarão os orçamentos dos seus Ministerios.

O Sr. Presidente: - Está em discussão. Tem a palavra o Sr. Alexandre de Barros.

O Sr. Alexandre de Barros: - A Assembleia Nacional Constituinte deliberou que a abertura da sessão legislativa fosse no dia 2 de dezembro de cada anno, e o artigo 43.° estabelece que nos primeiros quinze dias depois de constituida a Camara dos Deputados, os Ministros apresentem os orçamentos dos seus Ministerios.

Desejava que a commissão do projecto, ou a commissão de finanças, me dissesse como é que deve comprehender-se este artigo, se elle não vem trazer gravissimos embaraços de ordem economica e financeira se o votarmos tal como se encontra redigido.

No dia 2, o orçamento que seja apresentado pelos diversos Ministerios deve ser decididamente una orçamento destinado a vigorar, ou no anno civil, ou no anno economico. Se elle é destinado a vigorar no anno civil, começa em janeiro e finda em 31 de dezembro. Compre-hendo a impossibilidade de discutir seriamente um orçamento que seja apresentado depois do dia 17 de dezembro. Se se destina a vigorar no anno economico, não se comprehende como se ha de discutir em janeiro um orçamento que só pode vigorar em l de julho de cada anno. Supponho que este artigo se redigiu antes de se presumir que a Camara houvesse de abrir a sessão em 2 de dezembro.

Tão delicada acho a materia d'este artigo que eu dese-ava ouvir as explicações da commissão de finanças, ou da commissão do projecto.

Penso que, sobre este assunto, a Assembleia não fará mal em discuti-lo meudamente e votar depois.

Interroguei o Sr. Ministro das Finanças sobre este assunto, e S. Exa., embora particularmente não me desse explicações que pudessem esclarecer o meu espirito, desejava que S. Exa. me esclarecesse e eu depois pediria a palavra para explicações de outra natureza.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Estevam de Vasconcellos.

O Sr. Estevam de Vasconcellos: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho a seguinte substituição no artigo 43.°

Art. 43.° Os Ministros apresentarão os orçamentos dos seus Ministerios até o dia 31 de janeiro.

Sala das Sessões, em 14 de agosto de 1911. = O Deputado, Estevam de Vasconcellos.

Sr. Presidente: a disposição que se encontra no artigo 43.° do projecto da Constituição foi feita na persuação da Camara abrir em 31 de janeiro.

Abertas as Camaras em 2 de dezembro, é absolutamente impossivel que todos os Ministros possam apresentar, nos primeiros quinze dias depois de constituida a Camara dos Deputados, os orçamentos dos seus Ministerios.

É tal o estado de anarchia que tem havido entre o poder executivo e o poder legislativo, que não temos elementos seguros pelos quaes precisamos dizer qual a data em que os orçamentos possam ser presentes á Camara.

A hypothese a que se referiu o Sr. Alexandre de Barros, de que o orçamento pudesse dizer respeito a annos

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SESSÃO N.° 47 DE 14 DE AGOSTO DE 1911 9

civis, é absolutamente inadmissivel; o orçamento tem de referir-se a annos economicos.

Já devemos ficar satisfeitos se o orçamento for presente no dia 31 de janeiro de cada anno.

Uma voz: - É muito cedo.

O Orador: - Deve notar-se que é preciso que a Camara tenha depois tempo para estudar e discutir esse diploma.

Chamo a attenção da Assembleia para o seguinte.

É de toda a conveniencia que o orçamento venha á Camara o mais cedo possivel, mas é inconveniente fixar na Constituição um principio que depois não possa ser cumprido.

O bom seria fazer se como no Japão, em que o orçamento é apresentado com alguns meses de antecipação áquelle que inicia o anno a que elle diz respeito.

Mas não podendo ser como no Japão, parece-me que a questão já fica bem resolvida com a minha emenda.

Salientou se aqui o inconveniente de vir o orçamento á Camara, seis meses antes da época a que diga respeito.

Ora tal argumento mais razão teria de ser se se mantivesse o que está na Constituição, que marca o prazo de quinze dias depois da abertura da Camara, para apresentação do orçamento.

Estou pronto a retirar a minha substituição se appare-cer outra melhor. (Apoiados).

Tenho dito.

O orador não reviu.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta de emenda apresentada pelo Sr. Estevam de Vasconcellos.

Foi lida na mesa e admittida.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. José Barbosa.

O Sr. José Barbosa: - O projecto da Constituição marcava que ao fim de quinze dias de constituida a camara seria apresentado o orçamento, porque se fixava a data de 31 de janeiro para a abertura do Parlamento.

Assim, pois, o orçamento seria apresentado em 15 de fevereiro.

Supponho que podemos fixar 'o prazo de quarenta e cinco dias ultimos da sessão legislativa para discussão do orçamento e medidas financeiras.

Acho que se deve apresentar uma emenda neste sentido.

No Japão é o final da sessão legislativa que se destina exclusivamente á discussão do orçamento e de assuntes diversos de finanças.

Vou redigir nesse sentido uma emenda que tenho a honra de mandar para a mesa.

E a seguinte:

Proposta

Art. 43.° Os orçamentos serão apresentados ao Congresso pelo menos quarenta e cinco dias antes do termo da sessão legislativa ordinaria. - José Barbosa.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Feres Rodrigues.

O Sr. Peres Rodrigues: - Sr. Presidente: a commissão do projecto havia fixado o ineado de fevereiro para apresentação do orçamento. Eu, porem, entendo que não é conveniente fixar o prazo para a apresentação d'aquelle diploma, e que apenas se deve dizer que antes de se entrar no quarto mês da sessão legislativa, elle deve ser apresentado, porque se já não houver tempo de o examinar, a Camara proroga a sessão, ou adia-a para abril, para então discutir o orçamento. Nestes termos mando para a mesa a seguinte

Emenda ao artigo n.° 43.° Em vez de:

"Nos primeiros quinze dias depois de constituida a Camara dos Deputados".

Inscreva-se:

"Antes de se entrar no quarto mês da sessão legislativa". = Peres Rodrigues.

De resto isto mesmo concorda com a proposta apresentada pelo Sr. José Barbosa, o que me parece ser vantajoso.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Goulart de Medeiros.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Eu entendo, Sr. Presidente, que o orçamento não se deve apresentar com grande antecedencia, porquanto muitas vezes é necessario prever os encargos que trazem as leis votadas. (Apoiados).

Por isso encontro razão naquelles que desejam que o orçamento venha á Camara o mais cedo possivel, mas parece-me muito difficil consegui-lo.

E porque isso assim é, tenho a opinião de que o orçamento venha á Camara um mês antes de encerrada a sessão legislativa.

Neste sentido vou mandar para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o artigo 43.° seja substituido pelo seguinte:

Os orçamentos dos differentes Ministerios serão apresentados pelo menos um mês antes de encerrada a sessão legislativa. = O Deputado, Manuel Goulart de Medeiros.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Egas Moniz.

O Sr. Egas Moniz: - Este artigo foi transplantado da velha carta constitucional, e era um dos preceitos mais queridos nas disposições d'este diploma.

Eu entendo, Sr. Presidente, que o Orçamento Geral do Estado deve ser apresentado ao Parlamento o mais cedo possivel.

Ministerios houve que dentro d'este espaço de quinze dias o apresentaram e não sirva de razão dizer-se, que, tendo as novas camaras de reunir-se em principios de dezembro e não em principios de janeiro não pode consignar-se esse principio, porque eu affirmo que, nos tempos da monarchia, houve occasiões em que as Camaras se reuniram em outubro e comtudo essa disposição foi cumprida, até mais fielmente.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Os orçamentos no antigo regime não representavam a verdade.

O Orador: - Sempre ataquei esses orçamentos e teria agora um grande prazer em formar, acêrca d'esse diploma, uma opinião inteiramente diversa. Mas, devo dizer a S. Exa., que mesmo para um orçamento falso é preciso tempo para o estudar e discutir e talvez até seja necessario maior espaço de tempo.

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10 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Eu não faço questão de quinze dias; para mim o que é fundamental é que se marque um prazo.

De maneira alguma posso acceitar a doutrina d'aquelles que querem protelar a sua discussão para depois, de maneira que tenhamos só um mês para a discussão do orçamento. (Apoiados).

V. Exas. sabem que o orçamento é a questão mais grave de todas as que aqui se discutem. (Apoiados). V. Exas. sabem que vindo o orçamento á Camara tem de ir para a commissão de fazenda e não ha nenhuma commissão de fazenda, par mais diligente que seja, que apresente o orçamento devidamente apreciado em menos de quinze ou vinte dias.

E necessario que, para a discussão de um diploma d'esta natureza, a Assembleia tenha deante de si bastante tempo para não ter de o apreciar de afogadilho.

Chamo a attenção da Camara para este assunto.

Como julgo indispensavel que fique consignado na Constituição o prazo que concedemos ao poder executivo para apresentação do orçamento, mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o prazo de quinze dias marcado no artigo 43.° passe a ser de trinta dias. = O Deputado, Egas Moniz.

Foi admittida.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. José Relvas: - Dispensar-me-hia de tomar a palavra sobre este assunto se o Sr. Alexandre de Barros, referindo-se a uma conversa que tivemos não me collocasse na obrigação de dizer algumas palavras a este respeito.

Entendo, como o Sr. Egas Moriiz, que é absolutamente indispensavel, que a apresentação do orçamento se faça a tempo de poder ser devidamente apreciado, porquanto elle constituo o diploma mais importante.

O Sr. Dr. Egas Moniz disse, e muito bem, que se não trata apenas da discussão na sala do Parlamento, trata-se tambem da discussão dentro da commissão. (Apoiados).

E preciso um estudo muito demorado, e é possivel que a Camara, sem o estudo da commissão, não se queira occupar do orçamento.

E por isso sou de parecer que não deve ser apresentado alem de quinze dias depois do mês de janeiro.

Nesse sentido mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o artigo 43.° seja assim redigido:

"Nos primeiros quinze dias de janeiro o Ministro das Finanças apresentará á Camara o orçamento do Estado".

Sala das Sessões, 14 de agosto de 1911. = O Deputado, José Relvas.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Goulart de Medeiros.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Afinal Sr. Presidente tudo o que se tem dito a este respeito não vem senão confirmar o que eu havia já exposto sobre este assunto, mas a melhor affirmação foi a de que a commissão vae apresentar a esta assembleia o orçamento; e se o não apresentou já é porque as leis promulgadas pelo Governo provisorio demoraram a sua confecção.

Nós temos que fixar as futuras despesas do Estado.

Uma outra cousa que é preciso explicar ao Sr. Germano Martins é que nunca se fizeram orçamentos neste país.

Havia uns individuos encarregados de preparar essas contas, e o Parlamento não lhe ligava importancia alguma. Era a repartição de contabilidade que verificava se correspondiam as despesas, e se as contas eram ou não exactas.

O orçamento é somente uma presunção. O que na realidade é importante é verificar só as receitas e as despesas foram feitas em virtude das verbas determinadas pelo orçamento. Pode-se orçar uma despesa em mil contos de réis pelo Ministerio da Guerra, por exemplo, e pode essa despesa ser excedida.

É claro que é o Parlamento que teve que dar autorização; nós poderemos approvar as despesas a fazer não e desprezando a discussão do orçamento. Não se exija do Governo precipitação na confecção d'esse trabalho formando-nos de algum modo a discutir pelo systema antigo, precisando numeros que não teem coherencia alguma.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Estevam de Vasconcellos.

O Sr. Estevam de Vasconcellos: - É certo que alguns oradores propuseram 30 dias e outros mais para a apresentação do orçamento.

Ora, é claro que não tenho a menor duvida em substituir a data 31 de janeiro por 15 do mesmo mês, tanto mais que a proposta do Sr. Ministro offerece um prazo mais largo.

Por consequencia peço licença para retirar a minha iroposta porque acceito a do Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que autorizam o Sr. Estevam de Vasconcellos a retirar a sua proposta tenham a bondade de se levantar.

Foi concedida a autorização pedida.

O Sr. José Barbosa: - Sr. Presidente: Peço tambem para retirar a minha proposta.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que autorizam que o Sr. José Barbosa retire tambem a sua proposta, tenham a bondade de se levantar.

A Camara accedeu ao pedido.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a emenda do Sr. Deputado Peres Rodrigues.

Lida na mesa a posta a votação foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a emenda do Sr. Deputado Goulart de Medeiros.

Lida na mesa foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a emenda apresentada pelo Sr. Deputado Egas Moniz.

Lida na mesa e posta a votação foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a emenda mandada para a mesa pelo Sr. Ministro das Finanças.

Lida na mesa e posta a votação foi approvada.

O Sr. Presidente: - Por consequencia está prejudicado o artigo 43.°

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SESSÃO N.° 47 DE 14 DE AGOSTO DE 1911 11

Vae ler se o artigo 44.°

Leu-se.

Art. 44.° Os Ministros devem comparecer nas sessões do Congresso e teem sempre o direito de se fazer ouvir em defesa dos seus actos.

O Sr. Presidente: - Está em discussão. Ninguem pode a palavra vae votar-se.

Foi approvado.

O Sr. Presidente: - Se algum Sr. Deputado tinha qualquer additamento a mandar para a mesa, pode fazê-lo. Tem a palavra o Sr. José Barbosa.

O Sr. José Barbosa: - Não tenho additamento algum a mandar para a mesa, tenho apenas que lembrar á Camara que foi votado ha pouco um artigo com a declaração expressa de que estava dentro da Constituição.

Eu só faço esta prevenção por lealdade.

Nós não temos, portanto, agora a responsabilidade solidaria dos Ministros nos casos em que ella devia existir.

Quando tive occasião de falar na discussão da generalidade d'este projecto, fiz notar que era de toda a conveniencia, e até indispensavel, que se consigne na Constituição se ha ou não Presidente do Conselho.

Pretendo que se faça esta declaração porque sou presidencialista, e porque depois de approvada a Constituição será impossivel ou difficil introduzir-lhe este preceito e para que o país defina por que lado deve encarar a Constituição Portuguesa.

A Camara não disse até agora se entende que haja ou não Presidente do Conselho.

Eu entendo que o Presidente do Conselho é uma excrescencia dentro do regime, é uma duplicata do Presidente da Republica.

A Camara dirá agora, se assim o entender, se deve ou não haver Presidente de Conselho.

Ha pouco o Sr. Ministro da Justiça affirmou claramente que...

O Sr. Ministro da Justiça: - Já está votado o sufficiente para se discutir esse caso.

Nenhuma das razões apresentadas pelo Sr. Deputado caracteriza o caso.

O Orador: - E um Governo de gabinete?

Parece que não.

A caracteristica indica que os Governos parlamentares teem a responsabilidade solidaria e nós não a temos, temos a responsabilidade individual.

Ora, se um Ministro é responsavel publicamente, perante a Camara é responsavel solidario com os seus collegas.

É preciso, portanto, que se determine isto neste artigo, porque não ha sufficiente explicação do preceito.

É preciso uma nova doutrina estabelecendo se os Ministros são ou não solidariamente responsaveis.

E o que se me offerece dizer por emquanto.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Eduardo de Almeida.

O Sr. Eduardo de Almeida: - Pedi a palavra para declarar a V. Exa. e á Camara que, em minha opinião, a questão agora suscitada pelo Sr. José Barbosa está já resolvida pela votação do artigo 29.° da Constituição.

A Camara já declarou que o poder executivo é de delegação temporaria do poder legislativo, exercida pelo Presidente da Republica e pelos Ministros.

Desde o momento em que a Camara resolveu que fosse eliminada a enumeração de Ministros, e sendo incidentemente Presidente do Conselho um Ministro, não reconheço a necessidade de se introduzir um artigo novo na Constituição para declarar que á frente de Ministros, que não estão enumerados na Constituição, haverá um Presidente do Conselho sem funcções definidas, porque a Constituição não as pode definir.

O Sr. José Barbosa procedeu, certamente, num intuito de lealdade, declarando ser necessaria, desde que se tinha posto esta Constituição como parlamentar, que nella se definisse se havia gabinete com Presidente do Conselho. Mas V. Exa. labora num erro. Eu já na generalidade expus á Camara que o regime parlamentar não é estavel e immutavel. V. Exa. acaba de ver que na Inglaterra se deu uma importante evolução no regime parlamentar, e em França a corrente é do evolução parlamentar. Nós estamos collaborando nessa evolução, e a Republica Portuguesa é grande, não só pela maneira como foi proclamada, mas pela maneira como se está adeantando aos outros povos.

Os tratadistas não fazem mais do que expor nos seus livros as caracteristicas do regime parlamentar, tal como o conheceram, segundo os factos politicos, mas amanhã esses tratadistas hão de definir o regime parlamentar em conformidade com phenomenos sociaes existentes. Os tratadistas observam para nos seus compendios definirem quaes as caracteristicas d'este ou d'aquelle regime. É essa a confusão em que V. Exa. labora. Os tratadistas apenas observam os phenomenos sociaes que teem de definir nos seus tratados. Não são os tratadistas que impõem á sociedade certos caracteres ou quaesquer factos politicos...

Posto assim o assunto, entendo ser absolutamente desnecessaria e perigosa a instituição do Presidente do Conselho.

Essa materia, como a da organização do Ministerio, é uma das tarefas que ha de incumbir aos politicos da Republica, porque abrange alguns dos mais importantes problemas de administração e politica, modernamente discutidos. No outro dia, quando se discutiu o artigo 29.°, eu tive occasião de apresentar á Camara uma proposta para que fosse eliminado o Ministerio do Interior, se se não adoptasse o melhor criterio de supprimir da Constituição a enumeração dos Ministerios.

Sem desconhecer a intenção honesta como o Sr. José Barbosa pôs a questão, eu entendo que ella está resolvida e que o Parlamento andará bem não inscrevendo na Constituição que haja Presidente do Conselho, desde que julgou desnecessaria a enumeração dos Ministros, e que melhor procederá ainda não tratando, nem da existencia d'um gabinete, nem da responsabilidade collectiva, solidaria dos Ministros, que é aliás um principio adquirido. Seria um embaraço á propria evolução politica, que estamos determinando e viria impossibilitar desde já a iniciativa politica dos que pretendessem modificar a actual organização dos Ministerios. E julgo mesmo que essa materia não é constitucional e que, amanhã, ella representa para nós um perigo.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. José Barbosa (interrompendo): - Os senhores que não são de frases feitas é que laboram num erro...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Affonso Costa.

O Sr. Affonso Costa: - S. Exa. o Sr. José Barbosa já disse que não mandava proposta para a mesa porque

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12 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

era presidencialista: ora não havendo proposta nenhuma na mesa, para que havemos de estar a perder tempo?

Para que havemos de fazer d'esta Assembleia uma academia a discutir?

Emquanto não se apresenta proposta, para que a discute S. Exa.?

O Sr. Celestino de Almeida: - A Assembleia, me parece, pronunciou-se contra a minha proposta que foi a unica que se apresentou nesse sentido e por isso é que eu renovo agora a proposta tal qual foi rejeitada pela Camara.

O Sr. Affonso Costa: - Isso pertence ás leis ordinarias. V. Exa. labora num equivoco quando suppõe que, por cada Ministro responsavel, não o pode ser solidariamente, quando em direito essa responsabilidade solidaria é inteira de todos e de cada um.

V. Exa. está a fazer a sua dissertação de direito constitucional com 20 annos de idade.

É direito que já tem cabellos brancos. (Risos).

O Sr. José Barbosa: - Sr. Presidente: o Sr. Eduardo de Almeida disse que o regime parlamentar não exigia declaração de que havia Presidente do Conselho ou não. Não se trata agora d'isso, do que se trata é de saber se ha Governo de Gabinete, por isso eu, satisfazendo o pedido do Sr. Dr. Affonso Costa, vou apresentar uma proposta dizendo que não haverá Governo de Gabinete.

O Sr. Presidente: - Peço silencio. Continua no uso da palavra o Sr. Celestino de Almeida.

O Sr. Celestino de Almeida: - Está-se fallando do regime parlamentar e do regime presidencial e eu tenho receio de incommodar a Camara, falando d'este assunto, sobre o qual não tenho competencia, mas qualquer homem de boas intenções, com um bocadinho de bom senso e um quasi nada de observação do que se faz nos parlamentos, lá fora, pode ter uma opinião a este respeito.

Eu tenho a minha.

O regime parlamentar, essencialmente sob o ponto de vista concreto do que estamos a tratar, consiste no seguinte: Ha um individuo que se costuma chamar Presidente do Conselho que é encarregado pelo chefe de Estado, seja monarcha ou Presidente da Republica, de constituir o Ministerio. Ora, eu pergunto, Sr. Presidente, na Republica parlamentar, desde que não haja quem execute essas demarches preparatorias, quem as ha de fazer? Se for o Presidente da Republica teremos, não o regime parlamentar, mas o presidencialista.

Não tenho que dar lições á Assembleia, antes tenho de recebê-las. Releve-se-me por isso expor a minha opinião. Mando por isso para a mesa a seguinte

Emenda

"Art. 42.°, mantem-se o primeiro periodo.

Os Ministros serão julgados, nos crimes de responsabilidade politica, por um tribunal constituido pelo Alto Tribunal de Justiça, e por igual numero de delegados do Senado, eleito por lista incompleta". = O Deputado pelo circulo n.° 38, Celestino de Almeida.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Affonso Costa.

O Sr. Affonso Costa: - Lembro que a Camara acabou de rejeitar uma proposta idêntica, á do Sr. Celestino de Almeida.

Se muitos deputados votaram contra essa proposta foi não porque não concordassem com os seus principios, mas se entenderem que ella não constituia materia constitucional, e sim ser objecto de uma lei ordinaria.

O Sr. Celestino de Almeida: - Eu falei em responsabilidade ministerial collectiva em condições muito estrictas.

O Sr. Affonso Costa: - V. Exa. falou em responsabilidade ministerial collectiva e o Sr. José Barbosa, nos casos de politica geral.

Inscrever qualquer d'estas propostas na Constituição é gerir os direitos de poder legislativo. O que está na Constituição está bem: quem exerce o poder executivo é o Presidente da Republica e os Ministros. Se se inscrever na responsabilidade individual, exclue-se a responsabilidade solidaria. Eu espero que, com a evolução, a Republica Portuguesa venha até a dispensar o Presidente da Republica, pelo qual voto conscientemente, por cuja conservação voarei na revisão que se fizer na Constituição, e por cuja eliminação votarei quando entender que já não e necessario.

Chegado o momento em que dispensemos o Presidente da Republica, temos avançado muito.

Na propria organização do poder executivo podemos encontrar grandes modificações.

Mas neste momento, na situação em que o país se encontra, deixemos ficar a constituição como está.

É bastante para a organização do poder legislativo, e a evolução dos factos dir-nos-ha o que a Republica considera mais util.

O Presidente da Republica pode escolher um homem e esse homem é que escolhe os outros.

Fiquemos com o que aqui está que é sufficiente.

A responsabilidade solidaria, a que S. Exa. se referiu, não fica excluida, e a legislatura ordinaria caminha para a exclusão de todos os orgãos desnecessarios, isto é, para a abolição do Presidente da Republica, para a Constituição do Estado democratico, para a igualdade de todos emfim. (Apoiados).

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Celestino de Almeida.

O Sr. Celestino de Almeida: - Sr. Presidente: falei incidentalmente na Presidencia do Conselho e no mester que ella tem a desempenhar, porque não me pareceu que isso tenha a importancia que o Sr. Affonso Costa quis attribuir á minha proposta de additamento.

Mas permitta-me a Assembleia que eu uie refira a um ponto concreto, a um caso especialissimo que é um perigo grave e um inconveniente reconhecido em todos os parlamentos: é á instabilidade ministerial.

Vozes: - Votos, votos.

O Orador: - A Assembleia está com pressa de votar, mas eu podia usar do direito de continuar a falar, emquanto o Sr. Presidente não me interrompesse.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. João de Menezes.

O Sr. João de Menezes: - Julga conveniente observar os factos, quando se trate de modificar o direito de interpellação e assegurar a estabilidade dos Governos.

A actual Republica Francesa tem tido cincoenta e um Ministerios, alguns dos quaes não duraram mais de tres a quatro meses.

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SESSÃO N.º 47 DE 14 DE AGOSTO DE 1911 13

E certo que a repetição das crises ministeriaes tem sido um derivativo que tem evitado actos violentos, revoltas e tumultos, mas é certo tambem que as crises ministeriaes da França teem-na prejudicado na politica internacional, nas finanças, na organização militar e na organização naval.

Seria um grande bem para a Republica Portuguesa que se estabelecessem as regras e se fixassem as condições em que os Gabinetes são forçados a demittir-se.

Nunca mais tornará a haver neste país uma Camara tão independente como esta. Muitos dos erros que esta Assembleia tenha praticado, muitos dos seus defeitos são compensados pela certeza que tem o povo de que esta Assembleia não é instrumento de chefes de partido.

No dia em que venham a constituir-se partidos dentro da Republica (o que é inevitauel e necessario, porque a existencia de um só partido daria logar á criação de tyrannetes), o que o orador não deseja antes d'esta Assembleia haver terminado o seu mandato, veremos que os Governos não podem estar sujeitos ás contingencias a que estiveram os Governos da monarchia nos ultimos vinte annos.

O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para se votar, a proposta do Sr. José Barbosa.

Posta á votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Deu a hora.

A próxima sessão é amanhã, 15, ás 2 horas da tarde sendo a ordem do dia a continuação da discussão do projecto de lei n.° 3 (Constituição).

Está levantada a sessão.

Eram 12 horas e 15 minutos da noite.

Documentos mandados para a mesa nesta sessão

Declarações de voto

Se estivesse presente quando se votou a moção do Sr. Dr. João de Menezes, declaro que a rejeitaria, por não considerar questão de principios a inelegibilidade dos Ministros para a Presidencia da Republica.

Assembleia Nacional Constituinte, em 14 de agosto de 1911. = O Deputado, Padua Correia.

Para a acta.

Declaro que votei o additamento proposto, pelo Sr. Deputado Francisco Cruz, ao n.° 9.° do artigo 39.° Não concordo que o Presidente da Republica possa indultar os crimes dos Ministros.

Sala das Sessões, em 14 de agosto de 1911. = O Deputado, Tiago Salles.

Para a acta.

Declaro que votei contra a moção apresentada pelo Deputado Sr. João de Menezes na sessão de hoje.

Lisboa, Sala das Sessões, em 14 de agosto de 1911. = O Deputado, Achilles Gonçalves.

Para a acta.

O REDACTOR = Albano da Cunha.

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